Buscar

fundamentos Teóricos

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 13 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 13 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 13 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA 
LITERATURA 
AULA 1 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Prof. Phelipe de Lima Cerdeira 
 
 
2 
CONVERSA INICIAL 
Estimado (a) aluno (a), receba as nossas boas-vindas! 
Muito provavelmente, este é um dos primeiros contatos – se não o 
primeiro – da área de estudos literários com você. Após uma trajetória de 
formação e de estudos no ensino médio, chega o momento de abrir um novo 
capítulo em sua história como estudante: a proposta é estreitar relações com 
temas que sempre lhe despertaram interesse; estar aberto para entender que 
crescemos a partir do diálogo; deixar-se surpreender por discussões antes não 
imaginadas ou pouco aprofundadas; e, ainda, (re)pensar a cada momento as 
certezas cristalizadas. 
A partir deste material, damos início à discussão da nossa disciplina, um 
dos conteúdos que dizem respeito à grade obrigatória do nosso curso de 
graduação. Será possível perceber que esta disciplina se apresenta como 
uma grande possibilidade para rever determinados conceitos e alinhar as 
principais questões que terão de fazer parte do seu horizonte crítico. Isso 
significa que tudo o que abordaremos em cada um dos encontros terá a 
finalidade de lhe deixar mais à vontade, com segurança para cursar as demais 
disciplinas que farão parte do módulo relacionado à literatura. 
Ainda que falemos aqui em “disciplina obrigatória”, precisamos esclarecer 
um ponto fundamental desde o princípio: o nosso grande desafio será, a todo 
momento, desconstruir a sensação de exigência e de certo monitoramento 
intelectual atrelada ao texto literário ao longo de nossa formação na educação 
básica. Ainda que ganhe foco de interesse teórico e crítico por conta do 
desenvolvimento de uma área específica, os estudos literários, a literatura 
precisa existir sempre como manifestação discursiva. A premissa que, sim, 
merece valor inicial quando se alude à literatura é a da fruição, do prazer 
advindo da leitura. Ainda que se referindo pontualmente ao livro, ao objeto que 
personifica o plano literário, o poeta gaúcho Mario Quintana parece nos ajudar a 
lembrar sobre o poder da literatura: “O livro traz a vantagem de a gente poder 
estar só e ao mesmo tempo acompanhado” (Quintana, S.d.). 
Para que possamos acompanhar toda a discussão com atenção e 
tranquilidade, todas as nossas aulas seguirão uma divisão bastante intuitiva e 
pedagógica. A proposta é que todo o raciocínio possa ser apresentado de 
maneira clara, facilitando a retomada de algum tema específico que precise ser 
 
 
3 
revisado ou, ainda, que acabou lhe despertado maior interesse. Nesta aula, por 
exemplo, o conteúdo contará com a seguinte a proposta de seções: 
1. Contextualizando; 
2. Antes de literatura, littera; 
3. Literatura para quê?; 
4. A literatura está em perigo?; 
5. Literatura, um direito; 
6. Na prática; 
7. Finalizando; 
8. Referências. 
É sempre importante reforçar que, ao falar de literatura, espera-se que a 
leitura seja uma ação presente e necessária. Contamos com a sua participação 
aqui e também em nossas conversas a partir de videoaulas, fóruns e atividades 
extra-curriculares que possam vir a ser oferecidas. Que possamos estabelecer 
um diálogo profícuo até o final deste módulo, (re)descobrindo um mundo 
chamado literatura. Bons estudos! 
TEMA 1 – CONTEXTUALIZANDO 
É muito provável que você tenha ouvido falar em um certo filósofo grego 
clássico chamado Sócrates, não é mesmo? O que ele tem a ver conosco, com 
as letras e com a literatura? Basicamente, tudo. Em um momento apropriado, 
em uma disciplina que verse sobre a literatura clássica, por exemplo, será 
possível conhecer as contribuições socráticas para o desenvolvimento dos 
estudos literários. Por enquanto, o que nos interessa aqui é retomar o nome de 
Sócrates para demonstrar a importância de tomar a literatura não com uma 
leitura ou interpretação pronta, decorada, mas sempre com uma boa 
desconfiança, com o interesse de querer ler e perceber diferentes detalhes. 
Com ajuda de muitas das reflexões socráticas, aprendemos que a única 
certeza possível é a dúvida. O que isso quer dizer na prática? Significa que, ao 
longo de toda a sua formação, você perceberá o quanto novas leituras podem 
ajudar a problematizar o que é apresentado, criando novas perguntas e 
possibilidades para se abordar um mesmo tópico. A partir das letras, 
(re)escrevemos novos caminhos para o aprender e descobrimos, como diria o 
escritor argentino Jorge Luís Borges, que um só jardim pode apresentar 
 
