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PORTUGUÊS FORENSE

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PORTUGUÊS 
FORENSE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
3 
 
 
SUMÁRIO 
 
1) LÍNGUA, VARIAÇÃO E PRECONCEITO LINGUÍSTICO ................................................. 11 
1Linguagem .................................................................................................................................. 12 
2Língua ......................................................................................................................................... 12 
3Sistema ........................................................................................................................................ 15 
4Norma .......................................................................................................................................... 16 
5Português brasileiro ................................................................................................................... 18 
6Variedades linguísticas .............................................................................................................. 20 
6.1Padrão vs. não padrão ........................................................................................................ 20 
6.2Variedades sociais ............................................................................................................... 21 
6.3Classificação das variedades .............................................................................................. 26 
7 Preconceito e intolerância linguística ...................................................................................... 37 
Exercícios ...................................................................................................................................... 40 
2) COMO A LINGUAGEM FUNCIONA ..................................................................................... 45 
1Análise do discurso..................................................................................................................... 46 
2O estudo da linguagem .............................................................................................................. 46 
3O discurso ................................................................................................................................... 49 
4Condições de produção .............................................................................................................. 49 
5Paráfrase e polissemia ............................................................................................................... 51 
6Formação discursiva .................................................................................................................. 52 
7Ideologia do sujeito .................................................................................................................... 55 
8Incompletude e ruptura ............................................................................................................. 55 
9O dito e o não dito ...................................................................................................................... 57 
10Tipos de discurso ...................................................................................................................... 57 
Exercícios ...................................................................................................................................... 62 
3) ESTUDOS DAS PALAVRAS: O SENTIDO NA LINGUAGEM JURÍDICA ...................... 67 
1Polissemia .................................................................................................................................... 68 
2Estudo do léxico .......................................................................................................................... 69 
2.1Sinonímia.............................................................................................................................. 69 
2.2Antonímia ............................................................................................................................. 71 
2.3Hiperonímia/hiponímia........................................................................................................ 72 
2.4Meronímia ............................................................................................................................ 72 
2.5Associação semântica........................................................................................................... 72 
3Homonímia ................................................................................................................................. 76 
4 
 
3.1Homofonia ............................................................................................................................ 76 
3.2Algumas considerações ........................................................................................................ 76 
4Denotação e conotação ............................................................................................................... 77 
5A função de coesão e coerência textual do vocabulário .......................................................... 78 
6Competência lexical ................................................................................................................... 84 
7Semântica e pragmática ............................................................................................................. 86 
7.1Processos de formação de palavras ..................................................................................... 89 
Exercícios ...................................................................................................................................... 98 
4) COESÃO TEXTUAL ................................................................................................................ 101 
1Introdução................................................................................................................................. 102 
2Mecanismos de coesão textual ................................................................................................. 104 
2.1Coesão referencial .............................................................................................................. 105 
2.2Coesão sequencial e recorrencial ....................................................................................... 109 
2.3Sequenciação parafrástica .................................................................................................. 109 
2.4Sequenciação frástica ......................................................................................................... 110 
Exercícios .................................................................................................................................... 113 
5) COERÊNCIA TEXTUAL......................................................................................................... 117 
1Necessidade de coerência ......................................................................................................... 118 
2Condições para a existência de um texto ............................................................................... 121 
3Competência textual ................................................................................................................ 122 
4Saber partilhado ....................................................................................................................... 124 
5Boa formação e continuidade de sentido................................................................................ 126 
Exercícios .................................................................................................................................... 131 
1Conceito de texto ......................................................................................................................136 
2Percurso gerativo do sentido ................................................................................................... 136 
3Nível figurativo ......................................................................................................................... 136 
3.1Isotopia................................................................................................................................ 137 
3.2Motivo ................................................................................................................................. 137 
4Esquema narrativo canônico ................................................................................................... 137 
5Actantes (unidade sintáxica de base da gramática narrativa) ............................................. 138 
6Categorias ................................................................................................................................. 139 
Exercícios .................................................................................................................................... 143 
7) ARGUMENTAÇÃO .................................................................................................................. 147 
1Introdução................................................................................................................................. 148 
2Expedientes da argumentação ................................................................................................ 148 
3Implícitos................................................................................................................................... 151 
5 
 
3.1Pressupostos........................................................................................................................ 151 
3.2Subentendido ....................................................................................................................... 153 
4Tipos de argumento ................................................................................................................. 154 
5Mecanismos de argumentação ................................................................................................ 156 
6Estilo .......................................................................................................................................... 157 
7Teorias da linguagem ............................................................................................................... 158 
8Pragmática ................................................................................................................................ 159 
9Procedimentos de persuasão: a argumentação ..................................................................... 160 
10Relações instauradas entre enunciação e enunciado .......................................................... 162 
11Temporalização e espacialização .......................................................................................... 164 
12Relações entre enunciador e enunciatário ........................................................................... 165 
Exercícios .................................................................................................................................... 168 
8) ENUNCIAÇÃO, DIALOGISMO, POLOFONIA E INTERTEXTUALIDADE ................. 171 
1Enunciação: conceito ............................................................................................................... 172 
2Enunciação, enunciado e enunciação enunciada ................................................................... 172 
3Enuncividade ............................................................................................................................ 173 
4Tempo ........................................................................................................................................ 174 
4.1Tempos enunciativos .......................................................................................................... 175 
5Espaço ....................................................................................................................................... 176 
6Debreagem e embreagem ........................................................................................................ 177 
7Os estudos de Bakhtin.............................................................................................................. 177 
8Dialogismo................................................................................................................................. 178 
9Polifonia .................................................................................................................................... 179 
10Polifonia textual e discursiva ................................................................................................ 179 
11Intertextualidade .................................................................................................................... 180 
11.1Citação .............................................................................................................................. 181 
11.2Alusão ............................................................................................................................... 181 
11.3Estilização ......................................................................................................................... 181 
12Interdiscursividade ................................................................................................................ 181 
12.1Citação .............................................................................................................................. 181 
12.2Alusão ............................................................................................................................... 182 
13Paródia .................................................................................................................................... 182 
13.1Diálogo intertextual ......................................................................................................... 182 
14Leitura polifônica ................................................................................................................... 185 
15Carnavalização ....................................................................................................................... 186 
15.1Signo como arena de classes............................................................................................ 186 
6 
 
Exercícios .................................................................................................................................... 186 
9) IDEOLOGIA .............................................................................................................................. 189 
1Sistema × discurso .................................................................................................................... 190 
2Discurso: a autonomia e a determinação ............................................................................... 190 
3Temas e figuras......................................................................................................................... 192 
4Formações discursivas ............................................................................................................. 194 
5Texto e discurso ........................................................................................................................ 195 
Exercícios .................................................................................................................................... 196 
10) O TEXTO E SUAS PROPRIEDADES .................................................................................. 201 
1Conceito de texto ......................................................................................................................202 
2Unidade ..................................................................................................................................... 203 
3Contextualização ...................................................................................................................... 203 
4Referência e tematização ......................................................................................................... 204 
5Coerência .................................................................................................................................. 205 
6Competência textual ................................................................................................................ 205 
Exercícios .................................................................................................................................... 206 
11) ESTILÍSTICA .......................................................................................................................... 209 
1Importância da estilística para o advogado ........................................................................... 210 
2Seleção e combinação ............................................................................................................... 210 
3Estilo de escrita e pensamento: coordenação e/ou subordinação? ...................................... 211 
4Colocação dos termos............................................................................................................... 212 
5Tonalidade emotiva das palavras ........................................................................................... 213 
5.1Palavras de significado afetivo ........................................................................................... 213 
5.2Palavras que exprimem julgamento .................................................................................... 213 
5.3Avaliação ............................................................................................................................ 214 
6Figuração e tematização .......................................................................................................... 214 
6.1Linguagem figurada ............................................................................................................ 214 
Exercícios .................................................................................................................................... 220 
12) GÊNEROS TEXTUAIS FORENSES E SEQUENCIAS TEXTUAIS ................................ 223 
1Conceito de gêneros textuais ................................................................................................... 224 
1.1A perspectiva bakhtiniana.................................................................................................. 225 
1.2Perspectiva de Bazerman, Corolyn Miller, Marcuschi ..................................................... 229 
1.3Leitura e redação de gêneros ............................................................................................. 233 
2Tipos textuais ............................................................................................................................ 234 
2.1Sequência textual narrativa ............................................................................................... 237 
2.2Sequência textual descritiva .............................................................................................. 237 
7 
 
