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número 26 | jun./dez. 2003 planejamento e políticas públicas ppp Brasília, 2006 As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e de inteira responsabilidade dos autores, não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ou o do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. A produção editorial desta publicação contou com o apoio financeiro do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID, via Programa Rede de Pesquisa e Desenvolvimento de Políticas Públicas – Rede-Ipea, o qual é operacionalizado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvi- mento – Pnud, por meio do Projeto BRA/04/052. É permitida a reprodução deste texto e dos dados nele contidos, desde que citada a fonte. Reproduções para fins comerciais são proibidas. © Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – ipea 2005 Planejamento e Políticas Públicas v.1−, n.1−, jun. 1989 – Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Semestral. Editor anterior: de 1989 a março de 1990, Instituto de Planejamento Econômico e Social. ISSN 0103-4138 1. Economia 2. Políticas Públicas 3. Brasil. 4. Periódicos. I. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. CDD 330.05 NOTA DO EDITOR A revista “Planejamento e Políticas Públicas – PPP” foi lançada pelo Ipea em 1989 com o objetivo de tornar-se referência para acadêmicos, gestores de go- verno e todos aqueles interessados na formulação, acompanhamento e avalia- ção de políticas públicas no Brasil. Desde então tem publicado trabalhos sobre os mais diversos aspectos das políticas públicas brasileiras, incentivado o debate sobre o tema e contribuído significativamente para a cultura da gestão pública no país. Atualmente a PPP passa por uma reestruturação interna que visa dar-lhe maior dinamismo e superar os atrasos experimentados nas últimas edições. Neste esforço, estão sendo lançadas proximamente, além do presente número, as edições de números 27 e 28, referentes aos anos de 2004 e 2005, respecti- vamente. Com isso, poderemos recuperar a cronologia desta publicação tão relevante para a melhoria e o desenvolvimento das nossas políticas públicas. Marcelo Piancastelli EDITOR SUMÁRIO ALGUMAS OBSERVAÇÕES SOBRE ORÇAMENTO IMPOSITIVO NO BRASIL 7 Edilberto Carlos Pontes Lima AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA PROMOVER E IMPLEMENTAR OS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO TRABALHO E A INTEGRAÇÃO ECONÔMICA INTERNACIONAL 17 Maria Cristina Mattioli TENDÊNCIAS DA BALANÇA DE COMÉRCIO EXTERIOR DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA BRASILEIRA: EVOLUÇÃO DAS IMPORTAÇÕES E EXPORTAÇÕES DE FARMOQUÍMICOS E MEDICAMENTOS NA DÉCADA DE 1990 33 Luís Carlos G. de Magalhães Leandro Pinheiro Safatle João Carvalho Leal Frederico A. Tomich Fernando Gaiger Silveira MAPAS CENSALES DE CARENCIAS CRÍTICAS EN LA RONDA DE LOS 2000: VIEJOS PROBLEMAS Y NUEVAS PROPUESTAS 65 Alícia Gómes Gustavo Álvares Fernanda Olmos Ariel Lucarini UMA AGENDA FISCAL PARA 2007-2010 85 Fabio Giambiagi A INSTABILIDADE DA PERFORMANCE DOS SERVIÇOS DE SANEAMENTO NO BRASIL 115 Simone Alves de Faria Ricardo Coelho de Faria José Aroudo Mota ALGUMAS OBSERVAÇÕES SOBRE ORÇAMENTO IMPOSITIVO NO BRASIL* Edilberto Carlos Pontes Lima** O texto analisa os principais aspectos da adoção de um orçamento impositivo pelo Brasil. Trata das propostas em discussão e das implicações econômicas e políticas que cada modelo poderia trazer. 1 INTRODUÇÃO Um dos assuntos em pauta no debate brasileiro atual é a adoção do chamado orçamento impositivo, que, em poucas palavras, visa obrigar o Poder Executi- vo a executar a programação orçamentária aprovada pelo Poder Legislativo. Diversas proposições sobre o tema tramitam no Congresso Nacional. O assunto tem vários aspectos a ser considerados, como questões concei- tuais e, principalmente, uma dimensão política que envolve disputa de poder extremamente relevante. É importante ter a perspectiva, como chama a aten- ção Allen Schick (1998), de que o “orçamento não é um processo para si mesmo, mas é parte de arranjos governamentais e institucionais mais amplos.” Há que se ressaltar que a maior parte do orçamento público já é de exe- cução obrigatória, como as despesas com pessoal, com benefícios previdenciários, com transferências a estados e municípios, com pagamento de juros e amorti- zação da dívida pública. Mesmo a ampla maioria das despesas de custeio é de execução obrigatória, já que não há como se deixar de pagar as contas de água, de luz, de serviços de limpeza, entre outras, inerentes ao funcionamento da máquina pública. Resta, portanto, parte do custeio, principalmente o referen- te a novos programas ou expansão dos existentes e o investimento público, em que há uma discricionariedade relativa, pois muitos projetos dependem de investimentos realizados ao longo de vários anos, tornando muito difícil interrompê-los. Por exemplo, considere a construção de um prédio de tribu- nal que tenha iniciado há três anos, em outra legislatura. Uma nova legislatura teria dificuldade em interromper a obra se 50%, 60% ou 70% dela já tivesse sido realizada. * Este trabalho refere-se ao orçamento da União. Boa parte das conclusões aplica-se a estados e municípios. O trabalho beneficiou-se dos comentários de Márcio Rabat e da troca de idéias com Carlos Pereira. Eventuais erros e omissões são de inteira responsabilidade do autor. * * Consultor legislativo da Câmara dos Deputados. planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 20038 Com efeito, embora a aprovação do orçamento impositivo tenda a impli- car substancial aumento do poder do Congresso Nacional, como será demons- trado neste trabalho, tal poder está longe de ser para definir a totalidade do orçamento ou mesmo a maior parte dele, pois, pela atual sistemática, o Poder Executivo também tem o poder de alocação de recursos públicos – em face das dificuldades enumeradas – extremamente reduzido. Este trabalho discute alguns pontos do tema. Inicialmente, analisam-se as diversas versões que o orçamento impositivo pode adquirir. Em seguida, examinam-se, brevemente, a atual forma de organização do orçamento brasi- leiro, as propostas de mudança e as implicações dessas mudanças. Por fim, reflete-se sobre as dificuldades de tal alteração institucional. 2 AS DIFERENTES VERSÕES PARA UM ORÇAMENTO IMPOSITIVO Numa versão extrema, trata-se de obrigar o governo a executar integralmente a programação orçamentária definida pelo Congresso Nacional. Numa versão intermediária, para a não-execução de parte da programação, exige-se a anuência do Congresso. Versões mais flexíveis determinam a obrigatoriedade de imple- mentar apenas parte do orçamento, deixando alguma margem para o Executivo decidir sobre a implementação ou não. O modelo extremo é improvável, pois, segundo esse modelo, quem detém o poder de autorizar que determinado gasto seja realizado – o Congresso – não detém o poder de autorizar que ele não seja mais feito. A versão intermediária, seguida pelos Estados Unidos desde meados dos anos 1970, parece a mais razoável e permite alguma flexibilidade orçamentária. No modelo extremo, pode-se exigir que o governo contraia uma dívida para executar determinado gasto no caso de as receitas serem insuficientes para cobrir a totalidade das despesas previstas. Assim, se o orçamento previa o equilí- brio entre receitas e despesas, mas, por alguma razão, as receitas se frustraram, o governo deve, mesmo assim, executar integralmente as despesas fixadas. Numa situação intermediária, o governo poderia deixar de executá-las em razão de re- ceitas abaixo do esperado ou do crescimento inesperado de outras despesas prioritárias. Por exemplo, considere a situação de um orçamento que previa a construção de 100 ginásios de esporte em várias cidades do país. Suponha que, ao longo do ano, tenha ocorrido uma catástrofe que tenha deixado 1 milhão de pessoas desabrigadas em vários estados. O governo precisará providenciar abrigo emergencial, alimentação e vestuário para aquelas pessoas por algum tempo. Eventualmente,ajudará na construção ou reconstrução de suas residências. Considere que não houvesse qualquer reserva para tal tipo de contingência no orçamento ou que existisse alguma reserva em patamar inferior ao necessário. Seria natural, portanto, que o governo adiasse a construção dos ginásios, a fim de Algumas observações sobre orçamento impositivo no Brasil 9 realizar as despesas imprevistas com a catástrofe. No caso extremo mencionado, isso não seria possível, pois nem mesmo o Congresso poderia autorizar que a programação fosse desfeita. Com efeito, por ser a despesa com os danos provoca- dos por catástrofe absolutamente obrigatória, o governo assumiria dívidas para fazê-la, visto que não poderia adiar ou cancelar a construção dos ginásios. No caso intermediário, o governo poderia pedir autorização do Congresso para não construir os ginásios em face das novas despesas imprevistas. Um caso ainda menos rígido é a situação que autorizaria o Executivo a não realizar determinadas despesas sempre que fatos supervenientes ocorres- sem. Caberia ao executor apenas explicar ao Congresso a razão de não ter exe- cutado certos créditos incluídos no orçamento. O modelo poderia permitir que o Congresso pudesse impor algum tipo de sanção ao Poder Executivo desde que não se convencesse da real necessidade de anular a despesa prevista. 