 
4 
diferentes caminhos que se bifurcam. O estudo da literatura, assim, apresenta-
nos diferentes aspectos que podem ser estudados e esmiuçados, de acordo com 
o nosso recorte de atenção ou objetivo. 
Como vimos desde a apresentação desta disciplina, a literatura – seja a 
partir de um romance, de um poema, de uma obra dramática, de um conto, de 
uma crônica, de ensaio ou de qualquer outro dos seus gêneros e manifestações 
possíveis – nos convida a pensar. Não é segredo algum que a melhor maneira 
para se começar a falar sobre a literatura é por meio da própria literatura. Por 
conta disso, antes de seguir com as nossas proposições, vale a pena nos 
dedicarmos à leitura de um fragmento de um verdadeiro clássico da literatura 
brasileira. A alusão aqui é para o romance Grande sertão: veredas, de João 
Guimarães Rosa: 
Sou só um sertanejo, nessas altas ideias navego mal. Sou muito pobre 
coitado. Inveja minha pura é de uns conforme o senhor, com toda 
leitura e suma doutoração. Não é que eu esteja analfabeto. Soletrei, 
anos e meio, meante cartilha, memória e palmatória. Tive mestre, 
Mestre Lucas, no Curralinho, decorei gramática, as operações, regra-
de-três, até geografia e estudo pátrio. Em folhas grandes de papel, com 
capricho tracei bonitos mapas. Ah, não é por falar: mas, desde do 
começo, me achavam sofismado de ladino. E que eu merecia de ir para 
cursar latim, em Aula Régia – que também diziam. Tempo saudoso! 
Inda hoje, apreceio um bom livro, despaçado. (Rosa, 2010, p. 30) 
O excerto que você acaba de ler foi retirado de uma das obras brasileiras 
mais lidas até hoje e que, sem dúvida alguma, marcou novos caminhos para o 
desenvolvimento do gênero romanesco não somente no Brasil. Publicada pela 
primeira vez no ano de 1956, a obra Grande sertão: veredas nos apresenta a 
realidade sertaneja a partir da perspectiva da personagem Riobaldo, que é 
também o narrador de toda a trama. Sem nos preocuparmos em uma leitura mais 
crítica e especializada, ou seja, apenas com o compromisso de ter a experiência 
de ler o texto, o que será que este trecho nos provoca? Tente responder esta 
pergunta voltando para a citação e relendo cada frase como se estivesse 
buscando o sabor das palavras. Como você poderia descrever quem está 
falando? Seria alguém novo? Viveria em qual parte do Brasil? Conhece outras 
realidades? Este narrador está falando com alguém? Se sim, a pessoa com 
quem ele fala é diferente? Existe algo que desperte o interesse deste narrador 
chamado Riobaldo? 
De forma rápida e sem a preocupação de um rigor crítico, fica evidente 
como um fragmento de um romance nos permite elencar diversas perguntas, 
 
