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i © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Cardiologia no Internato Bases Teórico-Práticas ii © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. iii © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Bases Teórico-Práticas SILVIA G. LAGE Professora Livre-Docente da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo-FMUSP. Diretora da Unidade Clínica de Terapia Intensiva Geral do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Presidente da Comissão de Ensino do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP JOSÉ ANTONIO F. RAMIRES Professor Titular de Cardiologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo-FMUSP. Diretor Geral do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP Cardiologia no Internato São Paulo • Rio de Janeiro • Belo Horizonte iv © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. EDITORA ATHENEU São Paulo — Rua Jesuíno Pascoal, 30 Tels.: (11) 222-4199 • 220-9186 Fax: (11) 223-5513 E-mail: atheneu-sp@atheneu.com.br Rio de Janeiro — Rua Bambina, 74 Tel.: (21) 539-1295 Fax: (21) 538-1284 E-mail: atheneu@atheneu.com.br Belo Horizonte — Rua Domingos Vieira, 319 — Conj. 1.104 PLANEJAMENTO GRÁFICO/CAPA: Equipe Atheneu LAGE S.G, RAMIRES J.A.F. Cardiologia no Internato — Bases Teórico-Práticas © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte — 2001 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Lage, Silvia G. Cardiologia no internato: bases teórico-práticas/Silvia G. Lage, Jose Antonio F. Ramires. — São Paulo: Editora Atheneu, 2001. Vários coordenadores. 1. Cardiologia 2. Internos (Medicina) I. Ramires, José Antonio F. II. Título. CDD-616.12 01-0136 NLM-WG 18 Índices para catálogo sistemático: 1. Cardiologia: Medicina 616.12 v © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. AUGUSTO HIROSHI UCHIDA Médico Assistente do Serviço de Eletrocardiografia do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP CAIO MEDEIROS Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP CARLOS ALBERTO PASTORE Médico Chefe do Serviço de Eletrocardiografia do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP CARLOS EDUARDO ROCHITTE Médico Assistente da Seção de Ressonância Magnética da Coordenação de Diagnóstico por Imagem do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Pós-Graduando em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP CARLOS MANUEL DE ALMEIDA BRANDÃO Médico Assistente da Unidade Cirúrgica de Valvopatias do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Pós-Graduando da Disciplina de Cirurgia Torácica e Cardiovascular da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP CLÁUDIO LUIS LUCARELLI Diretor do Seviço de Radiologia da Coordenação de Diagnóstico por Imagem do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP EDUARDO A. SOSA Diretor da Unidade Clínica de Arritmia do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Professor Livre-Docente da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP Coordenadores vi © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. EULÓGIO EMÍLIO MARTINEZ FILHO Diretor do Serviço de Hemodinâmica do Instituto do Coração — HC-FMUSP FÁBIO BISCEGLI JATENE Diretor da Unidade Cirúrgica de Cirurgia Torácica do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Professor Associado do Departamento de Cardio-Pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP FLÁVIO TARASOUTCHI Médico Assistente da Unidade Clínica de Valvopatias do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo–FMUSP JEANE TSUTSUI Médica Assistente da Seção de Ecocardiografia do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Pós-Graduanda em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP JORGE SAFI JR. Pós-Graduando em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP JOSÉ AUGUSTO BARRETO FILHO Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Professor Adjunto de Medicina Interna da Universidade Federal de Sergipe — UFS JOSÉ CARLOS NICOLAU Diretor da Unidade Clínica de Coronariopatia Aguda do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Professor Livre-Docente pela FMURP/USP — Ribeirão Preto JOSÉ R. PARGA Médico Assistente da Seção de Ressonância Magnética da Coordenação de Diagnóstico por Imagem do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP JOSÉ SOARES JUNIOR Médico Chefe do Serviço de Radioisótopos do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP KIYOMI KATO UEZUMI Médica Supervisora do Serviço de Radiologia da Coordenação de Diagnóstico por Imagem do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Doutora em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP vii © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. LILIANE KOPEL Médica Assistente da Unidade Clínica de Terapia Intensiva Geral do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Doutora em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP LUCIANO MONTE ALEGRE FORLENZA Médico Assistente da Unidade Clínica de Emergência do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP LUIS F. AVILA Médico Assistente da Seção de Ressonância Magnética da Coordenação de Diagnóstico por Imagem do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP MARCELO RICARDO PAULISTA MARKUS Médico Assistente da Unidade Clínica de Ambulatório Geral do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP MARCELLO S. BARDUCO Médico Assistente da Unidade Clínica de Emergência do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP MARCELO PARK Médico Assistente da Unidade Clínica de Emergência do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Pós-Graduando em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP MÁRCIA CALDAS Médica Assistente da Seção de Ecocardiografia do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Pós-Graduanda em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo- FMUSP MAX GRINBERG Diretor da Unidade Clínica de Valvopatias do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Professor Livre-Docente pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP NANCY TOBIAS Médica Assistente do Serviço de Eletrocardiografia do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Doutora em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP PABLO MARIA ALBERTO POMERANTZEFF Diretor da Unidade Cirúrgica de Valvopatias do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Professor Associado do Departamento de Cardio-Pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP viii © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. PAULO ROGÉRIO SOARES Médico Assistente do Serviço de Hemodinâmica do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP PEDRO ALVES LEMOS NETO Médico Assistente do Serviço de Hemodinâmica do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP RICARDO TAVARES DE CARVALHO Médico Assistente da Unidade Clínica de Terapia Intensiva Geral do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP. Pós-Graduando em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — FMUSP ROBERTO ROCHA C.V. GIRALDEZ Médico Assistente da Unidade de Coronariopatia Aguda do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP ROGÉRIO BICUDO RAMOS Médico Preceptor da Cardiologia do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSP VITOR SÉRGIO KAWABATA Médico Assistente da Unidade Clínica de Emergência do Instituto do Coração (Incor) — HC-FMUSPix © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Dedicatória Às nossas famílias, Aos nossos professores e alunos, Aos nossos doentes. x © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. xi © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Introdução A semente deste livro começou a ser cultivada em 1983, quando assumimos a orientação dos internos que passavam pelo Instituto do Coração, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, em rodízio opcional de Cardiologia. O referido estágio, resultante de empenho, organização e competência, foi in- troduzido, a pedido dos alunos, no calendário da Faculdade de Medicina da Uni- versidade de São Paulo, estendendo-se a todos os estudantes do sexto ano. Na seqüência, o curso para os internos, com aulas teóricas e práticas, abran- gendo o cardiopata em estado crítico, só melhorou. A ampliação e excelência da infra-estrutura da Instituição e a qualidade dos professores foram fundamentais para o êxito de nosso projeto. Faltava a documentação escrita, passo sempre desejável, mas que só tem sen- tido quando representa algo consistente, necessário e útil. Novamente pudemos ser sensíveis à expectativa dos alunos, pois já contávamos com o amadurecimento suficiente para preencher essa lacuna. Não tivemos a pretensão de escrever um tratado de Cardiologia, mas um texto didático, abrangente e específico do programa de Internato em Cardiologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, pelo qual somos respon- sáveis. É importante que reformas pedagógicas e mudanças didáticas sejam implan- tadas para atualizar e aperfeiçoar o ensino. No entanto, não se deve esquecer a responsabilidade, dedicação, interesse e vontade de ensinar. Sem esses quesitos, nenhuma reforma tem efeito, nenhum projeto atinge seu objetivo e nenhum exem- plo positivo é transmitido às novas gerações. A finalidade deste trabalho é contribuir para uma formação sólida e preparar os alunos para a próxima fase, isto é, a residência médica e/ou a realidade pro- fissional. Esta publicação é uma nova semente a ser aperfeiçoada. Continuaremos aten- tos ao essencial e permaneceremos abertos a modificações pertinentes. São Paulo, Verão de 2001 Silvia Gelás Lage José Antonio F. Ramires xii © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. xiii © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Sumário PARTE I — BASES ANATÔMICAS 1 Bases Anatômicas, 3 Carlos Manuel de Almeida Brandão Fábio Biscegli Jatene PARTE II — ELETROCARDIOGRAFIA BÁSICA 2 Princípios Básicos do Eletrocardiograma, 17 Carlos Alberto Pastore Augusto H. Uchida Nancy Tobias PARTE III — DIAGNÓSTICOS POR IMAGEM 3 Ecocardiografia, 35 Caio Medeiros Márcia Caldas Jeane Tsutsui 4 Cineangiocardiografia, 57 Pedro Alves Lemos Neto Eulógio Emílio Martinez Filho 5 Radiologia e Tomografia Computadorizada, 85 Kiyomi Kato Uezumi Claudio Luiz Lucarelli Carlos E. Rochitte xiv © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. 6 Ressonância Magnética em Cardiologia, 105 Carlos E. Rochitte Luis F. Ávila José R. Parga 7 Medicina Nuclear, 111 José Soares Junior PARTE IV — PROCEDIMENTOS CARDIOVASCULARES À BEIRA DO LEITO 8 Monitorização Hemodinâmica, 121 Ricardo Tavares de Carvalho 9 Acesso Venoso Central e Acesso Arterial, 135 Liliane Kopel 10 Marca-passo na Emergência, 143 Vitor Sérgio Kawabata Marcello Simaro Barduco 11 Assistência Circulatória, 153 Carlos Manuel de Almeida Brandão Pablo Maria Alberto Pomerantzeff PARTE V — TEMAS CLÍNICOS 12 Insuficiência Cardíaca, 161 Ricardo Tavares de Carvalho 13 Choque Cardiogênico, 175 Liliane Kopel 14 Edema Agudo dos Pulmões, 185 Marcello Ricardo Paulista Markus Marcelo Park 15 Síndromes Coronárias Agudas: I — Angina Instável, 195 Roberto Rocha C. V. Giraldez Marcello S. Barducco José Carlos Nicolau xv © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. 16 Síndromes Coronárias Agudas: II — Infarto Agudo do Miocárdio, 215 Paulo Rogério Soares José Augusto Barreto Filho 17 Crise Hipertensiva, 245 Jorge Safi Jr. Luciano Monte Alegre Forlenza 18 Emergências em Valvopatia, 261 Flávio Tarasoutchi Max Grinberg 19 Tromboembolismo Pulmonar, 275 Vitor Sergio Kawabata Liliane Kopel 20 Dissecção da Aorta, 293 Luciano Monte Alegre Forlenza Jorge Safi Jr. 21 Arritmias: Diagnóstico e Tratamento na Emergência, 309 Augusto H. Uchida Vitor Kawabata Eduardo A. Sosa 22 Testes de Avaliação, 333 Rogério Bicudo Ramos Augusto Hiroshi Uchida Índice Remissivo, 355 xvi © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Capítulo 2 • 15 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. PARTE 2 Eletrocardiografia Básica © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. 16 • Capítulo 2 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Capítulo 2 • 17 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Princípios Básicos do Eletrocardiograma Carlos Alberto Pastore Augusto H. Uchida Nancy Tobias Capítulo 2 CONCEITOS BÁSICOS Para interpretar o ECG é preciso conhecer como se processa a forma- ção e a condução da atividade elétrica cardíaca. FORMAÇÃO DA ATIVIDADE ELÉTRICA CARDÍACA Existem três grupos de células marca-passo no coração que podem comandar naturalmente o ritmo car- díaco (Fig. 2.1): 1. Nó sinusal (NSA). Geralmen- te é o grupo de células marca-passo que comanda o ritmo cardíaco pois impõe a maior freqüência (60 a 100bpm). 2. Nó atrioventricular (NAV). É capaz de formar impulsos com fre- qüência em torno de 50bpm. 3. His-Purkinje. É capaz de formar impulsos com freqüência em torno de 35bpm. Fig. 2.1 — Os três grupos de células marca-passo do coração e suas freqüências de disparo. NSA 80bpm NAV 50bpm His-Purkinje 35bpm 18 • Capítulo 2 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. CONDUÇÃO DA ATIVIDADE ELÉTRICA CARDÍACA Os impulsos gerados pelo marca- passo dominante, em geral o NSA, caminham pelo coração por vias de condução preferencial, permitindo uma rápida ativação elétrica de todo o miocárdio. A seqüência de ativação do cora- ção pode ser didaticamente dividida em duas partes (Fig. 2.2): 1. ATIVAÇÃO ATRIAL. Corres- ponde à onda P do ECG. 2. ATIVAÇÃO VENTRICULAR. Corresponde ao complexo QRS do ECG. ATIVAÇÃO ATRIAL O NSA fica localizado na junção da veia cava superior com o átrio di- reito. Como é ele o marca-passo que gera impulsos com a maior freqüên- cia, geralmente temos como ritmo predominante o ritmo sinusal. Os impulsos gerados pelo NSA ativam os átrios por vias preferen- ciais (feixes internodais) até atingirem o NAV. Como o NSA fica localizado à direita, a seqüência de ativação atrial fica assim configurada: 1o) Ativação atrial direita. Corres- ponde à primeira porção da onda P. 2o) Ativação atrial esquerda. Cor- responde à segunda porção da onda P. Após atingir o NAV, o impulso elétrico sofre um retardo fisiológico na condução denominado condução decremental e só então alcança o feixe de His. ATIVAÇÃO VENTRICULAR A onda de ativação elétrica passa pelo feixe de His, localizado no septo interventricular, e se espalha pelos seus dois ramos principais (direito e esquerdo). O ramo esquerdo ainda se reparte em três divisões (divisão ântero-superior, divisão anteromedial e