2.3Sequência textual argumentativa ...................................................................................... 240 
2.4Sequência textual expositiva/explicativa ........................................................................... 242 
2.5Sequência textual injuntiva ............................................................................................... 244 
2.6Sequência textual dialogal ................................................................................................. 244 
3Funções da linguagem .............................................................................................................. 245 
4Procuração ................................................................................................................................ 249 
4.1Substabelecimento .............................................................................................................. 255 
5Requerimento e petição ........................................................................................................... 256 
Exercícios .................................................................................................................................... 262 
13) LEITURA ................................................................................................................................. 263 
1Noção de texto: o primeiro passo para a leitura ................................................................... 264 
2As vozes de um texto: o segundo passo para a leitura .......................................................... 266 
3Leitura: inúmeras possibilidades ............................................................................................ 266 
4Leitura: texto dissertativo ....................................................................................................... 267 
5Divisão de um texto .................................................................................................................. 267 
5.1Divisão com base na oposição temporal ............................................................................ 267 
5.2Divisão com base na oposição espacial ............................................................................. 268 
5.3Divisão com base na oposição entre os vários personagens .............................................. 269 
5.4Divisão com base em oposições temáticas ......................................................................... 269 
5.5Leitura: alguns recadinhos para se tornar possível ........................................................... 269 
6Cálculo do sentido .................................................................................................................... 271 
Exercícios .................................................................................................................................... 275 
7Leitura passionalizada do texto jurídico: o réu como vítima de julgamentos injustos ..... 276 
14) TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO (TCC) .......................................................... 299 
1Introdução................................................................................................................................. 300 
2Iniciação científica.................................................................................................................... 300 
3Pesquisa científica .................................................................................................................... 300 
4Paradigmas científicos: métodos............................................................................................. 301 
5Revisão da literatura ................................................................................................................ 302 
6Redação do TCC ...................................................................................................................... 303 
7Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) ............................................................. 303 
8Passos......................................................................................................................................... 304 
9Importância da comunicação científica ................................................................................. 304 
10Estrutura do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) ...................................................... 305 
10.1Introdução .........................................................................................................................306 
10.2Desenvolvimento ............................................................................................................... 311 
8 
 
10.3Conclusão.......................................................................................................................... 311 
10.4Bibliografia (referências) ................................................................................................. 311 
10.5Anexos e apêndices ........................................................................................................... 311 
11Plano de trabalho escrito ....................................................................................................... 311 
12Articuladores textuais ............................................................................................................ 312 
12.1Articuladores de conteúdo proposicional ......................................................................... 312 
12.2Articuladores enunciativos ou discursivo-argumentativos ............................................... 312 
12.3Articuladores metaenunciativos ........................................................................................ 313 
Exercícios .................................................................................................................................... 313 
15) ASPECTOS FORMAIS DO TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO (TCC) ......... 317 
1Introdução................................................................................................................................. 318 
2Normas da ABNT para a elaboração de trabalhos acadêmicos: a NBR 14724:2011 ........ 318 
3Citações diretas e indiretas: a NBR 10520:2002 ................................................................... 323 
3.1Regras gerais ...................................................................................................................... 323 
4Normas para a elaboração de referências bibliográficas: a NBR 6023:2002 ..................... 333 
Exercícios .................................................................................................................................... 343 
16) APRESENTAÇÃO GRÁFICA DO TCC .............................................................................. 345 
1Parte pré-textual ...................................................................................................................... 346 
1.1Capa .................................................................................................................................... 346 
1.2Lombada.............................................................................................................................. 347 
1.3Folha de rosto ..................................................................................................................... 348 
1.4Verso da folha de rosto ....................................................................................................... 349 
1.5Errata .................................................................................................................................. 350 
1.6Folha de aprovação ............................................................................................................ 350 
1.7Dedicatória ......................................................................................................................... 351 
1.8Agradecimento .................................................................................................................... 352 
1.9Inscrição e epígrafe ............................................................................................................ 353 
1.10Resumo .............................................................................................................................. 354 
1.11Lista de ilustrações e outras ............................................................................................. 355 
1.12Sumário ............................................................................................................................. 356 
2Parte textual.............................................................................................................................. 356 
2.1Introdução ........................................................................................................................... 356 
2.2Desenvolvimento ................................................................................................................. 357 
2.3Conclusão do TCC .............................................................................................................. 357 
3Parte pós-textual do TCC ........................................................................................................ 357 
3.1Referências .......................................................................................................................... 357 
9 
 
3.2Apêndice e anexo ................................................................................................................ 357 
3.3Índices ................................................................................................................................. 358 
4Assuntos complementares ....................................................................................................... 358 
4.1Títulos e seções ................................................................................................................... 358 
4.2Tipos e corpos: itálico, bold (negrito), sublinha, letras maiúsculas .................................. 361 
4.3Numeração das folhas do TCC ........................................................................................... 361 
4.4Parágrafo ............................................................................................................................ 361 
4.5Considerações finais sobre a apresentação do TCC .......................................................... 362 
Exercícios .................................................................................................................................... 362 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
10 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
11 
 
 
 
 
1) LÍNGUA, 
VARIAÇÃO E 
PRECONCEITO 
LINGUÍSTICO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
12 
 
1Linguagem 
Entre as expressões linguísticas utilizadas normalmente que merecem cuidado com relação ao 
conceito, destacam-se: linguagem, sistema, língua, norma, variação, variedades, língua escrita, 
língua oral. 
Em primeiro lugar, LINGUAGEM é um sistema de signos utilizados para estabelecer uma 
comunicação. A linguagem humana seria de todos os sistemas de signos o mais complexo. Seu 
aparecimento e desenvolvimento devem-se à necessidade de comunicação dos seres humanos. Fruto 
de aprendizagem social e reflexo da cultura de uma comunidade, o domínio da linguagem é relevante 
na inserção do indivíduo na sociedade. 
Para Dubois (1988, p. 387), 
linguagem é a capacidade específica à espécie humana de comunicar por meio de um sistema 
de signos vocais, que coloca em jogo uma técnica corporal complexa e supõe a existência de 
uma função simbólica. 
A LINGUAGEM VERBAL é uma faculdade que o homem utiliza para exprimir seus estados 
mentais por meio de um sistema de sons vocais denominado língua. Esse sistema organiza os signos 
e estabelece regras para seu uso. Assim, pode-se afirmar que qualquer tipo de linguagem desenvolve-
se com base no uso de um sistema ou código de comunicação, a língua. A LINGUAGEM é uma 
característica humana universal, enquanto a LÍNGUA é a linguagem particular de uma comunidade, 
um grupo, um povo. 
Embora a linguagem verbal seja a mais importante de que se utiliza o homem, a não verbal é 
largamente utilizada e não destituída de relevância, como gestos, postura,cores, vestuário. 
As LINGUAGENS NÃO VERBAIS oferecem maior dificuldade de interpretação, visto que seus 
significados não são universais. Por exemplo, um gesto como balançar a cabeça pode ter significados 
diferentes, conforme o lugar em que é feito; a figa, que no Brasil significa desejo de boa sorte, é 
entendida na Holanda e na Tunísia como um gesto de conotação fálica. 
2Língua 
LÍNGUA: considerando a língua em sua imanência, ela foi estudada particularmente no passado 
em sua realidade estrutural. Entendia-se, sob a variação constitutiva de uma língua, que havia uma 
unidade sistêmica. Como a linguística estrutural nasceu em solo europeu, ela reproduziu a concepção 
de língua que aí existia, em que se identificava a língua com a norma-padrão. Faraco (2008, p. 33) 
afirma que a língua tornou-se “assunto de Estado nos países europeus, que, como parte do processo 
de centralização característico daquela conjuntura histórica, desenvolveram políticas linguísticas 
homogeneizantes em seus territórios”. Daí advém a dificuldade da linguística em admitir em seus 
modelos teóricos a heterogeneidade que é característica de qualquer língua. Assim, enquanto a 
linguística segue o pressuposto teórico de língua homogênea, a outras disciplinas cabe o estudo da 
heterogeneidade, como a dialetologia, a sociolinguística, a linguística histórica. 
Saussure, com sua divisão entre langue e parole, entendia que língua é um sistema social 
uniforme que se materializa em usos individuais. Essa concepção sistêmica mostrou-se produtiva nos 
estudos fonológicos, mas insuficiente para a explicação da variabilidade linguística supraindividual. 
Caracteriza-se a FALA, na concepção de Saussure, como a atualização da língua pelo indivíduo. 
O uso individual é resultado da necessidade de comunicação. Em virtude de sua realização oral 
ocorrer sobretudo em situações informais em que normalmente não se pratica a norma-padrão (a 
língua modelar, abstrata), a LÍNGUA FALADA é mais dinâmica que a ESCRITA. A ausência de 
censura favorece o surgimento de uma variedade rica em possibilidades expressivas. 
13 
 
