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U N I V E R S I D A D E E S T A D U A L D O S U D O E S T E D A B A H I A Departamento de História e Colegiado do Curso de História Área de História Moderna / História Moderna I Análise do texto de Pico della Mirandola Discurso sobre a dignidade do homem 1. Definição: Humanismo: Na realidade, a palavra humanismo tem dois significados muito diferentes. Por humanismo pode entender-se uma teoria que toma o homem como fim e como valor superior. Mas há outro sentido de humanismo, que significa no fundo isto: o homem está constantemente fora de si mesmo, é projetando-se e perdendo-se fora de si que ele faz existir o homem e, por outro lado, é perseguindo fins transcendentes que ele pode existir; sendo o homem esta superação e não se apoderando dos objetos senão em referência a esta superação, ele vive no coração, no centro dessa superação (SARTRE, 1973, p. 27). O humanismo como deslocamento: É próprio da natureza da capacidade humana de observação só poder funcionar quando o homem se desvencilha de qualquer envolvimento e preocupação com o que está perto de si, e se retira a uma distância de tudo o que o rodeia. Quanto maior a distância entre o homem e o seu ambiente, o mundo ou a terra, mais ele pode observar e medir […] (ARENDT, 1999, p. 263). 2. Descrição do conteúdo do texto 3. Com quem o texto busca dialogar? Com os padres da Igreja; Identidade e diferença: Obra: estruturas imanentes (Plano do conteúdo e da expressão: figuratividade e tematicidade). Contexto social: Estruturas significantes (Plano da expressão: valoratividade). Tradição cultural: estrutura englobante (Plano da expressão: valoratividade). 2 Essa história mostra que a identidade é relacional. A identidade […] depende, para existir, de algo fora dela: a saber, de outra identidade, de uma identidade que ela não é, […] mas que, entretanto, fornece as condições para que ela exista. A identidade […] é, assim, marcada pela diferença (SILVA, 2000, p. 9). A construção da identidade: Uma das formas pelas quais as identidades estabelecem suas reivindicações é por meio do apelo a antecedentes históricos (SILVA, 2000, p. 11). Com frequência, a identidade envolve reivindicações essencialistas sobre quem pertence e quem não pertencem a um determinado grupo identitário, nas quis a identidade é vista como fixa e imutável (SILVA, 2000, p. 13). Identidade e representação: A representação inclui as práticas de significação e os sistemas simbólicos por meio dos quais os significados são produzidos, posicionando-nos como sujeito. É por meio dos significados produzidos pelas representações que damos sentido à nossa experiência e àquilo que somos. Podemos inclusive sugerir que esses sistemas simbólicos tornam possível àquilo que somos e aquilo no qual podemos nos tornar. A representação compreendida como processo cultural, estabelece identidades individuais e coletivas e os sistemas simbólicos bis quais ela se baseia fornecem possíveis respostas às questões: Quem sou? O que eu poderia ser? Quem eu quero ser? Os discursos e os sistemas de representação constroem os lugares a partir dos quais os indivíduos podem se posicionar e a partir dos quais podem falar (SILVA, 2000, p. 17). 4. Instrumentos de análise do discurso: Figurativo (figuratividade); Temático (tematicidade); Axiológico (valoratividade). 5. Os elementos figurativos que compõe a estrutura do discurso? O conhecimento dos árabes, dos “venerandos padres” e do homem geral; O choque entre culturas como lastro formador de um novo saber: cristão, árabe e o místico-oriental Li nos escritos dos Árabes, venerandos Padres, que, interrogado Abdala Sarraceno sobre qual fosse a seus olhos o espetáculo mais maravilhoso neste cenário do mundo, tinha respondido que nada via de mais admirável do que o homem. Com esta sentença concorda aquela famosa frase de Hermes: "Grande milagre, ó Asclépio, é o homem" (PICO DELLA MIRANDOLA, 1989, p. 49). Os limites do conhecimento comum acerca do homem: o estado da questão […] não me satisfaziam de todo as múltiplas razões que são aduzidas habitualmente por muitos a propósito da grandeza da natureza humana: ser o homem vínculo das criaturas, familiar com as superiores, soberano das inferiores; pela agudeza dos sentidos, pelo poder indagador da razão e pela luz do intelecto, ser intérprete da natureza; intermédio entre o tempo e a eternidade e, como dizem os Persas, cópula, portanto, himeneu do mundo e, segundo atestou David, em pouco inferior aos anjos. Grandes coisas estas, sem dúvida, mas não as mais importantes, isto é, não tais que consintam a reivindicação do privilégio de uma admiração ilimitada. Porque, de fato, não deveremos nós admirar mais os anjos e os beatíssimos coros celestes? (PICO DELLA MIRANDOLA, 1989, p. 49). 