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03 3 MACCORMICK (2008) Retórica e o Estado de Direito

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Prévia do material em texto

COLEÇÃO TEORIA E F ILOSOFIA DO DIRE ITO 
C O O R D E N A D A P O R R O N A L D O P O R T O M A C E D O J R . 
RETÓRICA E O ESTADO DE DIREITO 
Neil MacCormick 
AGRADECIMENTOS 
Vários dos capítulos deste livro são versões mais ou menos reescritas 
de trabalhos publicados anteriormente, e são publicados dessa forma com o 
consentimento de publicações anteriores, o qual eu agradeço, conforme segue. 
Capítulo 2; "Rhetoric and the Rule of Lav^", em David Dyzenhaus 
(oy:g.),RecraftingtheRuleofLaw{Oidoxd\ Hart Publishing, 1999), p. 163-77, 
tendo sido apresentado por ocasião do Perelman Syinposium no 'Paideia' World 
Congress in Philosophy, na Universidade de Boston em agosto de 1998, e pu-
blicado nos Anais da Conferência. 
O Capítulo 3 não foi publicado anteriormente, mas foi preparado numa 
versão prévia para a John Dewey Lecture do ano 2000 na Universidade de 
Minnesota, u m convite pelo qual fiquei muito honrado. 
O Capítulo 4 contém elementos extraídos dos seguintes artigos que apare-
ceram no International Journal forSemiotks and Law: "Notes on Narrativity and the 
NormativeSyllogism" U5L4(1991), p. 163-74; "Legal Deduction, Legal Predicates 
and Expert Systems" ULS 5 (1992); e 'A Deductivist Rejoinder to a Semiotic Criti-
que" ULS 5 (1992), p. 215-24. A editora original, Deborah Charles, de Roby, 
Merseyside, UK, detinha os direitos autorais, mas que foram transferidos poste-
riormente a Kluwcr Academic. A publicação desses textos neste livro se deve à 
gentil permissão da Springer Science and Business Media. Um artigo similar, "Le-
gal Reasoning and the Institutional Theory of Law", foi publicado em P. KoUer, W 
Krawietz e E Strasser (oigs.) Institution und Recht, Rechtstheorie, Bàh^ 14, p. 117-
39, Ducker&HumboldtGmbH, Carl Heinrich Becker Weg 9,12165 Berlin (1994). 
O Capítulo 5 é substancialmente novo, mas tem sua origem, e em parte 
coincide com "Universalisation and Induction in Law", em C. Farrali e E. Pattaro 
(orgs.), Reason in Law-Proceedings of the Conference Held in Bologna, de 12 a 
15 de dezembro de 1984 (Milão: Dott. Giuffrè Editore, 1987), p. 91-106; 
publicado por Giuffrè Editore, Via Busto Arsizio 40, 20151 Müão, Itália. 
Capítulo 6: "Legal Decisions and their Consequences: from Dewey to 
Dworkin", New York University Law Review 58 (1983), p. 239-58 (original-
RETÓR ICA E O E S T A D O DE D I R E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
mente uma John Dewey Lecture, proferida na Escola de Direito da Universi-
dade de Nova York, em 1983). 
Capítulo 7: 'Argumentation e Interpretation in Law" Kluwer Academic 
Publishers, Argumentation 9 (1995), p. 467-80, pela gentil permissão de 
Springer Science and Business Media. Também "Argumentation and 
Interpretation in Law", em Ratio Júris 6 (1993), p. 16-29, pela gentil per-
missão de Blackwell and Co., 108 Cowley Road, Oxford OX4 IJF. 
Capítulo 8: "Why Cases have Rationes and What There Are", por Neil 
MacCormick, de Precedent and Law, editado por Goldstein, Laurence (Oxford: 
Oxford University Press, 1987). 
Capítulo 9: Esta é u m a versão parcialmente reescrita de "On 
Reasonableness", em Ch. Perelman e R. Vander Est (orgs.), LesNotions à Contenu 
Variable 6Tn Droit, com a gentil permissão da editora, Etablissements E. 
Bruylant, Bruxelas; uma versão posterior, alterada, intitulada "Reasonableness 
and Objectivity", foi publicada no número especial da Notre Dame Review em 
homenagem a Kent Greenawalt - Volume 74, Número 5, Notre Dame Review 
(Junho/1999), p. 1575-603. 
O Capítulo 10 é substancialmente novo, mas tem sua origem, e em 
parte coincide com, "On Coherence in Legal Reasoning" em W. Krawietz et. al. 
(orgs.), Theorie der Normen (Berlin: Duncker und Humboldt, 1984), p. 37-53. 
Capítulo 11: "Time, Narratives and Law", em J. Bjarup e M. Blegvad 
(orgs.). Time, Law and Society (ARSP-Beiheft 64), p. 111-25, por gentil permis-
são de Franz Steiner Verlag (Postfach 10 10 61, D-70009 Stuttgart). 
" ' - Capítulo 12: "Defeasibility in Law and Logic", em Z. Bankowski, I. 
White e U. Hahn, Informatics and the Foundations of Legal Reasoning (Dordrecht: 
Kluwer, 1995), por gentil permissão de Springer Science and Business Media. 
O Capítulo 13 é substancialmente novo, mas tem sua origem em, e em 
parte coincide com, "Can Judges Make Mistakes?", em H. Jung e U. Neumann 
(orgs.), Rechtsbegründung - Rechtsbegründungen (Baden-Baden: Nomos 
Verlaggesellschaft, 1999), p. 76-89; em sua primeira aparição, ele foi a pales-
tra anual de 1986 do Centre for Law and Society da Universidade de Edimburgo. 
O Capítulo 13, junto com o Capítulo 6, supera o meu "The Limits of 
Reason: A Reply to Dr. Knud Haakonssen", in Archiv für Rechts - und 
Sozialphilosophie 67 (1981), p. 504-9, que respondeu ao "The Limits of 
Reason and the Infinity of Argument", de Haakonssen, no mesmo volume 
nas páginas 491-503; por haver prestado atenção no caráter persuasivo, em 
vez de demonstrativo, dos argumentos ao longo deste trabalho, devo muito a 
esse artigo de Haakonssen. 
VIM 
PREFÁCIO À EDIÇÃO BRASILEIRA 
Tenho grande satisfação em apresentar a tradução de meu livro para a 
língua portuguesa por acadêmicos brasileiros que também são meus amigos. 
Sou muito grato ao esforço deles, tal a importância de imia real consciência 
mútua entre juristas e filósofos do Direito provenientes de diferentes tradi-
ções jurídicas e jurisdições. Somos todos preocupados com boas razões e boa 
argumentação no Direito. O Direito não é somente a vontade dos poderosos. 
O Direito é capaz de expressar a vontade racional de toda a sociedade. 
Certamente, no contexto do Estado territorial contemporâneo, o Direi-
to apresenta duas faces. Por u m lado, p)or meio do aparato coercitivo estatal, 
assegura ou pretende assegurar u m tipo de ordem imposta entre os residen-
tes do estado, principalmente seus cidadãos, mas residentes estrangeiros tam-
bém. Numa perspectiva ideal, por outro lado, pode ser concebido como um 
elemento na argumentação prática coletiva (collective practkal reasoning) das 
autoridades governamentais e dos cidadãos. Não é apenas uma ordem im-
posta, mas é também uma base para a interação razoável entre os muitos 
elementos dos quais o Estado é composto. 
O ideal do Estado de Direito (Rule of Law) leva a sério a possibilidade de 
que o Direito, enquanto base de razão prática (practical reason), possa colocar 
limites reais sobre as atividades coercitivas do Estado. A certeza jurídica pode 
ser obtida, em princípio, mesmo entre aqueles que contestam a justiça ou 
conveniência das regras jurídicas cuja aplicação ajuda a atingir tal certeza. 
Por outro lado, o próprio fato de que o Direito é um foco de argumentação 
prática acarreta que tudo no Direito pareça sempre aberto à argumentação prá-
tica diante de tribunais judiciais e outros lugares. 
Essas não são questões em relação às quais haja qualquer diferença 
séria entre países da tradição do civil law, como Brasil, Portugal, Alemanha, 
França e assim por diante, e países da tradição do common law como a Inglaterra, 
RETÓR ICA E O E S T A C O DE D J I : ^ " 
OU mesmo países com u m "sistema misto" como a Escócia. As modalidades 
superficiais de a p r e s e n t a ç ã o das decisões diferem, e h á diferenças reais em 
relação aos tipos de argumento a partir de precedentes judiciais, apesar de 
que tais diferenças podem ser menos fundamentais do que teorias sobre as 
"fontes do Direito" às vezes sugerem. 
Racionalidade é uma característica comum e definidora dos seres hu-
manos. É uma c a r a c t e r í s t i c a possível e desejável dos arranjos políticos e so-
ciais. A criação e aplicação razoável do Direito é um objetivo valioso e digno 
do esforço humano. Não é uma garantia de justiça perfeita, mas é certamen-
te uma proteção contras as piores formas de injustiça. Eu espero e acredito 
que este livro possa ajudar a mostrar os caminhos em direção à razoabilidade 
na tomada de decisão. Apesar de fazer menção especial aos sistemas jurídi-
cos em relação aos quais tenho n^ ior familiaridade,espero e acredito que ele 
tenha também re l evânc ia e valor para advogados, juizes e acadêmicos que 
trabalham em outros sistemas e em outras tradições. 
Edimburgo, janeiro de 2008 
Neil MacCormick 
PREFÁCIO 
Tive a grande felicidade de receber a Leverhulme Personal Research 
Professorship, primeiro entre os anos de 1997 e 1999 e, depois, com uma 
extraordinariamente generosa renovação do Leverhulme Trustees, por um 
período adicional a partir do mês de setembro de 2004. Essa renovação vem 
depois de u m intervalo de cinco anos durante os quais fui Membro do Parla-
mento Europeu pela Escócia. Eu registro meus calorosos agradecimentos aos 
Trustees, e também aos Professores Barry Supple e Sir Richard Brook, suces-
sivamente Diretores do Trust, pela gentileza e estímulo. 