A FALA é anterior à escrita, mas, ao longo dos tempos, tem sido relegada a uma condição de 
inferioridade por causa das circunstâncias modernas em que informações e documentos escritos 
constituem o mundo das relações humanas e de produção. 
As alterações que ocorrem na fala podem vir a tornar-se uso, desde que sejam experimentadas por 
um grupo de indivíduos. Ensina Saussure (1977, p. 196) que “nada entra na língua sem ter sido antes 
experimentado na fala, e todos os fenômenos evolutivos têm sua raiz na esfera do indivíduo”. 
Segundo o pensamento saussuriano, as características diferenciadoras entre LÍNGUA e FALA 
são: a língua é sistemática, tem certa regularidade, é potencial, coletiva; a fala é assistemática, nela 
se observa certa variedade, é concreta, real, individual. 
Para Oliveira (2011, p. 32), a forma como se vê a língua determina a maneira de ensinar português. 
Algumas teorias polarizam as discussões desde a segunda metade do século XX: a concepção 
estruturalista, representada por Ferdinand de Saussure, Leonard Bloomfield, Charles Fries, Noam 
Chomsky O estruturalismo entende que “a língua é um sistema formado por estruturas gramaticais 
inter-relacionadas”. Esse conceito de língua é problemático porque exclui o uso linguístico, o sujeito 
usuário da língua e as variações linguísticas que sujeitos diferentes produzem. 
Saussure não tratou da fala em sua pesquisa linguística porque entendia que a parte social e 
homogênea da língua seria o elemento que daria cientificidade à linguística. Chomsky, por sua vez, 
ocupou-se de dois conceitos: o de competência (conhecimento que o falante possui de sua língua) e 
o de desempenho (uso efetivo da língua). Também excluiu de sua pesquisa o desempenho, por 
entender que o uso da língua, que conta com a influência de fatores psicológicos e físicos, como 
cansaço, irritação, sono, não reflete sua competência. Fundamentou sua pesquisa em um falante ideal 
que vive em uma comunidade linguística homogênea. 
Saussure compreendia a língua como um código e um sistema de signos, o que o levava a 
interessar-se apenas pelo sistema e pela forma, e não por sua realização na fala nem por seu 
funcionamento em textos. 
A visão funcionalista da linguagem tem como representantes: Nikolai Trubetzkoy, Robman 
Jakobson, John Firth, Halliday, autores que se ocuparam sobretudo com aspectos funcionais, 
situacionais, contextuais e comunicacionais no uso da língua, e não apenas com o sistema. 
A concepção de língua sociointeracionista ou interacionista entende a língua como meio de 
interação sociocultural e compreende elementos como: sujeito que fala ou escreve, sujeito que ouve 
ou lê, especificidades culturais desses sujeitos, contexto de produção e recepção do texto, elementos 
que não fazem parte do conceito estruturalista de língua. 
Segundo a concepção pragmática, não bastam conhecimentos estruturais da língua, regras 
gramaticais, para o uso competente da língua. Dell Hymes seria o autor do conceito de competência 
comunicativa, 
segundo o qual o falante-ouvinte, para ser competente em sua língua, precisa não apenas ter 
conhecimento das regras gramaticais, mas também a habilidade de usar essas regras, 
adequando-as às situações sociais em que se encontra no momento em que usa a 
língua (OLIVEIRA, 2011, p. 35). 
Para Marcuschi (2011, p. 19 s), o contexto atual dos estudos de linguística enunciativa vê a “língua 
como um conjunto de práticas enunciativas e não como forma descarnada”. Toda e qualquer 
enunciação humana é organizada fora do indivíduo, é sempre um ato social. A substância constitutiva 
da língua não é um sistema abstrato de formas linguísticas, nem uma enunciação individual isolada, 
mas um fenômeno social de interação verbal realizado por meio de enunciações, em que a realidade 
da língua se manifesta na interação verbal. Marcuschi chama ainda a atenção para o que afirmam 
Bakhtin e Voloshinov, em Marxismo e filosofia da linguagem (1997, p. 124): 
A língua vive e evolui historicamente na comunicação verbal concreta, não no sistema 
linguístico abstrato das formas da língua nem no psiquismo individual dos falantes. 
14 
 
Bakhtin entende que fala (os enunciados) não é ato individual, mas sempre um ato social. Se fosse 
individual, a compreensão seria impossível. 
A noção de dialogismo seria o princípio fundador da linguagem, visto que todo enunciado é um 
enunciado de alguém para outra pessoa. E conclui Marcuschi à página 21: pensar a língua como 
interação “retira a reflexão sobre a língua do campo da estrutura para situá-la no campo do discurso 
em seu contexto sociointerativo”. Essa concepção de linguagem como atividade social e interativa 
tem consequências relevantes para a visão do texto como unidade de interação, para entender a 
compreensão como atividade de construção do sentido promovida por um eu situado em relação com 
um tu igualmente situado, ambos mediados pela noção de gênero textual (ver Capítulo 12), que é 
uma forma de ação social. Não é, pois, a língua uma entidade linguística apenas formalmente 
constituída. 
Essa concepção, no entanto, não nos deve levar a entender a linguagem como resultado de 
determinismos externos, assim como não é estrutura tão somente: ela é vista pelos interacionistas 
como forma de ação. Daí Marcuschi (2011, p. 22) afirmar que o uso e o funcionamento da linguagem 
dão-se “em textos e discursos produzidos e recebidos em situações enunciativas ligadas a domínios 
discursivos da vida cotidiana e realizados em gêneros que circulam na sociedade”. E, adiante, 
enfatiza: “não existe um uso significativo da língua fora das inter-relações pessoais e sociais 
situadas”. Assim, o uso autêntico da língua ocorre em textos realizados por sujeitos históricos e 
sociais “de carne e osso”, que apresentam alguma relação entre si e tenham algum umobjetivo 
comum. 
Outros estudiosos que introduziram o uso em suas pesquisas linguísticas foram: William Labov, 
que se ocupou da sociolinguística, John Austin e John Searle, que se dedicaram aos atos de fala, 
Robert-Alain de Beaugrande e Wolfang Dressler, que contribuíram decisivamente para os estudos da 
produção textual e da leitura como atividades de interação sociocultural. 
Koch (2002, p. 14) entende que à concepção de língua como estrutura “corresponde a de sujeito 
determinado, assujeitado pelo sistema, caracterizado por uma espécie de ‘não consciência’”. 
Em relação ao sujeito, teríamos de considerar as seguintes posições: 
1. Predomínio da consciência individual no uso da língua. Nesse caso, o sujeito da enunciação é 
responsável pela produção dos efeitos de sentido dos enunciados. A língua seria um código à 
disposição do indivíduo, que o utiliza como se não fosse um ente histórico. É o sujeito dono de suas 
palavras. A interpretação de seu texto implicaria tão somente descobrir suas intenções. Koch (2002, 
p. 14) afirma: “Compreender um enunciado constitui, pois, um evento mental que se realiza quando 
o ouvinte deriva do enunciado o pensamento que o falante pretendia veicular”. Para essa concepção 
de língua, há predomínio da consciência individual no uso da língua. 
2. A segunda posição de sujeito é de assujeitamento e, nesse caso, o indivíduo não é senhor de 
seu discurso nem de sua vontade. Aquele que fala é um sujeito anônimo, social; o locutor dependeria 
desse sujeito social, seria um repetidor dele, mas teria a ilusão de que seus enunciados são originais 
e de que é livre para fazer e dizer o que deseja. Todavia, só diz o que lhe é permitido dizer na posição 
em que está, pois está inserido em uma instituição e em uma ideologia; ele seria apenas um porta-voz 
dessa outra voz. Há sempre um discurso anterior que fala por meio do indivíduo. O sentido de um 
enunciado depende da formação discursiva a que pertence, entendendo-se por formação discursiva o 
que, em uma formação ideológica dada, determina o que pode e o que deve ser dito. Nesse caso, não 
se admite que um sujeito psicológico seja responsável pelos enunciados, pois o sujeito do enunciado 
não controla o sentido do que diz. Possenti, citado por Koch (p. 15), não aceita essa tese in totum, 
visto que, “para que o sujeito possa ser concebido como algo mais que um lugar por onde o discurso 
passa, vindo das estruturas, é necessário fazer a hipótese mínima de que ele age [...]. Para a 
compreensão de textos, são necessários, além do conhecimento linguístico, conhecimentos, 
experiências etc. que são classicamente analisados relativamente a sujeitos psicológicos, e não a 
posições e vetores. Penso que a Análise do Discurso ganharia se propusesse uma teoria psicológica, 
na qual o sujeito fosse ‘clivado pelo inconsciente’, mas não fosse reduzido a uma peça que apenas 
sofre efeitos”. 
https://jigsaw.minhabiblioteca.com.br/books/9788597017489/epub/OEBPS/Text/chapter12.html
15 
 
