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Ádila Cristie Matos Martins UCXIX — Locomoção e preensão Problema 4, TUTORIA t “Efeito borboleta” - LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO - O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica, multissistêmica, de causa desconhecida e de natureza autoimune, caracterizada pela presença de diversos autoanticorpos e considerada o protótipo das colagenoses (que se manifesta em diversos órgãos/sistemas, provocando inflamação em seu “tecido conjuntivo”, tecido rico em colágeno) - Caracteriza-se pela apresentação clínica POLIMÓRFICA que, nas suas fases iniciais, pode dificultar o diagnóstico preciso. Pode afetar múltiplos órgãos e tecidos, como pele, articulações, rins e cérebro - Manifestações clínicas podem aparecer isolada, consecutiva ou aditiva no decorrer do tempo, sobretudo nos primeiros 5 anos da doença, que é o período em que a enfermidade habitualmente mostra os locais preferenciais de comprometimento EPIDEMIOLOGIA - É muito mais prevalente em mulheres, principalmente na idade fértil, sendo que os seus primeiros sinais e sintomas iniciam-se entre a 2 e 3ª décadas de vida, nas quais o predomínio do sexo feminino pode ser até de 10:1 - Pode ocorrer em crianças e idosos, porém com menor predomínio do sexo feminino nestes extremos de idade, caindo a relação para 3~2:1 - É universal encontrada em todas etnias e em diferentes áreas geográficas, mas parece ser mais prevalente na raça negra (cerca de 3~4x mais) - É interessante notar uma determinada agregação de doenças autoimunes na família de pacientes com LES, pois aproximadamente 10 a 20% destes pacientes apresentam história familiar de alguma doença autoimune ou mesmo de lúpus - A prevalência do LES é variável conforme as regiões geográficas em decorrência da distribuição étnica e de gêneros, fatores ambientais e socioeconômicos ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA - Apesar dos progressos na identificação e da melhor caracterização dos autoanticorpos que comprovam a disfunção imunológica do LES, a sua patogênese ainda necessita de maiores esclarecimentos - A doença é MULTIFATORIAL e várias condições desempenham um papel predisponente ou coadjuvante na doença Fatores genéticos - Sabe-se que existe no LES maior frequência de certos haplótipos dos antígenos de histocompatibilidade (HLA), tanto de classe I (B8) como de classe II (DR3, DR2, DQw1 e DQw2), que se localizam no braço curto do cromossomo 6 - De maneira curiosa, deficiências de frações de complemento, notadamente C2 e C4, que são observadas no LES com frequência, também estão ligadas aos haplótipos DR2 e DR3, respectivamente - Estudos recentes sobre o genoma no LES identificaram várias associações, como o STAT4 (signal transduction and activator oftranscription 4), IRF5 (interferon regulatory factor) e o ITGAM (integrin alpha M) - De fato, mais de 90 loci de suscetibilidade foram identificados até o momento - Além disso, existe maior concordância da doença em gêmeos monozigóticos, que não é total, o que reforça a influência de outros fatores - Genes no cromossomo X (ex.: TREX-1) aparenta ter envolvimento Fatores hormonais - Comprovadamente, existe na doença um metabolismo anormal de hormônios sexuais, com aumento da 16-alfa-hidroxiestrona e de prolactina, e alterações no metabolismo dos androgênios, com diminuição de testosterona nos homens e de de-hidroepiandosterona nas mulheres com lúpus - Enquanto os estrogênios são imunoestimulantes (aumentam a atividade dos linfócitos B), os androgênios e progestágenos fazem o oposto, podendo explicar a predominância da doença em mulheres na idade fértil... Pacientes que fazem uso de ACO ou TRH possuem risco aumentado de LES (1, 2 a 2 vezes) Fatores ambientais - A