Este é o segundo livro de u m quarteto sobre o tema "Direito, Estado e 
Razão Prática", e espero que o terceiro, Institutions of Law, apareça dentro de 
dezoito meses. Retórica e o Estado de Direito é um livro que veio ganhando 
forma há bastante tempo - em torno de vinte e cinco anos. Meu Argumenta-
ção Jurídica e Teoria do Direito foi publicado primeiramente em 1978, e des-
de então tive o privilégio de receber muitos comentários e resenhas críticas, 
tanto em apoio quanto sugerindo correções. Em vez de produzir uma nova 
edição daquele trabalho, busquei responder, com uma certa mudança de pers-
pectiva, de forma nova ao debate provocado por Argumentação Jurídica. Por 
meio de convites para fazer visitas acadêmicas em muitos partes do mimdo, 
tive a oportunidade de discutir questões básicas sobre argumentação jurídica 
com uma grande diversidade de colegas, em quantidade excessiva para nomeá-
los individualmente. Muitos outros autores, ao mesmo tempo, publicaram 
sábios livros e artigos sobre muitos aspectos da argumentação jurídica. Juizes 
em todo lugar tornaram-se mais explícitos em suas reflexões sobre seu racio-
cínio e argumentação, e entraram em debates com acadêmicos do Direito em 
muitas ocasiões. Eles continuam, obviamente, a escrever e publicar votos 
nos casos que decidem, provendo u m repositório espantosamente rico de exem-
plos de argumentação prática em operação. 
R E T Ó Ü I C A E O E S T A D O DE D I R E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
Eu também acumulei tantas dívidas intelectuais e dívidas de amizade e 
hospitalidade ao longo do tempo que é impossível agradecer adequadamente a 
todos os envolvidos. Com as renovadas desculpas a todos que inadvertidamente 
omit i , tenho ao menos agradecer à extensa Usta seguinte: Aulis Aarnio, Ruth 
^ e r , Robert Alexy, Manuel Atienza, Fernando Atria, Hans Baade, Jack Balkin, 
Zenon Bankowski, Garrett Barden, John Bdl, Joxerramon Bengoetxea, Jes Bjanip, 
Mogens Blegvad, James Boyle, Beverley Brown, Stephen Burton, Tom Campbell, 
Emilios Christodoulidis, David Dyzenhaus, Ronald Dworkin, Carla Faralli, John 
Finnis, Michael Freeman, Ake Frándbeig, David Galbraith, Ffeter Goodrich, Ron 
Griffin, Les Green, Andrew Halpin, Herbert Hart, Graham Hughes, Bemard Jackson, 
Nils Jareboig, Hdke Jung, Urpo Kangas, Martin Krygier, Niki Lacey, Eerik Lagerspetz, 
Etouglas Leggatt, Brian Leiter, Sanford Levinson, David Lyons, Michael Machan, 
Alastair MacLeod, Geoffrey MarshaU, Stuart Midgley Bob Moles, Michael Moore, 
Geoi?e Mousourakis, David Nelken, Byung-Sun Oh, Russdl Osgood, Alan fóterson. 
Enrico Pãttaro, George Pavlakos, Aleksander Péczenik, Bill Itowers, Joseph Raz, 
Michael Roumeliotis, Wojcziech Sadurski, Burkhard Schafer, Mike Sharlot, Raimo 
Siltala Sundram Soosay, Bob Summers e todos os membros do Círculo de Bielefeld 
(Bielefelder Kreis) não mencionados aqui, Alice Tày, John Touchie, Michel Troper, 
Takeshi Tsvmoda, Kaarlo Tuori, VNTiUiam Twining, Sebastian Urbina, Scott Veitch, 
Vittorio Villa, Neil Walker, Alan Watson, Ota Weinberger, Jim Weinstein, Jerzy 
Wròblewski, e Mark Yiidof. Alguns deles, infelizmente, não estão mais vivos para 
poderem receber os agradecimentos pessoalmente, mas minha gratidão a des per-
siste. Uma palavi-a particular de agradecimento é devida a Sundram Soosay por 
exortar-me a não ficar satisfeito com um simples formato de "ensaios reunidos", 
mas a revisar todo o corpo do trabalho com a intenção de reafirmar uma teoria da 
argumentaçãojmidica fundamentada na teoria institucional do Dii"eito {institutional 
theory of law). 
Esse é o conselho que tentei seguir, e apresento este livro como uma con-
cisa afirmação contemporânea de uma teoria da argumentação jurídica como 
u m ramo da argumentação prática (practical reasoning). Não se trata apenas de 
uma coleção de ensaios soltos, mas de uma substancial reelaboração de idéias 
que desenvolvi ao longo dos anos e ventilei em palestras, artigos e capítulos em 
outros livi-os. Argumentação jurídica importa, entre outras razões, porque ela é 
uma chave para a possibilidade de u m Estado de Direito genuinamente objetivo, 
mediado pelos julgamentos fundamentados das cortes. Na tentativa de delinear 
o caráter de argumentos genuinamente persuasivos (mas não demonstrativos) 
X I I 
ELSEVIER . PrepACIO 
no contexto jurídico, eu extraí vários exemplos de julgamentos em casos já deci-
didos. Esses são, de fato, principalmente das jurisdições do Reino Unido, mas 
mantive ao menos alguma atenção a casos do outro lado do Atlântico e também 
à União Européia e a alguns de seus Estados-membros. Algumas vezes se diz 
que a abordagem da argiunentação jurídica encontrada em livros como o presen-
te é distorcida pelo fato de que ele extrai suas provas sobre o caráter da argumen-
tação exclusivamente das decisões judiciais de cortes superiores de apelação. 
Portanto, não seria representativo do dia-a-dia real do Direito. O objetivo deste 
trabalho, contudo, não é ser representativo desse modo. É estabelecer uma visão 
de quais são os elementos de força e de fraqueza na argumentação que nos 
habilita (se é que podemos) a discriminar entre argumentos melhores e piores, 
mais ou menos racionalmente persuasivos. Para essa apreciação qualitativa, 
não há melhor fonte do que o tipo de argumento cuidadosamente considerado 
que se encontra nos votos de juizes em tribimais superiores. 
O livro tem esse título em parte devido ao tema desenvolvido no Capí-
tulo 2, mas em parte, também, como uma saudação à memória de Chaim 
Perelman. Perelman tornou-se meu amigo n u m a conferência do Scots 
Philosophical Club, em Stirling, 1976, e me estimulou a desenvolver meus 
pensamentos sobre a argumentação jurídica de u m tipo inspirado por sua 
"nova retórica". O Capítulo 9 começou como u m artigo sobre o "razoável" por 
ocasião de u m seminário no Centre for Studies in Logic in Brussels, em 1982. 
O Capítulo 2, sob o nome O Estado de Direito e o Caráter Argumentativo do 
Direito, que agora foi apropriado para o livro inteiro, foi inicialmente um 
artigo apresentado ao Perelman Symposium no "Paideia" World Congress in 
Philosophy, em Boston, no ano de 1998, depois de um debate na MacQuarie 
University, NSW. Rastros de outros artigos escritos sob a provocação de 
Perelman estão espalhados de forma mais difusa pelo livro. Espero que o uso 
do termo "retórica" n u m sentido u m pouco amplo, e sem muita alusão aos 
clássicos da retórica que não o trabalho de Perelman, não seja visto como 
nmito inapropriado pelos puristas. 
Finalmente, meus agradecimentos a Gv\̂ en Booth, John Louth, e ou-
tros colegas da Oxford University Press pela paciência editorial em face dos 
atrasos autorais. 
Edimburgo, janeiro de 2005 
Neil MacCormick 
X I I I 
RETÓRICA E O ESTADO DE 
DIREITO NO BRASIL 
Cláudio Michelon 
Cornado Hübner Mendes" 
Marcos Paulo Veríssimo'" 
O ideal político do Estado de Direito faz algumas promessas. Original-
mente, esse ideal esteve associado a u m regime de "governo das leis, não dos 
homens", de proteção contra o arbítrio e o capricho no exercício de autorida-
de, a um regime de decisões justificadas racionalmente. No período moderno, 
ganhou alguns traços adicionais. Em nome da emancipação individual(e 
também do bom funcionamento das economias capitalistas), comprometeu-
se também com a garantia de certeza no Direito e com a previsibilidade das 
decisões jurídicas. Somente posso ser livre e autônomo, nessa perspectiva, se 
tiver a capacidade de planejar minhas ações futuras. Para tanto, preciso ter 
segurança de que as conseqüências de tais ações são certas e mensuráveis de 
antemão e de que minhas expectativas serão atendidas. Essa é uma virtude 
do Estado de Direito, uma conquista dotada de valor moral, a "ética do 
legalismo".' 
Para oferecer essa capacidade de planejamento, a comunidade política 
institui um conjunto de fontes normativas dotadas de autoridade. Dessas 
' Professor de Teoria do Direito na Universidade de Edimburgo e Professor Adjunto licenciado da 
UFRGS. 
" Doutorando em Teoria do Direito na Universidade de Edimburgo. Pesquisador licenciado da 
Direito CV e da Sociedade Brasileira de Direito Público - SBDP. 
"• Professor da Direito GV e da Sociedade Brasileira de Direito Público - SBDP. 
' N. MacCormick. Retórica e o Estado de Direito, p. 9. 
RETÓR ICA E O E S T A D O DE D I R E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
fontes é possível extrair racionalmente u m conjunto de normas, em maior ou 
menor medida, gerais e abstratas. Tais normas têm a pretensão de regular os 
eventos particulares e são a referência a partir da qual se espera que o indiví-
duo seja capaz de planejar sua vida de maneira certa a segura (ou, ao menos, 
em u m ambiente de incerteza e insegurança controladas). Essas fontes de 
normas prospectivas possuem, contudo, capacidade limitada de regular ca-
sos futuros. Entre a fonte do direito e a norma geral e abstrata, entre a norma 
e o fato concreto que desperta u m pedido de aplicação dessa norma, e entre 
tudo isso e a decisão de aplicação da norma, há u m processo controverso de 
interpretação e argumentação. 
Por essa razão, o caráter argumentativo do Direito e a sua promessa de 
certeza e segurança são dois "lugares comuns" que convivem sob certa ten-
são.- Como promover ambos os ideais? Se tudo no direito está sujeito, em 
alguma medida, à argumentação, como posso ter certeza sobre o resultado 
da aplicação das normas jurídicas? Que tipo de previsibilidade o Direito ofe-
rece? 
A tensão entre esses dois ideais é o ponto de partida do livro, cujo 
objetivo central é oferecer concepções compatíveis de argumentação jurídica 
e da previsibilidade e certeza necessárias n u m Estado de Direito. Para tanto, 
MacCormick percorre um caminho repleto de temas fundamentais da teoria e 
da prática do Direito. Mostra, ao final, que o ideal do Estado de Direito é 
dinâmico, não estático, que o seu caráter argumentativo é u m dos seus com-
ponentes, não a sua antítese, e que a certeza jurídica, apesar de não absoluta 
e de sempre estar sujeita a novas exceções, pode existir dentro de alguns 
limites. Revela, mais claramente, a angústia (ou fascínio) de engajar-se numa 
atividade prática que, apesar de racional, parece não ser objetiva, que não 
tem soluções permanentes e absolutamente estáveis, que está sempre sujeita 
a novas investidas argumentativas. Apesar desses possíveis "defeitos", mos-
tra como essa opção é melhor do que as alternativas. Mais do que isso, como 
essa opção é um marco distintivo de sociedades civilizadas. 