3. Uma terceira posição do sujeito advém da concepção de língua como lugar de interação. E esta 
vê o sujeito como ativo, participante; um sujeito social, histórica e ideologicamente situado, que se 
constitui na interação com o outro. 
Essa concepção de língua é fundamental para o conceito de texto e de sentido. Se a língua é vista 
como representação do pensamento e o sujeito é senhor absoluto de suas ações e de seu dizer, o texto 
é meramente um produto do pensamento do autor. Ao leitor ou ouvinte não cabe senão captar essa 
representação mental, bem como as intenções do autor. A ele caberia apenas um papel passivo. Se 
vejo a língua como instrumento de comunicação, como código, e o sujeito é determinado pelo 
sistema, o texto falado ou escrito é resultado da codificação que implicará um leitor ou ouvinte que o 
decodificará. Basta-lhe possuir a chave do código, o conhecimento do código, para ter acesso ao 
sentido. Portanto, um papel de interlocutor que também se revela passivo. Finalmente, na concepção 
interacionista da língua, ou dialógica, locutor e interlocutor são vistos como sujeitos, responsáveis 
pela produção do sentido. Afirma Koch (2002, p. 17): 
Os sujeitos são vistos como atores/construtores sociais, o texto passa a ser considerado o 
próprio lugar da interação e os interlocutores, como sujeitos ativos que – dialogicamente – 
nele se constroem e são construídos. 
Essa concepção de língua, de texto e de sujeito rejeita o entendimento de que a compreensão é 
simples decodificação de uma mensagem codificada por um emissor. A compreensão é uma atividade 
interativa complexa, realizada com base em elementos linguísticos da superfície do texto, mas que 
implica a mobilização de um conjunto amplo de saberes (conhecimento de mundo, conhecimento 
enciclopédico). 
3Sistema 
SISTEMA é uma organização que rege a estrutura de uma língua. Para Dubois (1988, p. 560), 
sistema é um conjunto de termos estreitamente correlacionados entre si no interior do sistema 
geral da língua. Fala-se, assim, do sistema do número no português (singular vs. plural), do 
sistema fonológico, do sistema vocálico etc. 
Bechara (2015, p. 44) opõe sistema e norma usual (uso): 
O sistema contém apenas as oposições funcionais, isto é, contém unicamente os traços distintivos 
necessários e indispensáveis para que uma unidade da língua (quer no plano da expressão, quer no 
plano do conteúdo) não se confunda com outra unidade. 
Assim, no sistema dos relativos em português, que e o qual se opõem ambos a quem e cujo, por 
exemplo; mas a norma usual da língua prefere unicamente o qual, e não que, depois de preposição 
com mais de duas sílabas: 
Os caminhos de que (dos quais) lhe falei... 
Mas: 
As razões segundo as quais (e não segundo que). 
Outros exemplos incluem o sistema verbal português que utiliza o morfema -o para marcar a 
primeira pessoa do singular do presente do indicativo: canto, vendo, parto, e utiliza também o sufixo -
ção para formar substantivos geralmente denotadores de ação, oriundos de verbos: povoar – 
povoação, alegar – alegação. A norma, no entanto, prefere casamento, tratamento. 
No domínio da sintaxe, Bechara (2015, p. 45) apresenta exemplo que comprova a diferença entre 
sistema e norma: 
16 
 
Os chamados complementos verbais quando constituídos por substantivos normalmente se 
dispõem na ordem direto + indireto (Dei um livro ao primo), mas quando aparece, numa 
dessas funções ou nas duas, pronome pessoal, a norma é vir primeiro o indireto: (Dei-lhe um 
livro)/Dei-lho (lhe + o). 
Na fala prestigiada, hoje se diz: dei um livro para ele. 
E conclui o gramático citado que o domínio da norma é muito complexo “e exige do falante uma 
aprendizagem por toda a vida”. 
4Norma 
Enquanto a oposição língua/fala é de Saussure (1977), o conceito tripartite de 
SISTEMA/NORMA/FALA é de Coseriu (1979). Para este último autor, o falante, ao utilizar a língua 
(sistema) e sua fala, seleciona modelos de enunciação que são retirados da norma. Entende Faraco 
(2009, p. 34) que, sob o olhar estruturalista sussuriano, a norma pode ser vista como “cada um dos 
diferentes modos de realizar os grandes esquemas de relações do sistema”. Assim, cada norma se 
organiza dentro das possibilidades que lhe permite o sistema, e cada uma dessas organizações se apoia 
no uso corrente de um grupo de falantes socialmente definido. Dessa forma, ainda segundo Coseriu, 
uma norma não indica o que se pode dizer, que é tarefa do sistema, mas o que tradicionalmente se diz 
na comunidade. 
A NORMA varia segundo a influência do tempo, espaço geográfico, classe social ou profissional, 
nível cultural do falante. A diversidade de normas, visto que há tantas quantos os indivíduos, não 
afeta a unidade da língua, que contém a soma de todas as normas (isso na concepção tradicional da 
existência de língua homogênea). Por isso, Camara Jr. (1975, p. 9) afirma que a língua é uma unidade, 
uma estruturaideal, que apresenta “os traços básicos comuns a todas as suas variedades”. 
Segundo Bechara (2015, p. 44), a norma 
contém tudo o que na língua não é funcional, mas que é tradicional, comum e constante, ou, 
em outras palavras, tudo o que se diz “assim, e não de outra maneira”. É o plano de 
estruturação do saber idiomático que está mais próximo das realizações concretas. O sistema 
e a norma de uma língua funcional refletem a sua estrutura. 
Mattoso Camara Jr., em Dicionário de linguística e gramática (1978a, p. 177), afirma que norma 
é “conjunto de hábitos linguísticos vigentes no lugar ou na classe social mais prestigiosa do país”. 
Faraco (2009, p. 35) não vê na norma essa restrição de Mattoso Camara, uma vez que entende 
norma como determinado conjunto de fenômenos linguísticos (fonológicos, morfológicos, 
sintáticos e lexicais) que são correntes, costumeiros, habituais numa dada [observe que não 
diz “na classe social mais prestigiosa do país”] comunidade de fala. Norma nesse sentido se 
identifica com normalidade, ou seja, com o que é corriqueiro, usual, habitual, recorrente 
(“normal”) numa certa comunidade de fala [destaque nosso]. 
Em nota de rodapé da p. 35, Faraco chama a atenção para o fato de que uma norma não comporta 
tão somente fenômenos fixos, mas também fenômenos em variação. E, adiante, à página 37, 
complementa seu argumento, afirmando que uma comunidade linguística é formada por um conjunto 
de normas: “cada comunidade linguística tem várias normas (e não apenas uma)”. E exemplifica: tia, 
dia conhecem em algumas comunidades brasileiras a pronúncia africada (tchia, djia); em outras, a 
pronúncia não africada. 
Uma norma convive ao lado de outra sem nenhum problema, como é o caso do uso do pronome 
pessoal tu que é normalmente usado no Brasil com o verbo sem s: tu vai, tu pode. Em situações mais 
monitoradas, no entanto, podemos ouvir: tu vais, tu podes. Da mesma forma, temos comumente a 
17 
 
