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Aula 4 - Fordismo_Toyotismo

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Aula 4 – Abordagem Clássica – Modelo Fordista de Produção: 
Comparações com o Toyotismo – Prof. Marcos Travassos 
 
FORD, GM, TOYOTA: 
A INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA E SUAS CONTRIBUIÇÕES PARA A ADMINISTRAÇÃO1 
 
INTRODUÇÃO 
Resolvi aproveitar o tema da aula “Modelo Fordista de Produção – Comparações com o Toyotismo” para incluir 
uma abordagem não só estritamente voltada para o modelo de produção industrial, mas também para abor-
dar a questão do mercado nessa indústria. Em se tratando da indústria automobilística não poderia deixar de 
lado outro participante fundamental dessa área – Alfred Sloan (GM) que na década de 1920 revolucionou esse 
mercado e desbancou a hegemonia da Ford (até hoje). Fez com que Ford fosse obrigado a rever seus conceitos 
de produção para poder continuar no mercado. 
Não apresentaremos aqui a biografia de nenhum dos envolvidos, Ford, Sloan(GM) e Ohno(Toyota). A biblio-
grafia utilizada foi bastante reduzida para tentar abordar o assunto de forma menos extensa. Aconselho a 
leitura dessa bibliografia. A maioria são livros que podem ser encontrados em sebos com facilidade. 
Este trabalho está dividido em três partes: A primeira, baseada principalmente no livro de Clemente Nobrega, 
fará uma breve comparação entre as duas grandes montadoras americanas: Ford e General Motors. Na se-
gunda parte, a comparação se dará entre a Ford e a Toyota. Por isso, alguns conceitos sobre a Administração 
oriental serão apresentados, tomando por base os livros de Taiichi Ohno e Shigeo Shingo. Finalmente, na ter-
ceira parte, utilizaremos três artigos publicados em diferentes edições da revista Exame para acrescentar con-
siderações adicionais ao assunto e, ainda, fazer alguns questionamentos. 
 
FORD X GM 
Seguindo a linha de raciocínio de Clemente Nobrega, antes de iniciarmos uma comparação propriamente dita 
entre a Ford e a General Motors, faremos um resumo das três fases da história do Marketing nos EUA, utili-
zando o livro de Tedlow (1990) como referência. 
Fase 1. Até a virada do século (1900), os mercados dentro dos EUA eram fragmentados, dispersos. Devido às 
dificuldades de transporte e comunicação, praticamente não havia mercados nem marcas nacionais. Só locais. 
Uma infinidade de produtos com nomes e fabricantes diferentes, vendidos em quantidades relativamente 
pequenas em cada localidade e a preços altos. O lucro tinha de ser obtido a partir dessa lógica de fazer negó-
cios. Nada de propaganda nacional, pois não havia nem veículo nacional de comunicação nem marca nacio-
nalmente conhecida. 
Fase 2. Os mercados nacionais foram criados a partir da implementação da rede nacional de estradas de ferro 
e do telégrafo, no final do século passado. A tecnologia introduzia o fator decisivo para integrar o país e tirar 
as cidades do ‘interior’ da sua simplicidade provinciana. Tecnologia induzindo relações mais complexas. (...). 
O lucro vinha da venda de grandes quantidades de produtos com margem pequena por item. A grande quan-
tidade vendida é que propiciava um lucro total atraente. O contrário da Fase 1. Essa foi a fase da unificação 
do mercado. (...) A propaganda passou a ser vital. (...) 
Fase 3. A última fase é a da segmentação. Um jogo mais sofisticado. De novo, como na primeira fase, volta a 
ser importante considerarmos agrupamentos de pessoas com características comuns bem-definidas. Seja em 
termos do preço que elas estão dispostas a pagar, como em termos de idade, estilos de vida etc. (...). Dividir 
o mercado em segmentos é válido só até o ponto em que é econômico fazê-lo, isto é: só até o ponto em que 
o grupo final que eu vou querer atingir me permita cobrar um preço que me dê lucro. Esse preço deve traduzir 
o valor que o produto tem para o consumidor. Com isso, desvinculo o preço do custo de produção. (...) 
 