Este livro é valioso, porém, não apenas pelo seu conteúdo, pelas per-
guntas e respostas que apresenta de maneira criativa, mas também pela his-
tória que está por trás de sua elaboração e pela metodologia com a qual o 
autor enfrenta os problemas teóricos que o preocupam. 
' Ver p. 19-21. 
XVI 
ELSEVIER RTIÔMCA e o ESTADO ot Dineiro NO BBASIL 
Neil MacCormick projetou-se internacionalmente na filosofia jurídica 
quando, em 1978, publicou y47gumeníafão Jurídica e Teoria do Direito.^ Aquele 
livro faz parte daquilo que o próprio autor chamou, em sua Valedictory Lecture, 
de seu "período Hartiano". Essa fase do seu pensamento, que inicia em 1972 
e vai até começo da década de 1980, foi sucedida por u m período, entre 1979 
e 1992, em que foi itnpactado por imi conjunto de influências intelectuais 
que acabam por determinar seu paulatino afastamento de Hart.'* Em segui-
da, entre os anos de 1992 a 2004, MacCormick passa pelo que chamou de 
"período europeu", no qual atenta para o caráter da ordem jurídica sui generis 
que se forma na Europa e de uma autoridade política transnacional que trans-
forma o conceito de soberania e passa a despertar a preocupação com o 
constitucionalismo para além das fronteiras do estado nacional. Culmina, 
finalmente, no que ele denominou de "período conclusivo", no qual se propõe 
a escrever uma série de quatro livros, intitulada 'Direito, Estado e Razão 
Prática'. O livro Retórica e o Estado de Direito pertence justamente a essa série.' 
Durante mais de três décadas, MacCormick beneficiou-se de uma ex-
tensa fortuna crítica, e esse constante diálogo com os seus críticos sofisticou 
' Originalmente, Legal Reasoning and Legal Theory (Oxford: Clarendon Press, 1978). 
'' Entre essas influências estão a filosofia do iluminismo escocês em geral e principalnfiente a obra 
de Stair e dos juristas que o sucederam; a obra de John Finnis e a nova perspectiva sobre razão 
prática, natureza humana e bem comum que ela propicia; a provocação de novos teóricos sobre 
a importância da interpretação no direito, entre eles Ronald Dworkin e Robert Summers; a 
percepção do direito como um discurso racional, apontada por Robert Alexy; e, finalmente, o 
positivismo institucional de Ota Weinberger. 
' Sua Valedictory Lecture (palestra que marcou o encerramento de seu período como Regius 
Professor of Public Law and the Law of Nature and Nations da Universidade de Edimburgo) teve 
o título de "Just Law" e foi proferida em 28 de Janeiro de 2008, ocasião em que se tornou 
Professor Emérito da mesma Universidade. Nessa ocasião, o autor ofereceu esse panorama sobre 
a evolução de sua própria obra. Trata-se de um pensamento que toma como ponto de partida a 
original percepção de que o Direito é um "fato institucional" (idéia que expressou, primeiramen-
te, em sua Inaugural Lecture, proferida em 1973, intitulada "Law as Institutional Fact") que se 
refinou para alcançar a formulação mais precisa e definitiva do Direito como "ordem normativa 
institucional" (institutional normative order), desenvolvida a fundo em seu recente livro Institutions 
of Law. Ademais, à medida que atenua sua adesão ao positivismo hartiano, passa a conceber a 
relação entre Direito e moral de forma mais próxima à "fórmula de Radbruch", segundo a qual 
situações extremas de injustiça não podem ser consideradas "Direito". Nesse espírito, 35 anos 
depois, em sua Valedictory Lecture, enfatiza que o Direito tem uma aspiração à justiça iaspiration 
to justice) e que a teoria do Direito não deve apenas cumprir a óbvia tarefa de teorizar sobre o 
Direito. Sua missão mais ambiciosa é teorizar sobre o "Direito justo" (/usf law): "A teoria do 
Direito é também sobre Direito justo" ("Jurisprudence is aiso about Just law"). 
X V I I 
RETÓÜ ICA E O E S T A D O DE D I R E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
diversos aspectos do seu pensamento. Engajou-se não só com interlocutores 
britânicos, mas também com muitos autores importantes dos Estados Unidos, 
da Europa continental e da Escandinávia. Sua filosofia política (na qual se 
insere seu tratamento do ideal do Estado de Direito), sua concepção de argu-
mentação jurídica (cujo ponto culminante é o Retórica e o Estado de Direito) e 
mesmo sua concepção de Direito (revisitada no recente Institutions of Law') 
evoluíram gradativamente. Essa evolução pode ser traçada em diversos livros 
e artigos publicados entre 1978 e 2007. Entre outras pubKcações sobre a sua 
"teoria institucional do Direito" e sobre a sua teoria constitucional para a 
União Européia, coordenou, junto com Robert Summers, u m projeto compa-
rativo coletivo que resultou em dois importantes livros: Interpretando Leise 
Interpretando Precedentes.' Essas duas obras apresentam e comparam siste-
maticamente as técnicas de interpretação das leis e dos precedentes de vários 
países importantes do Direito ocidental e desenham a metodologia da "re-
construção racional". Em 2005, o autor publicou Retórica e o Estado de Direi-
to, uma tentativa de consolidar essa experiência acumulada e de revisar e 
reconstruir a posição de seu primeiro livro. Argumentação Jurídica e Teoria do 
Direito. É, nas palavras do autor, a afirmação definitiva de sua teoria da 
argumentação jurídica. 
O presente livro é, portanto, a demonstração de como a interação cons-
trutiva com os críticos pode contribuir para o desenvolvimento de idéias e 
para uma reelaboração mais refinada e poderosa de posições iniciais. Trata-
se de uma atitude intelectual notável e incomum. MacCormick leva seus 
interlocutores a sério e não hesita em concordar com eles e em revisar as 
suas próprias idéias quando os considera corretos, ou em discordar e manter 
sua opinião, não sem antes depurá-la e mostrar precisamente por que discor-
da. Sempre indica explicitamente onde seus argumentos se inserem na tradi-
ção do pensamento, quais são suas referências e quais autores o influenciam 
em cada momento.® Não está obcecado em demonstrar ou insistir na corre-
« N. MacCormick. Institutions of Law (Oxford: OUP, 2007). 
' Originalmente, Interpreting Statutes, Dartmouth Publishing, 1991; e Interpreting Precedents, 
Dartmouth Publishing, 1997, 
° Em sua Valedictory Lecture, Neil MacCormick demonstrou essa preocupação com transparência 
ao enumerar, explicitamente, suas principais dívidas intelectuais. Conforme dito acima, elas 
foram: H. L A. Hart, o iluminismo escocês (principalmente na obra de Stair), John Finnis, Ronald 
Dworkin, Robert Alexy e Otta Weinberger. 
X V I I I 
ELSEVIER R ÍTÕMCA E O ESTADO DE DIREITO NO BRASIL 
ção de suas posições originais, mas sim em encontrar as melhores respostas 
possíveis aos problemas que foi-mula. Pressupõe que seus críticos estejam, 
freqüentemente e pelo menos em alguma medida, corretos, e é na análise 
cuidadosa desta exata medida que ele qualifica e reapresenta o seu próprio 
argumento, tentando reconciliá-lo com a crítica. Pode-se dizer que tal ética 
acadêmica corresponde ao que, na tradição da retórica e da filosofia, se 
convencionou chamar de "princípio da caridade".' 
Esta atitude, provavelmente, influencia o caráter de sua própria teoria. 
É possível perceber, em praticamente todas as questões que o livro enfrenta, 
um grande esforço recondliatório e gradualista na busca de costurar um 
espaço conceituai para o "meio-termo", uma posição intermediária que não 
se adapta a uma dicotomia estática. Faz concessões para ambos os lados, 
mas não se acomoda a nenhum deles pois percebe que perderia algo 
cognitivamente importante e empobreceria a sua percepção do fenômeno ju-
rídico. Rejeita, nesse sentido, a radicalidade de certos diagnósticos 
pretensamente definitivos sobre as qualidades ou defeitos do Estado de Direi-
to. Obviamente, essas concessões só são feitas na medida em que MacCormick 
percebe que elas são necessárias à melhor compreensão do Direito. Qualquer 
crítica que ele não considere esclarecedora de alguma forma é refutada com 
argumentos contundentes. 
Algumas teses do livro exemplificam isso mais claramente: as regras 
jurídicas, de fato, não propiciam certeza absoluta, mas é possível minimizar 
a sua incerteza e indeterminabilidade; pode-se distinguir bons e maus argu-
mentos, argumentos mais ou menos razoáveis, mas as pessoas continuarão 
a discordar sobre eles; argumentos jurídicos não são demonstrativos e con-
clusivos, mas há aqueles mais persuasivos e objetivos do que outros; a dedu-
ção, o silogismo e a decisão com base na análise das conseqüências 
(conseqüencialismo) não esgotam, certamente, o fenômeno jurídico, mas 
contam ao menos parte da história; juizes são falíveis, realmente, mas nem 
ix)r isso suas decisões deixam de ter validade dentro da ordem jurídica, e a 
validade da decisão não se confunde com a sua correção; juizes não são, 
efetivamente, aplicadores mecânicos de normas jurídicas, mas estão sujeitos 
a limites diferentes daqueles que agem sobre o legislador. 
' Um princípio caro a muitos filósofos e que poderia ser formulado, de modo simplificado, da 
seguinte maneira: qualquer enunciado ou conjunto de enunciados proferidos por outra pessoa 
devem ser considerados, na maior medida possível, como não sendo nem absurdos, nem banais. 