divisão póstero-inferior); que tam- bém participam do sistema preferen- cial de condução. A ativação ventri- cular pelo sistema de condução produz um QRS estreito (< 0,12s). Fig. 2.2 — Ciclo elétrico do coração, ilustrando as seqüências de ativação dos átrios e dos ventrículos. Onda T Recuperação ventricular Onda U Avaliação ventricular tardia Início da ativação elétrica Disparo do NSA Onda P Ativação atrial NAV-HIS Retardo fisiológico da condução Ativação septal Ativação das paredeslivres Ativação das porções basais Capítulo 2 • 19 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. A seqüência de ativação ventricu- lar pode ser didaticamente dividida em três partes: 1a) Ativação do septo interventri- cular. Corresponde à onda Q do com- plexo QRS. 2a) Ativação das paredes livres dos ventrículos. Corresponde à onda R do complexo QRS. 3a) Ativação das porções basais dos ventrículos. Corresponde à onda S do complexo QRS. ECG é, portanto, o registro da se- qüência de ativação elétrica do co- ração. Esquematicamente temos (Tabela 2.1): TESTE SEUS CONHECIMENTOS 1) Quais as células que mantém a freqüência cardíaca entre 60- 100bpm? 2) Onde se dá o retardo fisiológi- co da condução elétrica dentro do sistema de condução? 3) O que corresponde no ECG ao fenômeno da ativação vetricular? 4) Embora a onda P seja monofá- sica, quais regiões anatômicas corres- pondem a suas 1a e 2a posições? 5) A presença da onda T repre- senta que momento da ativação elé- trica do coração? REGISTRO DO ECG DERIVAÇÕES DO ECG Entendam as der ivações do ECG como pontos de vista diferen- tes. Chama-se derivação à linha que une dois eletrodos; na práti- ca, uma derivação corresponde ao registro obtido por um eletrodo posicionado em qualquer ponto do corpo. Normalmente os eletrodos são colocados na superfície do tórax e dos membros, no entanto, existem situações onde se usam eletrodos no interior do esôfago (derivação eso- fágica), no interior do coração (de- rivação endocárdica) ou na super- fície do coração (derivação epicár- dica). Derivações Unipolares e Bipolares Uma derivação é dita unipolar quando um eletrodo explorador faz o registro da atividade elétrica cardí- aca (ex.: V1 a V6 e aVR,aVL,aVF). As derivações aVR, aVL e aVF são de- nominadas derivações unipolares aumentadas dos membros. Derivação bipolar é aquela em que o registro se faz através de dois eletrodos situados a mesma distância do coração (ex.: DI, DII e DIII). Tabela 2.1 Seqüência da Ativação do Coração e o ECG Seqüência de Ativação do Coração Correspondência Eletrocardiográfica 1. Ativação atrial direita Onda P (1a porção) Ativação atrial 2. Ativação atrial esquerda Onda P (2a porção) NAV — HIS Intervalo PR 1. Ativação septal Onda Q Ativação ventricular 2. Ativação das paredes livres Onda R 3. Ativação das porções basais Onda S 20 • Capítulo 2 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Plano Frontal e Plano Horizontal Para o registro do ECG padrão usamos 12 derivações. Seis deriva- ções cobrem o plano frontal ou ver- tical (aVR, aVL,aVF, DI, DII e DIII) e Tabela 2.2 Detalhes da Ativação do Coração SE VOCÊ QUISER SABER MAIS O POTENCIAL DE AÇÃO (PA). O PA CARACTERIZA A SÍSTOLE ELÉTRICA DO CORAÇÃO, E É CLASSIFICADO EM DOIS TIPOS : TIPO RESPOSTA RÁPIDA. Possui cinco fases, característico das fibras de Purkinje. FASE 0. É a fase de ascensão do PA. Gerada devido a um grande influxo de Na por abertura de canais voltagem-dependentes. FASE 1. É a fase inicial da repolarização rápida. Resulta em uma espícula devido ao término brusco da fase 0. Há um efluxo transitório de K. FASE 2. Fase de platô. Momento onde o efluxo de K contrabalança o influxo de Na e Ca. FASE 3 . É a fase terminal da repolarização rápida. Promovida por efluxo de K tempo- dependente. FASE 4. Fase de repouso (diástole elétrica), onde as células permanecem com o potencial de repouso estável até serem ativadas por um impulso propagado. TIPO RESPOSTA LENTA. Característico das células marca-passo do coração. Exemplo: NSA. FASE O. Fase de ascensão mediada por um influxo lento de Ca e Na. FASE 4. Em tipos celulares tais como no NSA, NAV e His-Purkinje, o potencial de repouso não se mantém estável. Há uma despolarização gradual, fenômeno denominado despolarização diastólica da fase 4, o que confere a propriedade de automatismo. Fig. 2.3 — As derivações do plano frontal e horizontal. Capítulo 2 • 21 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. seis cobrem o plano horizontal ou precordial (V1 a V6), numa tentati- va de registrar a atividade elétrica cardíaca por vários ângulos diferen- tes. Eventualmente, são utilizadas derivações precordiais adicionais para uma melhor visualização da parede posterior do coração (V7 e V8) e do ventrículo direito (V3R e V4R). Posicionamento dos Eletrodos Para a obtenção do ECG, os ele- trodos devem ser posicionados segun- do convenção universal (Tabela 2.3): Outras variações são ainda descri- tas: V1 a V3............................. PA- REDE ÂNTERO-SEPTAL V4 a V6............................. PA- REDE ANTEROLATERAL V1 a V6............................ PARE- DE ANTERIOR EXTENSA D1 e aVL.......................... PARE- DE LATERAL Tabela 2.3 Derivações Eletrocardiográficas Derivação Posicionamento do(s) eletrodo(s) DI MSD/MSE DII MSD/MIE DIII MSE/MIE AVR MSD AVL MSE AVF MIE V1 4o EIC / BORDA ESTERNAL DIREITA V2 4o EIC / BORDA ESTERNAL ESQUERDA V3 5o EICE / ENTRE V2 e V4 (V3R - 5o EICD) V4 5o EICE / LINHA HEMICLAVICULAR ESQUERDA (V4R - 5o EICD – LHCD) V5 5o EICE / LINHA AXILAR ANTERIOR V6 5o EICE / LINHA AXILAR MÉDIA V7 5o EICE / LINHA AXILAR POSTERIOR V8 5o EICE / LINHA HEMICLAVICULAR POSTERIOR Localização topográfica das expressões eletrocardiográficas. Todas as paredes do coração têm as suas derivações correspondentes: DERIVAÇÕES PAREDE CORRESPONDENTE V1 a V4 ANTERIOR DII, DIII e Avf INFERIOR ou DIAFRAGMÁTICA V5,V6 e DI,Avl LATERAL V7,V8 ou IMAGEM EM ESPELHO EM V1-V2 DORSAL OU POSTERIOR V3R, V4R VENTRÍCULO DIREITO 22 • Capítulo 2 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. A PADRONIZAÇÃO DO REGISTRO ELETROCARDIOGRÁFICO (FIG. 2.4) A calibração é padronizada para 1mV = 10mm (calibração N). A velocidade do papel também é padrão: 25mm/s. Com esta padronização, a menor unidade de área (menor quadrado) vale 1mm de lado vertical e 0,04s de lado horizontal (Fig. 2.5). CONFIRA SEUS CONHECIMENTOS 1) O que você entendeu por deri- vação? Dê exemplo. 2) O que são derivações uniformes e bipolares? 3) Quais as derivações que enxer- gam a parede inferior e a parede la- teral? 