1 Adaptado de Edna WOJCIECHOWSKI. Ford, GM, Toyota: a indústria automobilística e suas contribuições para a administra-
ção. Rio de Janeiro: mimeo, 1997. 
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Comparações com o Toyotismo – Prof. Marcos Travassos 
 
Segmentar direito é saber como fazer isso. Um produto para cada tipo de gente, ou melhor, um produto para 
cada tipo de cabeça. É mais uma arte do que uma ciência. A crescente importância da segmentação de mer-
cado é que caracteriza a terceira fase da evolução do Marketing. 
Nós vivemos nessa fase, mas ela tem vários níveis. (...) 
O que caracteriza a Fase 2 é a uniformidade das coisas, a não-variedade. 
O que caracteriza a Fase 3 é o fato de a multiplicidade ser o fundamental. (...) 
Com a Coca-Cola foi inventado o Marketing de massa. (NÓBREGA, 1996 – p.63-67) 
As comparações entre a Coca-Cola e a Ford são muitas. O conceito de produto imutável, por exemplo, aplica-
se tanto ao refrigerante quanto ao Modelo T, da Ford. O Modelo T deu certo. Tanto que Henry Ford jamais 
admitiu a ideia de mudá-lo ou mesmo de introduzir outro modelo de automóvel em sua linha de produção. 
Henry Ford foi, sem dúvida, um homem genial. Conseguiu montar um sistema para produzir o Modelo T cada 
vez mais barato e em quantidades cada vez maiores. Com isso, transformou o carro num artigo para as massas, 
algo aparentemente impossível em 1900! 
O processo de produção na Ford era totalmente planejado, passo a passo, de ponta a ponta (Taylor). A pro-
dução em massa do Modelo T, iniciada em 1908, foi um enorme sucesso. Foi Ford quem criou a “sociedade 
do automóvel”. A partir do Modelo T, o automóvel foi se tornando cada vez mais popular. Só para se ter uma 
ideia, em 1908 foram vendidos 5.986 Modelos T a US$ 850 cada. Em 1916, foram vendidas 577.036 unidades 
a US$ 360 cada. 
À medida em que aumentava seu volume de produção, a Ford reduzia seus custos e, por conseguinte, seu 
preço (diluição dos custos fixos). Ford comparava a produção de um automóvel à produção de alfinetes: todos 
os automóveis deveriam ser iguais, em absolutamente tudo! 
O Modelo T, aliava duas características muito atraentes: boa qualidade e preço baixo. Era bastante resistente, 
seguro para os padrões da época e, principalmente, barato. Graças a isso, em 1920, cerca de 33% das famílias 
americanas possuíam um carro. Sinal de que essa estratégia deu certo. Ele conseguiu desenvolver um mercado 
consumidor muito grande, mas havia muito o que explorar nesse mercado. 
Em 1930, 77% das famílias americanas possuíam um carro. Um aumento fantástico nas vendas de automóveis. 
Porém, o mercado começava a se tornar saturado. Ou será que as necessidades estavam mudando? 
Muito antes disso, porém, Ford começou a ter problemas. Em 1923, Alfred Sloan tornou-se presidente da GM 
e trazia consigo uma visão totalmente nova para a administração. 
Uma aguda percepção deveria haver uma estrutura organizada dentro da empresa para que ela pudesse ter 
sucesso no mercado lá fora. (NÓBREGA, 1996, p.88) (até então as empresas eram fechadas para o mundo 
externo – Taylor e Fayol) 
Em 1922, o relacionamento de Ford com seus revendedores tornou-se intolerável. A demanda havia se tor-
nado muito complexa, chocando-se com a sua visão de simplicidade. O que fazer com os carros usados, por 
exemplo? 
A competição que a GM oferecia à Ford até 1920 era muito pequena. A Ford parecia invencível. 
(...) Sloan sabia que a GM estava com problemas. Ford se recusava a sequer considerar a hipótese de ter de 
alterar alguma coisa na sua visão. (...) 
O significado do automóvel havia mudado. A relação entre oferta e procura também. Os carros duravam mais 
tempo em média em hoje, e os Ford duravam ainda mais que os outros. 
E pior ainda: Qual seria o limite mínimo que a Ford poderia chegar em termos de preço? Em 1924, a Ford 