XIX 
RFTÔR ICA t O E S T A D O D t D I B E I T O — N E I I M A C C O R M I C K ELSEVIER 
Esse esforço reconciliatório não se confunde com ecletismo ou 
sincretismo metodológico, por meio do qual os mais diversos argumentos, 
ainda que sejam contraditórios, são combinados, sem nenhuma mediação ou 
qualificação, dentro de uma macroteoria. Nessas teorias sincréticas as in-
consistências ficam escondidas e o argumento ganha uma aparência persu-
asiva. O próprio autor, em seu livro subseqüente, publicado em 2007, refuta 
o sincretismo metodológico: 
É fácil, portanto, prever os críticos acusando o presente trabalho de ecletismo 
simplista, de sincretismo metodológico. Talvez digam ser este apenas um exem-
plo de um jurista se movendo rápida e frivolamente de uma teoria incompatível 
para outra teoria incompatível, selecionando porções aparentemente atraentes 
de cada uma e juntando-as sem perceber sua profunda incompatibilidade. Tal 
crítica seria, contudo, inadequada. Impressionar-se excessivamente com tal tipo 
de acusação envolveria retirar-se para o tipo de isolacionismo teórico castigado 
por Roger Cotterrell.'" 
Neil MacCormick escapa tanto do isolacionismo teórico típico de cer-
tas correntes extremadas de pensamento quanto da tentação de transformar 
a teoria do Direito em uma mera colcha de retalhos. Não se satisfaz com o 
fatalismo de posições como a do realismo jurídico americano ou a dos estu-
dos jurídicos críticos {criticai legal stiidies), segundo as quais o Direito não 
passaria, respectivamente, do que os juizes dizem que o Direito é ou de um 
^ «mples mascaramento de batalhas ideológicas travestidas da aparente neu-
{ tralidade da técnica jurídica. Por outro lado, também não cai na descrição 
^ fantasiosa do formalismo, que cumpriu papel ideológico central, desde a Re-
volução Francesa, na sustentação da crença de que o juiz não é mais do que 
a "boca da lei". Portanto, não é porque descobrimos que as regras jurídicas 
( não nos dão toda a segurança que desejávamos que devemos ignorar comple-
( tamente seu potencial para oferecê-la, em maior ou menor grau. 
( 
"/t is easy therefore to foresee at this point critics leveiling at the present work accusations offacile 
eclecticism, or methodological syncretism. They may well say this is just an instance of a jurist 
flitting in a light-minded way from incompatible theory to incompatible theory, selecting attractive-
seeming portions and lumping them together in blithe disregard of their deep incompatibility. 
Such criticism would, however, be ill-founded. To be over-impressed with sucb accusations would 
involve retreating into the kind oftheoretical isolationism castigated by Roger Cotterrell". (Institutions 
of Law, Oxford University Press, 2007, p. 303) 
XX 
ft; 
ELSEVIER RÍTÕMCA E O ESTADO DE DIREITO NO BRASIL 
Seria possível, porém, produzir uma teoria sofisticada e coerente que 
seja sensível a diversos pontos de vista e ocupe tal espaço do meio-termo? 
Procurar defender uma tal teoria, como faz este livro, é certamente menos 
confortável do que se apegar a qualquer das descrições absolutas e maniqueístas 
do fenômeno jurídico. Pode ser que sua teoria não esteja inteiramente corre-
ta, mas pelo menos aponta para um caminho que permite capturar o fenô-
meno jurídico mais integralmente. 
Este livro, obviamente, não teria razão de ser traduzido para a língua 
portuguesa se não nos ajudasse a pensar sobre o Brasil, Como vai o Estado de 
Direito brasileiro? Como vai anossa prática de argumentação jurídica? Em 
que medida a argumentação jurídica importa na forma como os tribunais e 
agentes públicos em geral têm tomado suas decisões? 
A resposta mais simples a essas questões é admitir que a auto-com-
preensão da argumentação jurídica no Brasil se tomou fragmentada e, de 
certa forma, dispersa, A crítica ao formalismo que começa no início do século 
XX, com autores como Carlos Maximiliano, e que, de certa forma, persiste 
até hoje não oferece em troca uma teoria da argumentação relativamente 
articulada ou sistemática. Ao contrário, faz por vezes uso indiscriminado de 
teorias díspares com propósito quase que exclusivamente doutrinário. 
No mundo todo, ao longo, sobretudo, da segunda metade do século 
XX, novos métodos de interpretação da lei foram propostos e se adicionaram 
aos métodos tradicionais. Após uma primeira leva de críticas, Perelman e 
Viehweg propuseram outras estratégias e técnicas argumentativas fundadas 
na retórica aristotélica. Mais recentemente, afirmou-se que a utilização de 
princípios jurídicos em processos argumentativos teria aberto terreno para 
outra forma de argumentação jurídica que levaria à necessidade de outros 
tipos de argumento, como o da comparação dos relativos pesos das normas 
(ponderação). A recepção dessas teorias no Brasil nem sempre foi capaz, to-
davia, de apreendê-las em todo o rigor e contornos originais, nem de identi-
ficar os pontos de divergência que as caracterizaram. Em vez disso, seu uso 
marcadamente forense foijou uma espécie de amálgama dessas visões todas, 
produzindo uma massa de artifícios retóricos que passou a ser contraposta 
de forma dicotômica ao "formalismo positivista". Essa prática produziu um 
modelo de discurso que acabou por legitimar a apresentação de convicções 
subjetivas como se fossem Direito objetivo (e como se, nessa condição, fos-
sem a única possibilidade de Direito objetivo, sem alternativas). 
X X I 
R E T Ó Ü I C A E O E S T A D O DE D I R E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
Contudo, se o resultado desse século de luta contra o formalismo é um 
conjunto assistemático de técnicas e métodos de argvmientação em busca de 
u m a estrutura, o que MacCormick provê em Retórica e o Estado de Direito é 
justamente u m a teoria sobre como vários desses elementos se combinam em 
u m a estrutura compatível com o ideal do Estado de Direito. O autor propõe 
u m a determinada forma de ai-ticulação dos vários elementos da argumenta-
ção jurídica, como a lógica formal ," a consistência e a coerência (Le. os 
princípios jurídicos), o conseqüencialismo, a força persuasiva dos preceden-
tes (mesmo em sistemas em que os precedentes não são obrigatórios), e a 
relação entre regras e princípios imiversais e casos particulares. Mostra como 
combinar esses elementos de forma impessoal, racional e universalizável. 
Poder-se-ia objetar que u m tal projeto de inserção da argumentação 
jurídica em u m a estrutura que, se não é rígida, é ao menos coerente e siste-
mática vai de encontro aos "costumes argumentativos brasileiros". No país 
em que o bacharelismo'^ ainda é u m importante componente da vida social, 
onde o argumento de autoridade é u m dos mais persuasivos e efetivos cânones 
a r g u m e n t a t i v o s , defender u m a fo rma de argumentação como a que 
MacCormick propõe poderia ser considerado algo inadequado ou, ao menos, 
fútil. A cultura jurídica no Brasil parece ser u m ambiente particularmente 
inóspito para formas não personalistas de argumentação em razão da predo-
minância da autoridade e da erudição (em decisões judiciais, em pareceres 
etc.) como indicadores da qualidade de u m argumento. A já referida estrutura 
fragmentária da argumentação jurídica, resultante da multifacetada crítica 
ao formalismo, foi terreno fértil para o crescimento desse personalismo." A 
" O papel da lógica formal foi um dos alvos mais atacados por essas críticas ao formalismo. No 
entanto, nem mesmo os seus mais radicais críticos defenderam a tese de que a argumentação 
jurídica possa ser estruturada em termos de falácias. A lógica formal parece, portanto, ter algum 
papel dentro da argumentação jurídica, e MacCormick tenta demonstrar essa exata medida. 
" O bacharelismo é um traço Identificado na sociedade brasileira que se caracteriza pela valori-
zação do diploma e dos títulos acadêmicos como instrumento para aquisição de status e de poder. 
Um estudo importante sobre o assunto é: Sérgio Adorno, Os Aprendizes do Poder: o bacharelismo 
liberal na política brasileira (Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988). 
" Uma referência obrigatória sobre este traço personalista das relações interpessoais na socieda-
de brasileira, cuja expressão mais acabada reside na figura do "homem cordial", que é impermeá-
vel a padrões impessoais e objetivos nas suas relações, é: Sérgio Buarque de Holianda, Raízes do 
Brasil (Rio de Janeiro: José Olympio, 1987). 
XXII 
ELSEVIER RÍTÕMCA E O ESTADO DE DIREITO NO BRASIL 
certeza que não se podia mais encontrar nas razões do Direito passou a ser 
encontrada em pessoas. O governo dos homens (no caso, dos professores, dos 
jurisconsultos, dos grandes juizes etc.) subordina, em alguma medida, o go-
verno das leis. 
A tradução do presente livro foi estimulada pela crença, compartilhada 
por muitos (e, entre esses, pelos tradutores), de que essa tendência possa ser 
revertida, e de que é possível combinar uma teoria da argumentação que não 
gera absoluta certeza com o ideal do Estado de Direito, sem se deixar seduzir 
pela certeza fácil e arbitrária do personalismo. Este livro, obviamente, não 
traz receitas prontas. Ele integra um conjunto de obras, quer já clássicas, 
quer contemporâneas, que nos ajudam a entender o papel e o valor da 
racionalidade na prática jurídica. 
Pode-se ler proveitosamente este livro em diferentes estágios de for-
mação, desde o início de um curso de graduação em Direito até uma pós-
graduação, ou mesmo como suporte à prática profissional de juizes, advogados 
etc. Essa leitura representa u m desafio intelectual duplo: compreender as 
complexas respostas do autor a cada problema e se posicionar pessoalmente 
sobre elas de maneira que faça jus ao esforço argumentativo do autor. 
X X I I I 
NOTA DOS TRADUTORES 
A tradução de Retórica e o Estado de Direito teve o privilégio de ser feita 
num contexto de diálogo com o próprio autor, que contribuiu com parte de 
seu tempo não apenas para escrever u m prefácio a esta edição e conceder 
uma entrevista de apresentação do livi-o, mas também para discutir dúvidas 
e opções de tradução que tivemos ao longo do trabalho. A transposição para 
a língua portuguesa de um trabalho acadêmico na área do Direito escrito em 
inglês encontra ao menos dois tipos de dificuldades: em primeiro lugar, os 
obstáculos decorrentes dos diferentes ritmos e estruturas gramaticais das 
duas línguas; em segundo lugar, as diferenças entre os dois sistemas jurídi-
cos e seus respectivos conceitos e instituições, que muitas vezes não encon-
tram equivalência perfeita um no outro. 
A qualidade da recepção de um livro estrangeiro numa cultura jurídica 
e acadêmica local depende, em parte, da qualidade da tradução e especial-
mente do cuidado terminológico com expressões técnicas específicas. À me-
dida que se traduz u m conjunto de obras dentro de uma mesma tradição de 
pensamento, como no caso desta coleção de Teoria do Direito, que abrange 
vários livros da tradição jurídica anglo-saxã, torna-se ainda mais importan-
te convencionar as traduções desses termos técnicos, condição para que es-
sas obras possam dialogar fluentemente na língua da tradução assim como o 
fazem na língua original. Por essa razão, a explicitação das eventuais dúvi-
das e das escolhas de tradução é útil para minimizar potenciais problemas de 
interpretação do texto e para ajudar na consolidação de u m vocabulário está-
vel para os termos técnicos de obras jurídicas escritas em inglês. 