 
5 
aguçando a nossa criatividade, conectando-nos com informações e leituras 
anteriores, provocando a nossa imaginação e curiosidade. Assim, fazendo 
perguntas para nós mesmos, relacionando conhecimentos, dialogando com 
demais leituras, fruindo o texto, ou seja, permitindo realmente ter prazer ao 
ler é que nos aproximamos do que deve ser a literatura. 
Entendidos tais compromissos iniciais, podemos nos dedicar a uma 
pergunta pontual para o nosso primeiro encontro: caso tivéssemos lido aquele 
mesmo trecho, mas sem saber que ele faz parte do romance Grande sertão: 
veredas ou mesmo desconhecendo a informação de que se tratava de uma obra 
de Guimarães Rosa, teríamos as mesmas impressões iniciais? 
Embora pareça simples, a provocaçãofeita agora é uma inquietude que 
faz parte da vida de teóricos literários dispostos a refletir sobre a natureza da 
literatura desde o século passado. Nomes como Terry Eagleton (1983), Tzvetan 
Todorov (2009), Antoine Compagnon (2009) e, no Brasil, Antonio Candido (2004) 
– este último, aliás, que será repetido nesta disciplina e na grande maioria das 
que você vai cursar ao longo do curso – têm pensado na natureza e nas 
propriedades que caracterizam a literatura há muitas décadas. Em uma de suas 
reflexões, Todorov esclarece como “[a] literatura não nasce no vazio, mas no 
centro de um conjunto de discursos vivos, compartilhando com eles numerosas 
características; não é por acaso que, ao longo da história, suas fronteiras 
foram inconstantes” (Todorov, 2009, p. 22, grifo nosso). 
A ideia que temos a respeito da literatura, portanto, corresponde a um 
determinado tempo, contexto e realidade discursiva. Para o crítico brasileiro 
Antonio Candido, por exemplo, a literatura está ligada diretamente a um acordo 
social: 
Cada sociedade cria as suas manifestações ficcionais, poéticas e 
dramáticas de acordo com os seus impulsos, as suas crenças, os seus 
sentimentos, as suas normas, a fim de fortalecer em cada um a 
presença e atuação deles. Por isso é que nas nossas sociedades a 
literatura tem sido um instrumento poderoso de instrução e educação, 
entrando nos currículos, sendo proposta a cada um como equipamento 
intelectual e afetivo. Os valores que a sociedade preconiza, ou os que 
considera prejudiciais, estão presentes nas diversas manifestações da 
ficção, da poesia e da ação dramática. A literatura confirma e nega, 
propõe e denuncia, apóia e combate, fornecendo a possibilidade de 
vivermos dialeticamente os problemas. Por isso é indispensável tanto 
a literatura sancionada quanto a literatura proscrita; a que os poderes 
sugerem e a que nasce dos movimentos de negação do estado de 
coisas predominante. (Candido, 2004, p. 175) 
 