3 PARCELA DO ORÇAMENTO FEDERAL BRASILEIRO QUE SERIA AFETADA PELO ORÇAMENTO IMPOSITIVO Como foi comentado na introdução, a grande maioria dos recursos orçamen- tários já tem destinação obrigatória, o que não deixa qualquer margem para quem faz a programação orçamentária. A tabela 1 ilustra esse fato. Observa-se que as despesas com transferências a estados e municípios, pessoal e encargos, benefícios previdenciários, abono e seguro-desemprego, Lei Orgânica da Assis- tência Social (Loas), transferências referentes à Lei Kandir, subsídios e subven- ções e com o Sistema Único de Saúde (SUS) – despesas que o governo não tem como deixar de fazer – abrangem quase 90% das despesas totais. Em outras despesas também se encontram itens de caráter obrigatório, tais como, custeio dos ministérios e continuação de obras iniciadas no passado, em que a interrup- ção causaria grandes prejuízos ao erário. Portanto, sobra pouca margem para dispêndios realmente discricionários. TABELA 1 Orçamento da União – 2003 Elaboração do autor, com base em dados da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira (Coff)/Contribuição Definida (CD). Obs.: Valores aproximados. (Em R$ bilhões) (Em %) Despesas 322 100 Transferências a estados e municípios 57 18 Pessoal e encargos 79 24 Benefícios previdenciários 107 33 Abono e seguro-desemprego 8 3 Loas 5 1 Lei Kandir 4 1 Subsídios e subvenções 6 2 SUS 23 7 Outras despesas 34 11 Discricionárias +- 20 6 planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 200310 Considerando, portanto, a totalidade do orçamento, a mudança resultante do orçamento impositivo seria pequena. Em termos absolutos, contudo, os valores são significativos, aproximadamente R$ 20 bilhões por ano. É natural, assim, que o assunto mereça interesse e seja objeto de intensos debates. 4 O MODELO BRASILEIRO ATUAL Definido fundamentalmente na Constituição da República, arts. 165 a 169, o modelo brasileiro não estabelece a obrigatoriedade de se executar tudo o que foi definido no orçamento, pois não é preciso pedir autorização ao Con- gresso para não implementar determinada despesa. Mesmo a vedação de transposição, remanejamento ou transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro (art. 167, VI) é flexi- bilizada pela possibilidade de uma autorização genérica – dada na Lei Orça- mentária – de que um porcentual do orçamento possa ser objeto de tais movimentos (art. 165, § 8o). Tal porcentual é definido na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Alguns intérpretes entendem que, com o advento da Lei de Responsabili- dade Fiscal (LRF), a não-execução de determinada despesa só poderia acontecer caso houvesse risco de não se alcançar a meta fiscal. Assim, ou uma frustração de receita ou um aumento inesperado de despesas obrigatórias que dificultassem a obtenção das metas de superávit primário ou de superávit nominal, estabelecidas na LDO, poderiam justificar a não-realização de determinada despesa. Essa não- realização, contudo, envolveria certo controle do parlamento, pois seria necessá- ria a explicação das razões para o contingenciamento orçamentário. Não se trata de autorização do parlamento para que o contingenciamento ocorra, mas de obrigação de prestar regularmente, em períodos estabelecidos previamente, ex- plicações aos parlamentares. Há os que defendem, assim, que, com esse mecanismo, a LRF introduziu o orçamento impositivo no Brasil, pois o único caso que justificaria a não- implementação integral do orçamento seria o da dificuldade com o alcance das metas fiscais. Nas demais situações, a execução dos créditos orçamentários seria obrigatória. Tal entendimento, contudo, não é o que tem prevalecido. Na prática, não se observam alterações – desde o advento da LRF – no modo de proceder do Poder Executivo quanto à implementação ou não de determinados créditos orçamentários. Prevalece, em síntese, a interpretação de que o orçamento é meramente autorizativo e que determinado crédito orçamentário pode não ser executado por discricionariedade do Poder Executivo. Algumas observações sobre orçamento impositivo no Brasil 11 5 AS PROPOSTAS DE MUDANÇA Como se mencionou, há intensas discussões no Congresso Nacional sobre a obrigatoriedade de execução integral do orçamento público. A cada novo contingenciamento promovido pelo Poder Executivo, surgem discursos, deba- tes e proposições para alterar o processo orçamentário brasileiro e ampliar a força do parlamento. A proposta do senador Antônio Carlos Magalhães (PEC no 22, de 2000) obriga o Poder Executivo a pedir autorização ao Congresso para não realizar determinada despesa fixada na Lei Orçamentária. Trata-se, portanto, de um mo- delo intermediário entre o que está em vigor atualmente no Brasil e um mode- lo extremo em que os créditos orçamentários teriam de ser executados em qualquer situação. A PEC no 169, de 2003, do deputado Jaime Martins, também obriga o Poder Executivo a implementar integralmente a programação orçamentária. Estabelece que, em caso de frustração da receita prevista ou outra impossibili- dade de execução da despesa, o Poder Executivo encaminhe ao Congresso Nacional, até quatro meses antes do encerramento do exercício financeiro, proposta de alteração da Lei Orçamentária. Tal proposta, ao contrário da PEC do senador Antônio Carlos Magalhães, não fornece muitos detalhes da forma de operacionalização do comando. Assim, não fica claro se, em caso de não-apreciação pelo Congresso, o Executivo estaria automaticamente au- torizado a contingenciar. Outra proposta é a que altera a LRF (Projeto de Lei Complementar no 87, de 2003) e estabelece a obrigatoriedade da execução total do orçamen- to. Pela proposta, apenas em caso de risco de comprometimento das metas de resultado fiscal é que se autorizaria a limitação de empenho das dotações. O cancelamento definitivo, por sua vez, só seria possível se fosse constatada a inviabilidade financeira da execução. Em ambas as situações seria necessá- ria a autorização prévia do Congresso Nacional. Ao contrário da PEC no 22/ 2000, esta proposta não traz mecanismos para o Executivo realizar ajustes no orçamento no caso de o Congresso não deliberar tempestivamente, o que, obviamente, lhe retira totalmente a flexibilidade.1 Há ainda outras proposições, como a que veda que o contingenciamento incida sobre as emendas dos parlamentares (PEC no 481, de 2001). A proposta 1. Para tornar tal proposta operacional, talvez fossem necessárias modificações adicionais no processo legislativo que estabelecessem o trancamento da pauta em caso de não-deliberação após certo prazo. O problema é que a pauta já é trancada por medidas provisóriase por matérias que tramitam em regime de urgência. Outra alternativa é que a apreciação fosse realizada exclusivamente pela Comissão Mista de Orçamento. O fato é que aprovar a proposição sem modificações substanciais no processo legislativo poderia implicar excesso de rigidez no processo de execução do orçamento. planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 200312 não estabelece necessidade de autorização, mas, sim, a vedação completa de que se limitem empenhos ou se cancelem emendas de membros do Con- gresso Nacional. 6 IMPLICAÇÕES DA APROVAÇÃO DO ORÇAMENTO IMPOSITIVO NO BRASIL 6.1 Mudanças institucionais Para melhor compreender as implicações do orçamento impositivo, é impor- tante analisar, primeiramente, as características do chamado orçamento autorizativo, que, como o nome diz, traduz uma autorização para realizar os gastos públicos. Em essência, trata-se de uma permissão para que determina- da programação seja executada, e não outra. Não pode, então, o Poder Exe- cutivo apresentar determinada programação ao Congresso e implementar uma diversa daquela. O ponto central, contudo, é que a programação é definida pelo Executivo, que, após a autorização parlamentar, a implementa. Não é, portanto, o parlamento que define em que e quanto se gastar, mas apenas autoriza que a programação seja feita. Nos casos extremos, o parlamento diz apenas sim ou não. Era a situação brasileira antes da Constituição de 1988. Em casos intermediários, o parlamento pode ter algum poder de alterar a programação. O ponto central, contudo, é que o núcleo duro da programação é definido no âmbito do Executivo. Deduz-se, pois, o papel secundário do Congresso em matéria orçamentária. Com o orçamento impositivo, teria de haver uma mudança profunda de enfoque. Não há muito sentido em se falar de orçamento impositivo sem mudar a responsabilidade pela programação. Um Congresso que não faz a programa- ção não tende a ter muito interesse em obrigar que ela seja integralmente cumprida. É natural que o Poder Executivo possa não a cumprir integral- mente por alguma razão superveniente. Com efeito, adotar o orçamento impositivo implica, essencialmente, trans- ferir a maior responsabilidade de programar o orçamento para o Congresso. É a situação dos Estados Unidos, país exemplo de um parlamento que exerce o principal papel no processo de destinação das despesas públicas. O seu parlamento é, de longe, o mais forte do mundo em matéria orçamentária (Organization for Economic Cooperation and Development – OCDE, 1996). É de se esperar, portanto, que quem programa o orçamento exija que ele seja cumprido, tal como acontece nos Estados Unidos. Situação diversa é a dos demais países em que a programação orçamentária é essencialmente uma peça do Poder Executivo. O parlamento, grosso modo, apenas toma conhecimento dela e a autoriza. As modificações que são feitas, em geral pequenas, não alte- ram a essência da proposta do Executivo. Algumas observações sobre orçamento impositivo no Brasil 13 Tornar o orçamento impositivo, portanto, implica uma modificação ainda mais profunda que a exigência de implementação integral da programação apro- vada. Implica a mudança sobre quem decide a programação, passando o eixo de decisão para o parlamento. Se a decisão sobre o que e quanto se gastar for toma- da no âmbito do Executivo, cabendo ao Congresso apenas dar a autorização, retira-se substancialmente o incentivo de se exigir o implemento integral.2 6.2 Relações de poder Para fins de raciocínio, considere a aprovação de um modelo intermediário de orçamento impositivo, isto é, que exigisse a autorização do Congresso Nacio- nal para que determinado crédito orçamentário não fosse executado. De ime- diato, haveria fortalecimento do Poder Legislativo. Afinal, uma decisão que, atualmente, é tomada unilateralmente passaria a depender de autorização de outro Poder, o que envolveria, naturalmente, negociações. Em contrapartida, haveria enfraquecimento do Poder Executivo, pois o orçamento autorizativo