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História, Cultura e Poder – Modulo: A Religião Romana e o Culto Imperial Para além dos cultos públicos a religião romana apresentava três dimensões a se refletir: a primeira é a religião pública, entendida também como sacro pública, nela o sacerdócio está intrinsecamente relacionado com a política e a ortopraxis ritualística é de fundamental importância. O rito quando bem realizado é o elemento qualificante em que se firma a religio, do contrário quando não bem respeitoso ao rito é entendido como supersticio. Neste ritualismo público se insere o culto ao imperador, é por ele que se avalia o mandato dos imperadores e se ao final de sua vida este poderá ser cultuado como divino. Soma-se a isso ainda o culto aos antepassados, mosmaiorum. A segunda dimensão é a privada nela o sacerdócio está ligado e é determinado pelo pater família. O culto privado dedicado ao deus Lares e Penates encontra em seus nichos a representação da vida privada do romano e sua forma de se relacionar com o mosmaiorum. A terceira dimensão está ligada aos outros cultos manifestados, estes relacionados as crenças externas que na maior partes das vezes sempre era enxergadas pelos romanos como superstício. A religião pública e sua função social Em Cícero pode-se observar que as leis romanas relacionadas a religião fazem da mesma um objeto público. Ele entende que o público deve se fazer presente no privado, assim a religião deve pautar a conduta social. Ainda que a religião romana, durante o Império seja uma mescla de discursos, povos e culturas em conflitos, Cícero faz de seu discurso sobre a religião uma forma de manutenção da ordem social. Há relações de poder intrínsecos nas normas e nos ritos o que torna a religião um elemento de identidade romana, daí a necessidade de uso dela pelos Imperadores, estes deveriam se manter sempre dentro do religio para poder posteriormente alcançar a apoteose, ser divinizado. A religião garantia a Pax deorum, o equilíbrio da Urbs por isso a diversidade é permitida até que não se contraponha a política e a ordem social. Petrônio em Satyricon escolhe propositalmente uma narrativa em forma de prosa satírica como forma de ironizar o culto a outras manifestações religiosas não ligadas ao culto oficial romano. A forma como ele associa a sacerdotisa Enoteia a práticas não virtuosas e por vezes charlatãs é uma forma de os deslegitimar, uma vez que os mesmos são vistos como não dignos de uma sociedade como a romana. Tanto Cícero quanto Petrônio ao final acabam cumprindo a mesma função: Legitimar um tipo de culto que interessa ao Estado romano e relegar outras práticas que não se encaixam neste modelo ideal a uma posição de inferioridade, feminilidade e marginalidade. Ainda que de formas diferentes ambos são sujeitos de sua época, em que a identidade romana buscava ser reconstruída. Outros cultos, crenças externas e supersticio Roma sofreu influências de muitas culturas, ela as absorveu e modificou os parâmetros originais das mesmas, podemos chamar isso de sincretismo aberto ou hibridização. Exemplos de cultos que foram absorvidos pelos romanos são os cultos a Priapo, Cibele, Isis e Osíris, Mitra, entre outros. Cada um teve seu maior ou menor sucesso. Esses cultos não requeriam uma adesão exclusiva da parte dos fiéis. Eram rituais muitas vezes secretos, o que nos leva a estuda-los pelas falas daqueles que viveram, sem muito embasamento documental. As novas religiões eram ligadas principalmente a fecundidade, sem as questões morais do cristianismo. Priapo era representado com um falo (um membro viril) ou ainda como hermafrodita. Era encontrada em praias, encostas, espaços rurais, jardins e até mesmo no espaço urbano. Personagem da poesia foi objeto de culto de mulheres, aparentemente seu culto se ligava as divindades ancestrais do próprio povo romano. Bacanais foram proibidos pelo Senado romano, ou restrito, pelo medo do Estado de conspirações políticas, mas Príapo não teve seu culto proibido. Foi muito cultuado pelas ordens sociais mais baixa e nos círculos mais elevados ele tinha um o poder catártico e regenerador do riso. Associado a Tutino Mutino, causava horror aos primeiros cristãos. Figas romanas de ouro representavam o ato sexual que eram