4) Qual a duração do menor qua- drado do papel do ECG? 5) Qual a voltagem correspondente a cinco quadrados pequenos no ECG? DICAS IMPORTANTES • Deflexões positivas indicam que o vetor de ativação caminha no sen- tido do eletrodo. • Deflexões negativas indicam que o vetor se afasta do eletrodo. ANÁLISE DO ECG. CRITÉRIOS DE NORMALIDADE Conselho: seja sistemático na aná- lise do ECG para não esquecer qual- quer detalhe. Sugestão para a seqüência de aná- lise: (Fig. 2.6) RITMO e FREQÜÊNCIA. ONDA P. Fig. 2.5 — Os valores das unidades. Calibração N. Fig. 2.4 — O registro da calibração. Capítulo 2 • 23 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. INTERVALO P-R. COMPLEXO QRS. SEGMENTO S-T. ONDA T. INTERVALO Q-T. CONCLUSÃO. RITMO E FREQÜÊNCIA O ritmo normal é o sinusal, carac- terizado por onda P arredondada e monofásica; sendo positiva em DI,DII e aVF e negativa em aVR. A freqüên- cia normal varia de 60 a 100bpm. (Temos ritmo sinusal bradicárdico quando a freqüência está abaixo dos 60bpm e ritmo sinusal taquicárdico quando a freqüência ultrapassa os 100bpm). Existem duas regras práticas para obtenção da freqüência (Fig. 2.7). REGRA DOS 1.500 Para obter a freqüência através da regra dos 1.500, basta dividir 1.500 pelo número de quadrados MENO- RES (unidade menor). ONDA P • Eixo (orientação): no plano fron- tal o eixo de P fica entre 0º-90o (onda Fig. 2.6 — Deflexões do eletrocardiograma. Fig. 2.7 — Regra dos 300 — para obter a freqüência através da regra dos 300, basta dividir 300 pelo número de cinco quadradosmenores, que perfazem 0,20s. 1 segundo .20 seg R P J T U Q S Segmento S-T QRS interno Q-T internoP-R interno Segmento P-R 1 2 3 4 55 mm 300 1 2 3 4 5 2 3 4 5 6 1 segundo 300 150 100 75 60 50 1 0.20 seg 24 • Capítulo 2 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. P positiva em DI, DII e aVFe negati- va em aVR), considerado o vetor normal dirigido para baixo e para a esquerda. No plano horizontal, o vetor se dirige para frente (onda P positi- va em V1). Em V1, a onda P pode ser difásica tipo plus-minus. Quan- do isso ocorre a fase positiva deve ser maior do que a negativa. • Amplitude: a maior amplitude não deve exceder 2,5mm (0,25mV). • Morfologia: arredondada e mo- nofásica, podendo ser difásica em V1. • Duração: duração máxima é de 0,10s. INTERVALO PR É medido do início da onda P até o início do QRS. Varia de 0,12s a 0,20s. Representa o tempo que o impulso gerado pelo NSA levou para atingir as fibras de Purkinje. COMPLEXO QRS • Eixo (orientação): a faixa de va- riação do eixo do QRS no plano fron- tal é de –30o a +120o. No plano ho- rizontal, o vetor médio do QRS é orientado para trás (Fig. 2.8). • Amplitude: diz-se que existe baixa voltagem quando não se regis- tra qualquer deflexão maior do que 5mm em derivação bipolar ou se a maior deflexão no plano horizontal não ultrapassa 8mm. Alta voltagem é definida quando se registram on- das R ou S > 20mm nas derivações frontais ou, no plano horizontal, ondas S (V1/V2) ou ondas R (V5/V6) > 30mm. • Morfologia: varia de acordo com a derivação e a posição elétrica do coração. Onda Q. É a primeira deflexão negativa do QRS e representa a ati- vação septal. Onda Q patológica é definida quando exceder 25% do tamanho de R e duração > 0,04s. Em algumas derivações, estes limites podem ser ultrapassados (aVR, aVL e D3). A presença de onda Q em V1, V2 e V3 deve ser sempre considera- da anormal. A ausência de onda q em V5 e V6 também é anormal (Fig. 2.9). Onda R. É a primeira deflexão positiva do QRS e representa funda- mentalmente a ativação das paredes Fig. 2.8 — Determinação rápida do eixo elétrico do coração. Capítulo 2 • 25 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. livres. Normalmente deve progredir de amplitude de V1 para V6. Onda S. É a segunda deflexão negativa do complexo QRS e repre- senta a ativação das porções basais dos ventrículos. Normalmente deve diminuir de amplitude de V1 para V6. • Duração: o complexo QRS deve ter duração máxima de 0,12s. Deflexão intrinsecóide é o tempo de ativação ventricular. Medido do iní- cio do QRS até o vértice da onda R, deve ser no máximo de 0,045s. O aumento da deflexão intrinsecóide pode ocorrer por: hipertrofia ventri- cular, bloqueio de ramo, bloqueio divisional ou infarto agudo do mio- cárdio (Fig. 2.10). SEGMENTO ST Começa no ponto J (término do Fig. 2.9 — Onda Q patológica. Fig. 2.10 — Complexos qRs do plano horizontal e suas respectivas derivações. Q > 0,04s Q > 1/ 4 R ou R rS qR(s) V 1 V 2 V 3 V 4 V 5 V 6 1 2 3 4 5 6 26 • Capítulo 2 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. QRS) e termina na porção ascendente da onda T. Normalmente a primeira porção do segmento ST é isoelétrica. Desníveis do segmento ST podem ocorrer por múltiplas causas, sejam elas primárias (corrente de lesão do IAM) ou secundárias (hipertrofias, bloqueios de ramo etc.). ONDA T Sua orientação segue o vetor mé- dio do QRS. Tem morfologia tipica- mente assimétrica, com a porção ini- cial mais lenta. Não deve exceder 5mm nas derivações frontais ou 10mm nas precordiais. Sua polari- dade pode ser muito variável, sen- do obrigatoriamente positiva em V5 e V6 e obrigatoriamente negativa em aVR. INTERVALO QT É medido do início do QRS até o final da onda T e representa o tem- po de ativação e recuperação do mio- cárdio ventricular. O QT varia com a idade, sexo e muito com a freqüên- cia cardíaca, portanto, deve ser cor- rigido através da fórmula de Bazzet: QTcorrigido QTmedido RR = (O limite superior para homens fica em torno de 0,425s e para mu- lheres em torno de 0,440s). Dica: o QT é mais bem medido em aVL, pois a onda U é perpendicular a esta derivação. Obs.: a onda U é uma deflexão pequena após a onda T e segue a sua polaridade. Parece corresponder a repolarização dos músculos papilares. Onda U oposta à onda T é sempre sinal de patologia. Ocorre em presen- ça de hipertrofia ventricular, bloqueio de ramo, insuficiência coronária e distúrbios metabólicos ou hidroele- trolíticos. DIAGNÓSTICO ELETROCARDIOGRÁFICO DAS PRINCIPAIS ALTERAÇÕES SOBRECARGA Os critérios para o diagnóstico de sobrecarga ventricular seguem na seqüência: Para Diagnóstico de SVE Escore de Romhilt-Estes para SVE 1. R ou S no plano frontal > 20mm 3 pontos S (V1ouV2) ou R (V5/V6) > 30mm 2. Padrão Strain (V5/V6): infra ST com inversão da onda T. (Se usa digital: 1 ponto) 3. SAE 1. 3 pontos 4. Desvio do eixo > — 30o 2 pontos 5. Duração do QRS > 0,09s 1 ponto 6. Deflexão intrinsecóide > 0,05s 1 ponto SVE = 5 pontos. Possível SVE = 4 pontos Critério de SOKOLOW-LYON para SVE S (V1) + R (V6) > 35mm Critério de CORNELL para SVE R (aVL) + S (V3) > 28mm (ho- mem) ou > 20mm (mulher) Para Diagnóstico de SVD Critério de SOKOLOW-LYON para SVD R (V1) + S (V 6) > 11mm Capítulo 2 • 27 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Para Diagnóstico de Sobrecarga Biventricular • SVE com desvio do eixo para direita. • SVE com R amplas em V1 e V2. • onda s em V1 com S em V2 • SAE com critérios de SVD • Complexos RS em V2/V3/V4 (Si- nal de Katz-Wachtel). DISTÚRBIOS DA CONDUÇÃO INTRAVENTRICULAR BLOQUEIOS COMPLETOS DE RAMO Bloqueio de ramo ocorre quando o estímulo elétrico sofre um retardo ou é impedido de prosseguir através de um dos ramos do feixe de His. A ativação ventricular fica retardada em conseqüência da ativação lenta (célula a célula) do ventrículo com o ramo bloqueado. A manifestação eletrocar- diográfica desse retardo da ativação é o alargamento do QRS. Existem várias causas para os blo- queios de ramo: fibrose degenerativa senil, insuficiência coronária, cardio- patia chagásica, cardiopatia hiperten- siva, cardiopatia valvar (principalmen- te aórtica), malformação cardíaca congênita, sífilis, embolia pulmonar, trauma cirúrgico, uremia, hipercale- mia, intoxicações (digital, quinidina, procainamida), entre outras. Dica: o diagnóstico de bloqueio completo de ramo é feito nas deriva- ções precordiais (V1 a V 6). Duas condições caracterizam o diagnóstico de bloqueio completo de ramo (direito ou