mistura de você com teu, em algumas situações (“você não viu a mancha na tua blusa?”; em situações 
mais monitoradas podemos encontrar: “você não viu a mancha na sua blusa?”. Outro exemplo 
comum no Brasil é o uso de ter no sentido existencial: “não tem problema”, “não tem ninguém na 
sala”; em situações mais monitoradas (muitíssimo raramente), poderíamos ter: “não há problema”, 
“não há ninguém na sala”. O uso de ter nessas situações é generalizado de Norte a Sul, sem distinção 
de categoria social, da mesma forma como já faz parte de nosso cotidiano o uso de pega ele, veja ele, 
sem distinção de classe social. É comum no Jornal Nacional ouvirmos esse tipo de construção. O uso 
de a gente no lugar de nós também já está generalizado de Norte a Sul: “a gente pode sair da sala?”, 
mas também se ouve: “nós podemos sair da sala?”. Outra variação comum em nosso meio é a 
substituição do futuro do presente por dois verbos: “você vai estar presente na reunião amanhã?” 
(forma mais corriqueira que “você estará presente na reunião amanhã?”). 
Enfim, paulatinamente a variedade da fala prestigiada vai provocando mudança no uso de uma 
norma anterior. Faraco (2009, p. 41) chama a atenção para o fato de que, qualquer que seja a norma, 
ela não se constitui apenas de um conjunto de formas linguísticas; ela é também “um agregado de 
valores socioculturais articulados com aquelas formas”. Verifique-se, por exemplo, que as normas 
que organizam as variedades estigmatizadas na sociedade brasileira são vistas como “introdutoras de 
erros linguísticos” e os falantes dessas variedades são considerados ignorantes. E, como se trata de 
valores, há formas que são consideradas mais erradas que outras. Quando os mais escolarizados e os 
que gozam de status social prestigiado usam determinadas formas, elas não são estigmatizadas; 
quando não usam, as formas usadas pelos menos escolarizados e colocados à margem da sociedade 
são vistas como erradas. 
Norma é, pois, um conjunto de regras que regulam as relações linguísticas. A norma sofre afrontas 
ou é contrariada devido a vários fatores: alterações devidas às classes sociais diferentes, alterações 
devidas aos vários indivíduos que utilizam a língua. 
Resumindo, norma designa os fatos de língua usuais, correntes, em uma comunidade de fala. Ela 
designa os fatos linguísticos que caracterizam a fala de pessoas de uma comunidade, incluindo os 
fenômenos em variação. 
A norma pode ser coletiva ou individual. Com base no sistema coletivo, o usuário procura fazer 
uma adaptação individual. A norma social considera o que é comum a uma comunidade (língua) e o 
que é comum a uma região (dialeto). 
Ainda é necessário esclarecer dois conceitos que adiante trataremos mais minuciosamente: 
NORMA CULTA e NORMA-PADRÃO, que têm sido vistos de forma confusa: “a expressão norma 
culta/comum/standard designa o conjunto de fenômenos linguísticos que ocorrem habitualmente no 
uso dos falantes letrados em situações mais monitoradas de fala e escrita” (FARACO, 2009, p. 71). 
A NORMA CULTA é a linguagem praticada pela classe social de prestígio, que é identificada 
com a da chamada classe social cujos indivíduos têm escolaridade superior (graduação completa em 
alguma faculdade) e possuem antecedentes biográficos culturais urbanos, isto é, nasceram, cresceram 
e sempre viveram em ambiente urbano. Trata-se de uma variedade social que nada tem de melhor em 
relação às outras. Seu prestígio decorre da importância da classe social a que corresponde. 
Bagno (2015, p. 157-158), discutindo a confusão entre norma culta e norma-padrão, afirma: 
O dilema relativo à norma-padrão se prende ao fato de que esse termo (às vezes sob a forma 
enganosa e imprecisa de “norma culta”) é usado pela tradição gramatical conservadora 
para designar uma modalidade de língua que [...] não corresponde à língua efetivamente 
usada pelas pessoas cultas do Brasil nos dias de hoje, mas sim um ideal linguístico inspirado 
no português literário de Portugal, nas opções dos grandes escritores do passado, nas regras 
sintáticas que mais se aproximam dos modelos da gramática latina, ou simplesmente no gosto 
pessoal do gramático – para Napoleão Mendes de Almeida, por exemplo, o “certo” é dizer 
eu odio e não EU ODEIO. 
Já a expressão norma-padrão designa não propriamente 
18 
 
uma variedade da língua, mas um constructo sócio-histórico que serve de referência para estimular 
um processo de uniformização. 
Enquanto a norma culta/comum/standard é a expressão viva de certos segmentos sociais em 
determinadas situações, a norma-padrão é uma codificação relativamente abstrata (FARACO, 
2009, p. 73). 
A norma-padrão é a norma gramatical. Não há, propriamente, falantes que a utilizam tal como ela 
se apresenta nos manuais, mesmo porque há divergência entre os gramáticos e, muitas vezes, o que 
ali se encontra não é seguido sequer pelos literatos. 
Para Bagno (203, p. 43), há confusão entre a língua que falamos e a língua escrita. A própria 
gramática se apoia em um tipo específico de atividade linguística, a língua escrita: 
de um grupo muito especial e seleto de cidadãos, os grandes estilistas da língua, que também 
costumam ser chamados de “os clássicos”. Inspirados nos usos que aparecem nas grandes 
obras literárias, sobretudo do passado, os gramáticos tentam preservar esses usos compondo 
com eles um modelo de língua, um padrão a ser observado por todo e qualquer falante que 
deseje usar a língua de maneira “correta”, “civilizada”, “elegante” etc. 
Faraco (In: ZILLES; FARACO, 2015, p. 21-22), depois de afirmar que não se nega “em nenhum 
momento a necessidade de garantir a todos o acesso à expressão culta”, questiona o que o se deve 
entender por “expressão culta”: 
A questão normativa emergiu com força no Brasil na segunda metade do século XIX. Surgiu 
como uma reação ao ideário de nossos autores românticos. Defendiam eles um projeto que 
desse forma literária às nossas paisagens e às nossas realidades socioculturais. Emoutros 
termos, eles batalhavam por uma independência literária e cultural como desdobramento da 
independência política. [...] 
No século XIX, eram já bem distintos o português europeu e o português brasileiro, seja na 
pronúncia, seja na sintaxe, seja ainda no vocabulário. E as nossas características, quando 
transpostas para a língua escrita, foram, então – ao cabo de um conjunto de pesadas 
polêmicas –, inadequadamente classificadas como erros. 
Espalhou-se entre nós, em consequência, o discurso de que nosso português é cheio de erros, 
de que não sabemos português, de que escrevemos mal a língua. E difundiu-se, nas últimas 
três décadas do século XIX, um discurso normativo que recusou as características do 
português culto brasileiro e defendeu a adoção e o ensino das características do português 
culto europeu como norma de referência. 
5Português brasileiro 
O Português Brasileiro é um sistema linguístico que abrange o conjunto das normas que se 
concretiza por meio dos atos individuais de fala. Ele é um dos sistemas linguísticos existentes dentro 
do conceito geral de língua e compreende variações diversas devidas a locais, fatores históricos e 
socioculturais, estilo, que levam à criação de variados modos de usar a língua. 
Em 1500, a língua que aqui chegou não foi a língua literária de Gil Vicente, Camões, Fernão 
Lopes ou do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende, mas a língua falada pelos colonizadores que 
iniciaram o povoamento do Brasil a partir de 1532, com a divisão do Brasil em 15 capitanias 
hereditárias. De início, pelas diferenças de língua que falavam e de interesses, portugueses e índios 
tiveram dificuldade de relacionamento. O interesse dos portugueses pelas novas terras, no entanto, só 
se concretizaria após 1550. A partir de 1590, os colonos começaram a substituir o trabalho escravo 
do índio pelo africano. Durante o primeiro século após o Descobrimento, nessa sociedade de brancos, 
19 
 