 
6 
Diante do que foi evidenciado por Candido, fica mais fácil perceber como 
a literatura passou a ser vislumbrada a partir de diversas facetas, valorizando o 
quanto ela não se resume apenas a imitar ou transformar em ficção uma dada 
realidade, já que ela é, também, uma das responsáveis por garantir tal 
existência. À vista disso, literatura não é nunca um fim, uma resposta, mas, 
essencialmente, um meio. 
Se uma definição taxativa da literatura é inviável, por que grande parte de 
nós insiste em simplificar a literatura em uma espécie de produção textual 
específica? Em uma busca no dicionário eletrônico Michaelis, será possível 
encontrar dez entradas diferentes. Vejamos as definições: 
1. Arte de compor escritos, em prosa ou em verso, de acordo com 
determinados princípios teóricos ou práticos: “Os tênues murmúrios 
suspirosos desdobravam-se em orquestra de baile, onde se 
distinguiam instrumentos, e os surdos rumores indefinidos eram já 
animadas conversas, em que damas e cavalheiros discutiam política, 
artes, literatura e ciência”. 
2. Atividade ou profissão de um homem de letras; o trabalho, a arte do 
escritor: A literatura é a mais sedutora e enganosa das artes. Minha 
filha pretende fazer carreira na literatura. 
3. O conjunto das obras literárias de um país, um gênero, uma época 
etc. que, pela qualidade de seu estilo ou forma e pela expressão de 
ideias de interesse universal ou permanente, têm reconhecido seu alto 
valor estético: É um excelente professor de literatura norte-americana. 
4. O conjunto das obras literárias de um agregado social, ou em dada 
linguagem, ou referidas a determinado assunto: As livrarias hoje têm 
muitos livros bons na área da literatura infantil. 
5. A história das obras literárias do espírito humano. 
6. O conjunto dos homens de letras em atuação em determinada 
sociedade: A literatura brasileira vem marcando presença nos 
colóquios internacionais. 
7. O conjunto de conhecimentos relativos às obras literárias e a seus 
autores: A minha faculdade tem um excelente curso de literatura. 
8. Disciplina escolar voltada para o estudo da produção literária e dos 
escritores: Sempre teve boas notas em literatura. 
9. Qualquer dos usos estéticos da linguagem, mesmo quando não 
escrita. 
10. Palavreado artificial, desvinculado do que se entende por realidade: 
No fundo, todo esse discurso científico não passa de literatura. 
Ao voltarmos às definições do Dicionário Michaelis, não é difícil notar que, 
em sua grande maioria, as explicações versam a respeito da natureza da 
literatura com o plano escrito, da sua função de categorização e legitimação ou, 
ainda, da relação entre a literatura e uma dada identidade nacional. A entrada 3, 
pontualmente, evidencia a literatura como uma espécie de estabelecimento de 
norma, um parâmetro de classificação responsável por definir o que é bom ou 
ruim, sendo reconhecida, portanto, pelo seu “alto valor estético”. Não há dúvidas 
de que essa proposição é válida e nos interessará em breve, em aula futura, 
 
 
7 
quando falarmos da conexão entre a literatura e a língua e da instituição do que 
chamamos como cânone literário. Por ora, é prudente apenas entender que esse 
“alto valor estético” é um crivo estabelecido por um determinado grupo, mediante 
interesses e expectativas de diversas instâncias. 
Ainda no que diz respeito às entradas presentes no dicionário, vale 
pontuar como a definição 10 nos ajuda a tomar a outra faceta relacionada à 
literatura, a ideia equivocada de que à literatura competem os assuntos menos 
importantes, já que não se trata de uma ciência. A acepção pejorativa fará parte 
de discussões teóricas que vamos travar ao longo do curso, por isso vale sempre 
a atenção e a leitura crítica sobre tal ponto. 
TEMA 2 – ANTES DE LITERATURA, LITTERA 
Como vimos no final da seção de contextualização, a conduta mais 
imediata quando se fala de literatura está atrelada ao plano do texto. O 
movimento não é, em todo caso, incoerente, afinal a palavra literatura advém do 
latim erudito littera, transformado depois para letera. Está contido nesses dois 
radicais algo relativo à arte de escrever ou mesmo à erudição. Tal como relembra 
a pesquisadora portuguesa Paula Cristina Lopes, 
Nas línguas europeias, a palavra “literatura” designou em regra, até ao 
século XVIII, o saber, o conhecimento, as artes e as ciências em geral. 
Até à segunda metade desse século, para designar especificamente a 
arte verbal, o corpus textual, eram utilizadas palavras como “poesia”, 
“verso” e “prosa” (que hoje reconhecemos enquanto classificação de 
géneros literários). (Lopes, S.d., p. 1) 
Passa a ser inteligível, portanto, como a origem etimológica do termo 
literatura acabou explicando, mesmo que na contemporaneidade, como muitos 
passaram a simplificar a literatura. É bem verdade que, na continuidade da 
história, sobretudo por conta das contribuições de Voltaire, o vocábulo literatura 
ganhou novas acepções, passando a ficar relacionado a padrões estéticos. O 
resultado, como é possível imaginar, parece vigorar para alguns até hoje em dia. 
Cabe-nos, no entanto, questionar resoluções fáceis, relembrando que, para 
pensar em literatura, é fundamental não apenas considerar certa conduta 
ao trabalhar com a linguagem, mas, sim, contemplar o contexto no qual ela 
é produzida e para quem ela está destinada. 
 