tivera um lucro de mais de 82 milhões de dólares, mas desse total só cerca de quatro milhões estava vindo da 
venda de carros novos, o resto vinha da venda de peças de reposição e acessórios... Sabe qual era o lucro da 
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Ford por carro novo vendido? US$ 2,00. 
O Modelo T estava sendo vendido praticamente a preço de custo. (...) 
A estratégia de preços da Ford, tão brilhante, estava esgotada. (...) 
A Ford achava que o seu negócio era produzir Modelos T. Sua cultura de empresa, seus hábitos, suas enormes 
fábricas, tudo era para produzir Modelos T. (NÓBREGA, 1996, p.88-90) 
O comentário a seguir foi feito por Alfred Sloan anos depois, em suas memórias: 
O velho mestre não conseguiu tratar a mudança. Não me pergunte por quê... 
Ford, que tivera tantos insights brilhantes em épocas anteriores, parecia nunca ter entendido 
quão completamente seu mercado havia mudado em relação àquele no qual construíra seu nome 
e com o qual estava acostumado. (...) (NÓBREGA, 1996, p.90) 
Sloan estava enfrentando a realidade dos novos tempos na GM em várias frentes. Primeiro, organizando a 
empresa internamente. Atraindo gente boa. Criando o conceito de divisões com executivos respondendo por 
resultados e assumindo responsabilidades perante o comando central da corporação. 
Sloan mexia em tudo e usava várias formas para dinamizar a GM e sob seu comando, criou o conceito de 
administração de empresa, ou melhor, definiu-se na GM uma moldura de organização, um esquema de funci-
onamento que fez escola. A escola em que os executivos se formam até hoje. 
Sistemas de informação. Relatórios gerenciais. Níveis hierárquicos. Fluxos de trabalho organizados. Informa-
ções fluindo de forma mais organizada. Políticas de pessoal. Treinamento e a isso foi adicionada uma visão de 
Marketing inédita no ramo de automóveis (...). (NÓBREGA, 1996, p.91) 
O estilo de administrar de Sloan era totalmente diferente do que havia até então. Seria como reunir os aspec-
tos mais interessantes da Teoria Clássica da Administração, de Fayol, aos ensinamentos da Teoria Neoclássica 
e de Peter Drucker - que só surgiria décadas depois, inspirados, em grande parte, no próprio Sloan -, a concei-
tos hoje tão amplamente utilizados em Administração, como o de “sistemas de informação”, e à uma visão 
moderna de Marketing. 
A redefinição da GM promovida por Sloan foi lhe garantindo resultados cada vez mais positivos. Mesmo depois 
de ter trocado o Modelo T pelo Modelo A em 1924, a Ford possuía menos de 10% de participação no mercado 
de automóveis, no final dos anos 20 e nunca mais recuperou o seu domínio. Sloan estava criando um dos 
maiores sucessos da história empresarial norte-americana e mundial, além de definir e implantar o conceito 
de management. A GM foi campeã em Marketing definindo a questão do papel do consumidor. 
Ford padronizara o consumidor e Sloan acabou com isso, introduzindo a ideia de um carro para cada renda e 
cada finalidade. Segmentou. Trouxe um nível novo de complexidade para o jogo reconhecendo que a socie-
dade da década de 20 era outra. (...) 
Sloan nos ensinou a organizar a empresa, e consolidou certas ideias de Marketing que se aprendem até hoje 
nas escolas de administração. (...) (NÓBREGA, 1996, p.93-94) 
Sua política consistia em dois pontos básicos: 
1. Produzir diferentes linhas de carro com preços diferentes. 
2. As faixas de preço entre os vários níveis deviam ser tais que não houvesse buracos entre cada 
nível. (NÓBREGA, 1996, p.94) 
Este segundo ponto é praticado até hoje aqui no Brasil. Para compreendê-lo, basta olharmos para as tabelas 
de preços de carros novos publicadas nos jornais semanalmente. Para um mesmo modelo, há várias divisões. 
Para cada divisão, um preço para a versão básica, outro para a versão completa, que, por sua vez, é bastante 
próximo da versão básica da divisão seguinte. 