índios e negros predominou a língua geral, não obstante os esforços da metrópole pelo uso do 
português. A LÍNGUA GERAL era um veículo de comunicação entre os nativos e os portugueses. 
Após a segunda metade do século XVIII, a língua geral foi paulatinamente deixando de ser 
utilizada, assim como os dialetos falados pelos negros, e a língua portuguesa impôs-se. A língua geral 
foi proibida e obrigado o uso da língua portuguesa pelo Marquês de Pombal, em 3 de maio de 1757, 
em Portugal; em 17 de agosto de 1758, no Brasil. Outro fato que contribuiu para a difusão do 
português no Brasil foi a expulsão dos jesuítas (1759) de nosso solo. Eles eram os principais 
defensores da língua geral. Além disso, a língua portuguesa manteve seu prestígio mesmo durante o 
predomínio da língua geral, sobretudo nos contratos, nos atos administrativos, nos casamentos. 
Ao final do século XVIII, o domínio da cultura dos brancos consolidou-se. Surgiram as 
Academias, de 1724 a 1758. No início do século XIX, a vinda da Família Real para o Brasil 
constituiu-se um fato relevante para a vida social e cultural do país. 
Nesse tempo, o padrão lusitano foi tido como ideal linguístico, tanto na língua oral, como na 
escrita literária. Todavia, com a Independência do Brasil em 1822, passou-se a valorizar tudo o que 
nos distanciasse de Portugal. Com o Romantismo, toma vulto a questão da língua brasileira, que 
reivindicava para o Brasil uma língua própria. 
A segunda metade do século XIX conheceria ainda a chegada dos imigrantes italianos e alemães. 
No início do século XX, o Modernismo (1922) novamente proporia a questão da língua brasileira, 
associado à oralidade da língua, à diferença entre língua escrita e língua falada. Como recebeu muitas 
contribuições, a língua nacional é o português brasileiro, uma língua que alcançou independência 
linguística e cultural em relação a Portugal. Assim, pelos fatos apresentados verifica-se que o percurso 
da língua portuguesa em Portugal e no Brasil é muito diverso. Embora a língua de portugueses e a de 
brasileiros utilizem o mesmo código linguístico e o mesmo sistema, elas apresentam diferenças na 
norma usual (uso). 
Bortoni-Ricardo e Rocha (In: MARTINS; VIEIRA; TAVARES, 2014, p. 37-38) entendem que 
o português do Brasil é uma língua transplantada e, como tal, tende a ser mais conservadora 
que a língua no seu nascedouro. Comparada ao português europeu, as variedades brasileiras 
são faladas com ritmo relativamente mais lento, que alguns estudiosos consideram uma 
preservação de um traço arcaico do português. O gramático pioneiro Fernão de Oliveira, 
descrevendo a língua falada em Lisboa no século XVI, disse: “mas nós falamos com grande 
repouso, como homens assentados”. Silva Neto, Mattoso Camara e Naro referem-se a 
profundas mudanças fonéticas no português da metrópole, ocorridas no último quartel do 
século XVII e no primeiro do século XVIII, que teriam conferido à língua um ritmo em allegro. 
Essas mudanças não chegaram ao Brasil, ou pelo menos não chegaram de forma consistente 
e generalizada no repertório dos colonizadores ao longo dos primeiros séculos de 
colonização e não se consolidaram aqui. Ademais, os colonos provinham de diferentes 
regiões na metrópole, e, portanto, em seu repertório linguístico, as mudanças em curso 
estavam em estágios distintos. Ao se encontrarem no Brasil, esses repertórios tenderam a um 
amálgama mais conservador em prejuízo das novas variantes. 
Para Andrade e Medeiros (1997, p. 43), 
o português do Brasil atual apresenta traços conservadores e inovadores. Os conservadores 
são notados, principalmente, nas linguagens regionais, que preservam arcaísmos e formas 
desusadas até nas linguagens regionais de Portugal. Os estudiosos do assunto afirmam que 
há, nas linguagens regionais do Brasil, um substrato comum do português do século XVII. As 
inovações correm por conta das linguagens urbanas, fortemente influenciadas pelos meios 
de comunicação, por isso mais abertas aos processos de transformação, e da linguagem 
literária. Quanto às diferenças da norma escrita e falada no Brasil e em Portugal, podem ser 
20 
 
apontadas distinções em vários níveis: fonético e fonológico; morfológico e sintático e, 
sobretudo, no vocabulário. 
Considerando a diferença entre a língua portuguesa falada em Portugal e a falada no Brasil, 
destaca-se que a prosódia portuguesa difere bastante da que vigora por aqui. Enquanto os brasileiros 
falam morrer, correr, bondade, forçoso, corado, os portugueses 
falam murrer, currer, bundade, furçoso, curado. Portugueses suprimem vogais 
mediais: c’roa (coroa), impr’ador (imperador); brasileiros usam /e/ e /o/ fechados em Antônio, 
demônio, gênio; portugueses falam: António, demónio, génio. 
Em Portugal, morfologicamente falando, é comum madeiro, lenho, horto, fruto, enquanto no 
Brasil prevalece madeira, lenha, horta, fruta. Há diferenças também num e noutro país em relação 
ao uso de diminutivos. Em Portugal, fala-se dormindinho, saudezinha, pueirama, oirama. Os 
brasileiros preferem o gerúndio no lugar de infinitivo regido de preposição, como em estava a 
redigir, chegou a falar, está a dormir, que são comuns em Portugal, e estava redigindo, chegou 
falando, está dormindo, que são comuns no Brasil. 
Na sintaxe, a colocação pronominal tem sido campeã de discussões. Enquanto portugueses 
preferem a ênclise (diga-me), os brasileiros gostam da próclise (me diga). 
No vocabulário, difere bastante a língua falada aqui e lá: 
Brasil Portugal 
Bala Confeito 
Banheiro Casa de banhos 
Calcinha Cueca 
Carona Boleia 
Carpete Alcatifa 
Chiclete Pastilha elástica 
Crianças Putos 
Goleiro Guarda-redes 
Moça Rapariga 
Ônibus Autocarro 
Pernilongo Melga 
Trem Comboio 
Xícara Chávena 
 