3 6. Quais os elementos figurativos do discurso? As imagens do Homem e sua integração ao mundo: o jardim das delícias HOMEM MUNDO AS POTENCIALIDADES DO HOMEM […] o espetáculo mais maravilhoso neste cenário do mundo (linha 2); […] ser o homem como vínculo das criaturas familiar com as superiores, soberano das inferiores (linha 6 e 7); […] o homem o mais feliz de todos os seres animados e dignos (linha 13 e 14); […] invejável não só pelas bestas, mas também pelos astros e até pelos espíritos supramundanos (linha 15); […] este contemplador do universo (linha 29); […] obra de natureza indefinida […] (linha 35); […], não constrangido por nenhuma limitação […] (linha 39 e 40); Não te fizemos celeste nem terreno, nem mortal nem imortal, árbitro e soberano, artífice de ti mesmo, (linhas 41 – 43). Já o Sumo Pai, Deus arquiteto, tinha construído segundo leis de arcana sabedoria este lugar do mundo como nós o vemos, augustíssimo templo da divindade (linhas 20 e 21); Mas, consumada a obra, o Artífice desejava que houvesse alguém capaz de compreender a razão de uma obra tão grande, que amasse a beleza e admirasse a sua grandeza (linhas 23 – 25). DEUS Sumo pai /Arquiteto / Ótimo artífice (Ens perfectissimum) […] árbitro e soberano, artífice de ti mesmo […] (linha 42); […] a fim de que tu […]te plasmasses e te informasses, na forma que tivesses seguramente escolhido (linhas 42 e 43); Poderás degenerar até aos seres que são as bestas […] (linha 43); […] regenerar-te até às realidades superiores que são divinas, por decisão do teu ânimo (linha 44); Se racionais, elevar-se-á a animal celeste (linha 50); Se intelectuais, será anjo e filho de Deus […] (linha 51); […] se, não contente com a sorte de nenhuma criatura, se recolher no centro da sua unidade, tornado espírito uno com Deus, na solitária caligem do Pai, aquele que foi posto sobre todas as coisas estará sobre todas as coisas (linhas 51 – 53). 4 7. Quais os elementos temáticos? Liberdade = > razão/trabalho => dignidade 8. Quais os elementos axiológicos? Trabalho como instrumento máximo de valorização das ações humanas; 9. Articulação do texto com o contexto cultural da Itália no século XV A valorização do trabalho em Leon Battista Alberti: Fatum e fortuna e o I libri della famiglia; Aprendi que o Destino (Fatum) não é nada mais do que o curso dos acontecimentos da vida dos homens, que transcorre segundo uma ordem própria. Compreendi também que a Fortuna é mais ágil para aqueles que no momento em que caem no rio possuem o auxílio de um pedaço de madeira ou diretamente um barco. Entendi que, ao contrário, aFortuna é dura para nós que caímos na corrente quando era necessário superar o ímpeto de uma onda com um nado contínuo. E, todavia, não se pode ignorar que nas coisas humanas vale muito a prudência e o engenho (ALBERTI ap. BIGNOTTO, 2001, p. 301). Dicevano gli Stoici l’uomo essere dalla natura constittuito nel mondo spetaculatore e operatore delle cose. Crisippo giudicava ogni cosa essere nata per servire all’uomo, e l’uomo per conservare compagnia e amistà fra gle uomini. Dalla quale sentenza Protagora, quell’altro antico filosofo, fu, quanto ad alcuni suol parere, non alieno, el quale affirmava l’uomo esse modo e misura di tutte le cose. Platone scrivendo ad Archita tarentino dice gli omini essere nati per cagione degli uomini, e parte di noi si debbe alla patria, parte a’ parenti, parte algi amici. Ma sarebbe lungo sequire in questa materia tutti e’ detti de’ filosafi antichi, e molto piú lungo sarebbe agiungnervi le molte sentenze de’ nostri passati teologi. Per ora qusti m’occorsono a mente, a’ quali, come vedi, tutti piace nell’uomo non ozio e cessazione, ma oeprazione e azoine (ALEBRTI, 1969, p. 158 – 159). Condenação à tirania e a exaltação da magnificência; O governo de Lorenzo de Medici, o Magnífico e a academia platônica de Marsílio Ficino; Platonismo e o corpus hermeticus: a valorização da filosofia essencialista. 10. Premissas gerais do texto, ou o posicionamento do autor em relação ao tema: conclusão O homem é apresentado como potência realizadora de si-mesmo; Negação dos aspectos dogmáticos do teocentrismo; Confirmação dos valores da cultura humanista; Afirmação dos valores seculares como via para a devotio moderna. BIBLIOGRAFIA: ALBERTI, Leon Battista. I libri della famiglia. Cura di Ruggiero Romano e Alberto Tenenti. Torino, It: Giulio Einaudi editore s. p. a., 1969. ______. Fatum e Fortuna. In: BOGNOTTO, Newton. Origens do republicanismo moderno. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001. ARENDT, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999. SILVA, Tomaz Tadeu da. Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000. SARTRE, Jean-Paul. O existencialismo é um humanismo. São Paulo: Abril Cultura, 1973.