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Mas, voltando à GM, à medida em que diferentes veículos eram introduzidos em sua linha de produção, o 
negócio se tornava cada vez mais complexo. Negócios complexos exigem mais organização interna. 
O relacionamento entre cada divisão e o comando central da empresa introduzia tarefas que teriam de ser 
muito bem articuladas para dar certo. (...) 
E a visão de Sloan ia além. Ele queria uma outra coisa: mudar os modelos dos carros todo ano! (...) 
A proposta começou a ser articulada na GM em 1923, mas só estava totalmente implementada em 1930. Era 
arriscadíssimo enveredar por esse caminho. As fábricas teriam de trabalhar sob enorme pressão e os custos 
iriam explodir. Teria de se criar competência na previsão de tendências, estilo, moda... Os vendedores teriam 
de estar em treinamento constante sobre as vantagens dos novos modelos. (NÓBREGA, 1996, p.95) 
Sloan reinventou o conceito de automóvel, percebendo que naquela época, as pessoas em geral não tinham 
realmente motivo para comprar um carro novo. O fator mais importante para isso era a aparência do carro 
que já possuíam. Talvez fosse o único fator na visão de Sloan. (...) os competidores menores não teriam chance 
de acompanhar um movimento desses. Não disporiam de recursos. Iriam todos quebrar. 
E mais ainda: a Ford iria se violentar tanto a ponto de introduzir variações anuais nos seus modelos? 
Foi uma tacada de mestre com todos os seus riscos. 
Durante os anos vinte, a GM ultrapassou a Ford tanto em parcela de mercado como em lucro. 
Por falar em lucro, o seu foi, ininterruptamente, maior que o da Ford de 1925 a 1986 - todos os anos. 
(...) o que Sloan fez é essencialmente o que se entende por Marketing. 
Inventou a realidade através de uma proposta de diálogo com o mercado de compradores de automóveis 
usando a linguagem da moda e do estilo. 
Os consumidores responderam. Funcionou. Marketing é isso. 
(...) de qualquer forma, a história o aplaude como o (re)inventor do conceito de automóvel. (NÓBREGA, 1996, 
p.96-97) 
Contrariando o estilo de Ford, Sloan conseguiu fazer da GM o padrão de excelência na produção industrial. 
Até que... 
(...) até que, décadas depois, o Japão se tornou o mais importante produtor de automóveis no mundo, ata-
cando a GM com uma versão atualizada da mesma estratégia que a GM tinha usado contra a Ford. 
O mundo em que a GM reinara absoluta não valorizava tanto a qualidade e segurança dos carros e o consu-
midor ainda não tinha a opção de comprar carros estrangeiros produzidos segundo outras condições a preços 
viáveis. Isso acabou. 
A GM parece estar fadada agora a se reinventar de novo segundo outro padrão, algo como a Ford fez na 
segunda metade do século: promover mudança radical e maciça na empresa. (NÓBREGA, 1996, p.98) 
Vivemos na era da contingência. Muitos fatores - tecnologia, meio ambiente, informação, etc. - contribuem 
para o sucesso - ou não - de um negócio. 
Sucesso em business é a gerência da mudança. Por muitos anos, a GM gerenciou a mudança melhor que qual-
quer outra empresa. De fato, a GM programava a mudança e nos apresentava ao futuro de acordo com o seu 
próprio cronograma. 
Mesmo depois da chocante queda do Modelo T, a Ford ainda não entendia o novo mundo competitivo. Ela 
substituiu o Modelo T pelo novo Modelo A que fora concebido como o novo ‘carro Universal’. 
O Modelo A teve sucesso, mas só por algum tempo. Demorou anos para a Ford entender que não conseguiria 
manter com sucesso seu approach original (Fase 2). Uma importante razão para esse atraso vital foi o próprio 
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Ford que foi incapaz de modificar-se com o passar do tempo. Em vez de preparar sua empresa para o futuro, 
ele se agarrou ao passado. Como no caso de Robert Woodruff na Coca-Cola, a longevidade de Ford prejudicou 
a habilidade de sua empresa de responder ao mercado e ao desafio da competição. (TEDLOW, 1990, p.99-
100)2 
 