utilizados como objetos de sorte. O culto a Cibele e Átis, deuses frígios, chegam através da cerimonia da evocativo (chamamento para fazer parte do mundo romano). Trazem rituais muito diferentes da tradição romana, mas chegaram a fazer parte do culto oficial. Espécie de presságio durante as Guerras Púnicas, segundo Tito Lívio, a incorporação de seu culto permitiria a retirada de Aníbal dos territórios da Itália. Sobre seu mito, Cibele a deusa mãe era apaixonada por Atis e o tornou sacerdote de seu culto, mas foi traída e acabou por castrar amado Átis. Isto justificaria a violência do ritual de castração de seus sacerdotes do culto, Eunuquismo ritualístico. Era durante o mês de março que se realizavam as festividades e cerimônias e se revivia todo o mito da deusa. O culto a Cibele e Átis sempre teve cunho iniciático e não cívico, apesar disso ela nunca foi incorporada completamente a vida cívica romana. A autocastração era muito chocante aos olhos romanos e a mesma era aceita por se aceitar em algum momento do ano a subversão da ordem, para depois tudo voltar ao seu lugar. Cibele era sempre associada a figura feminina, e a mulheres, em geral nestes novos cultos, pareciam ser melhor inseridas. O ritual era chamado de Taurobólio/Criobólio, trazia proteção divina quando associada ao imperador e no culto privado era associado a purificação, com o passar do tempo o culto adquiriu uma dimensão mística e esotérica. Isis e Osíris, deuses de origem egípcia, encontraram culto em todo o Mediterrâneo. Apesar do sucesso em Roma, o culto por várias vezes foi impedido pelo Senado, posteriormente acabaram sendo usados pelos Imperadores que os associaram a própria imagem. Isis por sua característica ligada a fertilidade acabou sendo identificada com Demeter. No culto público ela sempre ficou excluída, ficando com um espaço maior nos outros cultos. Sabe-se que havia uma dimensão iniciativa. Mithra, deus iraniano com dimensão isotérica iniciativa, também nunca teve seu culto público manifestado. O estudo dos mithreus permite-se conhecer o ritual iniciático, o que se consegue supor está presente nos conhecimentos obtidos a partir da arqueologia. Tanto a tolerância quanto a intolerância jamais se manifestaram em sua plenitude. Intolerância e discriminação são antes componentes da lógica de definição das identidades de si mesmo e dos outros, de modo que a alteridade é fabricada, inventada e reforçada nas fronteiras dos grupos. Até meados do século III, o Estado Romano jamais implementou uma perseguição sistemática de um determinado culto. Há distinção do que era e não era aceito, aconselhado ou desaconselhado. Práticas mágicas e astrológicas geraram problemas e em alguns momentos eram criticadas, mas pouco se perseguiu algum culto religioso como o que se verificará com o cristianismo. Importância das vestais na religião pública A religião pública romana sempre foi uma religião essencialmente masculina, as mulheres cabiam apenas papéis específicos com algumas exceções, exemplos a se destacar são as vestais e flâmines. Sabe-se que o fogo representava a glória e a proteção de Roma, a continuação do poderio que estava ligada a ordem e tradição da história de dominação romana. Acreditavam que se o fogo apagasse a cidade e o próprio Império estaria em perigo. O fogo também representa a castidade das vestais, um símbolo de pureza ritualista por isso a incumbência de manter aceso a chama deveria ser de alguém digno da escolha do pontífice máximo. A escolha seria por uma pessoa destinada a manter-se pura para o exercício da ortopraxis ritualística, de maneira assegurar arenovação da identidade romana por meio da tradição. Referência Bibliográfica PARRA, AMANDA GIACON. Religiões e identidades religiosas em Roma. In: PARRA, AMANDA GIACON. Os elementos religiosos nas sátiras do poeta Juvenal (séculos I e II d.C). Tese (Doutorado em História) – Faculdade de Ciências e Letras de Assis, Universidade Estadual Paulista. Assis, p. 46 a 51. 2016. PARRA, AMANDA GIACON. A cidade de Roma no Principado. In: PARRA, AMANDA GIACON. As religiões em Roma no Principado: Petrônio e Marcial (séculos I e II d.C). Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de Ciências e Letras de Assis, Universidade Estadual Paulista. Assis, p. 16 a 53. 2010.