acaba por ser um forte instrumento de barganha nos momentos de votações importantes no Congresso, conforme noticiam amplamente os jornais do País.3 Os parlamentares de oposição também seriam beneficiados, já que o Exe- cutivo não poderia mais decidir a implementação de uma obra de acordo com o apoio ou não de determinado parlamentar. Assim, as emendas individuais seriam executadas independentemente do partido do legislador. Como todos os parlamentares têm direitos a tais emendas, num valor fixo, independente- mente de pertencerem à maioria ou à minoria, os direitos das minorias e da oposição estariam mais preservados. Um resultado também importante é que os parlamentares de apoio ao governo perderiam vantagens que ora desfrutam em relação aos de oposição. Suponha dois deputados federais de um mesmo estado da Federação. No atual modelo, quem apóia o governo terá muito mais possibilidades de levar recur- sos federais para seu estado, por meio de suas emendas. O de oposição, em contrapartida, terá mais dificuldades. Portanto, a sobrevivência política do primeiro tende a ser mais fácil que a do segundo. Com efeito, a adoção do orçamento impositivo não é neutra dentro do parlamento. Se for verdade que o parlamento como um todo aumenta o seu poder, há parlamentares que perderão posição relativa a outros parlamentares. Haveria, ainda, necessidade de modificações no processo decisório de ela- boração do orçamento. Considerando-se que o Congresso teria mais poder, 2. A existência de propostas para obrigar a execução integral apenas das emendas dos parlamentares (como, por exemplo, a PEC no 481, de 2001) é sintoma desse fato. 3. O trabalho de Pereira e Mueller (2002) analisa de forma sistemática a utilização do orçamento público como instrumento de barganha. planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 200314 teria obrigatoriamente mais responsabilidade na apuração de eventuais erros e omissões nas receitas e despesas obrigatórias. Também o processo de autoriza- ção para a anulação de determinado crédito teria de ser rápido, sob pena de ficar sem efetividade a exigência. Suponha que o Executivo solicite tal autori- zação. Naturalmente, não implementará o crédito até que o Congresso se posicione. Portanto, a demora de deliberação por parte do Congresso acabaria por implicar a não-execução, conforme havia solicitado o Executivo. O projeto do senador Antônio Carlos Magalhães, por exemplo, prevê que a autorização para cancelamento é automática caso o Congresso não delibere em 30 dias. Em termos internacionais, o Brasil tornar-se-ia um dos países em que o parlamento tem mais influência em matéria orçamentária, comparando-se aos Estados Unidos. Ter mais poder em matéria orçamentária implica aumento de poder de uma forma geral. Assim, o Congresso brasileiro seria muito fortalecido. Essas considerações permitem perceber as dificuldades para uma modifi- cação institucional dessa natureza. Tornar o orçamento impositivo implicaria profundas mudanças nas relações de poder entre Executivo e Legislativo, e no âmbito do próprio Legislativo. Parece improvável que os beneficiários do atual sistema apóiem mudanças que reduzam os mecanismos que lhes asseguram a prevalência no processo. Como eles detêm a maioria, é fácil antever as dificul- dades de aprovação no atual contexto. 7 O ORÇAMENTO IMPOSITIVO SERIA BOM PARA O BRASIL? Avaliar se algo é bom ou ruim envolve, necessariamente, juízos de valor. Quando se trata de escolhas sociais, importa saber se uma política vai deixar a sociedade em situação melhor ou pior. Se a escolha acarreta dar mais de deter- minados bens para todos, sem reduzir bens de outros, significa uma melhora social. Raramente, mudanças são dessa natureza. Em geral, as modificações implicam mais de alguns bens e menos de outros ou mais para alguns grupos e menos para outros. Analisam-se, pois, algumas variáveis que sofrerão impac- to com o orçamento impositivo. O orçamento impositivo, como foi comentado, implica maiordemocra- tização do processo orçamentário. Certamente, a maior parte da sociedade atribui valor positivo para o aumento da democracia na alocação de recursos públicos. Com ele, o Congresso, no qual, ao contrário do Poder Executivo, está representado todo o povo, e não apenas a maioria, teria mais influência sobre a destinação dos recursos públicos. Contudo, no atual sistema político-eleitoral brasileiro, com os proble- mas de ausência de fidelidade partidária, de excesso de partidos políticos com representação no parlamento, entre outras dificuldades, o orçamento impositivo Algumas observações sobre orçamento impositivo no Brasil 15 poderia ser um fator de imobilismo, de obstáculos para a implementação de uma agenda para o país. Afinal, como se comentou, a implementação seletiva do orçamento acaba por ser um importante instrumento de governabilidade. Sem ele, poderia haver óbices adicionais para a aprovação de emendas consti- tucionais, de projetos de lei, de medidas provisórias, enfim, dos projetos de poder que o Presidente da República tem. Há, assim, que se ponderar os pesos das duas variáveis. Para diminuir os efeitos negativos de um possível imobilismo, seria importante que o orçamento impositivo viesse acompanhado de outras mudanças institucionais, tais como, a reforma política e a eleitoral. Por meio delas, apoios que formassem maioria no Congresso Nacional poderiam ser obtidos independentemente de execução maior ou menor de emendas dos parlamentares ao orçamento. Com efeito, se um partido está apoiando o governo, este conta com aqueles votos, indepen- dentemente de barganhas pontuais. É o resultado da disciplina partidária. Pode-se argumentar que, independentemente da reforma política e da eleitoral, o presidencialismo brasileiro dispõe de outros mecanismos que evi- tariam o imobilismo. É o caso da distribuição de cargos no governo, dos pró- prios instrumentos legislativos, como a medida provisória e o pedido de ur- gência de projetos de lei importantes – ambos com poder de trancar a pauta do parlamento –, e dos instrumentos de convencimento parlamentar por meio de pressão da mídia, quando se trata de projetos do Executivo em que se argu- menta que há interesse nacional, etc. O orçamento autorizativo seria apenas mais um entre outros mecanismos de que o governo dispõe. Talvez seja o caso, mas é difícil chegar a tal conclusão. Os estudos empíricos (Pereira e Mueller, 2002) sugerem, como o noticiário político vem há muito comentando, que a importância da execução das emendas parlamentares como elemento de for- mação de maiorias no Congresso Nacional é crucial. Algumas sociedades adotariam o orçamento impositivo, independente- mente de eventuais dificuldades de implementação de agenda. São sociedades que atribuem grande valor a uma maior participação dos diferentes repre- sentantes do povo no processo orçamentário. Outras, talvez com problemas muito urgentes para solucionar, preferem menos democracia a perderem ve- locidade nas decisões. O Brasil parece estar mais para o segundo caso do que para o primeiro. 8 COMENTÁRIOS FINAIS Este trabalho procurou definir o orçamento impositivo, o seu alcance, as pro- postas de implantação em tramitação no Congresso Nacional, as implicações que sua adoção pelo Brasil traria e as dificuldades de implementação. planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 200316 Duas observações gerais são cabíveis. A primeira é que o orçamento impositivo não é algo comum a todos os sistemas democráticos do mundo. Na verdade, é mais exceção do que regra – os Estados Unidos são o país exemplo de tal sistemática. A segunda é que, para implementá-lo no Brasil, muitos obstáculos terão de ser removidos. Com um presidente da República com maioria no Congresso Nacional, é muito difícil a idéia prosperar, pois a execução seletiva do orçamento é um importante instrumento de governa- bilidade e de convencimento para apoio em matérias de interesse do Poder Executivo. Haveria possibilidade se, como comentado, viesse acompanhada de profundas mudanças no sistema partidário e eleitoral, a fim de garantir maiorias mais sólidas no Congresso. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ORGANIZATION FOR ECONOMIC COOPERATION AND DEVELOPMENT (OCDE). Budgeting and policy making. Sigma making, n. 8. Paris, 1996. PEREIRA, C.; MUELLER, B. Comportamento estratégico em coalizões presidencialistas: as relações entre executivo e legislativo na elaboração do or- çamento brasileiro. Dados, v. 45, n. 2, 2002. SHICK, A. Contemporary approach to public expenditure management. Word Bank Institute – governance, regulation and finance division. 1. ed. 1998. AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA PROMOVER E IMPLEMENTAR OS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO TRABALHO E A INTEGRAÇÃO ECONÔMICA INTERNACIONAL Maria Cristina Mattioli* A interdependência econômica entre as nações aumentou consideravelmente na segunda metade do século passado e muito tem contribuído para a melhoria do padrão de vida em vários países. Todavia, a vulnerabilidade das economias nacionais a eventos e políticas internacionais tem criado dilemas e dificuldades no gerenciamento da política nacional e da cooperação internacional. Ao mesmo tempo em que se busca a integração econômica, as nações buscam sua autonomia política. A crescente integração econômica entre as nações, com o objetivo de eliminar as diferen- ças econômicas, surge como limitação dessa autonomia nacional, verificando-se, pois, verdadeira tensão. Essa tensão é claramente sentida no mercado de trabalho quando da implementação e execução de direitos fundamentais do trabalho, reconhecidos internacionalmente por intermédio da Declaração de 1998 da Organização Internacional do Trabalho. A conclusão é que tais políticas somente podem ser implementadas pelo fortalecimento de regimes internacionais, como a Orga- nização Internacional do Trabalho (OIT) ou a Organização Mundial do Comércio (OMC), com a estipulação de que os países signatários de tratados e convenções relevantes sejam responsáveis por sua implementação no âmbito nacional. Isso, certamente, representa a derrogação da auto- nomia nacional em face do movimento global, como resultado de uma regulação harmonizada e que depende de execução internacional, por meio de cláusulas sociais inseridas nos acordos de comércio internacional. 