FORD X TOYOTA 
Para que possamos estabelecer uma comparação entre os sistemas de produção - e administração - da Ford 
Motor Company e da Toyota, faremos uma breve caracterização de cada um dos dois sistemaspara, então, 
compará-los. 
 
FORD: A PRODUÇÃO EM LINHA DE MONTAGEM 
Esta caracterização é baseada nos livros de Shigeo Shingo, Sistemas de Produção com Estoque Zero: o Sistema 
Shingo para Melhorias Contínuas (SHINGO, 1996, p.239-240) e de (OHNO, 1997). 
A utilização de linhas de montagem para a fabricação de automóveis móveis teve início em 1913/14 na Ford 
e teria sido desenvolvida por Charles E. Sorensen, gerente-geral a quem se atribui, também, a passagem da 
liderança da empresa para Henry Ford II, após a morte de Edsel Ford. 
A característica principal do sistema desenvolvido por Sorensen para a Ford era o fato de se deslocar o chassi 
ao longo do almoxarifado de componentes ao invés de movimentar todos os componentes até o chassi. O 
sucesso alcançado por este sistema fez com que (ele) fosse considerado o modelo básico de montagem de 
automóveis e copiado no mundo todo. Inclusive no Japão... 
O método da Ford visava a melhoria do trabalho. Segundo Shingo, 
(...) O processo de montagem foi dividido em vários passos para simplificar a movimentação de componentes 
grandes e pesados que, dessa forma, eram posicionados na ordem na qual eles seriam montados. (SHINGO, 
1996, p.240) 
Ainda segundo Sorensen, esse procedimento teria sido uma tentativa de melhorar as operações e não o pro-
cesso propriamente dito, o que não diminui sua importância. 
A utilização do sistema fordista de produção de automóveis fez com que, durante décadas, as montadoras 
americanas baixassem custos produzindo em massa um número menor de tipos de carros. (OHNO, 1997, p.23) 
Segundo Taiichi Ohno, 
Imitar os Estados Unidos não é sempre ruim. Os Estados Unidos geraram maravilhosas técnicas gerenciais tais 
como controle de qualidade (CQ) e controle de qualidade total (CQT), e métodos de engenharia industrial (EI). 
O Japão importou estas ideias e as colocou em prática e nunca deveriam esquecer que estas técnicas nasceram 
nos Estados Unidos e foram geradas por esforços americanos. (OHNO, 1997, p.25) 
Mas o fato é que o grande sucesso da produção em massa da Ford fundamentava-se, como já foi dito, na 
produção de grandes quantidades e de poucos modelos. Isto funcionava para o mercado americano, aumen-
tava a eficiência das empresas, mas também gerava muitos desperdícios, conforme veremos adiante. 
A produção em massa é o que os japoneses chamam de “sistema de empurrar” a produção. O processo inicial 
da linha de montagem produz determinada quantidade de componentes e a envia para o processo subse-
quente, que faz a sua parte no processo de montagem e envia o lote para o processo subsequente, e assim 
por diante, até chegar ao processo final da linha de montagem, que entrega o produto acabado para o 
 
2 Richard TEDLOW. The story of mass Marketing in America. In: Clemente NOBREGA. Em busca da empresa quântica. Rio de 
Janeiro: Ediouro, 1996. p. 99-100. 
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estoque. 
Este sistema, porém, exige a criação de grandes estoques de insumos ao longo de toda a linha de montagem. 
Afinal de contas, não pode haver paralisação da linha por falta de material. Caso não haja uma perfeita sincro-
nização entre as quantidades processadas em cada etapa, pode-se ter problemas de “gargalos” na linha de 
produção.3 
Além disso, a produção de muito inventário (estoques) significa altos custos para a empresa. 
Sobre o Sistema Ford, Taiichi Ohno declara: 
Este é o verdadeiro sistema de produção em massa, segundo o qual a matéria bruta é usinada e transportada 
em correias transportadoras para ser transformada em peças de montagem. Os componentes de vários tipos 
são então fornecidos a cada um dos processos de montagem finais, sendo que a própria linha de montagem 
se movimenta a uma velocidade regular enquanto as peças são montadas para finalmente tornarem-se carros 
totalmente montados saindo da linha, um a um. (OHNO, 1997, p.105) 
 
O SISTEMA TOYOTA DE PRODUÇÃO 
O chamado “Sistema Toyota de Produção” começou a ser desenvolvido por Taiichi Ohno em 1947, na oficina 
de produção n.º 2 da fábrica matriz da Toyota. Ohno lembra as palavras de Toyoda Kiichiro (1894-1952), na 
época presidente da empresa: 
“(...) alcancemos os Estados Unidos em três anos. Caso contrário, a indústria automobilística do Japão não 
sobreviverá.” (OHNO, 1997, p.25) 
E era verdade. A produtividade dos trabalhadores japoneses, em comparação à dos trabalhadores americanos, 
era baixíssima. Em média, algo como 1 americano para 9 japoneses. No caso da indústria automobilística pro-
priamente dita, uma das mais desenvolvidas nos Estados Unidos naquela época, a proporção com certeza seria 
ainda mais desfavorável ao Japão. 
Assim, Taiichi Ohno logo concluiu que os trabalhadores japoneses estavam desperdiçando alguma coisa, mas 
ainda não sabia exatamente o quê. E concluiu que, a partir da eliminação do desperdício, poderia multiplicar 
por 10 a produtividade de sua mão-de-obra. (OHNO, 1997, p.25) 
O sistema Toyota de Produção fundamenta-se em dois pilares de sustentação: 
1. Just-in-time 
2. Autonomação, ou automação com um toque humano. 
De forma simplificada, just-in-time pode ser definido como um processo de fluxo em que as partes necessárias 
à montagem chegam à linha de montagem no momento exato em que são necessárias e somente na quanti-
dade necessária. Isto implica numa tendência ao “estoque zero”. 
É claro que um sistema como esse é de difícil implantação, podendo apresentar problemas incontáveis decor-
rentes de falha na previsão, erro no preenchimento de formulários, produtos defeituosos, necessidade de 
retrabalho, falhas no funcionamento do equipamento, faltas de funcionários, etc. Portanto, sua implementa-
ção em toda a linha de montagem pode demorar alguns anos. Entretanto, isto não reduz os méritos do mé-
todo. 
O funcionamento do just-in-time (JIT) segue a ordem inversa do sistema tradicional. No JIT, um processo final 
vai para um processo inicial para pegar apenas o componente exigido na quantidade necessária e no exato 
momento necessário. Assim, a lógica manda que o processo anterior faça somente o número de componentes 
retirados. Um processo indica claramente para o outro o que e quanto é necessário. A este meio de sinalização 
 