Esta nota introdutória pretende explicar genericamente comolidamos 
com alguns desses dilemas. No decorrer do livro, quando oportuno, também 
optamos por fazer notas de tradutor específicas no rodapé, indicadas com o 
sinal de asterisco. 
RETÓÜ ICA E O E S T A D O DE D I R E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
O livro menciona urna grande quantidade de nomes próprios de auto-
ridades individuais (Lord Reid, p. ex.), instituições estatais (Privy Council, p. 
ex.), casos judiciais (Siveet v Parsley, p. ex.) e de diplomas legais (Employment 
RightsAct, p. ex.). Nesses casos, adotamos a regra de não traduzi-los e de 
manter a expressão estrangeira em itálico, com exceção de quando os nomes 
encontravam tradução simples e já convencionada na língua portuguesa. 
Portanto, House ofLords, Court ofAppeal e American Supreme Court, entre outros 
exemplos, receberam as versões já consolidadas em português - respectiva-
mente, Câmara dos Lordes, Corte de Apelação e Suprema Corte americana. 
Privy Council e Home Secretary, por outro lado, são algumas das autoridades 
que decidimos manter na língua original. Por não haver qualquer expressão 
consolidada em português para se referir a essas autoridades e tampouco 
uma autoridade equivalente no sistema político brasileiro, consideramos essa 
a melhor opção. Uma rápida pesquisa sobre o sistema político estrangeiro 
pode sanar eventuais dúvidas do leitor. 
Muitos termos específicos em inglês não possuem uma tradução exata 
para a língua portuguesa, quer porque tenham múltiplos sentidos, cada qual 
expresso por uma palavra diferente na língua portuguesa, quer porque inexista 
uma palavra que denote exatamente o seu significado. Isso pode ocorrer, por 
exemplo, com a palavra right, que mais comumente se traduz como direito 
individual (e, portanto, diferente de law), mas algumas vezes pode significar 
"correto" ou "justo". Suas traduções, em regra, foram opções desconfortáveis 
na falta de uma melhor alternativa em português. Nesses casos, porém, de-
cidimos manter a palavra original entre parênteses e itálico, pelo menos na 
primeira vez em que ela apareceu em cada capítulo. 
Alguns termos e expressões merecem menção específica aqui, pois 
impõem opções problemáticas de tradução. Comecemos por uma expressão 
que aparece no próprio título: Rule of Law. 
Em geral, essa expressão é traduzida por Estado de Direito (apesar da 
etimologia diferente desse conceito). A mesma raiz está presente em várias 
outras línguas, como por exemplo: Rechtsstaat, em alemão. Estado de Derecho, 
em espanhol, État de droit, em francês, Stato di diritto, em italiano, e assim 
por diante. Optamos por manter essa tradução, mas é importante notar al-
gumas das nuances do termo em inglês. A noção de Estado de Direito, na 
tradição do civil law, muitas vezes é entendida de forma algo diferente do 
sentido exato da expressão Rule of Law, tal como usada neste livro. Esta 
X X V I 
u 
ELSEVIER NOTA DOS TRADUTORES 
corresponde sobretudo a certo padrão de racionalidade na aplicação do Direi-
to. Aquela, mais comumente, refere-se a u m modelo de Estado que se subor- * 
dina ao Direito e que, portanto, não é autoritário. Eventualmente, costuma-se ' 
até conceber a noção específica de "Estado de Direito" de forma conectada à ^ 
democracia, de onde se deriva a expressão "Estado Democrático de Direito". 
O próprio autor, inclusive, não utiliza a expressão Rule of Law quando quer 
referir-se ao sentido mais restrito de Estado de Direito, preferindo a expressão < 
(pouco usual em inglês) Law State. , 
Desse modo, se a expressão "Estado de Direito" refere-se, mais 
comumente, em nossa tradição, a um determinado sistema político que su-
bordina a atuação do governo às regras do Direito com o objetivo de evitar o ' 
autoritarismo, a idéia de "rule of law", sobretudo no contexto em que o livro ( 
se insere, diz respeito também a esse ideal, mas acentua u m componente ( 
específico do Direito ao qual o Estado se subordina. Ressalta, assim, a neces-
sidade de certeza em sua aplicação e põe em destaque sua constituição a ' 
partir de regras preexistentes e razoavelmente claras, de modo a evitar-se ' 
não apenas o risco de autoritarismo, mas também o de se produzirem, por ( 
conseqüência de um Direito menos claro, decisões judiciais erráticas, incon-
sistentes e, eventualmente, arbitrárias. Entre nós, esse componente específi-
co do rule of law, que é talvez aquele mais propriamente ligado ao termo tal 
como é utilizado no título original em inglês, é mais comumente identifica- < 
do com o princípio da legalidade. Portanto, uma outra opção (igualmente { 
desconfortável) de tradução para o título seria algo como Retórica e Legalida- i 
de. No caso, a escolha pela tradução afinal utilizada foi do próprio autor. 
Universalizability foi aqui traduzido por universálizabilidade (o texto * 
também apresenta algumas de suas variantes: universal, universalization e 
universality, correspondentes, em português, a universal, universalização e 
universalidade, respectivamente). Trata-se de u m termo da filosofia moral 
kantianajá consolidado mesmo na língua portuguesa. Numa paráfrase, sig-
nificaria a "capacidade de ser imiversalizado". São universalizáveis aqueles 
preceitos morais igualmente aplicáveis a todos. I 
O substantivo defeasibility, tal como utilizado no livro, diz respeito à 
qualidade daquilo que pode ser subseqüentemente excepcionado. Conforme 
referido no Oxford American Dictionary, dtfeasible é aquilo que está "aberto, em 
princípio, à revisão, à otyeçao válida, ao desapossamento ou à anulação". ^ 
Conforme exposto neste livro, são dessa ordem as certezas e as universalizações ( 
X X V I I ' 
RETÓÜICA E O E S T A D O DE D I R E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
que encontramos no Direito. São certezas e universalizações que valem 
plenamente, mas apenas até o momento em que sejam alteradas ou modifi-
cadas (por força da argumentação). Nesse momento, tais certezas e universa-
lizações são substituídas por novas certezas e universalizações, as quais, 
igualmente, estarão sujeitas a potenciais alterações ou modificações subse-
qüentes. Considerando a dificuldade de encontrar algum termo em português 
que traduzisse perfeitamente essa idéia, preferimos, como regra, deixar o 
substantivo no original em todas as suas ocorrências. No caso de suas varian-
tes, optamos por traduzi-las pelas variantes de "excepcionar", e por manter 
os termos originais entre parênteses e em itálico. Assim, defeat foi traduzido 
por excepcionar, defeating por excepcionador, defeasible por excepcionável e 
defeasance por exceção. 
Também optamos por manter no original as expressões common law e 
civil law, usadas para designar de forma geral os Direitos pertencentes às 
tradições anglo-saxã e romano-germânica, respectivamente. Nesse caso, a 
justificativa para essa decisão consistiu no fato de já serem, entre nós, ter-
mos de uso comum, normalmente referidos em inglês, sem que para eles 
exista uma tradução igualmente consagrada. 
Especificamente no que respeita à tradição do common law, sabe-se 
também da importância desempenhada pelo sistema de precedentes, que são 
considerados fontes formais de Direito. O Direito produzido a partir dos pre-
cedentes é chamado de case-law e, na falta de melhor expressão para designá-
lo, traduzimos essa expressão por "Direito jurisprudencial". A razão para a 
escolha dessa expressão foi a tentativa de diferenciar essa fonte de Direito 
própria da tradição anglo-saxã daquilo que chamamos entre nós de "juris-
prudência", uma vez que essa última expressão remete, entre nós, a u m 
corpo de decisões mais ou menos vasto ao qual não é reconhecido o status de 
fonte formal de Direito. Já a expressão statute, que na tradição do common 
law designa de u m modo geral as leis produzidas pelo Parlamento, foi nor-
malmente traduzida por "lei" ou por "Direito escrito", conforme o caso. 
Oferecemos, a seguir, um pequeno glossário contendo as escolhas de 
tradução que julgamos mais importante explicitar, para o efeito de esclareci-mento do exato sentido do texto original, nas ocasiões em que tais expres-
sões são utilizadas. O glossário não substitui, obviamente, a consulta a um 
dicionário jurídico ou a pesquisa detida do Direito estrangeiro para aqueles 
interessados em desenvolver um estudo mais aprofundado. 