 
 
8 
TEMA 3 – LITERATURA PARA QUÊ? 
Dentre os críticos dispostos a pensar no rumo do ensino da literatura e na 
maneira como ela passava a fazer parte da nossa rotina como estudantes e 
leitores, merece destaque o nome do francês Antoine de Compagnon. O que 
motivava as preocupações desse pensador? Compagnon percebia que, cada 
vez mais, a literatura era tratada de forma secundária, transformando-se em 
refém de uma perspectiva que a transformava em ferramenta para identificação 
de estruturas ou simplesmente uma replicação de uma leitura engessada. Ora, 
como vimos desde o início, tal postura é exatamenteo contrário do que se espera 
para um discurso como o literário, que almeja o diálogo constante e o 
envolvimento dos leitores. Em uma sociedade cada vez mais utilitária, a 
perspectiva humanista e a concepção de que o estímulo à reflexão é a chave 
para o desenvolvimento passavam a ser ameaçadas pelo afã tecnicista e pela 
desculpa da não praticidade. Ao perceber todo o cenário francês de aprendizado 
– mas que, decididamente, poderia ser replicado para a grande maioria dos 
países ocidentais – Compagnon dedica uma aula inaugural no Collège de 
France. Dos seus apontamentos, surge o ensaio Literatura para quê?, traduzido 
e publicado no Brasil em 2009. 
A ideia de resgatar esse trabalho é demonstrar como o crítico francês 
parte da provocação daqueles que minimizam a relevância da literatura para a 
formação humana. Ao longo dos seus argumentos, Compagnon atesta: 
Não é que achemos na literatura verdades universais, nem regras 
gerais, nem somente exemplos límpidos. [...] Ora, a literatura age 
diferentemente dos mandamentos, mas também das parábolas. [...] A 
literatura, exprimindo a exceção, oferece um conhecimento diferente 
do conhecimento erudito, porém mais capaz de esclarecer os 
comportamentos e as motivações humanas. Ela pensa, mas não como 
a ciência ou a filosofia. Seu pensamento é heurístico (ela jamais cessa 
de procurar), não algorítmico: ela procede tateando, sem cálculo, pela 
intuição, com faro. (Compagnon, 2009, p. 51) 
Muito mais do buscar números ou resultados, cabe à literatura o exercício 
de seguir oferecendo possibilidades, de não se contentar. É exatamente por 
conta disso que “A literatura nos ensina a melhor sentir, e como nossos sentidos 
não têm limites, ela jamais conclui, mas fica aberta como um ensaio de 
Montaigne, depois de nos ter feito ver, respirar ou tocar as certezas e as 
indecisões, as complicações e os paradoxos que se escondem atrás das ações 
[...]” (Compagnon, 2009, p. 51-52). 
 
 
9 
Se insistirmos na mesma pergunta, na razão pela qual estudamos 
literatura, será bastante oportuno considerar uma ponderação mais recente, 
advinda da Argentina, a partir da escritora e crítica María Teresa Andruetto: 
[…] la literatura es todavía esa metáfora de la vida que sigue reuniendo 
a quien dice y quien escucha en un espacio común, para participar de 
un misterio, para hacer que nazca una historia que al menos por un 
momento nos cure de palabra, recoja nuestros pedazos, acople 
nuestras partes dispersas, traspase nuestras zonas más inhóspitas, 
para decirnos que en lo oscuro también está la luz, para mostrarnos 
que todo en el mundo, hasta lo más miserable, tiene su destello1. 
(Andruetto, 2013, p. 25) 
TEMA 4 – A LITERATURA ESTÁ EM PERIGO? 
Da mesma forma que Antoine Compagnon, o teórico Tzvetan Todorov 
dedicou espaço para pensar sobre o assunto, utilizando as suas impressões de 
como a literatura passou a ser tratada nas salas de aulas francesas a partir da 
década de 1960. De forma mais incisiva, Todorov parece denunciar como a 
literatura passou a ser pensada não por conta das leituras das obras e do diálogo 
entre os leitores, mas simplesmente pela impressão daquilo que pensavam os 
críticos. O perigo passado pela literatura começava a ser, portanto, que a sua 
existência estivesse limitada ao conhecimento do que outro escreveu, não 
necessariamente do prazer e da oportunidade de conhecer uma obra (seja ela 
um romance, um livro de poesia, de contos, ou uma peça de teatro). 
Se fôssemos pensar em nosso contexto, talvez seria exatamente o perigo 
que poderíamos passar ao limitar a nossa experiência apenas na leitura de um 
artigo sobre uma obra ou, muito pior, basear as nossas impressões 
simplesmente a partir de um resumo ou resenha. Isso soa familiar para você? É 
exatamente isso o que queremos combater a partir desta disciplina, reforçando 
o quanto o caminho pode – e deve – ser muito mais prazeroso quando 
apostamos na literatura como uma experiência discursiva. 
 Em nossa realidade de estudantes e pesquisadores de letras, é preciso 
lembrar que o único e grande perigo que a literatura corre é quando o direito ao 
prazer de ler é negado. 
 