3 O livro A meta ilustra bem o problema de “gargalos” na linha de produção. 
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chamamos Kanban. 
(...) cada elo na corrente just-in-time está conectado e sincronizado. Por essa razão, os níveis gerenciais são 
também drasticamente reduzidos. O Kanban é o meio usado para transmitir informação sobre apanhar ou 
receber a ordem de produção. 
(...) O método Kanban é o meio pelo qual o Sistema Toyota de Produção flui suavemente. 
Um exemplo de utilização do Kanban pode ser facilmente visualizado na rede McDonald’s, onde os kanbans 
informam os “operários da linha de montagem de sanduíches” sobre as necessidades do processo final (venda 
dos sanduíches). 
A autonomação é um avanço com relação à automação industrial propriamente dita. A cada dia as máquinas 
se tornam mais e mais automáticas, podendo trabalhar sozinhas, bastando para isso que estejam ligadas. Seu 
desempenho é tal que a ocorrência de pequenas anormalidades pode danificá-las. E, se isso acontece, deze-
nas, centenas, milhares de componentes defeituosos são produzidos e se acumulam. Um grande desperdício 
para a empresa. Não há como evitar a produção de componentes defeituosos, pois não existe qualquer sis-
tema de conferência automática embutido no equipamento para sanar tais ocorrências. 
A ideia da autonomação surgiu a partir da invenção de uma máquina de tecer auto ativada por Toyoda Sakichi 
(1867-1930), fundador da Toyota. Se qualquer um dos fios da trama se rompesse, o tear parava instantanea-
mente e, assim,produtos defeituosos não eram produzidos. 
Então, uma máquina automatizada com um toque humano (autonomação) significa uma máquina que tem 
acoplado a ela um dispositivo de parada automática. Na Toyota, a grande maioria das máquinas, novas ou 
velhas, está equipada com este tipo de dispositivo, assim como com vários outros, de segurança, parada de 
posição fixa, o sistema de trabalho completo, e sistemas baka-yoke 4 à prova de erros para impedir produtos 
defeituosos. 
Uma das maiores vantagens da autonomação, além do fato de impedir a produção de produtos defeituosos 
e, com isso reduzir o desperdício, é o fato de que um operador só se faz necessário quando a máquina para 
devido a uma situação anormal que justifique atenção humana. Dessa forma, um mesmo operador pode aten-
der várias máquinas, reduzindo, assim, o número de operadores, e aumentando a eficiência da produção. 
Ohno afirma que: 
Parar a máquina quando ocorre um problema força todos a tomar conhecimento do fato. Quando o problema 
é claramente compreendido, a melhoria é possível. (...) mesmo numa linha de produção operada manual-
mente, os próprios trabalhadores deveriam acionar o botão de parada para interromper a produção se surgir 
qualquer anormalidade. (OHNO, 1997, p.28) 
Dentro do Sistema Toyota de Produção, a autonomação corresponderia à habilidade e ao talento individual 
de cada trabalhador, enquanto o just-in-time seria o trabalho de todos eles para alcançar um objetivo pré-
estabelecido. 
A autonomação elimina a superprodução e, ao mesmo tempo, evita a produção de produtos defeituosos. Mas 
para que isto funcione, procedimentos de trabalho padronizados devem ser obedecidos sempre. 
São algumas das características do Sistema Toyota de Produção: 
 just-in-time; 
 Kanban; 
 autonomação; 
 operador multifuncional; 
 