X X V I I I 
GLOSSÁRIO 
INSTITUIÇÕES ESTATAIS TRADUZIDAS 
American Supreme Court - Suprema Corte americana 
Court ofAppeal - Corte de Apelação 
Court of Criminal Appeal - Corte de Apelação Criminal 
Crown - Promotoria 
European Court of Justice - TVibunal de Justiça Europeu 
Higher Court - Corte Superior 
House ofLords - Câmara dos Lordes 
Trial court - corte de primeira instância 
Canadian Supreme Court - Suprema Corte canadense 
German Constitutional Court - Tribunal Constitucional alemão 
INSTITUIÇÕES ESTATAIS MANTIDAS N O ORIGINAL 
Attorruy General 
Employment Appeal Tribunal 
EngUsh Law Commission 
Foreign Compensation Commission 
HomeSecretaty 
Inner House of the Court ofSession 
Privy Council 
Scottish High Court ofJusticiary 
T E R M O S ESPECÍFICOS 
Adjudication - contencioso, decisão judicial 
Adjudicative institutions - instituições judicantes 
Arguable - defensável / sujeito à argumentação 
The arguable character oflaw - o caráter argumentativo do Direito 
RETÓÜ ICA E O E S T A D O DE D I R E I T O — NEiL M A C C O R M I C K ELSEVIER 
Argument - disputa / argumento 
Authoritaüve - dotado de autoridade 
Backward-looking / forward-looking - retrospectivo / prospectivo 
Balance, balancing - balanceamento 
Binding - vinculantes 
Binding precedent - precedente vinculante 
Body 
Body oflaw - ordenamento jurídico / conjunto de normas 
Body of case law - conjunto de casos 
Public body - órgão público 
Case - argumento / pleito / caso 
Case-law - Direito jurisprudencial 
Problem-case - caso-problema 
Hard-case - caso difícil 
Causation - nexo de causalidade / causalidade 
Charge - acusação 
Civil litigation - contencioso civil, procedimentos civis 
Claim - alegação, exigência, pleito, argumento 
Compensation - indenização / reparação 
Compensatory award - indenização 
Constraint - constrangimento / freio, limite 
Construction - interpretação / construção 
Decision-mãker - autoridade decisória 
Deductivism - dedutivismo 
Defeasibility - defeasibility 
Arguing defeasibly - argumentação sujeita a exceções 
Defeasible - excepcionável 
Defeating - excepcionador 
Defeat - excepcionar 
D^easance - exceção 
Depart - rejeitar, afastar (to depart from precedent / departure from 
precedent) 
XXX 
J 
ELSEVIER GLOSSÁR IO 
Directive - diretivas 
Doctrine - doutrina / teoria 
Enact - promulgar / editar / positivar 
Enacted law - Direito posto, Direito legislado 
Enacted mies - regras promulgadas 
Evidence - prova / meio de prova 
Circumstantial evidence - prova circunstancial 
Direct evidence - prova direta 
Law of evidence - Direito probatório 
Expediency - conveniência e oportunidade 
Fault - culpa 
Formalistic - formalista 
Formalism - formalismo 
Framework laws - leis-quadro 
Free government - governo democrático, governo livre 
Classes - interpretações explicativas 
Guidance - diretriz 
Holding - decisão / dispositivo 
Initial pleadings - petições iniciais 
Injury - dano, lesão 
Instance - desdobramento / exemplo / concretização 
To instantiate - exemplificar 
Interpretive - interpretativo 
Judge-made law - Direito produzido por juizes / Direito jurisprudencial 
Judicial lawmaking - criação judicial do Direito 
Jurisprudence - teoria do Direito 
Justification - justificativa / justificação 
Justifying reasons - razões justificadoras 
Justificatory practices - práticas justificadoras 
XXXI 
( 
^ RBTÓHICA I o E S I A O O Df D I K E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIHl 
^ LãW - Dire i to / lei 
( Laws - leis i 
( Law-state - Estado de Direito i 
Law reports - repertórios de jurisprudência í 
Lawfiil / unlawfiil - legal / ilegal j 
Lawmaker - legislador í 
Lawyers, jurists - advogados, juristas 
Legal - jurídico, legal 
Legal commentators - a doutrina / doutrinadores [ 
Legal materiais - materiais jurídicos, documentos jurídicos, fon-
tes jurídicas : 
Legal order - ordem jurídica í 
Legal reasoning - argumentação jurídica / raciocínio jurídico j 
Legal setting - cenário jurídico, contexto jurídico 
Legal system - sistema jurídico 
L^aíZy-juridicamente J 
Legislature - legislador, Poder Legislativo [ 
Liability - responsabilidade [ 
Liable - responsável / sujeito a ser responsabilizado 
Substitiite liability - responsabilidade subsidiária 
Law - Direito 
Law of tnists - o Direito fiduciário (trusts - arranjos fiduciários) ' 
Laws - leis j 
Loss - dano í { ( 
( Material facts - fatos juridicamente relevantes 
Merits of the case - mérito do caso 
Misdirection - orientação equivocada do juiz ao júri 
I Offence - ofensa / infração 
! Ojficial - funcionário público / agente público 
^ Opinions, decisions - decisões 
Outweigh - superar, ter mais peso, sobrepujar {outweighing reasons) 
X X X I I 
ELSEVIER GLOSSÁR IO 
Persuasiveness - habilidade de persuadir / persuasividade 
Fractítioner - profissional do Direito, operador do Direito 
Precedent - precedente 
Precedent-based system - sistema baseado em precedentes 
Precedent texts - textos dos precedentes 
Principie - princípio 
Principled application - aplicação fundada em princípio 
Rationalizing principies - princípios de racionalização 
Proposition - proposição / tese 
Prosecutor - a persecução penal 
Prospective overruling - revogação com efeitos não retroativos 
Provision - disposição 
Purposive interpretation - interpretação teleológica 
Pursuer, plaintiffi petitioner - autor da ação judicial 
Reason - razão 
Reasoning - argumentação / raciocínio 
Practical reasoning - razão prática / argumentação prática 
Coherentist reasoning - argumentação por coerência 
Remedy - tutela judicial, indenização 
Respondent, defender, drfendant - réu 
Rules - regras 
Rule-case - caso-regra 
To rule - estabelecer, decidir 
Ruíings - decisão / soluções 
Scholar - acadêmico / intelectual / estudioso 
Shareholder - acionista 
Controlling shareholder - acionista controlador 
Sound - sólido / adequado 
Standard - parâmetro, padrão / conceito jurídico indeterminado 
Statute / statutory law - lei, leis, direito legislado 
Statute-book - código escrito 
Statutory provision - disposição legislativa 
Statutory interpretation - interpretação da lei 
X X X I I I 
RETÓRICA E O ESTADO DE D I R E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
Thin / thick terms - ternios fracos / fortes 
Thought-object - objeto mental 
Treatises - manuais 
Dial - julgamento, procedimento instrutório 
Type-case - caso típico 
Universal - universal 
Universal instantiation - exemplificação da proposição universal 
Universal nexus - conector universal 
Universality - universalidade 
Universalizability - universalizabilidade 
Universalizer / rational universalizer - universalizador racional 
Universais and particulars - universais e particulares 
Value-expression - expressão carregada de carga valorativa 
Value judgment - juízo de valor 
Value-scepticism - ceticismo moral 
Weighing - sopesamento / ponderação 
X X X I V 
Á 
SUMÁRIO 
Capítulo 1 - Prólogo: A teoria institucional e a perspectiva 
do legislador 1 
Introdução 1 
1. Teoria inst i tucional 3 
2. A perspectiva do legislador 9 
C a p í t u l o 2 - 0 Estado de Direito e o Caráter 
Argumentativo do Direito 1 7 
Introdução 17 
1. Primeiro l u g a r - c o m u m : o caráter a rgumenta t ivo do Direito . . 1 9 
2. Segundo luga r - comum : o Estado de Direito 2 1 
3. Em direção à reconciliação 2 3 
(a) Teorias Retóricas 2 3 
(b) Teorias Procedimentais 2 8 
(c) Leis 3 2 
Capítulo 3 - Sobre o Silogismo Jurídico 4 3 
In t rodução 4 3 
1. O silogismo jur ídico 4 5 
2. O Direito c o m o algo sujeito a interpretação? 5 2 
3. U m a diferença do common law? 5 9 
4. Insti tuição e r azão 6 4 
Capítulo 4 - Em defesa do deducionismo 6 5 
In t rodução 6 5 
1. l l m Direito sem lacunas? 6 9RETÕH ICA E O E S T A D O DE P I H E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
2. A objeção kelseniana 73 
3. Valor-verdade e fatos institucionais 81 
4. Qual lógica para os juristas? 90 
5. Uma objeção: classificar é também decidir 93 
6. A verdade e os procedimentos para determinação da verdade.. 95 
7. Avaliações na argumentação jurídica 97 
8. Predicados normativos? 100 
9. Conclusão 101 
Capítulo 5 - Universais e Particulares 1 0 3 
Introdução 103 
1. Particularismo 104 
2. Universalizando elementos particulares 116 
3. Universalização ou generalização 121 
4. Universalização e indução: o pensamento causai 126 
5. A universalização na justificação 129 
Capítulo 6 - Argumentação fundada em Conseqüências.. 135 
Introdução 135 
1. Armadilhas para os conseqüencialistas 138 
2. Conseqüências como implicações - "conseqüências 
jurídicas" 139 
3. Avaliação das conseqüências 149 
4. Os valores do Direito 153 
Capítulo 7 - Argumentando sobre a Interpretação 1 6 1 
Introdução 161 
1. Categorias de argumentos interpretativos 165 
2. Argumentos conflitantes e solução de conflitos 182 
3. A Interpretação no contexto da argumentação prática 184 
4. Classificação 187 
xxxvi 
ELSEVIER SUMAKIO 
Capítulo 8 - Usando Precedentes 191 
Introdução 191 
1. Justificação na decisão jurídica 195 
2. Legalismo na justificação 198 
3. Um modelo de ratio 202 
4. A reconstrução mais racional? 204 
Capítulo 9 - Sendo Razoável 2 1 3 
Introdução: subjetividade e objetividade 2 1 3 
1. Por que "razoabilidade"? 223 
2. Interpretando a "razoabilidade" : 227 
3. Sobre o que é razoável, e sobre se essa seria uma questão 
de fato 234 
Capítulo 10 -Coerência, Princípios e Analogias 24 7 
In t rodução 2 4 7 
1. Coerência Normativa 249 
(a) O significado da coerência 249 
(b) Princípios e coerência na justificação; alguns 
exemplos 253 
(c) Por que a coerência justifica 263 
2. Analogia e princípio: "desenvolvendo o Direito" 268 
3. Analogia e classificação: entendendo corretamente 276 
Capítulo 11 -Nar ra t ivas Jurídicas 2 79 
Introdução 279 
1. Tempo e atividade 279 
2. Tempo e narrativas 282 
3. Narrativas e Direito: casos 285 
4. Prova e coerência narrativa 288 
5. A Distinção entre coerência narrativa e normativa 298 
6. Coerência normativa como coerência narrativa? 303 
X X X V I I 
RETÓÜ ICA E O E S T A D O DE D I R E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
Capítulo 12 -Argumentação sujeita a exceções (Arguing 
Defeasibly) 3 0 7 
Introdução 307 
1. Pragmática e excepcionalidade 309 
2. Pragmática e realismo 320 
3. Defeasibility, poderes e instituições 322 
4. Defeasibility de regras? 326 
Capítulo 13 - Julgando equivocadamente? 329 
Introdução 329 
1. Sobre questões de opinião 331 
2. Precedentes e a teoria declaratória 339 
3. Decisionismo: um exemplo 344 
4. Contra o decisionismo 351 
5. Falibilidade judicial e o Estado de Direito 357 
Apêndice - Entrevis ta com Neil MacCormick 3 6 3 
Apêndice - índice de Casos 3 7 7 
índice O n o m á s t i co 3 8 1 
índice Remissivo 3 8 5 
X X X V I I I 
Capítulo 1 
PRÓLOGO: A TEORIA INSTITUCIONAL E A 
PERSPECTIVA DO LEGISLADOR 
INTRODUÇÃO 
'A prisão por tempo indefinido sem acusação nem julgamento prévios é um anátema 
em qualquer país que observe o Estado de Direito. Ela priva a pessoa detida da prote-
ção que o processo penal se destina a oferecer. Circunstâncias verdadeiramente excep-
cionais precisam existir antes que esse passo extremo possa ser justificado.'" 