6Variedades linguísticas 
6.1Padrão vs. não padrão 
Segundo Tarallo (1994, p. 8), “em toda comunidade são frequentes as formas linguísticas em 
variação”. A essas formas em variação dá-se o nome de variedades.1 
As variedades de umacomunidade de fala estão sempre em relação de concorrência: 
Padrão vs. não padrão; conservadoras vs. inovadoras; de prestígio vs. estigmatizadas. Em 
geral, a variante considerada padrão é, ao mesmo tempo, conservadora e aquela que goza 
de prestígio sociolinguístico na comunidade. As variantes inovadoras, por outro lado, são 
quase sempre não padrão e estigmatizadas pelos membros da comunidade. Por exemplo, no 
caso da marcação de plural no português do Brasil, a variante [s] é padrão, conservadora e 
de prestígio; a variante [0], por outro lado, é inovadora, estigmatizada e não 
padrão (TARALLO, 1994, p. 12). 
https://jigsaw.minhabiblioteca.com.br/books/9788597017489/epub/OEBPS/Text/chapter01.html#rfn1
21 
 
Duas são, portanto, as variedades fundamentais: a língua-padrão em oposição à língua não padrão. 
Em relação à primeira, impera um conservadorismo injustificável do ponto de vista da ciência 
linguística. Um ideário elitista e excludente sobre língua, norma, gramática, variação e mudança 
domina o cenário nacional (mídia, sala de professores, sala de aula, reunião de professores, bem como 
conversa sobre língua em qualquer instância social). Para Zilles (In: FARACO, 2009, p. 10-11): 
Há, ainda, muito trabalho analítico e político a fazer diante dessa postura muito discutível, 
que privilegia uma variedade de língua sobre as demais, sem levar em conta se esta variedade 
representa uma escolha adequada pra a sociedade brasileira como um todo, e não apenas 
para a classe dominante. O ônus dessa postura está também em estigmatizar os falantes que 
não dominam essa variedade e impô-la como língua legítima da escola, entre outras 
violências simbólicas. 
A introdução desses temas sociolinguísticos tem provocado discussões acaloradas, 
particularmente na mídia (impressa e eletrônica). Os mais conservadores acusam os professores 
linguistas de desleixarem no ensino da língua “culta”, mas, em geral, não atentam para duas realidades 
distintas: as variedades “cultas” (designadas pela expressão genérica norma “culta”) e a norma-
padrão. 
6.2Variedades sociais 
No estudo da variação sociolinguística, os linguistas observam a existência de variedades sociais 
a que atribuem o adjetivo cultas. A variedade “culta” pode ser assim definida: é aquela que ocorre 
em usos da língua de forma mais monitorada, que são realizados por segmentos urbanos, que estão 
no meio para cima na hierarquia econômica e com amplo acesso aos bens culturais, particularmente 
a educação formal, e à cultura escrita. 
Trata-se de uma variedade que é recorrente na expressão linguística desses segmentos sociais, em 
situações de maior monitoração. Por isso, recorre-se muitas vezes à expressão norma culta real. Essas 
variedades sociais, no entanto, não são homogêneas (é de lembrar que não há uma variedade “culta”, 
mas várias), embora apresentem traços comuns, difundidos quer pela televisão, rádio, jornais 
impressos, bem como pela escolarização de longo alcance. 
A variedade “culta” falada difere da variedade “culta” escrita; a escrita é sempre mais 
conservadora que a fala, ainda que se possa verificar na escrita a presença de estruturas provenientes 
da fala “culta”. 
Com base nesses conceitos, salienta-se então que, como as variedades “cultas” são manifestações 
do uso normal (no sentido de regular, comum, corriqueiro) da língua, 
a norma-padrão – quando existe em determinada sociedade – é um constructo idealizado 
(não é um “dialeto” ou um conjunto de “dialetos”, como o é a norma culta, mas uma 
codificação taxonômica, de formas tomadas como um modelo linguístico ideal) (FARACO, 
2009, p. 172). 
A fixação de um padrão é resultado de um projeto político que objetiva impor uniformidade 
onde a heterogeneidade é sentida como negativa (como “ameaçadora de uma certa ordem”). 
Foi esse o caso do Brasil no século XIX em que certa elite letrada, diante das variedades 
populares (em particular do que se veio a chamar pejorativamente de “pretoguês”) e face a 
um complexo jogo ideológico (em boa parte assentado em seu projeto de construir um país 
branco e europeizado) trabalhou pela fixação de uma norma-padrão (p. 172). 
Foi, para o linguista, o desejo de construir uma sociedade branca e europeizada que levou a elite 
a renegar as características linguísticas do País. Inicialmente, impedindo, no século XVIII, o uso das 
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línguas indígenas e da língua geral e, posteriormente, na segunda metade do século XX, impondo à 
sociedade uma norma-padrão artificial que atormenta os brasileiros. 
Embora mostre uma relativa unidade linguística, o Brasil tem dificuldade de reconhecer sua cara 
linguística: não admitimos que somos um país multilíngue, pois há centenas de línguas indígenas e 
dezenas de línguas de imigração, que são minoritárias, mas significativas para nosso patrimônio 
cultural. Além disso, o que se observa no português falado pela maioria dos brasileiros é que se trata 
de uma língua não uniforme, mas diversificada tanto no espaço geográfico quanto no espaço social. 
Essa diversidade não constitui problema, mas uma riqueza cultural de que temos de nos orgulhar, e 
não de nos envergonhar: “o problema está nas formas como lidamos com essa diversidade [...]. O 
problema está nas imagens saturadas de valores negativos que temos de nós como falantes” 
(FARACO, 2009, p. 181). 
A norma-padrão é uma norma distante das variedades “cultas” praticadas no Brasil. Em seu nome, 
têm-se praticado uma violência simbólica e uma discriminação sociocultural. Diante desses fatos, os 
linguistas entendem que não há por que ocupar-se de uma norma que não é utilizada e que é preciso 
defender o acesso escolar às variedades “cultas”. Defendem que à norma-padrão sejam incorporados, 
em gramáticas e dicionários, os fenômenos característicos das variedades “cultas”, ou seja, é 
necessário que a norma-padrão seja um reflexo da norma “culta” praticada no Brasil. Há algum 
sentido, já entrado o século XXI, em continuarmos nos ocupando da norma-padrão, visto não haver 
consenso sobre a expressão falada padrão? Temos mesmo necessidade de fixar uma norma-padrão 
brasileira? A diversidade linguística nacional põe algum risco à unidade das variedades “cultas” 
faladas? Evidentemente, a essas perguntas retóricas cabe uma resposta: não. Conclui Faraco (2009, 
p. 174): 
Diante desses fatos, talvez possamos mesmo abrir mão de projetos padronizadores, 
direcionando nossas energias para o que efetivamente interessa: de um lado, a descrição e a 
difusão das variedades cultas faladas e escritas; e, de outro, o combate sistemático aos 
preceitos da norma curta que, em nome de uma norma-padrão artificialmente fixada, ainda 
circulam entre nós quer na desqualificação da língua portuguesa do Brasil, quer na 
desqualificação dos seus falantes. 
Para Zilles, no prefácio à obra de Faraco (2009, p. 15), 
sofremos, de fato, uma esquizofrenia linguística, pois amargamos uma dura dissociação entre 
a ação (o modo como falamos) e o pensamento (o modo como representamos o modo como 
falamos). Essa dissociação, contudo, não é endógena como a patologia cujo nome tomamos 
emprestado acima, pois seu arcabouço é sócio-histórico, e, portanto, passível de ser 
conhecido, explicado e quiçá modificado. Mas é preciso querer fazê-lo. É preciso vontade 
política. 
Segundo Zilles, ainda, a norma linguística modelar recebe diversas denominações: norma culta, 
norma-padrão, norma gramatical, gramática, língua culta, língua-padrão, língua certa, língua 
cuidada, língua literária, entre tantas outras. 
Bagno (In: ZILLES; FARACO, 2015, p. 193), examinando a falsa sinonímia norma-padrão = 
norma culta, fez levantamento dos autores de livros didáticos e encontrou as seguintes 
expressões: língua culta, língua formal, língua oficial, língua-padrão, linguagem formal, modalidade 
culta, norma culta, norma-padrão, padrão culto, padrão formal, português-padrão, pronúncia-