influência é bem documentada, principalmente com a comprovação de que a exposição à luz solar agrava ou desencadeia a doença. A luz ultravioleta, em especial com a irradiação beta, é capaz de induzir e exacerbar a atividade inflamatória, tanto nos quadros cutâneos quanto sistêmicos do lúpus - Tabagismo e exposição à sílica são outros fatores que podem estar envolvido Ádila Cristie Matos Martins UCXIX — Locomoção e preensão Problema 4, TUTORIA t Fatores infecciosos - A participação de diversos agentes infecciosos, particularmente virais, como mixovírus, reovírus, parvovírus, retrovírus tipo C, vírus Epstein-Barr (EBV), na gênese da doença sempre foi considerada, embora a relação destes agentes com a doença não seja universal - Além do possível envolvimento no desenvolvimento da doença em indivíduos geneticamente predispostos, os gatilhos infecciosos estão implicados no desencadeamento dos episódios de exacerbação do LES - Particularmente quanto ao EBV, é interessante notar que apresenta mimetismo molecular com os antígenos Ro/SS-A e Sm, o que poderia levar à ocorrência de reatividade cruzada com antígenos próprios e, consequentemente, contribuir para o desencadeamento de autoimunidade Por substâncias - Existe uma forma especial, denominada lúpus INDUZIDO POR DROGAS, que se distingue do LES idiopático pela associação temporal do uso de determinados medicamentos, pela apresentação de um quadro clínico mais leve - Um dos mecanismos mais prováveis é a indução de demetilação do DNA (processo que permite a expressão exagerada de genes que numa situação normal permaneceriam inativos, como os genes de citocinas e pró-inflamatórios) - Os fármacos mais associados são: procainamida, hidralazina, D-penicilamina, isoniazida, diltiazem, clorpromazina, metildopa, interferon-alfa e agentes anti-TNF - Embora certamente exista a influência destes fatores, é importante ressaltar que a produção anormal de autoanticorpos pelas células B é o principal evento no LES, e esta alteração é a principal característica da doença - Alguns destes anticorpos são extremamente específicos do LES, como o anti-DNA de dupla hélice (anti-dsDNA), anti-Smith (anti-Sm) e anti-P, mas outros anticorpos encontrados no LES, como anti-U1RNP, anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B, também podem ser identificados em outras doenças autoimunes Teoria mais aceita sobre a etiopatogenia - Sugere que a apoptose contribui para a resposta imunológica inadequada do lúpus por meio da exposição de antígenos celulares - Acredita que, com um gatilho ambiental em pessoas que são suscetíveis, células tem seu DNA tão danificado que sofrem apoptose - A apoptose produz pequenos corpos apoptóticos e expõe o interior da célula, incluindo partes do núcleo, como DNA, histonas e outras proteínas para o resto do corpo - Os genes com suscetibilidade tem efeito sobre o sistema imunológico, de tal forma que suas células imunes são mais propensas a pensar que estes restos celulares da apoptose são corpos estranhos ou antígenos, e como eles são do núcleo, são chamamos de antígenos nucleares (autoantígenos) - Assim, há uma hiperatividade imune inata e adaptativa, onde as células imunes tentam atacar os antígenos nucleares - Acredita-se que há também uma deficiência de células T regulatórias, que naturalmente seriam capazes de inativar linfócitos autoreativos - As células B detectam esses antígenos nucleares e começam a produção de anticorpos, chamados de anticorpos antinucleares. Os anticorpos antinucleares se ligam aos antígenos nucleares, formando complexos antígeno-anticorpo - Genes de suscetibilidade também fazem com que a pessoa tenha um clearance menos efetivo. Assim, o sistema não é bom para se livrar dos autoanticórpos e dos imunocomplexos pelo sistema