1 INTRODUÇÃO 1.1 Integração econômica e políticas nacionais A interdependência econômica entre as nações aumentou consideravelmente na segunda metade do século passado e muito tem contribuído para a melhoria do padrão de vida em vários países. Todavia, a vulnerabilidade das economias nacionais a eventos e políticas internacionais tem criado dilemas e dificuldades no gerenciamento da política nacional e da cooperação internacional. Ao mesmo tempo em que se busca a integração econômica, as nações buscam sua autono- mia política. A crescente integração econômica entre as nações, com o objetivo de eliminar as diferenças econômicas, surge como limitação dessa autonomia nacional, verificando-se, pois, verdadeira tensão. * Juíza do Trabalho Titular da 4a Vara do Trabalho de Bauru e professora-pesquisadora do Centro de Pós-Graduação e Pesquisas da Universidade do Sagrado Coração. planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 200318 Essa tensão é aparente em termos de mercado de trabalho, na medida em que se busca uma padronização internacional dos direitos que regem as rela- ções de trabalho, porém, estimulam-se a sua promoção e implementação por meio de políticas nacionais. Essa padronização, vista como outra face da integração econômica – o trabalho é outra variante do custo do produto, junto com o capital –, força os governos locais a adotar políticas domésticas compa- tíveis com a exigência do mercado internacional, mas que, na visão de muitos, configurariam protecionismo. A estreita relação entre as economias deve-se, basicamente, a dois fato- res: às transformações tecnológicas, sociais e culturais e à redução das barrei- ras econômicas por meio de políticasgovernamentais. Esta última foi facili- tada pela primeira, que colaborou na promoção de novas formas de concretização de transações comerciais e tornaram a alteração legislativa na- cional, inclusive. Em especial, após a Segunda Guerra Mundial, muitos go- vernos nacionais começaram a reduzir suas barreiras comerciais e tornaram suas economias mais permeáveis. As negociações multilaterais, sob os auspícios do General Agreement on Trade and Tariffs (GATT), desde a Rodada Kennedy na década de 1960, a Rodada Tóquio nos anos 1970 e, mais recentemente, a Rodada Uruguai, emergem como exemplo mais proeminente de redução de barreiras para o comércio internacional. Juntos, esses dois fatores contribuíram para a transformação da economia mundial. Simultaneamente a essa realidade, outras transformações ocorreram na estrutura política mundial. Primeiramente, a expansão do nacionalismo, por intermédio de decisões governamentais, favoreceu a formação de Estados independentes.1 Posteriormente, a perda gradual da hegemonia política e eco- nômica dos Estados Unidos cedeu lugar, entre outros, à União Européia, visto que as relações passaram a ser de multilateralismo, ao invés do bipolarismo existente até então, em razão da Guerra Fria, Estados Unidos – União Soviéti- ca. Ainda, pode-se acrescentar a transformação política e econômica dos países do Leste-Europeu que adotaram reformas com base nos princípios capitalistas ocidentais. Esses fatores são essenciais na análise dos dilemas das políticas na- cionais, posto que quanto maior a integração e uniformização de mercados, menor o poder de resistência dos Estados nacionais. A separação entre política internacional e nacional era claramente visualizada. O cidadão sabia que, em regra, a primeira se restringia às tarifas e cotas do comércio internacional e a segunda era destinada a regulações da concorrência, 1. “The history of membership in international organizations documents the sharp growth in the number of independent states. For example, only 44 nations participated in the Bretton Woods conference of July 1944, which gave birth to the International Monetary Fund. But by the end of 1970, the IMF had 118 member nations. The number of members grew to 150 by the mid-1980s and to 178 by December 1993” (Ehrenberg, 1994). As políticas públicas para promover e implementar... 19 sociedades, padrões de produção, segurança no trabalho, instituições financeiras, proteção ambiental, entre tantos assuntos. Todavia, à medida que as barreiras fo- ram diminuindo e as inovações tecnológicas ocorrendo, as distâncias econômicas encolheram e a política nacional ficou mais exposta às exigências internacionais. Assim, governos nacionais e negociações internacionais tiveram de lidar, cada vez de forma mais aprofundada, com a integração de políticas. Por exemplo, se o país A permite que uma companhia se utilize de trabalho forçado na produção de um bem e o país B não permite, o país A gerará um custo mais baixo do produto. Desse modo, as companhias do país A que competem internacionalmente com as companhias do país B estarão se beneficiando de uma prática desleal no comércio e pressionarão pela elevação dos padrões de trabalho. Assim, se se pretende a elaboração de uma política nacional de promoção do crescimento econômico e desenvolvimento social, deve-se levar em consi- deração a tensão que exsurge com o aprofundamento da integração econômica das nações, que leva à diminuição da autonomia nacional e desafia a soberania política.2 Este é, pois, o foco do presente trabalho: apresentar a tensão existen- te entre a necessidade de integração econômica e a perda de autonomia nacio- nal em face do movimento, cada vez maior, por padronização de políticas e direitos, constituindo uma harmonização de regulações. Nesse sentido, a implementação de direitos fundamentais no trabalho deve ser vista à luz dessa tensão, visto que políticas públicas nacionais vão levar em consideração a gran- de variedade de normas internacionais ratificadas. A conclusão é que tais políticas somente podem ser implementadas pelo fortalecimento de regimes internacionais, como a Organização Internacional do Trabalho (OIT) ou a Organização Mundial do Comércio (OMC), com a estipulação de que os países signatários de tratados e convenções relevantes sejam responsáveis por sua implementação no âmbito nacional. Isso, certa- mente, representa a derrogação da autonomia nacional em face do movimento global, como resultado de uma regulação harmonizada e que depende de exe- cução internacional, por meio, como se sustentará, de cláusulas sociais inseridas nos acordos de comércio internacional. 1.2 A tensão entre políticas internacionais e nacionais e o mercado de trabalho Algumas atividades nacionais produzem conseqüências que atravessam fron- teiras e afetam outras nações. Isso acontece, por exemplo, com as instituições 2. Como sustentam Montgomery e Glazer, ao discorrerem sobre o que chamam de “globalismo”, “[…] there are newly-recognized moral claims on the state that have displaced the head of government as its sole appropriate or legitimate source of sovereignty. It is no longer considered fanciful to argue that the ultimate rationale for sovereignty is derived from the obligation to pursue a state’s moral purposes rather than the right to guarantee its power, to protect its territorial integrity, or to advance the material interests of its citizens” (Montgomery e Glazer, 2002, p. 4). planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 200320 financeiras, por meio do impacto da moderna tecnologia, que permite transações internacionais instantâneas e, muitas vezes, fraudulentas. O mesmo ocorre com as políticas no mercado de trabalho. Políticas de trabalho tornam-se objeto de consideração por outros países, em função da imigração de trabalha- dores que buscam trabalho em outro contexto. Assim, políticas de um país podem atingir o fluxo imigratório, aumentando ou diminuindo o mercado de trabalho. Nesse sentido, a tensão existente entre a pressão internacional para a liberação da mobilidade da mão-de-obra e a política doméstica de proteção do mercado de trabalho nacional pode gerar resultados passíveis de serem vistos como concorrência desigual. Basicamente, o país que sofre as conseqüências dessa política pressiona para que as restrições sejam eliminadas. Nesse ponto, as tensões aumentam entre as nações. Quando, por exemplo, governos nacio- nais negociam resoluções para questões como esta, que refletem no mercado de trabalho, e tentam acordar sobre a legitimidade do país para efetivar suas escolhas políticas e o dano que possa ser causado em outras nações, o diálogo é, invariavelmente, polêmico, visto que as resoluções dependem de circuns- tâncias complexas do cenário internacional e do peso do interesse particular de cada indivíduo ou nação.3 Essa polêmica diminui a autonomia nacional, na medida em que o Estado, individualmente, tem de cooperar com a exigência internacional do mercado, alterando seu regime legal, padrões e instituições, muitas vezes em atendimento a valores universais ou internacionais. Outras vezes, o próprio Estado, por inter- médio de seus cidadãos, pressiona para essa modificação. Alguns grupos concentram-se nos direitos humanos, por exemplo, e pressio- nam para a universalização de direitos trabalhistas considerados fundamentais e também humanos. O movimento para essa padronização é internacional, mas, ao mesmo tempo, políticas nacionais colidem com esses interesses. Um caso recente foi a proibição de transação comercial imposta pelos Estados Unidos às empresas que negociavam com o estado de Myanmar (Burma), em razão do uso do trabalho forçado. Ou ainda, a manifestação dos pescadores americanos, que reclamaram acerca da importação de atum de países que não utilizavam as mesmas regras de pesca, que afetou o México e a Venezuela, em razão da proibição de importação por não atenderem aos padrões da comunidade ambientalista. Dessa forma, há necessidade de se estabelecer uma políticade convergên- cia internacional, mas que respeite a autonomia nacional, objetivando explíci- ta harmonização de padrões regionais ou globais. Considerando-se que o mercado de trabalho possui uma série de caracte- rísticas que influenciam o fluxo comercial tanto de capital como de mão- 3. Ehrenberg (1994). As políticas públicas para promover e implementar... 