4 Baka-yoke = à prova de defeitos. Dispositivos baka-yoke são aqueles instalados nos equipamentos com o objetivo de prever defeitos. 
Taiichi Ohno cita alguns exemplos deste tipo de dispositivo à pagina 130 de seu livro. 
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 sistema de “puxar”, ou seja, o processo subsequente vai ao processo precedente buscar componentes 
just-in-time (quantidade necessária do componente necessário no momento necessário), ao contrário do 
sistema convencional; 
 eliminação de inventários; 
 análise total do desperdício; 
 mudança de mentalidade e de atitude por parte dos empresários; 
 folha de trabalho padrão; 
 trabalho em equipe; 
 repetir a pergunta “por quê?” cinco vezes. 5 
A análise total do desperdício inclui: 
 desperdício de superprodução; 
 desperdício de tempo disponível (espera); 
 desperdício em transporte; 
 desperdício do processamento em si; 
 desperdício de estoque disponível (estoque); 
 desperdício de movimento; 
 desperdício de produzir produtos defeituosos. 
No que se refere à folha de trabalho padrão, ela lista com clareza os três elementos do procedimento de 
trabalho padrão: 
 tempo de ciclo, que é o tempo alocado para fazer uma peça ou uma unidade. 
 sequência de trabalho, ou sequência de operações, ou ordem de operações em que um operário processa 
itens. Inclui transporte, montagem nas máquinas, remoção das máquinas, etc. 
 estoque padrão, que corresponde ao mínimo necessário para que as operações continuem incluindo os 
itens montados nas máquinas. É geralmente desnecessário se o trabalho estiver sendo realizado na ordem 
dos processos de usinagem. 
 Sobre o Kanban, (OHNO, 1997, p.48) apresenta o seguinte resumo: 
Funções do Kanban Regras para Utilização 
1. Fornecer informação sobre apanhar ou 
transportar 
1. O processo subsequente apanha o número de 
itens indicados pelo kanban no processo prece-
dente. 
2. Fornecer informação sobre a produção 2. O processo inicial produz itens na quantidade e 
sequência indicadas pelo kanban. 
3. Impedir a superprodução e o transporte ex-
cessivo 
3. Nenhum item é produzido ou transportado sem 
um kanban. 
4. Servir como uma ordem de fabricação afi-
xada às mercadorias 
4. Serve para afixar um kanban às mercadorias. 
5. Impedir produtos defeituosos pela identifi-
cação do processo que os produz. 
5. Produtos defeituosos não são enviados para o 
processo seguinte. O resultado é mercadorias 
100% livres de defeitos. 
6. Revelar problemas existentes e manter o 6. Reduzir o número de kanbans aumenta sua 
 
5 Taiichi Ohno explica em seu livro (p. 37-38) a importância de se questionar cinco vezes o por quê do problema, de modo a encontrar 
sua verdadeira origem e “cortar o mal pela raiz”. Shigeo Shingo também explica o conceito (O Sistema Toyota de Produção do ponto 
de vista da Engenharia de Produção, p. 116-117). 
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controle dos estoques. sensibilidade aos problemas. 
 
COMPARAÇÃO: FORD X TOYOTA 
 
Segundo Shingo (1996), existem três diferenças básicas entre os dois sistemas de produção. São elas: 
1. Lote grande versus produção em lotes pequenos; 
2. Adoção da produção com modelos mistos no processo de montagem; e 
3. Operação de fluxo consistente das peças de montagem. 
 
Quadro-resumo: 
Característica Ford Toyota Benefício 
1. Fluxo de peças 
unitárias 
Somente na montagem Interligação do pro-
cesso 
e montagem 
Ciclos curtos, inventário de 
produtos acabados reduzido, 
estoque intermediário pe-
queno 
2. Tamanho do 
lote 
Grande Pequeno Redução do estoque inter-
mediário, produção contra 
pedido 
3. Fluxo do pro-
duto 
Produto único 
(poucos modelos) 
Fluxo misto 
(muitos modelos) 
Redução do estoque inter-
mediário, ajustes para mu-
danças, promove o equilíbrio 
da carga 
FONTE: SHINGO, Shigeo. O Sistema Toyota de Produção do ponto de vista da Engenharia de 
 Produção. 2ª ed. Porto Alegre: Artes Médicas (Bookman), 1996. p. 128. 
 