esquerdo): • QRS alargado (> 0,12s) • Onda T oposta ao retardo do QRS Distúrbio da Condução Intraven- tricular Resumo Eletrocardiográfico: BRE — Acentuação do ECG Normal (V1 a V 6) Bloqueio do Ramo — QRS alargado na porção média Esquerdo — QRS predominantemente negativo em V1 BRD — Inversão do ECG Normal (V1 a V6) Bloqueio do Ramo Direito — QRS alar- gado na porção final — QRS predo- minantemente positivo em V1 Bloqueios Divisionais O ramo esquerdo se subdivide em três divisões (ântero-superior, ante- Tabela 2.4 Principais Critérios para o Diagnóstico das Sobrecargas SOBRECARGA ATRIAL ESQUERDA (SAE) Onda P bífida. Duração > 0,12s. Índice de Morris. Onda P difásica em V1 com componente negativo > positivo (> 0,04mm/s) SOBRECARGA ATRIAL DIREITA (SAD) Onda P ponteaguda. Amplitude > 2,5mm. SOBRECARGA VENTRICULAR ESQUERDA Romhilt-Estes. Escore > 5 pontos. (SVE) Cornell . Homem > 28mm. Mulher > 20mm. Sokolow-Lyon > 35mm. SOBRECARGA VENTRICULAR DIREITA (SVD) Desvio do eixo para direita qR em V1 Relação R/S > 1 em V1 RelaçãoR/S < 1 em V5 Sokolow-Lyon > 11mm. 28 • Capítulo 2 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. romedial e póstero-inferior); já o ramo direito apresenta três subdivisões nascidas em torno do músculo papilar anterior direito, onde a rede de Purkinje é muito abundante, o que impossibilita a individualização ele- trocardiográfica do bloqueio de uma destas três subdivisões direitas. Bloqueios Divisionais do Ramo Esquer- do — Fundamentos do Diagnóstico: BDAS — Eixo do QRS além de –30o Bloqueio Divisional Ântero-Superior — (S cresce de D2 para D3) BDAM — Eixo do QRS anteriorizado Bloqueio Divisional Anteromedial — (R amplas em V1/V2) BDPI — Eixo do QRS além de +120o Bloqueio Divisional Póstero-Inferior — (R cresce de D2 para D3) Dicas: • Para o diagnóstico de BDAS e BDPI olhe para o plano frontal. • Para o diagnóstico de BDAM olhe para V1 e V2. BDAS Este forte desvio do eixo para a esquerda comporta vários diagnósti- cos diferenciais: SVE, BRE, desvio posicional do coração (brevilíneos, enfisema, gravidez, ascite), infarto inferior, síndrome de Wolff-Parkin- son-White, hiperpotassemia e estimu- lação cardíaca artificial. São sinais acessórios do BDAS: • ausência de onda q e presença de onda S em V5 e V6 (precordiais esquerdas). • QRS em aVR e aVL deve termi- nar em uma onda R. • O pico da onda R em aVR re- tardado em relação ao pico da onda R de aVL. Significado clínico do BDAS. Tal distúrbio da condução pode estar presente em corações normais anatômicos e em uma série de pato- logias: insuficiência coronária, cardipatia hipertensiva, cardiopatia chagásica, cardiopatias valvares (prin- cipalmente aórtica), malformações cardíacas congênitas (coartação aórtica, estenose aórtica, atresia tricúspide, defeitos septais). BDAM Para diagnosticar esta entidade é obrigatório afastar as outras condições que produzem o mesmo aspecto eletrocardiográfico (R amplas em V1 e V2): • Sobrecarga ventricular direita (SVD) → o desvio do eixo para di- reita e os critérios de SVD excluem o diagnóstico de BDAM. • Infarto dorsal → infarto dorsal isolado é muito raro; geralmente é acompanhado de infarto inferior. Se houver área eletricamente inativa na parede inferior (D2,D3 e aVF), não se pode fechar o diagnóstico de BDAM. • Wolff-Parkinson-White → pre- sença de PR curto e onda delta in- dicando via anômala localizada à esquerda. • Hipertrofia septal seletiva (hi- pertrofia septal assimétrica) → pre- sença de ondas Q amplas na presença de SVE. Dicas: • BDAM isolado é muito raro e frequentemente se associa ao BDAS e/ou ao BRD. • A onda R obrigatoriamente cres- ce de V1 para V2. • BDAM é um diagnóstico de ex- clusão. BDPI Seu diagnóstico é baseado no gran- de desvio do eixo para direita. Pode Capítulo 2 • 29 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. ser presumido se podemos excluir SVD. Enquanto a divisão ântero-su- perior tem irrigação única da descen- dente anterior, a divisão póstero-in- ferior tem irrigação dupla da descendente anterior e da coronária direita. Portanto, é preciso uma isque- mia muito extensa para causar um BDPI. O ECG NO IAM: DIAGNÓSTICO TOPOGRÁFICO, EVOLUTIVO E DIFERENCIAL IMPORTANTE → o diagnóstico presuntivo de infarto agudo do mio- cárdio é feito baseado num tripé diag- nóstico: 1. DOR TORÁCICA TÍPICA PRO- LONGADA (> 30 minutos). 2. ECG COM SUPRADESNIVE- LAMENTO DO ST (em duas deriva- ções contíguas). 3. ELEVAÇÃO DE ENZIMAS CARDÍACAS (com curva caracterís- tica). O diagnóstico de IAM é feito quan- do temos duas condições antes rela- cionadas! Existe uma regra mneumônica para caracterizar as alterações clássicas da fase aguda do IAM: é a regra dos três Is. Infarto: cuja expressão eletrocar- diográfica é a onda Q. Infarto é re- sultado da necrose isquêmica do miocárdio. Portanto, significa que houve lesão miocárdica irreversível devido ao tempo prolongado de is- quemia. Injúria: representada pelo supra- desnivelamento do segmento ST. A corrente de lesão ou SUPRA de ST representa uma área de miocárdio em risco. Existe uma lesão isquêmica porém, reversível se houver alguma intervenção terapêutica rápida. Isquemia: manifestação no ECG pe- las alterações da onda T. Significa que existem áreas de miocárdio com so- frimento isquêmico, porém, sem evi- dência de lesão. DIAGNÓSTICO TOPOGRÁFICO DO IAM Do ponto de vista prático, quan- do conseguimos localizar a parede do IAM consideramos como IAM Q (an- tigo IAM transmural). Quando não conseguimos definir a parede do IAM temos o IAM NÃO Q (antigo IAM subendocárdico). Dicas importantes: • SUPRA de ST localiza a pare- de do IAM, o INFRA de ST não! • Existem várias causas de SUPRA ST além de IAM! • Cuidado com as alterações re- cíprocas! INFRA de ST em V1 e V2 pode ser imagem em espelho de um SUPRA de ST de V7 e V8. • Localizando o infarto. A locali- zação do infarto é baseada na presen- ça de ondas Q patológicas ou do SUPRA de ST se estamos na fase aguda do IAM. Localizando a pare- de infartada podemos até inferir a coronária relacionada ao infarto (Ta- bela 2.5). DIAGNÓSTICO EVOLUTIVO Esta é a seqüência de eventos ele- trocardiográficos que se seguem após a oclusão de uma artéria coronária: 1) Ondas T apiculadas (onda T hiperaguda). Ondas T amplas, posi- tivas, pontiagudas e de base simétrica ocorrem nos minutos iniciais de isquemia miocárdica. 2) Supradesnivelamento do seg- mento ST (corrente de lesão). A ele- vação do segmento ST ocorre após 20 minutos de isquemia miocárdica transmural contínua. Morfologicamen- te, o supradesnivelamento tende a ser convexo. 30 • Capítulo 2 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. 3) Ondas Q patológicas ou di- minuição das ondas R. O apareci- mento de ondas Q patológicas e a amputação das ondas R vão aconte- cer após horas de isquemia contínua. 4) Inversão de onda T e normali- zação do segmento ST. O retorno do segmento ST à linha de base e a onda T negativa, profunda e simétrica ocor- rem após alguns dias da oclusão coronária aguda. A persistência do supradesnivelamento do segmento ST após 6 semanas do evento agudo sugere a presença de aneurisma ventricular. 5) Positivação da onda T. Uma eventual onda T positiva poderá surgir meses após o evento agudo. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Existem vários quadros eletrocar- diográficos que podem simular um infarto do miocárdio. Outras condições clínicas podem cursar com ondas Q ou complexos QS: • Tromboembolismo pulmonar com cor pulmonale agudo; • Cardiomiopatia hipertrófica; • Deformidades torácicas; • Distrofias musculares; • Tumores cardíacos primários; • Grandes sobrecargas atriais di- reitas (inversão da ativação septal por predomínio das forças do septo di- reito). Simulam infarto ântero-septal; • Grandes sobrecargas atriais es- querdas. Simulam infartos laterais; • Síndrome de Wolff-Parkinson- White; • Obesos, brevilíneos ou pacien- tes com cúpula diafragmática eleva- da (grávidas, ascite, tumores abdomi- nais). Outras condições clínicas que podem cursar com supradesnivela- mento do segmento ST: • Pericardite; • Bloqueio do ramo esquerdo; • Sobrecarga ventricular esquerda; • Repolarização precoce; • Wolff-Parkinson-White; • Estimulação cardíaca artificial; • Hipotermia. Outras condições clínicas que podem cursar com alterações do seg- mento ST e da onda T simulando insuficiência coronária: • Distúrbios da condução intra- ventricular; • Tromboembolismo pulmonar; • Sobrecargas ventriculares; • Pericardite; • Miocardite; • Cardiomiopatias; • Deformidades torácicas; • Distúrbios metabólicos: mixe- dema; Tabela 2.5 Localização do Infarto do Miocárdio e Coronárias Relacionadas IAM ECG (SUPRA ST) Coronária Relacionada ANTERIORV1 a V4 DA 1/3 médio ANTERIOR EXTENSO V1 a V6 DA 1/3 proximal INFERIOR ou DIAFRAGMÁTICO DII,DIII, aVF CD ou CX LATERAL V5, V6 ou DI, aVL Dg , ME ou Dglis DORSAL ou POSTERIOR V7, V8 (ou infra ST V1,V2) CD ou CX VD V3R e V4R ou V1 isolado CD ou CX Capítulo 2 • 31 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. • Distúrbios hidroeletrolíticos; • Hipertensão intracraniana; • Gravidez; • Obesidade; • Hipotermia; • Uso de digital; • Uso de antiarrítmicos; • Prolapso valvar mitral; • Dextrocardia; • Troca de eletrodos. BIBLIOGRAFIA 1. Semiologia Cardiologia Não-inva- siva. Del Nero Junior e cols. Epume, 1979. 2. Tratado de Eletrocardiografia Clíni- ca. A. Bayes de Luna; Editorial Ci- entífico-Médica, 1988. 3. Revista da Sociedade de Cardiolo- gia do Estado de São Paulo, volume 9, no 3, Maio/Junho, 1999. 32 • Capítulo 2 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Capítulo 3 • 33 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. PARTE 3 Diagnósticos por Imagem © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. 34 • Capítulo 3 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Capítulo 3 • 35 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Ecocardiografia Caio Medeiros Márcia Caldas Jeane Tsutsui Capítulo 3 A ecodopplercardiografia é, atual- mente, o método diagnóstico por imagem mais utilizado na cardiologia por ser seguro, não-invasivo, com baixo custo e capaz de avaliar de maneira acurada uma ampla variedade de cardiopatias. A obtenção das ima- gens se faz pela utilização do ultra- som (sons de alta freqüência, inaudíveis ao ouvido humano) que são emitidos por um cristal piezo- elétrico (localizado em um transdu- tor) e refletidos pela superfície que separa dois meios de densidade acús- tica diferente (interface). Essas ondas refletidas voltam ao transdutor e são transformadas em imagens. A distân- cia entre o transdutor e as diferen- tes interfaces é calculada automatica- mente pelo equipamento a partir do tempo entre a emissão e a recepção da onda ultra-sonora, considerando-se a velocidade de propagação do ultra-som de 1.540m/s nos meios biológicos como sendo uma constante. Rotineiramente, para a cardiologia, utilizam-se freqüências de 1,8 a 10MHz, sendo características das maiores freqüências a maior resolu- ção e menor penetração (mais adequa- das para o estudo de crianças), e das menores, a menor resolução e maior penetração (mais adequadas para adultos por permitir a análise de estruturas mais profundas). Três modalidades de estudos são geralmente realizadas: 1) Modo M ou unidimensional; 2) bidimensional, e 3) Doppler. A obtenção das imagens se faz pela via transtorácica ou pela via transesofágica, descritas a seguir. ECOCARDIOGRAFIA UNIDIMENSIONAL OU MODO M As imagens são geradas a partir de um único feixe estreito de ultra-som, direcionando-se o transdutor, geral- mente posicionado no bordo paraes- ternal esquerdo, para cima e para baixo, para a direita e para a esquer- da obtendo-se, assim, as diferentes estruturas cardíacas. Esta modalida- de de ultra-sonografia foi a primeira a ser utilizada na cardiologia. Pelo 36 • Capítulo 3 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. fato de fornecer apenas as imagens que estão alinhadas nesse feixe es- treito de ultra-som e pela dificulda- de de avaliar certas regiões do cora- ção (ápex, coração direito e arco aórtico), seu uso hoje está limitado para a obtenção de medidas dos di- âmetros das cavidades, espessura das paredes e análise temporal da motilidade valvar (Fig. 3.1). ECOCARDIOGRAFIA BIDIMENSIONAL Introduzida na prática há cerca de duas décadas, essa modalidade de imagem veio solucionar algumas li- mitações do modo M, contribuindo para a expansão da utilização da eco- cardiografia como método diagnós- tico. As imagens são obtidas a partir de múltiplos feixes de ultra-som existen- tes em um plano de corte. O coração é reconstruído em duas dimensões, podendo-se posicionar o transdutor em múltiplas janelas (para-esternal, apical, subcostal) e obter cortes di- ferentes de acordo com a orientação do plano de corte (Fig. 3.2), o que permite a reconstrução imaginária tridimensional do coração. Isso pos- sibilita a análise mais acurada da anatomia cardíaca, motilidade das paredes e valvar e anormalidades como a presença de massas intra- cavitárias (vegetações, trombos e tu- mores) e sua relação com as estrutu- ras vizinhas. Assim, colocando-se o transdutor no terceiro ou quarto espaço intercostal esquerdo, bem próximo ao esterno, com o plano de corte orientado da base ao ápice do coração, obtemos o corte longitudi- nal paraesternal esquerdo, útil na avaliação do átrio esquerdo, valva mitral, ventrículo esquerdo, via de saída do ventrículo esquerdo, valva aórtica e raiz da aorta. Pode-se ori- Fig. 3.1 — Varredura aorto-VE pelo modo M orientada a partir do corte paraesternal longi- tudinal do ecocardiograma bidimensional. A seta aponta o plano de corte do modo M. AO — aorta; AE — átrio esquerdo; VM — valva mitral; VD — ventrículo direito; VE — ventrículo esquerdo. Capítulo 3 • 37 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. entar o plano do ultra-som para as cavidades direitas (corte longitudinal direito) para a análise da valva tricúspide, átrio direito e via de en- trada do ventrículo direito ou, depen- dendo da orientação, da via de saí- da do ventrículo direito, valva pulmonar e tronco da artéria pulmo- nar. Mantendo-se a posição do trans- dutor e fazendo uma rotação de 90o, obtemos os cortes paraesternais trans- versais, ou eixo curto, do coração. Planos diferentes são utilizados para a avaliação da valva aórtica, valva mitral e ventrículo esquerdo. Com o transdutor posicionado no ictus cordis e o plano ultra-sonográfico pas- sando pelas quatro cavidades cardí- acas, adquire-se o corte apical qua- tro câmaras, podendo-se analisar as valvas mitral e tricúspide, átrios e ventrículos. Neste plano podemos avaliar a motilidade das paredes la- teral, septal e apical do ventrículo esquerdo. Com a rotação em 90o do transdutor, mantendo-se a posição apical, obtém-se o corte apical duas câmaras, que permite a visualização das câmaras esquerdas (paredes an- terior, inferior e ápice do ventrículo esquerdo) e a valva mitral. Em determinadas cardiopatias ou quando a obtenção das imagens pela via transtorácica não é possível de- vido a limitações técnicas, podemos utilizar a via subcostal, colocando-se o transdutor na região epigástrica. A Fig. 3.3 mostra diferentes cortes eco- cardiográficos. ESTUDO DOPPLER Descrito pela primeira vez no sé- culo XIX pelo físico austríaco Christian Johann Doppler, passou a fazer parte da propedêutica car- Fig. 3.2 — Esquema ilustrativo dos diferentes planos de corte ao ecocardiograma bidimensional. AP — artéria pulmonar; AD — átrio direito. 