retículo-endotelial (que os remove da circulação por fagocitose de macrófagos e outras células fagocitárias), fazendo com que tenha permanência desses imunocomplexos na circulação * Naturalmente podemos produzir imunocomplexos, porém oclearance nos faz remove-los de maneira eficaz da circulação - Assim esses imunocomplexos na circulação e começar a se depositar em todos os tipos de órgãos e tecidos, como rins, pele, articulações e coração. Com a deposição, iniciam uma reação inflamatória local, que causa dano através da ativação do complemento Células B Ádila Cristie Matos Martins UCXIX — Locomoção e preensão Problema 4, TUTORIA t - A ativação do sistema complemento, após a ativação de uma enorme cascata de enzimas, deixa membranas celulares com canais, que permitem que fluidos e moléculas entrem e saiam sem controle, fazendo a célula estourar e morrer. Naturalmente isso acontece com células estranhas ou infectadas - Quando os tecidos são danificados como resultado desses complexos imunes, é conhecido como uma reação de hipersensibilidade tipo III - Muitos pacientes também desenvolvem anticorpos visando outras células como glóbulos brancos e vermelhos e moléculas, como fosfolipídios, que as células imunes podem marcá-las para fagocitose e destruição, levando há outros sintomas. Isso é considerado uma reação de hipersensibilidade tipo II MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS - É uma doença autoimune multissitêmica crônica, incurável, cumulativa, remitente e recidivante - A característica mais marcante é o desenvolvimento de focos inflamatórios - O LES, na fase inicial, acomete com maior frequência o sistema osteoarticular e o cutâneo e, de forma mais grave, o renal e o SNC. A predileção por esses sistemas e os possíveis sistemas acometidos geralmente se mostram nos primeiros 5 anos SINTOMAS GERAIS E CONSTITUCIONAIS - Anorexia e perda insidiosa de peso podem ser identificadas no início do quadro e até preceder em meses o aparecimento de manifestações orgânicas - Febre como primeiro sinal pode ocorrer em 50%, principalmente em crianças e adolescentes e, com frequência, associada aos sintomas consumptivos - Outros sintomas são: mal-estar, fadiga (que costuma ser o primeiro sinal de uma recaída iminente) e queda do estado geral - Linfoadenopatia no LES é encontrada em 30 a 80% dos pacientes, sendo mais frequente em crianças, pode ser generalizada ou localizada, com certo predomínio das cadeias cervical e axilar - Hepatoesplenomegalia febril como apresentação inicial de LES exige diferencial com as doenças linfoproliferativas. A pesquisa dos FAN pode não ser discriminativa de LES, uma vez que podem ser encontrados em ambas doenças, mas a pesquisa de anticorpos específicos de LES (anti-Sm e anti-dsDNA) pode ser de grande valia nesta diferenciação LESÕES CUTÂNEAS - São de grande importância no reconhecimento do LES - No INÍCIO, as manifestações cutâneas são extremamente frequentes, correspondendo a cerca de 70% dos casos, o que facilita a suspeita, e são observadas em mais de 90% dos pacientes lúpicos em algum momento da doença - O lúpus cutâneo AGUDO é o mais conhecido. A forma localizada é descrita como rash malar ou em asa de borboleta (erupção sobre bochechas e nariz), sendo simétrica e fortemente associada à fotossensibilidade (sendo exacerbada ou precipitada pós exposição à radiação ultra-violeta ou luz artificial fluorescente) - Por vezes pode ser dolorosa ou pruriginosa. Podendo pesistir por horas a dias e é habitualmente recorrente - É encontrada em 20 a 60% dos pacientes - Evolui para hiperpigmentação após resolução da fase inflamatória inicial (podendo ser confundida com melasma) - A forma generalizada é conhecida como rash maculopapular ou dermatite lúpica fotossensível e se apresenta como