1 “[...] a literatura é ainda essa metáfora da vida que segue reunindo a quem disse e a quem 
escuta em um espaço comum, para participar de um mistério, para fazer que nasça uma história 
que, ao menos por um momento, nos cure da palavra, recolha os nossos pedaços, junte as 
nossas partes dispersas, transpasse as nossas zonas mais inóspitas, para nos dizer que, no 
escuro também há luz, para nos mostrar que tudo no mundo, até o mais miserável, tem o seu 
brilho” (Tradução-livre). 
10 
TEMA 5 – LITERATURA: UM DIREITO 
Por falar no direito ligado à literatura, seria impossível não reservar a 
última seção da nossa aula para abordar o nome do crítico literário brasileiro 
mais profícuo e presente em nossos estudos: Antonio Candido. Em sua obra 
Vários escritos (2004), é possível encontrar um ensaio chamado O direito à 
literatura, um exame minucioso a respeito de como a literatura deve ser encarada 
como um verdadeiro bem de primeira necessidade. 
Para alicerçar os seus argumentos, Candido retoma a teoria do 
sociólogo Louis-Joseph Lebret, baseada na diferença entre os bens 
compressíveis e os bens incompressíveis. Esses seriam todos e quaisquer 
bens que jamais deveriam ser negados a alguém, tais como alimento, casa, 
roupa e a própria literatura! Para justificar a sua afirmação, Candido endossa 
exatamente tudo o que discutimos até aqui, demonstrando a necessidade de 
se entender como a ideia de literatura acabou se transformando ao longo do 
tempo. Para aclarar, então, a sua perspectiva, o crítico brasileiro define: 
Chamarei de literatura, da maneira mais ampla possível, todas as 
criações de toque poético, ficcional ou dramático em todos os níveis de 
uma sociedade, em todos os tipos de cultura, desde o que chamamos 
folclore, lenda, chiste, até as formas mais complexas e difíceis da 
produção escrita das grandes civilizações. 
Vista deste modo a literatura aparece claramente como manifestação 
universal de todos os homens em todos os tempos. Não há povo e 
não há homem que possa viver sem ela, isto é, sem a 
possibilidade de entrar em contacto com alguma espécie de 
fabulação. Assim como todos sonham todas as noites, ninguém é 
capaz de passar as vinte e quatro horas do dia sem alguns 
momentos de entrega ao universo fabulado. (Candido, 2004, 174, 
grifo nosso) 
A relação indissociável entre a nossa vida e a literatura fica evidente na 
justificativa crítica de Candido, mas seria mesmo a literatura um bem 
incompreensível? Exagero do professor Candido? Em nossa perspectiva, muito 
pelo contrário, trata-se de um acerto, sobretudo por entender a literatura como 
um discurso que viabiliza (re)significar e fazer pensar sobre a realidade. Ao 
destacar projetos ficcionais, como a poesia de Castro Alves, Antonio Candido 
demonstra como a literatura é capaz de demarcar um quadro do tempo e seguir 
sendo atual para a discussão não apenas do plano estético. Sendo assim, “[u]ma 
sociedade justa pressupõe o respeito dos direitos humanos, e a fruição da arte 
e da literatura em todas as modalidades e em todos os níveis é um direito 
inalienável” (Candido, 2004, p. 191). 
 