38 • Capítulo 3 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Fig. 3.3 — Principais cortes obtidos pela ecocardiografia bidimensional. 3A — Corte paraesternal longitudinal em diástole (as setas apontam a valva mitral aberta e a valva aórtica fechada); 3B — corte paraesternal longitudinal em sístole (as setas apontam a valva mitral fechada e a valva aórtica aberta); 3C — corte paraesternal longitudinal das cavidades di- reitas (as setas apontam as cúspides septal e anterior da valva tricúspide abertas) S — septo interventricular, PP — parede posterior do ventrículo esquerdo. Continua A B C Capítulo 3 • 39 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Fig. 3.3 — Principais cortes obtidos pela ecocardiografia bidimensional. 3D — corte paraesternal transversal no nível dos vasos da base (os asteriscos mostram as três válvulas da valva aórtica fechadas); 3E — corte paraesternaltransversal no nível da valva mitral (as setas apontam as cúspides anterior e posterior da valva mitral abertas); 3F — corte paraesternal transversal do ventrículo esquerdo. VT — valva tricúspide, VP — valva pulmonar. Continua D E F 40 • Capítulo 3 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Fig. 3.3 — Principais cortes obtidos pela ecocardiografia bidimensional. 3G, H, I — se- qüências dos cortes apicais quatro e duas câmaras e longitudinal, respectivamente. A — parede anterior, I — parede inferior. Continua G H I Capítulo 3 • 41 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Fig. 3.3 — Principais cortes obtidos pela ecocardiografia bidimensional. 3J — corte sub- costal quatro câmaras; 3K — corte supra-esternal. VT — valva tricúspide, AAO — arco aór- tico, APD — ramo direito da artéria pulmonar. diológica armada no início da déca- da de 1980. Baseia-se no princípio de que uma onda ultra-sonora refletida por um objeto em movimento sofre uma variação de freqüência propor- cional à velocidade do objeto. No coração, o objeto em movimento é a hemácia sangüínea. A partir da va- riação de freqüência do feixe de ultra-som ao atingir uma hemácia, o equipamento nos fornece a sua velo- cidade pela fórmula: V = f1.c 2.f0.(cos q) onde V é a velocidade do sangue (m/ s); f1, a variação de freqüência (kHz); c, a velocidade do som em tecidos biológicos (m/s); q, o ângulo entre o feixe de ultra-som e o fluxo sangüí- neo; f0, a freqüência de emissão do ultra-som (MHz). Podemos, a partir do efeito Doppler, analisar a direção do fluxo sangüíneo, a presença de fluxo la- minar ou turbulento e a velocidade do fluxo. Uma vez que a velocidade do sangue é proporcional à diferen- ça de pressão existente entre duas J K 42 • Capítulo 3 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. câmaras, pode-se, a partir de fórmu- las matemáticas, calcular pressões e gradientes pressóricos intracardíacos e nos grandes vasos. O sinal Doppler pode ser documentado em forma de curva de velocidade (Fig. 3.4) ou escala arbitrária de cores (mapeamento de fluxo em cores) que representam a direção e a velocidade dos fluxos (Fig. 3.5). Os fluxos turbulentos apre- sentam, geralmente, alta velocidade, curva de velocidade característica (Fig. 3.6) e mosaico de cores pelo mapeamento de fluxo em cores (Fig. 3.7). ECOCARDIOGRAFIA TRANSESOFÁGICA Nesta modalidade, o transdutor encontra-se montado na ponta de um endoscópio modificado que é posi- cionado no esôfago do paciente. A utilização de transdutores de alta fre- qüência e resolução e a proximida- de do mesmo com as estruturas cardí- acas possibilitam a aquisição de ima- gens de excelente qualidade e visua- lização de detalhes nem sempre ob- servados na abordagem transtorácica. Suas principais indicações estão na avaliação da aorta torácica (alta sen- sibilidade e especificidade no diag- nóstico de dissecção aórtica), valvas atrioventriculares, cavidades atriais (mais sensível na detecção de trombos intra-atriais), próteses valvares, sus- peita de endocardite infecciosa (me- lhor para demonstrar vegetações e complicações), etiologia de eventos isquêmicos cerebrais (trombos, tumo- res e vegetações intracardíacos e aterosclerose aórtica) e em casos onde as imagens pela abordagem transto- rácica são inadequadas. A Fig. 3.8 mostra imagem de dissecção aórtica em aorta descendente podendo-se visualizar nitidamente a dupla luz aórtica. Em relação ao seu uso durante o ato cirúrgico, a ecocardiografia transesofágica permite a avaliação imediata do procedimento, possibi- litando a correção dos resultados Fig. 3.4 — Curva de velocidade do fluxo da via de saída do ventrículo esquerdo (VSVE) pelo Doppler pulsado. Capítulo 3 • 43 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. inadequados no mesmo tempo cirúr- gico. Sua utilidade é maior na corre- ção de cardiopatias congênitas e valvares e na monitoração da função ventricular em cirurgias de alto risco. ECOCARDIOGRAFIA DE CONTRASTE Esta técnica consiste na injeção periférica de contraste ecocardiográ- fico capaz de opacificar as câmaras cardíacas. Inicialmente, incapazes de atravessar a barreira pulmonar, esses contrastes eram utilizados principal- mente na avaliação das cardiopatias congênitas, especialmente as comu- nicações intracavitárias. O advento do mapeamento de fluxo em cores levou ao desuso dos contrastes durante anos. Com a descoberta de novos Fig. 3.5 — Corte apical quatro câmaras mostrando o enchimento ventricular em diástole (fluxo vermelho) e o esvaziamento ventricular na sístole (fluxo azul). 44 • Capítulo 3 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. agentes de contraste que atravessam a barreira pulmonar e opacificam câmaras esquerdas, o interesse pelo método ressurgiu, inicialmente, pelo fato de melhorar a análise da contra- ção do ventrículo esquerdo e do si- nal Doppler, nos casos onde a qua- lidade técnica do ecocardiograma é inadequada e, mais recentemente, pelo fato de permitir a avaliação da Fig. 3.6 — Estudo Doppler mostrando fluxo mitral normal (A) e turbulento secundário à estenose mitral (B — com cálculo automático do gradiente e área valvar mitral). E — onda E (pico do enchimento rápido); A — onda A (sístole atrial). A E A AE B Capítulo 3 • 45 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. perfusão miocárdica. O contraste (microbolhas de ar ou gás específico recobertas por substância que confere sua estabilidade na circulação sangüí- nea) acompanha a circulação do san- gue e confere um brilho intenso ao ecocardiograma. No miocárdio, as áreas bem irrigadas apresentam bri- lho enquanto que as áreas isquêmicas, pouco irrigadas, apresentam-se mais escuras (Fig. 3.9). ULTRA-SOM INTRAVASCULAR Pouco utilizado em nosso meio e ainda em fase de investigação, é ca- paz de fornecer maiores detalhes na análise das paredes e lesões das ar- térias coronárias. É um método útil na sala de hemodinâmica, especial- mente durante procedimentos terapêu- ticos como a angioplastia. Fig. 3.7 — Corte apical quatro câmaras mostrando fluxo mitral normal (acima) e turbulento secundário à estenose mitral (abaixo). 