erupção exantematosa ou morbiliforme generalizada - O lúpus cutâneo SUBAGUDO é uma entidade à parte do LES, caracterizado pela presença de lesões eritematosas papuloescamosas (tipo psoriasiformes) ou anulares (tipo placas policíclicas), localizadas sobretudo em regiões de exposição solar (tronco e braços). São difusas e descamativas, não ulcerativas Ádila Cristie Matos Martins UCXIX — Locomoção e preensão Problema 4, TUTORIA t - Ambas as formas de lesão estão fortemente associadas à fotossensibilidade e à presença dos anticorpos anti-Ro/SS-A. Podem ser acompanhadas por sintomas musculares - As lesões evoluem pós-tratamento sem deixar cicatrizes profundas, mas produzem áreas de hipopigmentação, tipo vitiligoides, que podem se tornar permanentes - Existe uma forma de erupção lúpica que se desenvolve nas mãos, tida por muitos como bastante sugestiva dessa condição. Há envolvimento do dorso das falanges de forma a poupar os nós articulares das interfalangianas, numa espécie de “espelho” do sinal de Gottron da polimiosite - O lúpus cutâneo CRÔNICO (ou discoide) engloba uma série de lesões: - Ocorrem em cerca de 20% dos pacientes com LES, porém apenas 5 a 10% dos pacientes com lúpus discoide desenvolvem LES - A discoide é a mais conhecida. Inicialmente, a lesão discoide clássica é caracterizada por placa eritematosa e hiperpigmentada que evolui com lentidão na periferia, deixando uma cicatriz central hipopigmentada com atrofia. Na maioria das vezes, esta lesão é única e preferencialmente encontrada na face, no couro cabeludo, no pavilhão auricular e no pescoço - O lúpus discoide costuma deixar sequelas cicatriciais, incluindo alopécia irreversível - As úlceras mucosas, geralmente, não são dolorosas e são encontradas em até 25% dos pacientes, sendo relacionadas à atividade inflamatória da doença, o que justifica um exame clínico minucioso se houver suspeita da doença. Ocorrem no palato, lábios, septo nasal, vagina, etc * A paniculite de Kaposi é uma forma rara de lúpus cutâneo crônico, caracterizada pela presença de nódulos firmes e dolorosos no tecido subcutâneo, às vezes evoluindo com atrofia. É causado por vasculite nas arteríolas do tecido adiposo, com formação de infiltrados mononucleares perivasculares - Ainda fazem parte do LES algumas outras lesões cutâneas não específicas, cuja importância reside na alta frequência da doença: - Alopecia não discoide: observada em até 50% dos casos, podendo ser o primeiro sinal clínico, e está diretamente relacionada com atividade inflamatória. Em geral, há recuperação após a remissão do surto inflamatório. É causada por aumento nas taxas de apoptose celular nos folículos pilosos - Vasculite cutânea: identificada em 20 a 70% dos casos, variando desde lesões do tipo urticária até grandes úlceras necróticas. O padrão é determinado pelo nível e pela intensidade do dano inflamatório dos vasos comprometidos. Pode estar associada aos anticorpos antifosfolipídios - Livedo reticular: podem apresentar quadro de vasculopatia trombótica decorrente da síndrome dos anticorpos antifosfolípides (SAF) - O fenômeno de Raynaud, fortemente associado à presença dos anticorpos anti-U1RNP. Manifesta-se com a sequência palidez-cianose-rubor nos dígitos MANIFESTAÇÕES MUSCULOESQUELÉTICAS - São frequentes nas fases iniciais de doença, sendo que artralgia e/ou artrite podem ser a principal queixa em aproximadamente 75 a 80% dos indivíduos no momento do diagnóstico - Nesta fase, a natureza transitória da poliartrite pode determinar certa dificuldade, uma vez que o derrame articular constatado ao exame nem sempre é percebido pelos pacientes Ádila Cristie Matos Martins UCXIX — Locomoção e preensão Problema 4, TUTORIA t - Os quadros articulares tornam-se mais marcantes no curso do doença quando comprometem