Essas palavras (proferidas por Lord Nicholls de Birkenhead) colocam em 
questão um dos profundos desafios enfrentados pelo Direito contemporâneo. Pode 
o Estado de Direito ser mantido em face dos perigos contemporâneos que emer-
gem do terrorismo e das preocupações com a segurança pública? Por meio de 
quais argumentos advogados e juizes podem enfrentar esse problema? Esses ar-
gumentos são testáveis de forma objetiva e impessoal, ou são puramente políti-
cos e subjetivos, não possuindo qualquer caráter jurídico especial? Responder a 
essas questões exige uma ampla compreensão acerca da riatureza dos argumen-
tos jurídicos. 
Este livro oferece uma teoria da argumentação jurídica. Ele revisa as posi-
ções apresentadas em meu Legal Reasoning and Legal Theory de 1978, levando em 
consideração críticas significativas feitas àquele trabalho e, também, respon-
dendo ao trabalho de outros estudiosos. A trajetória do meu pensamento tem 
' A (FO and others v Secretary of State for the Home Department [2004] UKHL 56 {parágrafo 74). Lord 
Nicholls foi um dos oito (entre nove) juizes que concluíram que as circunstâncias não eram suficien-
temente excepcionais para justificar a prisão sem julgamento ou acusação prévios de estrangeiros 
suspeitos de terrorismo, em circunstâncias nas quais cidadãos britânicos sobre os quais recairiam as 
mesmas suspeitas não estariam sujeitos ao mesmo regime. Os argumentos apresentados no caso 
ocupam um lugar importante entre aqueles discutidos ao longo deste livro. Preferindo dar ao caso um 
nome mais fácil de lembrar que "A(FO v Home Secretary", eu o chamo de "Caso dos Suspeitos de 
Terrorismo". 
1 
RcTõmcA E o ESTADO DC DiRtiTo - N E I L M A C C O K M I C K ELSEVIER 
estado distante de alguns dos elementos que formaram o pano de fundo de meu 
argumento em Legal Reasoning and Legal Theory, sobretudo daqueles colhidos do 
positivismo jurídico apresentado por H.L. Hart e do ceticismo moral derivado de 
David Hume. As formas básicas de argumentos jurídicos continuam parecendo-
me terem sido bem descritas no livro de 1978. Agora, contudo, parece-me que 
toda a empreitada de explicar e sistematizar critérios e formas de boa argumen-
tação jurídica tenha que ser colocada no contexto dos valores fundamentais que 
nós imputamos à ordem jurídica. A argumentação em relação à aplicação do 
Direito à luz desses valores é persuasiva, não demonstrativa, e nesse sentido o 
presente livro é uma contribuição à "nova retórica" tratada pioneiramente por 
meu falecido amigo e respeitado colega Chaim Perelman, j u n t o com Lucie 
Olbrechts-Tyteca. Alguns argumentos são genuinamente melhores que outros, 
ainda que seja freqüentemente possível que juizes razoáveis e bastante experien-
tes divirjam quanto à conclusão correta a ser atingida. Nesses casos, decisões 
devem ainda assim ser tomadas, em caráter final mas não infalível, porque não 
é em contrapartida razoável usar métodos como uma votação majoritária para 
resolver uma questão que deve ser resolvida no interesse da justiça e da boa 
ordem. ̂ 
Hido isso tem relação com o Estado de Direito. Respeitar o Estado de Direi-
to é algo de profundo valor político em Estados ou confederações de Estados, 
como a União Européia. Ter leis devidamente publicadas e prospectivas, igualda-
de dos cidadãos diante dessas leis e limitação do poder oficial em respeito a elas 
são os alicerces da liberdade democrática, consistindo em elementos essenciais 
para a estabilidade econômica. T\ido isso não seria possível se as leis e os argu-
mentos a respeito delas tivessem apenas u m simulacro de inteligibilidade. Nesse 
caso, quando chegasse o momento de aplicá-las, qualquer coisa poderia aconte-
cer, por conta da radical indeterminação dos textos legais e da ausência de quais-
quer bases razoáveis para preferir uma interpretação a outra. 
À visão pós-positivista do Direito pressuposta nesta investigação acerca 
dos argumentos jurídicos é dado o nome de "teoria institucional do Direito". 
Uma pequena explicação é necessáría aqui para revelar as premissas acerca do 
caráter do Direito que animam o resto do livro e dão apoio ao estudo da argu-
mentação jurídica aqui oferecido. 
' Scott Veitch questiona a necessidade de alcançar uma decisão final em casos especialmente contro-
versos, e o faz a partir de uma perspectiva liberal específica do Estado de Direito. Esse é um 
questionamento importante, com o qual irei lidar mais adiante neste trabalho. Ver S. Veitcfi, Moral 
Conflict and Legal Reasoning (Oxford: Hart Publishing, 1999), p. 169-71.ELSEVIER C A P Í T U L O 1 — PRÓLOGO: A TEORIA INSTITUCIONAL E A PCRSPCCTIVA DO LEGISLADOR 
1 . TEORIA INSTITUCIONAL 
o Direito é uma ordem normativa institucional. O exemplo mais saliente 
e comumente debatido do Direito, o Direito interno do Estado moderno, tem 
características especiais, e é apropriado ao propósito deste livro focar-se princi-
palmente nessas ou em ou t ras características similares de organizações 
supranacionais duráveis como a União Européia. Mas, neste estágio preliminar, 
uma visão mais geral é apropriada. 
Duas idéias proximamente relacionadas, aquelas de "ordem jurídica" e "sis-
tema jurídico", são essenciais a essa visão mais geral. A ordem jurídica é um 
exemplo de ordem normativa. Ela se estabelece quando a vida em uma determi-
nada sociedade segue seu curso de uma maneira ordenada e com uma razoável 
segurança de expectativas comuns entre as pessoas, sobre as bases de uma ob-
servância razoável das normas de conduta aplicáveis pela maior parte das pessoas. 
Isso pressLipõe uma concepção de Direito como algo até certo ponto sistemático e 
organizado, u m conjunto de normas organizado e sistemático em sua natureza. 
Se as pessoas acreditam e orientam sua conduta de acordo com u m conjunto de 
normas considerado como u m sistema jurídico, essa é uma maneira de atingir 
uma certa medida de ordem e segurança entre elas. Isso é possível mesmo em 
sociedades de larga escala, cuja maior parte dos membros não tem qualquer co-
nhecimento pessoal uns dos outros. É claro que u m sistema jurídico não é uma 
entidade física tangível. É uma construção ideal ou u m objeto mental. Um siste-
ma jurídico pertence ao mundo social real, não a vun mvmdo puro de idéias, na 
medida em que uma ordem legal correspondente exista, ainda que imperfeita-
mente. Afirmar que u m "sistema jurídico" existe em algum lugar é uma forma 
de dar conta da ordem social que é encontrada ali. Um elemento significativo no 
ordenamento à nossa volta pode ser uma "ordem jurídica". Duas condições pre-
cisam ser satisfeitas para que isso possa se dar dessa maneira. 
A primeira é a seguinte: há muitas normas de conduta regulando as ativi-
dades das pessoas, e essas atividades em grande medida se conformam àquilo 
que as normas exigem. Ademais, conformando-se de fato ou não, e não impor-
tando em que medida as pessoas estejam ou não cientes de uma dada norma 
específica, elas estão cientes de que há normas regulando aquilo que elas fazem. 
O que elas fazem é, portanto, legal ou ilegal, ou de uma outra forma juridica-
mente efetivo ou inefetivo. Uma consciência generalizada disso informa muito 
do que as pessoas fazem e, em particular, o modo como elas respondem a e 
fazem julgamentos sobre aquilo que as outras pessoas fazem (e até mesmo sobre 
o que elas mesmas fazem). 
RETÓRICA E O ESTADO DE D I R E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
A segunda condição é esta: todas as numerosas normas de que falamos são 
consideradas como sendo em alguma medida interconectadas umas às outras. 
Todas elas se ajustam formando em alguma medida u m único corpo do "Direito". 
É na articulação desse corpo único que nós utilizamos a idéia de "sistema". "Nós", 
que utilizamos a idéia de sistema, somos todos aqueles envolvidos até certo ponto 
no estudo profissional ou acadêmico do Direito, ou seja, na "ciência jurídica". A 
sistematização do Direito e da compreensão jurídica tem sido uma tarefa contínua 
da ciência jurídica sob muitas formas ao longo de três milênios. 
Não precisamos fingir que exista uma única visão ou versão verdadeira do 
que seja o sistema jurídico; tem havido muitas descrições iluminadoras de um ou 
outro aspecto dessa idéia ou família de idéias. O que é oferecido aqui é um mode-
lo baseado na idéia de ordem normativa institucional. O primeiro elemento nes-
sa idéia lida com a tentativa de garantir a existência de julgamentos imparciais e 
respeitados em casos que envolvam disputa ou controvérsia acerca do significa-
do de uma norma em u m dado contexto prático, ou que envolvam sua aplicação 
justa em u m determinado caso. Esse elemento também lida com situações nas 
quais alguém se nega a se submeter voluntariamente a uma dada sanção ou 
conseqüência jurídica, mesmo que não exista nenhuma dúvida séria quanto ao 
fato de ter havido a violação de uma norma capaz de acarretar aquela sanção ou 
conseqüência jurídica. Aqui também torna-se necessária alguma forma de inter-
venção imparcial de u m terceiro. A simples intervenção de um espectador ou de 
árbitros escolhidos pelas partes pode algumas vezes ser suficiente para suprir 
essas necessidades, mas, nas hipóteses em que ocorre recusa de submissão vo-
luntária, ou quando não há qualquer razão para crer que a submissão voluntária 
poderá ocorrer, algo mais é necessário. É preciso haver, então, algum modo de 
recorrer a uma pessoa ou grupo de pessoas com autoridade reconhecida para 
tomar decisões em casos como esses, sem viés evidente em relação a uma parte 
ou à outra. Essas pessoas têm de ser brindadas com u m status pessoal, ou poder 
suficiente, ou com o apoio daqueles que exerçam u m poder suficiente para tomar 
quaisquer decisões e fazê-las efetivas mesmo contra uma parte recalcitrante, ao 
menos na maior parte dos casos. 