21 de-obra, este vai ser influenciado, também, pelo processo de integração econô- mica, que pressiona por mudanças. Todavia, apesar das tensões, é perfeitamente possível que a integração econômica sobreviva entre países com diferentes níveis de padrões e políticas de trabalho. A tensão existe, mas pode ser atenuada por meio de políticas domésticas convergentes com a necessidade de ajuste da política econômica ao comércio internacional.4 1.3 O mercado de trabalho O mercado de trabalho e a relação de emprego envolvem muito mais fatores do que a simples troca da prestação de serviços pelo salário. Jornadas de traba- lho, por exemplo, são, freqüentemente, objeto de legislação nacional ou nego- ciação coletiva e estão influenciadas por outros fatores públicos, como feria- dos, férias, políticas de fixação de horários para o comércio, o setor bancário e o industrial. Seja por legislação ou pelo processo da negociação coletiva, muitos países estabelecem os seus próprios padrões para o mercado de trabalho, a fim de garantir aos trabalhadores condições minimamente desejáveis de trabalho. Esses padrões incluem: salário mínimo, restrições ao trabalho infantil, saúde ocupacional e segurança no trabalho, políticas não-discriminatórias em razão de gênero, raça, idade ou deficiência, por exemplo. Assim é que muitos países possuem políticas que facilitam o ajuste do mercado de trabalho incluindo quem pode ingressar no país (políticas de imigração) e quais os direitos que vão determinar o contexto do trabalhador (direitos fundamentais no traba- lho). Muitos críticos da liberalização do comércio acreditam que seja injusto celebrar acordos comerciais com países que possuem padrões de trabalho muito inferiores ou que não exigem o cumprimento dos padrões já existentes. Nesse contexto, vale lembrar o debate quando da implantação do North America Free Trade Area (Nafta) em 1993. Seus opositores argumentaram que o tratado não poderia ser assinado a menos que um acordo anexo fosse firmado para garantir que o México atendesse a condições mínimas de trabalho, entre elas, salário mínimo e legislação que proibisse o trabalho infantil e protegesse a saúde e segurança do trabalhador.5 Esses padrões, a toda evidência, fazem com que existam modificações na política de trabalho, com base, precipuamente, na política econômica. Isso porque, normalmente, tais padrões impõem custos para os empregadores, que não podem ser realocados para o trabalhador.6 4. Essa tensão é bem retratada por Ronnie Lipschutz ao analisar a regulação e a política social separadamente e sob as condições da globalização. Para o autor, de um lado, tem havido grandes modificações na divisão internacional do trabalho associadas aos veículos de mercadoria transnacional e, de outro, têm sido feitas mudanças nos regimes internacionais, mercados e Estados (Lipschutz, 2002, p. 292). 5. A administração Clinton negociou tal acordo em agosto de 1993 (cf. How..., 1993, p. 45). 6. Salário mínimo aumenta o custo para a maioria dos empregadores que se utilizam de mão-de-obra não qualificada no processo de produção. Leis que dispõem sobre o trabalho infantil e sobre o trabalho forçado também aumentam os custos para o mesmo grupo de emprega- dores. Igualmente, há aumento do custo quando o trabalho da mulher passa a ter a mesma remuneração que o trabalho masculino. planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 200322 Dessa forma, as características do mercado de trabalho e de suas instituições são diretamente afetadas pela integração econômica, e vice-versa. Porém, observa-se que essa integração, não necessariamente, exige a harmonização dos padrões de trabalho nacionais, como salário mínimo, jornada de trabalho ou seguros para os desempregados. Todavia, quanto maior a integração econômi- ca mais se pressiona para que direitos considerados fundamentais sejam obser- vados, não só porque influenciam, diretamente, os custos da produção, mas, principalmente, porque fazem parte de um leque maior, que são os direitos humanos universais. A fixação desses direitos mínimos, contudo, em termos de legislação, pouco significado tem se não houver políticas nacionais para sua implementação e posterior compromisso de torná-los eficazes e executados, seja por intermédio da legislação nacional seja por meio das sanções comer- ciais impostas pelos acordos comerciais internacionais. 2 DIREITOS FUNDAMENTAIS NO TRABALHO 2.1 O vínculo trabalho – comércio De uma forma geral, as escolhas políticas definem o modelo econômico a ser seguido nacionalmente. Em conseqüência, em razão da forte influência das empresas e do comércio internacional, é evidente que esse modelo tem o poder de influenciar a ordem jurídica. No âmbito das relações do trabalho, este atual modelo – que privilegia a liberalização do comércio – é responsável por formatar um novo modelo de relações laborais. Por conseguinte, dele decorre a necessidade de regulamentação particular, dando origem, também, a um novo ordenamento jurídico laboral. À medida que essas relações estão presentes e consolidadas, cada vez mais se comprova que trabalho e comércio são elementos inseparáveis. Muita discus- são acadêmica existe acerca desse vínculo e da forma como se concretiza. A ten- tativa de elaboração desse vínculo pode ser transportada para desde quando o Japão obteve acesso à International Trade Organization (ITO), predecessora do General Agreement on Trade and Tariffs (GATT)/World Trade Organization (WTO), durante a década de 1950, até o final do milênio, quando a China se tornou membro dessa organização internacional. A especulação acerca da exis- tência desse vínculo varia entre dois eixos: política salarial e direitos humanos. O sistema de regulação do comércio internacional foi desenhado para usar o salário como a exata medida para determinar a violação de padrões de trabalho, os quais, por sua vez, têm evidente impacto nos custos da produção. E, sem dúvida, o valor do salário é elemento-chave no custo. Esse foi o principal argumento dos ingleses ao oporem-se à adesão do Japão ao GATT. Os baixos salários dos trabalhadores japoneses eram vistos como uma vantagem compa- As políticas públicas para promover e implementar... 23 rativa desleal também pelos americanos, o que poderia prejudicar as relações comerciais. Outras questões também foram levantadas, como a não-observância das leis sobre condições e jornada de trabalho, além do desrespeito à liberdade de associação e negociação coletiva. Tanto isso é verdade que o secretário-exe- cutivo do GATT respondeu a tais considerações inglesas e americanas dizendo que o governo japonês havia feito prova de não mais retornar ao sistema de mão- de-obra barata, modificado sua legislação e proibido práticas injustas no tra- balho. Não obstante essas medidas, o medo sempre esteve presente nos países opositores, mas, de qualquer forma, o Japão tornou-se membro em 1955.7 Como se percebe, claramente, a política salarial, quer dizer, o salário, principal elemento das relações industriais e reflexo do modelo econômico, teve participação importante na vinculação do trabalho ao comércio. No en- tanto, essa orientação foi, mais recentemente, alterada com o ingresso da China na OMC, quando outro aspecto da questão foi levantado: a vinculação tam- bém com os direitos humanos. Na opinião de Raj Bhala, essa vinculação do trabalho com o comércio enseja duas questões e assim se manifesta: “the economic cornerstones of the trade-labor link are wages and employment. The political cornerstone is the outrage against exploitation of workers’ rights” (Bhala, 1998) (37 Colum. J. Transnat’l L. 11, 19 (1998)). Assim é que, quando aChina pretendeu sua inclusão no GATT/WTO, ao contrário do Japão, não se questionou a prática de mão-de-obra barata em razão da inobservância de condições de trabalho, mas em razão de violações de direitos trabalhistas fundamentais, considerados como direitos humanos, isto é, o uso da mão-de-obra infantil, por exemplo.8 Nessa esteira, o debate sobre como os padrões de trabalho devem ser entendidos no contexto do comércio teve seu rumo alterado. O desenvolvimento na área de direitos humanos inter- nacionais, em especial no pós-guerra,9 teve papel importante na crescente ên- fase dada aos direitos trabalhistas como direitos humanos. O acesso de países menos desenvolvidos ao GATT/WTO intensifica esse debate, na medida em que o salário, nesses países, é visto como uma vantagem comparativa.10 7. Como pontificado por Elissa Alben, “In sum, during Japan’s accession process, the negotiators focused on production cost to generate stop-gap trade measures, including an enhanced safeguards deal and an Article XXIII plan, to prevent the influx of lower cost goods produced with lower labor standards. Their approach naturally comported with an understanding of labor standards as having an impact on wages. In fact, all proposals offered (other than the opt-out solution of Article XXXV) relied upon provisions that explicitly required a showing of injury, and hence some production cost effect” (Alben, 2001) (101 Colum. L. Rev. 1410). 8. “Certainly, another clear contrast is the extent to which human rights principles, rather than wages, have been invoked in the labor standards debate over China’s accession” (Alben, 2001). 9. “After the Second World War, and especially in the last one or two decades, as the process of globalization gathered momentum and labor and capital, began to move more freely across nations, the labor standards concern spilled beyond national and regional boundaries and became properly an international matter” (Basu, 2001) (34 Cornell Int’l L. J. 487). 