até 90% dos pacientes - Apesar de não existir um padrão articular, a maioria dos casos cursa com quadros de poliartrite simétrica episódica, de caráter migratório ou aditivo, e quase sempre não deformante. Geralmente acomete mãos,punhos e joelhos - Por vezes, a rigidez matinal é bastante proeminente e o diagnóstico de LES pode ser facilmente confundido com o da artrite reumatóide (AR), visto que também compromete pequenas e grandes articulações, na maioria das vezes é simétrica. O fator reumatoide pode estar presente em aproximadamente 25% dos pacientes com LES, o que dificulta o diagnóstico - Na evolução da doença, cerca de 10 a 15% dos casos apresentam artropatia crônica ou artropatia tipo Jaccoud, que se caracteriza por desvio ulnar seguido de subluxação, deformidades do tipo pescoço-de-cisne e subluxação das interfalângicas do polegar. Esta deformidades (redutíveis) são decorrentes da instabilidade provocada pelo processo inflamatório crônico da cápsula articular, ligamentos e tendões - Mesmo nesta fase tardia do LES, estas deformidades reversíveis podem ser confundidas, à inspeção, com aquele decorrentes da AR, cuja diferenciação está na possibilidade de redução e alinhamento, ao exame clínico, nos casos de LES - Necrose avascular, pode acometer vários sítios, sendo mais frequente a cabeça femoral e, na maioria dos casos, associada ao tratamento com glicocorticoides - Tenossinovite pode ocorrer em até 10% dos casos em qualquer fase da doença - Mialgia generalizada é comum durante os episódios de exacerbação clínica da doença, podendo ser queixa inicial em 40 a 25% dos casos - Miosite envolvendo musculatura proximal com elevação de enzimas musculares, como a creatinofosfoquinase (CPK) e a aldolase, ocorre de 5 a 10% ENVOLVIMENTO CARDIOVASCULAR - Pericardite sintomática em 20 a 30% durante o curso da doença e pode ser observada como primeira manifestação em 5% dos casos - Pleurite é uma manifestação pulmonar frequente, ocorrendo em 40 a 60% dos casos, assim como o derrame pleural, que ocorre em 16 a 40% durante o curso da doença - A endocardite de Libman Sacks é uma forma verrucosa e não bacteriana de endocardite ou valvulite cardíaca. Constitui-se num surpreendente achado anatômico do LES, ocorrendo principalmente na valva mitral (face atrial) e, menos frequentemente, na valva aórtica (face arterial). Pode causar insuficiência mitral e/ ou aórtica de grau leve a moderado, justificando o aparecimento de sopro orgânico em pacientes com LES. A manifestação mais temida desse tipo de endocardite é a embolia arterial (ex.: AVE isquêmico, isquemia mesentérica, etc.). Sabemos, atualmente, que existe grande correlação entre a endocardite de Libman-Sacks e a presença de anticorpos antifosfolipídios - Ateroscleroses podem ser comuns e de formação acelerada por conta da inflamação - Miocardite aguda MANIFESTAÇÕES SISTEMA NERVOSO - 25 a 70% dos pacientes pode ter algum acometimento do SN - Os acometimentos do SNC podem ser difusos (encefalopatia, convulsão, psicose, etc) ou focais (SAAF, aterosclerose, AVE isquêmico por conta da endocardite de Libman Sacks, vasculites, etc) Outras manifestações encontradas - O autoanticorpo relacionado às alterações psiquiátricas do LES, em especial à psicose e à depressão é o anti-P ENVOLVIMENTO RENAL - O comprometimento renal pode ser evidenciado por proteinúria superior a 500 mg/ 24h ou ≥ 3 + no EAS e cilindros celulares no sedimento urinário - Os glomérulos são os principais alvos renais do lúpus - Pode-se manifestar: síndrome nefrítica e nefrótica, nefrite intersticial e insuficiência renal Doença cerebrovascular - Síndrome demielinizante - Cefaleia - Distúrbios do movimento (coreia) - Mielopatia - Crises convulsivas - Estado confusional agudo - Distúrbios de ansiedade - Disfunção cognitiva - Alterações do humor - Psicose lúpica Sistema nervoso periférico - Polirradiculoneuropatia desmielinizante inflamatória aguda (síndrome de Guillain-Barré) - Distúrbios autonômicos - Mononeuropatia - Miastenia gravis - Neuropatia craniana - Plexopatia - Polineuropatia Sistema nervoso central - Meningite asséptica Ádila Cristie Matos Martins UCXIX — Locomoção e preensão Problema 4, TUTORIA t - A nefrite lúpica ainda é uma das maiores preocupações na doença e exige maior atenção tanto no inicio como no seguimento - A deposição dos imunocomplexos DNA/anti-DNA é a base fisiopatológica da nefrite lúpica. A ativação do complemento é outro achado - Os quadros renais devem ser monitorada pois pode aparecer a qualquer momento do curso da doença, mas geralmente se apresenta nos primeiros 5 anos ALTERAÇÕES PULMONARES - A dor pleurítica (pleurite lúpica) é uma manifestação frequente no LES, ocorrendo em 50% dos casos. Embora possa haver derrames maciços, a dor pleurítica é mais comum do que o achado radiográfico de derrame pleural - O derrame pleural lúpico pode ser unilateral (sem predomínio de lado) ou, mais comumente, bilateral, sendo sempre um exsudato, com níveis de glicose geralmente normais - A pneumonite lúpica pode cursar com febre, tosse, dispneia, hemoptise e radiografia de tórax com infiltrado alveolar difuso, principalmente em bases. Paciente LES com quadro pneumônico, até prova contrária, se deve a uma infecção - Pode ser encontrado fibrose pulmonar também nesses pacientes - A síndrome do pulmão contraído é uma rara entidade lúpica, na qual os pacientes desenvolvem queixas de dispneia com RX de tórax com elevação da cúpula diafragmática, sem alterações no parênquima. Provavelmente, o problema encontra-se na fraqueza diafragmática, pela miosite lúpica ALTERAÇÕES HEMATOLÓGICAS - A mais comum é a anemia normocítica normocrômica causada por eritropoese deficitária e disponibilização de ferro bloqueada — a “anemia de doença crônica” - Uma anemia hemolítica autoimune é observada também nos pacientes. O mecanismo é a ligação de autoanticorpos antifator Rh na membrana das hemácias, estimulando a fagocitose pelos macrófagos esplênicos. Aqui o Coombs direto estará positivo - Trombocitopenia leve pode estar presente. O principal mecanismo é o surgimento de autoanticorpos IgG contra antígenos de superfície plaquetária * A associação anemia imuno-hemolítica + trombocitopenia autoimune, ou síndrome de Evans, tem no LES a sua causa mais comum. A plaquetopenia pode também se associar à síndrome do anticorpo antifosfolipídio - A leucopenia autoimune é comumente encontrada, com a contagem inferior a 4.000/mm3, sendo um parâmetro de atividade lúpica. Geralmente é por linfopenia ACOMETIMENTOS GASTROINTESTINAIS - Elevação das enzimas hepáticas, mas geralmente não há lesão significativa - Hepatomegalia - Pancreatite - Vasculite mesentérica que pode levar à isquemia/infarto, perfuração intestinal e peritonite generalizada - Peritonite/ascite - Hepatite autoimune - Sendo assim, os sintomas de dor abdominal, náuseas, vômitos e diarreia devem ser adequadamente avaliados nos pacientes com LES MANIFESTAÇÕES OCULARES - Ceratoconjuntivite seca (Sjögren) - Conjuntivite/Episclerite - Vasculite retiniana (corpos citoides — com áreas isquêmicas secundárias a oclusão de microvasos) EXAMES COMPLEMENTARES - São fundamentais tanto para a complementação diagnóstica quanto para o seguimento destes pacientes. Podem ser classificados em inflamatório e imunológicos - Provas INFLAMATÓRIAS DE FASE AGUDA: Ádila Cristie Matos Martins UCXIX — Locomoção e preensão Problema 4, TUTORIA t - O VHS, em geral, está aumentado na atividade de doença, refletindo a fase aguda dos processos inflamatórios, porém pode persistir elevado mesmo após