padrão, uso culto, uso formal, variação-padrão,variante culta, variante-padrão, variedade culta, 
variedade formal, variedade-padrão, variedades de prestígio. 
Até mesmo no ENEM, Bagno (p. 197-198) identificou imprecisão terminológica em relação à 
“norma culta”, que é tratada como modalidade culta, modalidade culta escrita, modalidade-padrão, 
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norma culta escrita, norma-padrão. E, adiante (p. 210), volta a insistir que, quando se usa a 
terminologia norma culta nas provas do ENEM, 
o que está em jogo é a variação social da língua, isto é, as diferenças que a língua apresenta 
de acordo com variáveis sociais como classe socioeconômica, grau de escolarização, idade, 
sexo, ambiente rural ou urbano etc. Quando se usa, por outro lado, a escala de formalidade 
(ou de monitoramento) para avaliar determinado uso da língua, o que está em jogo é a 
variação estilística. 
Ora, a falta de precisão com relação à nomenclatura revela que o que está no centro das discussões 
é mal compreendido e mal avaliado pela sociedade brasileira. Faraco (2009, p. 121), com base nas 
acusações de puristas que viam erros nos clássicos, “sempre que seus usos desmentiam as regras 
agora inventadas” (p. 120), afirma que 
é certamente esse vício de origem a causa principal do desenvolvimento da norma curta entre 
nós – essa coleção de preceitos categóricos que se autojustificam, que recusam a norma real, 
que desmerecem o trabalho dos escritores, dos bons dicionaristas e gramáticos e que excluem 
qualquer diversificação de suas fontes. 
Essas críticas à postura purista e conservadora no uso da língua, no entanto, não devem ser 
entendidas como uma postura relativista no estudo do português brasileiro. Em relação ao ensino da 
língua materna, Bagno (In: ZILLES; FARACO, 2015, p. 200) endossa o pensamento de Magda 
Soares, para quem as camadas populares têm o direito “de apropriar-se do dialeto de prestígio”. O 
objetivo desse tipo de ensino seria 
levar os alunos pertencentes a essas camadas a dominá-lo, não para que se adaptem às 
exigências de uma sociedade que divide e discrimina, mas para que adquiram um instrumento 
fundamental para a participação política e a luta contra as desigualdades sociais. 
Não se trata, pois, de abandonar o ensino exclusivo de uma norma, mas de “assumir a 
responsabilidade de letrar os aprendizes, isto é, inserir os cidadãos na cultura eminentemente letrada 
que domina a sociedade em que vivem, familiarizando-os com os mais diversos tipos e gêneros 
discursivos, falados e escritos, que circulam na sociedade” (BAGNO In: ZILLES; FARACO, 2015, 
p. 201). 
A questão da língua no Brasil, para os linguistas, não é apenas linguística, mas, antes de tudo, 
política, no sentido de que a variedade prestigiada é que deveria ser ensinada na escola, e não a norma-
padrão, variedade abstrata, que não é falada na sociedade brasileira. A relevância do tema pode ser 
observada sobretudo quando se depara com efeitos deletérios que o preconceito linguístico produz, 
principalmente a intolerância linguística, notável em expressões que diminuem pessoas que 
dominam outras variedades linguísticas, as não prestigiadas socialmente: ignorante, estúpido, 
desqualificado, idiota e outras que aproximam seres humanos do mundo animal. 
Toda língua é heterogênea, isto é, é constituída por um conjunto de variedades; a realidade das 
línguas não é a unidade homogênea. Segundo Castilho (2010, p. 197), as línguas, além de 
heterogêneas, são voltadas para a mudança. Não há, pois, senão variedades linguísticas e não, 
propriamente, uma língua superior às variedades, visto que são estas que lhe dão sustentação, que a 
fazem ser uma língua; nem há língua de um lado e variedades de outro; língua é o conjunto das 
variedades. 
Faraco define então língua não como entidade linguística, mas como entidade cultural e política, 
ou seja, critérios puramente linguísticos não são adequados para definir língua, pois ela comporta 
tanto a dimensão política quanto a cultural. 
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Cada variedade segue uma norma. Ora, como toda norma apresenta uma organização estrutural, 
não há consistência em afirmar a existência de erro em língua. Isso significa que toda variedade 
possui uma gramática. Falar em erro seria aplicar a organização estrutural de uma variedade a outra 
variedade. E é por querer aplicar a estrutura da variedade prestigiada à variedade não prestigiada 
(estigmatizada) que são comuns, na sociedade brasileira, juízos depreciativos sobre esta última: 
identifica-se erro quando se trata tão somente de diversidade. E, em geral, apenas são percebidas 
como erro as formas não usadas pela classe que desfruta de prestígio. 
Toda realidade linguística organiza formas heterogêneas, híbridas e mutantes. Essa a razão por 
que Faraco utiliza a expressão norma curta para referir-se aos que se valem de uma norma 
supostamente “culta” para discriminar outras variedades linguísticas. A norma culta é uma norma 
estreita, particularmente porque desconsidera o que já está registrado em dicionários e até em 
determinadas gramáticas. Esse é o caso, por exemplo, da regência do verbo assistir como transitivo 
direto, que alguns puristas teimam em considerar como errônea (“ele assistiu o programa Roda 
Viva”), mas que já é usada corriqueiramente por pessoas de educação superior e de status social de 
prestígio; a despeito do desagrado dos puristas, essa forma já está registrada em dicionário: “na 
literatura contemporânea, a tendência, ao que parece, é para o complemento direto” (LUFT, 1999, p. 
79). Cunha (1985, p. 508) também é assertivo em relação a tal uso: 
Na linguagem coloquial brasileira, o verbo constrói-se, em tal acepção [“estar presente, 
presenciar”], de preferência com objeto direto (cf.: assistir o jogo, um filme), e escritores 
modernos têm dado acolhida à regência gramaticalmente condenada. 
Norma culta, portanto, porque nela cabem apenas condenações a formas que indistintamente os 
brasileiros usam no seu dia a dia; norma em que não cabe nada além de preconceitos linguísticos, 
tachando de ignorantes os que se utilizam de variedades menos prestigiadas. 
O uso da expressão norma culta, ultrapassando os muros da universidade, tornou-se comum no 
discurso da mídia, mas perdeu a precisão semântica. E mesmo no discurso universitário a expressão 
apresentava imprecisão, confundindo-se com norma-padrão, que é outro conceito distinto. Norma 
culta também é identificada com norma gramatical, uma norma que se distancia e às vezes conflita 
com o uso culto efetivo que ocorre no Brasil. Nos estudos linguísticos, considera-se culto o uso da 
língua praticado por pessoas de escolarização superior (os que fizeram universidade), têm acesso a 
bens culturais, como jornais, livros, teatro, cinema, nasceram, cresceram e sempre viveram em 
ambiente urbano, como já afirmamos. 
Tradicionalmente, quando se fala em estudar ou ensinar português, vem à mente o ensino da 
gramática; daí a sinonímia, em nossa sociedade, entre ensinar gramática e ensinar português. E 
ensinar gramática também nunca esteve livre de distorções: entendia-se ora que se tratava de ensinar 
nomenclatura, conceitos, classificações, ora ensinar usos que os gramáticos entendiam ser o 
“correto”. 
A escola tradicional negava a variação linguística em seu ensino. Ela entendia que variação é 
equivalente a erro e lhe caberia corrigir os desvios. Ora, embora o tema da variação tenha sido 
ultimamente objeto do discurso pedagógico, ainda não conseguimos “construir uma pedagogia 
adequada a essa área”. 
Em vez da preocupação com projetos padronizadores do português brasileiro, poderíamos dedicar 
esforços no sentido da descrição e difusão das “variedades cultas faladas e escritas” e combater 
sistematicamente os “preceitos da norma curta que, em nome de uma norma-padrão artificialmente 
fixada, ainda circulam entre nós quer na desqualificação da língua portuguesa do Brasil, quer na 
desqualificação dos seus falantes” (FARACO, 2009, p. 174). E, citando

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