10. Na verdade, os países em desenvolvimento acreditam que a inclusão desses direitos básicos na OMC vai diminuir sua vantagem comparativa quando se trata de salários, o que não é verdadeiro, uma vez que a questão de estabelecimento de salário mínimo global foi deixada de fora do leque de direitos fundamentais. planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 200324 E, assim, a linguagem dos direitos humanos serve como importante retórica na tentativa de remover, desse debate, a discussão pautada na política salarial.11 Essa aproximação de trabalho e comércio implica não somente esta aná- lise econômica e política, mas também uma análise no âmbito da concretização. Em outras palavras, se existe esse vínculo, a questão que se coloca é como ele pode ser representado no mundo jurídico. Muitas medidas foram apresenta- das – como o selo social, as declarações de direitos e princípios, os sistemas de preferência nos Estados Unidos e Europa –, mas nenhuma outra teve, e ainda tem, tanta repercussão como a denominada “cláusula social”, por ser uma ação supranacional, com o intuito de impor sanções comerciais àqueles países que descumprem os direitos fundamentais no trabalho internacionalmente fixa- dos. E, nesse sentido, a primeira questão que exsurge diz respeito ao conteúdo dessa fixação. 2.2 A declaração de 1998 da OIT Pode-se dizer que existem duas formas de fixação coletiva desses direitos mínimos, fundamentais e internacionais do trabalho: i) os direitos fixados pelas empresas transnacionais, por intermédio de seus códigos de conduta ou das normas que incorporam quando da adesão ao Global Compact, Programa das Nações Uni- das, com o objetivo de fixar direitos e impor responsabilidade social para as empresas; e ii) e os direitos e deveres impostos aos governos por meio das convenções e recomendações da Organização Internacional do Trabalho. Esses instrumentos são referências essenciais dentro deste contexto.12 A globalização dessas referências levaram à codificação de padrões. Basica- mente, foram classificados em quatro espécies de direitos: 1) direitos básicos, que incluem o direito contra a prestação de serviços involuntária e medidas contra o trabalho infantil e a discriminação; 2) direitos civis, aqui incluído o direito do trabalhador de livremente associar-se e negociar coletivamente; 3) direitos de “sobrevivência”, que abrangem o direito a um salário mínimo, 11. A propósito, bastante esclarecedora essa anotação do professor William Gould, ao tratar da história dos padrões internacionais do trabalho, também traçando esta vertente entre política salarial e direitos humanos. Assim se manifesta: “The idea of international labor standards first gained momentum in early Nineteenth Century Great Britain with Robert Owen as their proponentand – and It was catalyzed by the expansion of the antislavery movement. Advocacy for this idea found strength in France, Switzerland and Germany, and proponents claimed that basic human rights were involved inasmuch as the benefits had their source in morality. But then as now, an argument for uniformity across nations, which can override the nation state’s sovereignty, was put forward on the grounds that nations providing improved wages and benefits would otherwise lose their competitive position. Thus, advocacy flourished, and continues to flourish, in the richer countries. Yet it is an argument that arises in the context of advanced countries competing amongst themselves when the question of comparative advantage enjoyed by developing countries, existing at a different economic state of development, is unknown” (Gould IV, 2001) (80 Neb. L. Rev. 715). 12. “The important difference between these two voluntary schemes is that they place the primary responsibility of ILS on different agencies. The Global Compact places the responsibility on multinationals and big corporations while the ILO conventions place the responsibility on the nations, and primarily the Third World nations since these are the potential violators of the standards” (Gould IV, 2001). As políticas públicas para promover e implementar... 25 indenização por acidente e direito a não ser exposto ao perigo; e 4) direitos de segurança, que impõem restrições às demissões e outorgam direitos a pensões por aposentadoria. Essa padronização está presente em vários documentos internacionais13 e, de uma forma geral, todos se concentram em cinco condutas: 1) proibição do trabalho forçado; 2) proibição de discriminação no emprego; 3) direito de associação; 4) direito à negociação coletiva; e 5) proibição do trabalho infantil. Verifica-se, dessas condutas e dos documentos que as contêm, um cres- cente consenso internacional sustentando que os chamados “direitos traba- lhistas fundamentais” são também direitos humanos fundamentais.14 Em 1998, a Organização Internacional do Trabalho aprovou a Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho e Seu Seguimento,15 a qual proclama qua- tro princípios básicos, extraídos de suas convenções e aplicáveis a todas as nações, independentemente de seu nível de desenvolvimento econômico, e que colidem com os direitos supramencionados, quais sejam: 1) liberdade de associação e de organização sindical e reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva; 2) eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório; 3) abolição efetiva do trabalho infantil; e 4) eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação. Essa Declaração aplica-se a todos os membros da OIT, independente- mente da ratificação das oito convenções fundamentais que correspondem a esses princípios, que são: Convenção 2916 (Trabalho Forçado); Convenção 8717 13. A OECD elaborou um estudo em 1996 (atualizado em 2000) sobre o elenco desses padrões e o porquê dessa distinção. Como salienta o professor William Gould IV (2001), “The OECD emphasizes its concern about uniformity by its distinction between core labor standards and other labor standards. The OECD finds this distinction to be ‘crucial’inasmuch as working time and minimum wages can affect ‘patterns of comparative advantage, e.g., higher minimum wages are likely to affect trade performance negatively. But core labor standards, unlike minimum wages, will not necessarily affect comparative advantage negatively, and indeed may have a positive effect.’” 14. Apesar de algumas diferenças, os princípios contidos nos instrumentos da OIT são considerados “quase completamente consistentes” com vários textos das Nações Unidas, como o art. 23(4) da Declaração Universal de Direitos Humanos e o art. 22 da Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e art. 8o da Convenção Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. 15. O programa In-Focus Promoção da Declaração inclui atividades de seguimento dos compromissos assumidos pelos Estados-Membros da OIT, relatórios anuais dos Estados-Membros que ainda não ratificaram alguma das oito convenções e relatórios globais sobre o progresso alcançado no âmbito mundial em cada uma das quatro áreas de princípios e direitos fundamentais. 16. Trabalho forçado (1930): dispõe sobre a eliminação do trabalho forçado ou obrigatório em todas as suas formas. Admitem-se algumas exceções, tais como, o serviço militar, o trabalho penitenciário adequadamente supervisionado e o trabalho obrigatório em situações de emergência, como guerras, incêndios, terremotos, etc. 17. Liberdade sindical e proteção do direito de sindicalização (1948): estabelece o direito de todos os trabalhadores e empregadores de constituir organizações que considerem convenientes e de a elas se afiliarem, sem prévia autorização, e dispõe sobre uma série de garantias para o livre funcionamento dessas organizações, sem ingerência das autoridades públicas. planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 200326 (Liberdade Sindical); Convenção 9818 (Direito de Sindicalização e de Negociação Coletiva); Convenção 10019 (Igualdade de Remuneração); Convenção 10520 (Abolição do Trabalho Forçado); Convenção 11121 (Discriminação no Emprego); Convenção 13822 (Idade Mínima para o Trabalho); Convenção 18223 (Piores Formas de Trabalho Infantil). Como reconhecimento da importância desses direitos e princípios funda- mentais, a OIT adotou a Declaração e impôs a obrigação para os estados membros de respeitá-la de boa-fé e de acordo com sua Constituição. O desenvolvimento desse rol de direitos implica que esforços especiais sejam efetivados para garantir que estes e outros direitos reconhecidos nas convenções sejam aplicados pelos países membros. Tradicionalmente, a OIT tem tido papel fundamental na elaboração dessas convenções, porém sua atuação tem sido menos efetiva na sua execução. Na prática, a adoção da Declaração não assegura, automatica- mente, que todos os estados-membros vão respeitar suas disposições. A OIT, na verdade, carece de mecanismo efetivo para exigir o cumprimento, pelos seus membros, das suas convenções ou da Declaração. Nesse sentido, embora o conceito de direitos ou padrões fundamentais no trabalho tenha obtido um consenso, ainda existe considerável debate em relação à aplicação e à execução desses direitos e quais os mecanismos mais apropriados para tanto. A OIT, como visto, por intemédio da Declaração de 1998, estabeleceu um mecanismo de promoção ou seguimento e, basicamente, sua atividade está ligada à orientação, assistência técnica e programas para implementação da Declaração. O cumprimento é, no fundo, voluntário, ine- xistindo sanções em caso de violações. Logo, há necessidade de se discutir qual o melhor caminho e qual o órgão apropriado para que tais direitos fundamen- tais, quando implementados por meio de políticas nacionais, sejam, efetiva- mente, cumpridos. 18. Direito de sindicalização e de negociação coletiva (1949): estipula a proteção contra todo ato de discriminação que reduza a liberdade sindical, a proteção das organizações de trabalhadores e de empregadores contra atos de ingerência de umas nas outras, e medidas de promoção da negociação coletiva. 