o controle da doença, não se correlacionado com sua atividade inflamatória - A PCR é geralmente baixa no LES e aumenta nos processos infecciosos, auxiliando por vezes no diagnóstico diferencial desta duas condições - Avaliação IMUNOLÓGICA é fundamental para a caracterização da doença - OsFAN detectados pela imunofluorescência indireta utilizando a célula HEp-2 são o primeiro teste a ser realizado, pois é positivo em mais de 98% dos casos * Ressalta-se que a alta sensibilidade deste exame não reflete a sua especificidade, pois o FAN ocorre em um grande número de doenças crônicas (infecciosas, neoplásicas), autoimunes e mesmo em indivíduos normais (idosos) - O FAN é um teste que avalia a presença de autoanticorpos - Diante da suspeita de LES e da positividade do FAN, é fundamental tentar caracterizar os autoanticorpos específicos para ajudar no diagnóstico: - Anti-dsDNA chega a 40% e a determinação de seus títulos é útil no acompanhamento da atividade inflamatória, particularmente na nefrite - Anti-Sm são identificados em aproximadamente 30% dos casos e auxiliam no diagnóstico - Aproximadamente 25% tem fator reumatoide positivo - A determinação da atividade hemolítica do complemento e dos níveis séricos dos seus componentes C3 e C4 é extremamente útil na monitoração de doenças e da resposta terapêutica Antígenos - Anti-DNA de dupla hélice (anti-dsDNA): Relação com atividade de doença, principalmente renal - Anti-Smith (anti-Sm): Maior especificidade, porém baixa sensibilidade - Anti-P: Relação com psicose lúpica - Anti-beta2-glicoproteína I IgM, IgG e IgA, anticardiolipina IgM, IgG e IgA, anticoagulante lúpico: Relacionada a síndrome do anticorpo antifosfolipídeo - Anti-histona: Presente em 70% dos LES. No lúpus farmacoinduzido, deve estar obrigatoriamente presente (95-100% dos casos) - Anti-Ro: lesões cutâneas subagudas e fotossensível, síndrome de Sjögren e lúpus neonatal (por passar placenta — bloqueio AV), aparenta ter menor chance de nefrite, associado ao FAN negativo - Anti-La/SS-B: Associação com síndrome de Sjögren - Anti-RNP (sindromes mistas autoimunes) - Outros: antineurônio, antieritrócito, antiplaqueta - Teste de Coombs direto: denota hemólise imunomediada DIAGNÓSTICO Ádila Cristie Matos Martins UCXIX — Locomoção e preensão Problema 4, TUTORIA t LES farmacoinduzido - Não acomete rim ou SNC - Não consome complemento - Não cursa com anti-DNA ou anti-Sm - 95-100% positivo para anti-histona - Melhora com suspensão do fármaco TRATAMENTO - É individualizado - Tem como objetivo: induzir remissão, manter sob controle e previnir outras manifestações Medidas gerais - Proteção contra a luz solar ou outras formas de irradiação ultravioleta, pelos riscos de exacerbação das lesões cutâneas e quadros sistêmicos - Tabagismo deve ser desestimulado, pois pode dificultar na melhora dos quadros cutâneos e renais - Dieta deve ser balanceada para uma melhor qualidade de vida, tendo restrições de acordo com as comorbidades - Atividade física deve ser estimulada para condicionamento - Suplementação com cálcio (preferencialmente na dieta) e vitamina D quando são utilizados glucocorticoides ou quando houver previsão da manutenção por longos períodos - As imunizações contra pneumococo e influenza são seguras, mas, em geral, menos eficazes na vigência de imunossupressores e prednisona em dose maior que 20 mg/dia. As vacinas com vírus vivos NÃO devem ser prescritas - A fertilidade no LES é normal, assim, deve-se aconselhar a anticoncepção em pacientes com doença ativa e/ou em uso de drogas com potencial teratogênico. O DIU de progesterona se mostra como melhor opção - A gestação deve ser planejada em conjunto, considerando atividade e gravidade da doença ou mesmo a toxicidade dos medicamentos. Paciente deve ser avaliada