Esse pode, em muitos casos (e não apenas naquele do Estado soberano que 
é senhor de u m território definido), ser o portão de entrada que marca o início de 
certa organização. Esse é o ponto no qual passam a existir critérios sobre: 
• quais indivíduos, com quais qualificações, são competentes para agir 
como julgadores; 
• quais as circunstâncias que os autorizam a exercer essa competência; e 
jL 
ELSEVIER C A P Í T U L O 1 — PRÓLOGO: A TEORIA INSTITUCIONAL E A PCRSPCCTIVA DO LEGISLADOR 
• quais (se é que ajam algumas) as formalidades de tipo processual que 
devem ser observadas para dar início ao processo de julgamento, para 
levá-lo adiante isento de quaisquer vícios e para chegar a uma conclu-
são. Tal conclusão toma a forma de uma decisão ou ordem emitida pela 
autoridade a cargo do julgamento e vinculante em relação àqueles a 
quem ela é endereçada. 
A essa altura, podemos dizer que julgamentos institucionalizados existem 
nesse determinado contexto. Aqueles que podem exercer a tarefa de julgar desse 
modo regulado consistem, coletivamente, em uma instituição dotada de poderes 
judicantes. O exercício apropriado do poder, por meio de procedimentos adequa-
dos e outras condições necessárias, produz decisões válidas (ou "julgamentos"). E 
assim podemos caracterizar a existência de "instituições judicantes", que produ-
zem "julgamentos institucionalizados". 
No modelo em questão, esses elementos são fundamentais à ordem norma-
tiva institucional. Através do portão de entrada mencionado anteriormente, nos 
movemos de uma ordem normativa informal e não institucional para uma ver-
são já institucional de ordem normativa. Uma vez que essa transição seja feita, 
dois problemas surgem quase automaticamente: o problema da identidade e o da 
mudança. O problema da identidade diz respeito à possibilidade de determinar 
em qualquer momento no tempo se u m a norma particular ou disposição 
normativa é relevante e vinculante para os órgãos judicantes institucionais. Pres-
supondo que esses órgãos não sejam considerados competentes para emitir jul-
gamentos com base em simplesmente qualquer coisa, e que sua autoridade tenha 
se constituído no contexto de alguma compreensão ampla do que seja sua esfera 
de atividade e do que seja sua correlata esfera de competência, isso exigirá defini-
ções tanto positivas quanto negativas. Positivamente, o que conta como base 
satisfatória ou razão satisfatória para a decisão? Essas bases incluem normas ou 
disposições normativas de algum tipo? E o que não pode contar como razão 
adequada ou relevante? Quais as normas que, podendo ter sido eventualmente 
invocadas, devem ser excluídas, por serem irrelevantes para esse processo de 
tomada de decisão? 
Nós podemos, de fato, estabelecer comocondição para a efetiva institucio-
nalização que sejam reconhecidos critérios de inclusão e exclusão, ainda que não 
necessariamente exatos e perfeitamente detalhados. H.L.A. Hart sugere para isso 
a útil terminologia de "critérios de reconhecimento",^ distinguindo entre normas 
' Ver H.LA. Hart, The Concept of Law, 2' ed., Oxford: Clarendon Press, 1994, p. 95-6. 
RETÓRICA E O ESTADO DE D I R E I T O — N E I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
reconhecidas e aquelas que não são reconhecidas como de aplicação obrigatória 
por parte dos órgãos judicantes. Estes podem ainda considerar que algumas nor-
mas sejam de aplicação possível, mas não obrigatória. Na medida em que seja-
mos capazes, em relação a uma dada instituição judicante, de especificar esses 
critérios, seremos capazes de imputar uma certa identidade ao corpo de razões 
que podem dar suporte à decisão, incluindo normas e disposições normativas que 
estejam em uso. 
O problema da mudança surge da necessidade sentida pelos seres huma-
nos de ajustar suas expectativas a u m ambiente natural, tecnológico e social em 
mudança. Em alguma medida, as instituições judicantes precisam lidar com isso. 
Por exemplo, na medida em que elas incluem a necessidade de adaptação e mu-
dança entre as razões que são consideradas como relevantes para dar suporte a 
uma decisão. Mas qualquer coisa que redunde em reforma, colocando o processo 
de tomada de decisão, deliberadamente, em um caminho novo em relação àquele 
que tenha prevalecido anteriormente, irá provavelmente exigir u m processo dife-
rente de tomada de decisão e anúncio da mudança. É quase inevitável que o 
anúncio dessa mudança tenha que tomar a forma de algum tipo de norma geral 
que seja aplicada de modo a impedir a utilização de razões anteriormente reco-
nhecidas à solução de u m determinado conflito. Mais uma vez, isso acaba sendo 
institucionalizado e, de novo, isso ocorre por meio do esclarecimento dos critérios 
que estabelecem 
- • quais indivíduos, com quais qualificações, são competentes para atuar 
de modo a alterar as normas em vigor; 
• quais as circunstâncias em que eles são autorizados a exercer essa com-
petência, bem como quais, se é que haja algumas, as formalidades de 
tipo processual que devem ser observadas para que se possa iniciar o 
processo de criação de normas, levá-lo adiante sem vícios e chegar a 
uma conclusão. 
A conclusão, nesse caso, envolve a promulgação de uma norma ou con-
jun to de normas explicitamente destinado a guiar as instituições judicantes e 
também, mais que possivelmente, as pessoas cujas vidas são afetadas pelos ór-
gãos judicantes. 
No modelo explicado até aqui, nada foi dito quanto à separação do pessoal 
encarregado de operar essas instituições. O fato de ser a criação de novas normas uma 
atividade distinta, em princípio, daquela consistente em aplicar as normas exis-
tentes (ou de trabalhar com outros fundamentos reconhecidos de decisão) não 
significa que precise haver pessoas diferentes encarregadas de cada uma dessas 
ELSEVIER CAPÍTUIO 1 — Püóioco: A TfoniA INSI ITUCIONAI t A PERSPECTIVA DO LEGISLADOR 
tarefas. De fato, em muitos contextos não haverá. Mas a diferenciação dessas 
funções torna possível alguma forma de disposição constitucional para a separa-
ção dos poderes envolvidos em órgãos compostos de membros completa ou signi-
ficativamente distintos. O Estado liberal-democrático tal como ele se desenvolveu 
a partir do século XVII tem sido marcado por esforços direcionados a atingir uma 
separação funcional, ainda que não absoluta, de tarefas entre diferentes órgãos 
institucionais. Isso envolve a proibição de que (a maior parte das) pessoas que 
exerçam funções em u m determinado órgão também as exerçam em outro. A 
"separação de poderes" compreendida nesse sentido tem sido, ao menos nos de-
talhes, pensada e posta em prática de maneira diferente em diferentes tradições 
constitucionais, representando partículas distintas em uma tradição mais ampla 
de governo democrático abaixo de u m Estado Constitucional ou Rechtsstaat (Es-
tado de Direito). De uma forma ou e outra, a separação de poderes é u m elemento 
essencial do Estado de Direito. Aqueles que aplicam o Direito, interpretando-o e 
desenvolvendo-o à medida que o fazem, devem ser pessoas distintas em relação 
àquelas que o positivam.'* 
Nós encontramos ordens normativas institucionais que se aproximam desse 
modelo em muitas formas duráveis de atividade social institucionalizada e em 
grupos corporativos e coletivos ou empresas, mas, em um grau particularmente 
alto, as encontramos em Estados nacionais. Para repetir um ponto já menciona-
do, essa não é simplesmente u m a questão abstrata relativa a u m sistema 
normativo concebido como u m puro objeto do pensamento. A idéia de imi siste-
ma como tal oferece uma moldura para entender a vida dentro de um Estado ou 
de uma dada coletividade como sendo algo organizado, ainda que imperfeita-
mente. A conduta dos indivíduos e dos grupos se conforma em alguma medida 
aos padrões estabelecidos naquilo que nós consideramos serem as normas do 
sistema, e as pessoas podem ser avaliadas com vistas àquilo que o sistema con-
sidera serem razões boas ou apropriadas para a ação (e assim por diante). Além 
disso, essa não é apenas uma questão de estabelecer-se uma visão externa sob a 
perspectiva de u m determinado observador. É também uma visão prática do pon-
" A idéia de "Estado de Direito" utilizada aqui e no resto deste livro é explicada de forma mais detida 
no Capítulo 3 (p. 27-48) de N. MacCormick, Questioning Sovereignty: Law, State, and Nation in the 
European Commonwealth (Oxford: Oxford University Press, 1999). Há ainda uma excelente exposi-
ção sobre o "Estado de Direito liberal" em Scott Veitch, Moral Conflict and Legal Reasoning, p. 137-40. 
Esse livro captura bem o conceito, mostrando algumas das dificuldades que ele apresenta para uma 
abordagem satisfatória da argumentação jurídica. Outra tese recente e consistente, ressaltando a 
relevância do Estado de Direito para a autonomia pessoal, está em Sebastian Urbina, Legal Method and 
the Rule of Law (Dordrecht: Kluwer Academic, 2002), p. 225-43. 
RETÓRICA E O ESTADO DE D I R E I T O — NE I L M A C C O R M I C K ELSEVIER 
to de vista do participante. Os membros de determinados grupos podem dirigir 
sua própria conduta com vistas (mas não necessariamente de modo absoluto ou 
irrestrito) àquilo que eles compreendem ser as normas do sistema. Ao concebe-
rem expectativas acerca das condutas dos outros, eles podem, de u m modo mais 
ou menos consciente, presumir que esses outros irão dirigir seus comportamen-
tos de forma similar a partir daquilo que se entende serem as normas aplicáveis 
a esses comportamentos. Portanto, a compreensão da existência de um sistema 
normativo e a compreensão do fato de que os outros vêem esse sistema normativo 
de modo semelhante e dão a tal sistema semelhante consideração prática contribui 
para, ou mesmo constitui, um certo ordenamento na conduta. Os participantes 
ostentam entre si uma ordem comum ou compartilhada. Eles fazem isso ao 
demonstrar consideração por uma concepção do sistema como algo dotado de 
força normativa para eles. Isso é significativo (mas não esgota completamente 
nem é u m determinante absoluto) entre as razões para a ação que eles elegem, e 
também para os modos de agir que eles consideram como sendo razoáveis. 
Algumas vezes, uma distinção entre uma abordagem "institucional" e ou-
tra "interpretatíva" é estabelecida.^ Esse tipo de distinção não é apropriado às idéi-
as expostas aqui. A idéia de ordem institucional (assim como a idéia relacionada a 
essa de fatos institucionais) depende de como os seres humanos agem e interpre-
tam as suas próprias ações e também as ações dos outros. Uma ordem institucional 
eqüivale a uma moldura comum de compreensão e interpretação compartilhada 
entre pessoas de u m mesmo contexto social. Como uma ordem normativa, ela tem 
contínua necessidade de interpretação e, como uma

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