19. Igualdade de remuneração (1951): preconiza a igualdade de remuneração e de benefícios entre homens e mulheres, por trabalho de igual valor. 20. Abolição do trabalho forçado (1957): proíbe o uso de toda forma de trabalho forçado ou obrigatório como meio de coerção ou de educação política, como castigo por expressão de opiniões políticas ou ideológicas; e a mobilização de mão-de-obra como medida disciplinar no trabalho, punição por participação em greves ou como medida de discriminação. 21. Discriminação (no emprego e na ocupação) (1958): preconiza a formulação de uma política nacional que elimine toda discriminação em matéria de emprego, formação profissional e condições de trabalho por motivos de raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, e a promoção da igualdade de oportunidades e de tratamento. 22. Idade mínima para o trabalho (1973): objetiva a abolição do trabalho infantil, ao estipular que a idade mínima de admissão ao emprego não deverá ser inferior à idade de conclusão do ensino obrigatório. 23. Piores formas de trabalho infantil (1999): defende a adoção de medidas imediatas e eficazes que garantam a proibição e a eliminação das piores formas de trabalho infantil. As políticas públicas para promover e implementar... 27 2.3 A cláusula social em acordos bilateriais e multilateriais do comércio Uma das formas de imposição do cumprimento dos direitos fundamentais no trabalho é a adoção de cláusulas sociais nos acordos de comércio internacional. O conteúdo dessa cláusula pode consistir dos direitos reconhecidos pela Orga- nização Internacional do Trabalho, por meio da Declaração de 1998. A imposi- ção dessa cláusula social estaria vinculada a acordos de comércio internacional e sob os auspícios da WTO, que imporia sanções comerciais aos países que a violassem. Muita crítica se fez contra essa proposta e é por essa razão que o tema saiu da esfera de debates da WTO e passou para a OIT, culminando com a Declaração de 1998. Há grande preocupação, nos países menos desenvolvidos, de que uma medida como esta possa implicar protecionismo em relação aos países desenvolvidos.24 Até o momento, uma cláusula como esta ainda não figura em contratos co- merciais supranacionais, dentro da WTO. Todavia, está presente em muitos outros acordos bilaterais, celebrados entre os países, especialmente quando os Estados Unidos são parte,25 amparados pelo General System of Preferences (GSP), ou ainda nos acordos celebrados com países menos desenvolvidos, no âmbito da União Européia, como autorizado pelo Parlamento Europeu, em 24. Como anota Kaushik Basu (2001), “Perhaps the most potent form of supra-national action contemplated is to have a social clause in the WTO provisions, which would allow the WTO to impose trade sanctions on an erring country”. E alerta que “The risk of empowering the WTO thus is that this will become a powerful instrument of protectionism in the North”. Finalmente, exemplifica com um caso brasileiro: “An interesting case in point is the use of the Sander’s Amendment against the Brazilian company Sucocitrico Cutrale. The charge was that the company was using children to pluck oranges. However, as the Wall Street Journal pointed out this was probably an act of reprisal headed by the Teamsters Union against Cutrale for downsizing some Minute Maid plants it had bought from Coca-Cola Co in Florida “ (Basu, 2001). 25. Por exemplo, o acordo celebrado com a Jordânia, para estabelecimento de Área Livre de Comércio, assinado em 24 de outubro de 2000 e em vigor desde 17 de dezembro de 2001, cujo art. 6o explicitamente dispõe: “ARTICLE 6: LABOR 1. The Parties reaffirm their obligations as members of the International Labor Organization (ILO) and their commitments under the ILO Declaration on Fundamental Principles and Rights at Work and its Follow-up. The Parties shall strive to ensure that such labor principles and the internationally recognized labor rights set forth in paragraph6 are recognized and protected by domestic law. […] 3. Recognizing the right of each Party to establish its own domestic labor standards, and to adopt or modify accordingly its labor laws and regulations, each Party shall strive to ensure that its laws provide for labor standards consistent with the internationally recognized labor rights set forth in paragraph 6 and shall strive to improve those standards in that light. […] 5. The Parties recognize that cooperation between them provides enhanced opportunities to improve labor standards. The Joint Committee established under Article 15 shall, during its regular sessions, consider any such opportunity identified by a Party. 6. For purposes of this Article, ‘labor laws’ means statutes and regulations, or provisions thereof, that are directly related to the following internationally recognized labor rights: (a) the right of association; (b) the right to organize and bargain collectively; (c) a prohibition on the use of any form of forced or compulsory labor; (d) a minimum age for the employment of children; and (e) acceptable conditions of work with respect to minimum wages, hours of work, and occupational safety and health”. O mesmo ocorreu com o acordo celebrado com o Camboja, especificamente para o setor têxtil, firmado em 12 de janeiro de 1999: “10. (A) The Parties seek to create new employment opportunities and improve living standards and working conditions through an enhanced trading relationship; affirm respect for each Party’s legal system and seeking to ensure that labor laws and regulations provide for high quality and productive workplaces; and seek to foster transparency in the administration of labor law, promote compliance with, and effective enforcement of, existing labor law, and promote the general labor rights embodied in the Cambodian labor code. (B) The Royal Government of Cambodia shall support the implementation of a program to improve working conditions in the textile and apparel sector, including internationally recognized core labor standards, through the application of Cambodian labor law. (C) The Government of the United States and the Royal Government of Cambodia shall conduct not less than two consultations during each Agreement Year to discuss labor standards, specific benchmarks, and the implementation of this program”. Disponível em: <http://www.tcc.mac.doc.gov/cgi-bin/doit.cgi?204:64:1:301> e <http://www.tcc.mac.doc.gov/cgi-bin/doit.cgi?204:64:1:25>. Acesso em: 27 maio 2003. planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 200328 1994, e mencionado no documento Resolution on EU standards for European Enterprises operating in developing countriestowards a European Code of Conduct.26 A diferença entre o sistema dos Estados Unidos e o sistema da União Européia consiste em sanções, pelo primeiro, quando violadas tais cláusulas e em incentivos, pelo segundo, quando cumpridas tais cláusulas. Há de mencio- nar-se, ainda, que no âmbito da União Européia, as diretrizes emitidas para os países-membros também contêm certo efeito vinculativo, objetivando a padroni- zação mínima de direitos trabalhistas. Dessa forma, a tensão entre a necessidade de integração econômica global e as políticas nacionais de trabalho seria mera- mente aparente, posto que estariam conjugadas num único instrumento. Evidentemente, a questão não está pacificada e muitos países ainda acredi- tam que a implementação desses direitos fundamentais é um primeiro passo para a harmonização e que a sua efetividade pode ser dada por meio de legislação nacional. Tal se dá, por exemplo, no Direito Americano, por meio do Alien Torts Claim Act (ATCA), pelo qual se tem responsabilizado empresas americanas que violem direitos trabalhistas fundamentais quando atuando em outros países.27 3 ELEMENTOS PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICA PÚBLICA 3.1 Direitos fundamentais e os desafios da globalização Não é por demais repetir que, enquanto a economia cresce internacionalmen- te, integrando mercados, a regulação do mercado de trabalho continua, larga- mente, sendo elaborada em esfera nacional. As instituições do trabalho ainda são produzidas e controladas por autoridades nacionais, mesmo que se atenda às orientações da Organização Internacional do Trabalho, cuja cooperação é voluntária. Nesse sentido, pode-se dizer que não há uma legislação internacio- nal do trabalho, no sentido estrito, isto é, elaborada e com autoridade para execução de suas disposições em termos globais. Apesar dessa soberania legal, as nações não são autônomas em termos de escolha da política de trabalho. A crescente mobilidade do capital e do produto 26. “… having regard to its resolution of 9 February 1994 on the introduction of a social clause in the unilateral and multilateral trading system”. Disponível em: <http://www.tcc.mac.doc.gov/cgi-bin/doit.cgi?204:64:1:301> e <http://www.tcc.mac.doc.gov/cgi-bin/ doit.cgi?204:64:1:25>. Acesso em: 27 maio 2003. (OJ C 61,28.2.1994, p. 89). 27. Em 18 de setembro de 2002, o United States Court of Appeals for the Ninth Circuit considerou a responsabilidade internacional subsidiária de empresas americanas em Myanmar, anteriormente chamado Burma. Os autores – John Doe et al.– propuseram ação contra o governo militar de Myanmar, contra a companhia estatal de petróleo e contra a companhia de petróleo americana (Government of Myanmar, UNOCAL Corporation e TOTAL S.A.), alegando que, direta ou indiretamente, moradores locais foram submetidos a trabalhos forçados, assassinatos, estupros e torturas, durante a construção de infra-estrutura petrolífera em Myanmar. Tais atos teriam sido praticados por militares, com o conhecimento da empresa. O Tribunal entendeu que a responsabilidade pelas violações decorre do princípio jus cogens e, por conseguinte, implica violações de Direito Internacional (law of nations). A responsabilidade decorre da aplicação do ATCA, um estatuto americano que pode sustentar a responsabilidade internacional de companhias estrangeiras. As políticas públicas para promover e implementar... 