quando à presença de anticorpos antifosfolípides e anti-Ro, pelo risco de síndrome antiforfolípide (levando a abortos de repetição) e lúpus neonatal, respectivamente. A hidroxicloroquina deve ser mantida durante gestação Terapêutica medicamentosa geral Depende dos sistemas acometidos e da intensidade do processo inflamatório Anti-inflamatórios não esteroides - Devem ser usados com cautela, particularmente nos que tem envolvimento renal, pois pode agravar a disfunção ou dificultar o monitoramento dos quadros renais - Indicado: controle do quadro articular crônico, serosites leves a moderadas e febres associadas à doença Glicocorticoides - São preferencialmente usados no início da doença ou durante os surtos de atividade, pois promovem rápido controle das manifestações clínicas - Doses baixas a moderadas são usadas para controle inicial de manifestações mais brandas (em razão ao efeitos colaterais, a menor dose possível) - Doses muito altas (1 mg/kg/dia para adultos e 1 a 2 mg/kg/dia para crianças e adolescentes) são indicados no casos graves, como manifestações renais, hematológicas e de SNC - Uma alternativa é pulsoterapia de glicocorticoide (metilprednisolona) com dose IV de 500 a 1.000 mg/dia por 3 dias consecutivos Antimaláricos - Usado para associar ao glicocorticoide, no sentido de diminuir o seu tempo de uso e promover redução da dose diária - São habitualmente prescritos, independente do órgão ou sistema acometido; embora sejam primeira escolha para quadros cutâneos e/ou articulares - A hidroxicloroquina (6 mg/kg/dia, dose máxima 400 mg/dia) é o de escolha, pois possui menor toxicidade ocular e se mostrou efetiva no controle da atividade inflamatória da doença, na redução do tempo da corticoterapia e na promoção de melhor controle das dislipidemias * Contraindicação — deficiência de G6PD Imunossupressores - Indicados como poupadores de glicocorticoides e para controle da atividade da doença - Casos leves a moderados: azatioprina, metotrexato, ciclosporina, micofenolato de mofetila e ciclofosfamida em doses baixas. Casos mais graves: dose alta de ciclofosfamida Ádila Cristie Matos Martins UCXIX — Locomoção e preensão Problema 4, TUTORIA t Biológicos - Rituximane é eficaz em melhorar atividade articular, trombocitopenia, índices de atividade de doença, títulos de anti-dsDNA e hipocomplementemia, além de ter efeito poupador de glicocorticoides - Belimumabe tem maior eficácia em pacientes com atividade cutânea, articular, anti-dsDNA positivo e hipocomplementenemia; pode usar em formas graves também Terapêutica medicamentosa específica Cutâneo - A talidomida, dapsona, metotrexato e a azatioprina podem ser consideradas quando as lesões cutâneas não forem responsavas aos antimaláricos - Pode usar um creme também Nefrite e acometimentos graves - O tratamento é dividido em duas fases: indução da remissão (glicocorticoide em altas doses + imunossupressor) por 3 a 6 meses e manutenção (glicocorticoide + imunossupressor) que dura cerca de 36 meses - Com intuito de minimizar efeitos de altas doses de glicocorticoides e permitir controle mais rápido do processo inflamatório, recomenda-se o uso de metilprednisolona na dose de 0,5 a 1 g/dia IV, por 3 dias consecutivos, mantendo- se prednisona na dose de 0,5 a 1 mg/kg/dia por 3 a 4 semanas, com redução progressiva com meta de, em 6 meses, alcançar doses de 5 a 10 mg/dia REFERÊNCIAS 1.CLÍNICA MÉDICA USP, VOLUME 5 — MARTINS (capítulo 12) 1.Systemic Lupus Erythematosus — Osmosis 2.Whitebook: conheça o diagnóstico e tratamento do lúpus eritematoso sistêmico — PebMed 3.Video aula MED — LES 4.Reumato, volume 2 — MedCurso (2019) 5.Lúpus eritematoso sistêmico (LES) e nefrite lúpuca — Manual MSD 6.Novos critérios classificatórios do Lúpus Eritematoso Sistêmico (ACR/ EULAR 2019)