 
11 
NA PRÁTICA 
A partir de toda a nossa discussão nesta aula, passa a ser possível 
entender como a ideia a respeito da literatura foi se transformando ao longo do 
tempo. Com base nessa discussão, reflita a respeito das duas questões a seguir: 
1. A que se deve o fato de que, muitas vezes, as pessoas acabam 
simplificando a ideia de literatura para um sinônimo de texto escrito? 
2. Como é possível relacionar as perspectivas de teóricos como Todorov, 
Compagnon e Candido para pensar a literatura? Quais são os principais 
pontos de contato entre os três teóricos no que diz respeito à 
compreensão da literatura?FINALIZANDO 
Como beletristas, estudantes de letras, precisamos estar atentos para não 
minimizarmos a literatura apenas como um amontado de conceitos ou 
classificações. Ao longo de toda esta aula, foi possível ponderar como a ideia de 
literatura é flexível e mais ampla do que simplesmente um texto que utiliza a 
linguagem sob uma proposta não usual. Por meio de reflexões como as de 
Antoine de Compagnon, Tzvetan Todorov e Antonio Candido, começamos a 
perceber como a compreensão a respeito da literatura passa a se adaptar 
conforme o tempo e o contexto de enunciação, demonstrando, ainda, a 
relevância do plano ficcional para tensionar a realidade e fazer com que ela seja 
questionada a todo instante. 
Tal como lembrado pelo crítico literário Antonio Candido, vale a pena 
pensar na literatura também como um direito de todos nós, humanos. Que ao 
final desta disciplina introdutória, esse sentimento faça parte do seu horizonte de 
expectativas e que lhe estimule enquanto leitor (a) e, claro, futuro (a) professor 
(a)! Nunca é demasiado lembrar que uma sociedade leitora se faz, 
verdadeiramente, quando a literatura passa a fazer parte do nosso dia a dia, 
de nossas conversas, não se restringindo a um conteúdo a ser medido por 
imposições estruturalistas ou expectativas que apenas reduzem o 
potencial de um texto. 
Para falar de literatura, temos, portanto, que vivê-la intensamente! Ou, dito 
de outra forma, “[a]ssim como não é possível haver equilíbrio psíquico sem o 
 
 
12 
sonho durante o sono, talvez não haja equilíbrio social sem a literatura” (Candido, 
2004, p. 175). 
 
 
13 
REFERÊNCIAS 
ANDRUETTO, M. T. Hacia una literatura sin adjetivos. Córdoba: Comunic-
Arte, 2013. 
CANDIDO, A. Vários escritos. São Paulo: Duas cidades, 2004. 
BANDEIRA, M. Estrela da vida inteira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. 
COMPAGNON, A. Literatura para quê? Belo Horizonte: UFMG, 2009. 
EAGLETON, T. Teoria da literatura: uma introdução. São Paulo: Martins 
Fontes, 1983. 
LOPES, P. C. Literatura e linguagem literária. BOCC – Biblioteca On-line de 
Ciências da Comunicação. Disponível em: <http://bocc.ubi.pt/pag/bocc-lopes-
literatura.pdf>. Acesso em 12 mar. 2019. 
MICHAELIS DICIONÁRIO BRASILEIRO DA LÍNGUA PORTUGUESA. 
Disponível em: <https://michaelis.uol.com.br/moderno-
portugues/busca/portugues-brasileiro/>. Acesso em: 12 mar. 2019. 
ROSA, J. G. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2010. 
TODOROV, T. A literatura em perigo. Rio de Janeiro: DIFEL, 2009.

Outros materiais