MAIS ALGUMAS CONSIDERAÇÕES 
O Sistema Toyota de Produção constitui apenas um item dentro do variado cardápio de técnicas industriais 
japonesas que, a partir da década de 70, começaram a invadir as empresas ocidentais a uma velocidade cres-
cente. O trecho a seguir dá apenas uma breve ideia dos conceitos básicos explorados por essas técnicas: 
Geralmente, as técnicas de melhorias usadas em empresas podem ser divididas em dois tipos: aquelas que 
visam à motivação para o trabalho tal como a administração por objetivos (APO) e o movimento zero defeitos 
(ZD); e aquelas que visam ao método de trabalho, tal como a engenharia de produção, o controle de qualidade 
(CQ) e a análise de valor (AV). 
O movimento de CQ é muito atuante no Japão. Será que isso deve-se ao fato de o controle de qualidade não 
ser visto somente como um método de trabalho, mas também por usar os círculos de CQ para enfocar a mo-
tivação para o trabalho? Não se pode esperar que atividades para sugestões de melhorias aumentem a moti-
vação para o trabalho somente pelo oferecimento de prêmios ou por meses de campanha especiais para su-
gestões de melhorias ou similares. Tais esforços devem estar associados com o aumento do conhecimento 
sobre métodos de trabalho, cursos sobre engenharia de produção, etc., antes que benefícios significativos 
possam ser obtidos. (SHINGO, 1996, p-242) 
Durante todo o trabalho desenvolvido por Taiichi Ohno na Toyota nos parece evidente a semelhança - em 
Aula 4 – Abordagem Clássica – Modelo Fordista de Produção: 
Comparações com o Toyotismo – Prof. Marcos Travassos 
 
alguns aspectos - de seu trabalho com os estudos de Taylor e dos Gilbreth. Mas, tantos anos depois, e após 
tantas experiências vividas - algumas bem-sucedidas, outras nem tanto - pelas próprias empresas americanas, 
nada mais natural do que aperfeiçoar as principais ideias que poderiam ser bem aproveitadas no Japão. (NÓ-
BREGA, 1997, p.124-128)Uma das técnicas mais exploradas no mundo ocidental é o kaizen, ou processo de melhoria contínua. Trata-
se de uma técnica a partir da qual as empresas estão buscando o aperfeiçoamento continuamente. É como se 
a empresa nunca estivesse 100% satisfeita com seu desempenho, com sua performance, por saber que pode 
melhorar ainda mais. A implementação desta técnica é bastante simples, e costuma apresentar resultados 
rápidos, ao contrário do que acontece com o Sistema Toyota de Produção (just-in-time e Kanban). 
 
CONCLUSÃO 
Para concluirmos este trabalho, vale lembrar que Nóbrega, 1997 cita em seu livro, de que Henry Ford era um 
homem de produção, não de Marketing. Opinião respeitável, principalmente considerando-se a vasta experi-
ência do autor como executivo de Marketing. 
Entretanto, afirmou Theodore Levitt: 
Em um certo sentido, Ford foi ao mesmo tempo o mais brilhante e o mais insensato homem de marketing da 
história americana. Ele foi insensato porque se recusou a oferecer ao consumidor outra coisa que não um 
carro preto. Ele foi brilhante porque forjou um sistema de produção desenhado para atender às necessidades 
de mercado. Nós habitualmente celebramos Ford pela razão errada: sua genialidade em produção. Sua real 
genialidade era em marketing. Nós pensamos que ele foi capaz de cortar seu preço de venda e em consequên-
cia vender milhões de carros a menos de 500 dólares porque sua invenção da linha de montagem tinha redu-
zido os custos. Na verdade, ele inventou a linha de montagem porque concluiu que a esse valor poderia vender 
milhões de carros. Produção em massa foi a consequência, e não a causa, dos preços baixos. (LEVITT, 1997) 
 
BIBLIOGRAFIA 
 
LEVITT, Theodore. In: Adriano SILVA. Que diabo é isso? Exame 31 (16), ed. 641, 30/jul./1997, p. 76-84. 
 
NOBREGA, Clemente. Em busca da empresa quântica. Rio de Janeiro: Ediouro, 1996. 
 
OHNO, Taiichi. O sistema Toyota de produção: além da produção em larga escala. Porto Alegre: Artes Médicas (Bookman), 1997. 
 
SHINGO, Shigeo. Sistemas de produção com estoque zero: o Sistema Shingo para melhorias contínuas. Porto Alegre: Artes Médi-
cas (Bookman), 1996. 
 
TEDLOW, Richard. The story of mass Marketing in America. Harper-Collins (Basic Books), 1990.

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