29 no mercado impõe restrições a essa escolha política. Nesse sentido, como a ado- ção de direitos fundamentais impõe, muitas vezes, um custo, os governos relu- tam em pressionar por padrões mais elevados. Assim, a abertura da economia nacional e a intensa competitividade entre os países provocam este debate acerca da implementação de direitos fundamentais no trabalho por intermédio de po- líticas públicas nacionais. Na verdade, a grande disparidade entre os custos do trabalho entre os países impulsiona para a eliminação de práticas consideradas injustas no comércio e que poderiam provocar o dumping social, por meio do descumprimento de direitos fundamentais no trabalho. Nesse sentido, com o aumento do comércio internacional e do investimento estrangeiro direto, a van- tagem comparativa de alguns países tem diminuído e o custo do trabalho passa a ser um elemento a mais na redução do custo do produto, de tal sorte que a mão-de-obra barata possa ser um grande atrativo. Logo, a disparidade no custo do trabalho aumenta a controvérsia internacional. 3.2 Execução dos direitos fundamentais no trabalho Se, por um lado, a implementação de políticas públicas para introdução de direitos fundamentais no trabalho é uma questão que, apesar do aparente con- flito, pode ser resolvida com a cooperação de organismos internacionais, como a OIT, por outro, o mecanismo apropriado para executar e tornar esses direitos eficazes é ainda uma questão intrigante para os governos nacionais. Como se sugere, a introdução de cláusulas sociais em acordos de comér- cio internacional – bilateriais ou multilarais – é um mecanismo eficaz e que garante o efetivo cumprimento e a observância dos direitos fundamentais no trabalho. Todavia, outros mecanismos podem ser adotados. Richard Freeman analisa o comportamento do consumidor no momento da escolha de um produto e sugere que este seja o referencial para tais meca- nismos. Assim, no âmbito doméstico, dois mecanismos estariam disponíveis:a legislação e o selo social, que funcionaria como um certificado de qualidade, atestando que o produto foi elaborado em consonância com os direitos funda- mentais. Apesar deste segundo mecanismo mostrar-se, aparentemente, eficaz, o próprio autor reconhece que, em geral, a sociedade confia mais nas normas jurídicas do que em decisões voluntárias de consumidores. Sustenta que “[...] One rationale for the use of legal enactment over labelling is the potential ease of mislabelling products. The higher the cost of obtaining accurate information, the less desirable is a market-based labeling strategy for obtaining desired labour standards” (Freeman, 1994).28 Entretanto, também não se pode confiar demais 28. Todavia, como sustenta Ronnie Lipschutz (2002, p. 314), campanhas feitas com vistas ao consumidor ou o chamado corporate market behaviour não vão, necessariamente, resultar em mudanças políticas ou sociais. planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 200330 na regulação jurídica, posto que, por exemplo, muitos trabalhadores ainda têm negado o direito à negociação coletiva, embora a lei lhes garanta esse direito. Favorável à colocação dos direitos fundamentais no corpo da OMC, subordinados à cláusula social (social dumping clause) e sujeitos ao seu meca- nismo de solução de conflitos, Alejandro Portes (1994) sustenta que um passo fundamental para implementação efetiva desses direitos seria transferir a sanção para as empresas, em vez de aplicá-las aos governos, que, em decorrência, teriam reduzidos os incentivos para atrair investimentos estrangeiros com base na inobservância de direitos mínimos. Transferir o ônus para as empresas seria uma forma de diminuir o debate entre países industrializados e países menos desenvolvidos. Além dessa medida, o autor sugere a adoção de outra política para forta- lecimento do trabalho de acordo com o modelo atual de desenvolvimento: a promoção de pequenas e independentes empresas. Para ele, o desenvolvimento de high-tech pequenas empresas tem três conseqüências positivas para o fortaleci- mento dos direitos fundamentais no trabalho. Primeiro, alivia a pressão sobre salários e condições de trabalho; segundo, trabalhadores em novas empresas se beneficiam com as oportunidades de aprendizagem e treinamento; e terceiro, o desenvolvimento de comunidades de pequenos produtores dá aos trabalhadores de grandes empresas a oportunidade de mudar para esse novo setor. Em suas palavras “The development of a dynamic small-scale sector can thus represent an efficient means to promote labour standards by giving workers the opportunity to make independent use of their energies and ingenuity” (Portes, 1994). 4 CONCLUSÃO A formatação de políticas públicas para implementação de direitos fundamen- tais no trabalho está no centro das discussões política e econômica internacio- nais e que separam o globo em países do norte e países do sul, variando suas opções entre as propostas neo-institucionalistas ou internacionalistas do norte e as propostas culturalistas do sul. A polarização do debate pode ser retratada da seguinte forma: além de um conjunto mínimo de direitos fundamentais, a visão neoclássica sugere que o governo deveria deixar a implementação desses padrões para o mercado de trabalho “livre”. De acordo com essa perspectiva, a elevação dos padrões prematuramente introduz distorções econômicas que retardam a criação de empregos e renda. A visão neo-institucionalista, ao con- trário, vê tais padrões como instrumentos que podem influenciar o processo social de desenvolvimento, de forma positiva ou negativa, dependendo de como os formadores de políticas públicas os aplicam (Herzenberg e Perez-Lopez apud Amsden, 1994). As políticas públicas para promover e implementar... 31 Dessa forma, a adoção de direitos fundamentais como prioridade na implementação de políticas públicas no campo do trabalho deve sopesar as necessidades das empresas de ter suficiente flexibilidade para competir nos mercados globais e a necessidade do trabalhador de ter certa proteção social. Assim, há necessidade de atender às exigências internacionais e, ao mesmo tempo, elaborar legislação ou outro mecanismo de controle nacional para que, efetivamente, direitos fundamentais no trabalho sejam cumpridos. Há, pois, necessidade de um procedimento democrático e institucionalizado, em cada país, para determinar os resultados econômicos, por meio do comércio in- ternacional contra o corrosivo impacto nos direitos fundamentais do traba- lho.29 Esse procedimento somente será efetivo e eficaz por intermédio da introdução de sanções comerciais aos países que não cumpram ou não exi- jam o cumprimento, por parte de empresas localizadas no seu território, de direitos fundamentais no trabalho, cuja premissa é a adoção de cláusulas sociais no âmbito dos acordos comerciais internacionais.30 Dessa forma, estar-se-á integrando políticas públicas nacionais às necessidades de ajuste à política econômica internacional.31 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALBEN, Elissa. GATT and the fair wage: a historical perspective on the labor- trade link. Columbia Law Review, Oct. 2001. AMSDEN, Alice H. Macro-sweating policies and labour standards. In: SENGENBERGER, Werner; CAMPBELL, Duncan (Orgs.). International labor standards and economic interdependence. Geneva: International Institute for Labor Studies, 1994. BASU, Kkaushik. Compacts, conventions and codes: initiatives for higher international labor standards. Cornell International Law Journal, v. 34, 2001. BHALA, Raj. Clarifying the link. Columbia Journal of Transnational Law, v. 37, 1998. 29. Segundo Rodrik (1999), “[...] it is going to be national governments who are left with the enforcement. Governments are more and more feeling the pressure to compete”. 30. Esta também é a opinião de Ronnie Lipschutz, assim manifestada: “[...] we might expect that activist campaigns may, first, lead to the incorporation of labor standards in international agreements and discourse and, subsequently, become a growing focus of ‘interest group activities and public attention’ within countries themselves. Under Those circumstances, sovereignty will not be challenged; rather, standards will be expected to observe and enforce such regulations as a matter of course” (Montgomery e Glazer, 2002). 31. Normalmente, políticas nacionais de trabalho são desenhadas mais como instrumentos de política social do que como instrumentos para assegurar eficiência na alocação e mobilidade da mão-de-obra e prover as necessidades de investimento em capital humano, segundo atesta Guash (1999). O que se pretende, aqui, é reformular essa visão, buscando-se eficiência e, ao mesmo tempo, progresso social. Por isso que a implementação de direitos fundamentais no trabalho deve estar combinada a um ajuste de política educacional, inclusive. planejamento e políticas públicas | ppp | n. 26 | jun./dez. 200332 BUSINESS and Human Rights. An interdisciplinary discussion held at HLS, December 1997. Human Rights Program HLS and the Lawyers Committee for Human Rights. Cambridge: Harvard Law School, 1999. EHRENBERG, Ronald G. Labor markets and integrating national economies. Washington: The Brookings Institutions, 1994. HOW complaints would be handled. New York Times, 14 Aug. 1993, p. 45. FREEMAN, Richard. A hard-headed look at labour standards. In: SENGENBERGER, Werner; CAMPBELL, Duncan (Orgs.). International Labor standards and economic interdependence. Geneva: International Institute for Labor Studies, 1994. GOULD IV, William B. Labor law for a global economy: the uneasy case for international labor standards. Nebraska Law Review, v. 80, 2001. GUASH, J. Luis. Labor market reform and job creation. Washington: The World Bank, 1999. LIPSCHUTZ, Ronnie. Doing well by doing good? Transnational regulatory campaigns, social activism, and impacts on state sovereignty. In: MONTGOMERY, John D.; GLAZER, Nathan (Orgs.). How governments respond: sovereignty under challenge. New Brunswick e Londres: Transaction Publishers,
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