46 • Capítulo 3 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. De maneira geral, a ecocardiogra- fia é capaz de identificar e quantifi- car a gravidade de lesões valvares, complicações da doença arterial co- ronária, cardiopatias congênitas, massas intracardíacas, cardiomiopa- tias, hipertrofia ventricular, pericar- diopatias, aortopatias e fornecer da- dos acerca do tamanho das câmaras cardíacas, função ventricular e parâ- metros hemodinâmicos de maneira não-invasiva. Fig. 3.8 — Corte transversal da aorta descendente pela ecocardiografia transesofágica multiplanar. As setas apontam a lâmina de dissecção (A) e o mapeamento de fluxo em cores (B) demonstra presença de fluxo na falsa e verdadeira luz (FL e VL, respectivamente). Capítulo 3 • 47 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO VENTRICULAR Durante muitos anos, o Modo M foi tido como método ideal para o cálculo da função ventricular. A partir de fórmulas matemáticas, partindo-se do princípio que o ventrículo esquer- do tem forma geométrica constante (elipsóide), pode-se calcular a fração de encurtamento (∆D%) da seguinte maneira: ∆D% = Dd – Ds Dd onde Dd é o diâmetro diastólico fi- nal e Ds o diâmetro sistólico final do ventrículo esquerdo. Seu valor nor- mal varia de 30 a 40%. A partir desses diâmetros obtêm-se os volumes diastólico e sistólico finais e a fração de ejeção do ventrículo esquerdo: FE = Dd 3 – Ds3 Dd3 A Fig. 3.10 mostra o traçado do ventrículo esquerdo com as medidas dos diâmetros e o cálculo automáti- co da fraçãode ejeção. Apesar de ainda ser amplamente utilizado atualmente, seu valor é li- mitado, em especial nas doenças onde ocorre grande modificação da geome- tria ventricular (cardiomiopatias di- latadas, por exemplo) ou com altera- ções segmentares da contração ventricular (como ocorre no infarto do miocárdio). Uma vez que as me- didas são obtidas na região dos mús- culos papilares, considerando-se somente o diâmetro ventricular ante- roposterior, a contração da região apical não é incluída no cálculo por este método. A ecocardiografia bidimensional permite a segmentação do ventrícu- lo esquerdo com o cálculo das vari- ações entre diástole e sístole de cada segmento (Fig. 3.11), incluindo a região apical. A maior complexidade para a obtenção da função pela eco- Fig. 3.9 — Corte apical quatro câmaras com utilização de contraste com microbolhas. Ob- serva-se área escura em toda a região apical (setas) correspondente à área isquêmica. L — parede lateral. 48 • Capítulo 3 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. cardiografia bidimensional foi simplificada pelos softwares disponí- veis nas gerações mais recentes de equipamentos. Este é o método ide- al nas doenças com alterações segmen- tares da contração, uma vez que to- das as paredes são incluídas no cálculo da função do ventrículo es- querdo. A análise da função ventricular direita é feita, em geral, qualitativa- mente, uma vez que a forma geomé- trica do ventrículo direito dificulta a quantificação. A ecocardiografia é o método de escolha para a obtenção da massa ventricular a partir da espessura das paredes, correlacionando-se bem com os valores da anatomia patológica. Essa medida é importante em doen- ças como a hipertensão arterial sis- têmica, estenose aórtica ou car- diomiopatia hipertrófica que cur- sam com o aumento da massa ven- tricular. LESÕES VALVARES A ecodopplercardiografia é o mé- todo não-invasivo ideal para a avalia- ção das valvopatias. A associação das imagens com o estudo dos fluxos (Doppler) permite a obtenção de in- formações quanto à etiologia, anato- mia e morfologia valvar (fusão comissural, fibrose, calcificação) e repercussão hemodinâmica (tamanho de cavidades, gradientes pressóricos, área valvar, pressões pulmonares). Os gradientes pressóricos na estenose valvar são obtidos pela equação simplificada de Bernoulli: Fig. 3.10 — Ecocardiografia modo M do ventrículo esquerdo em paciente com cardiomiopatia dilatada. A fração de ejeção é calculada automaticamente a partir dos diâmetros das cavi- dades. RVD(D) — diâmetro diastólico do ventrículo direito; IVS (D) — espessura diastólica do septo interventricular; LVD (D) — diâmetro diastólico do ventrículo esquerdo; LVPW (D) — espessura diastólica da parede posterior do ventrículo esquerdo; IVS(S) — espessura sistólica do septo interventricular; LVD(S) — diâmetro sistólico do ventrículo esquerdo; LVPW(S) — espessura sistólica da parede posterior do ventrículo esquerdo, EF — fração de ejeção; FS — fração de encurtamento; LV Mass — massa do ventrículo esquerdo em gramas. Capítulo 3 • 49 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Gradiente = 4.v 2 Onde v é a velocidade do sangue através do orifício estenótico. A Fig. 3.12 mostra os cortes longi- tudinal e transversal no nível da valva mitral em indivíduo normal e na estenose mitral reumática. A Fig. 3.6B mostra o cálculo dos gradientes e área valvar na estenose mitral. Por permitir a análise morfológi- ca detalhada do aparelho valvar, a ecocardiografia tem papel importan- te na escolha do procedimento tera- pêutico, principalmente na estenose mitral. Assim, nos casos de esteno- se grave com pouca alteração morfo- lógica pode-se optar pela dilatação valvar por cateter-balão. Nos casos onde há grande comprometimento do aparelho subvalvar, com espessamen- to acentuado das cúspides e calcifi- cação opta-se pela comissurotomia ou pela troca valvar mitral. O caráter não-invasivo possibili- ta seu uso seriado no seguimento de pacientes valvopatas fornecendo in- formações importantes acerca da evolução da doença e dos resultados imediatos e tardios da terapêutica. DOENÇA ARTERIAL CORONÁRIA A alteração segmentar da contra- ção ventricular é o sinal ecocardio- gráfico característico dessa doença. No infarto agudo do miocárdio, a análi- se da área com redução da contração determina sua extensão, com boa correlação com outros métodos de quantificação (medicina nuclear e anatomia patológica). Isso confere ao método não apenas um valor diagnós- tico, mas também prognóstico nessa doença. Ainda na fase aguda do infarto do miocárdio, a ecodoppler- cardiografia tem papel importante na detecção de complicações como a formação de trombos no ventrículo esquerdo, disfunção ou rotura de músculo papilar com conseqüente disfunção valvar, rotura do septo interventricular (Fig. 3.13), aneu- rismas, pseudo-aneurismas (rotura da parede livre do ventrículo), der- rame pericárdico e infarto do ventrí- culo direito. Fig. 3.11 — Corte apical quatro câmaras mostrando o cálculo da função ventricular es- querda pela fórmula de Simpson. 50 • Capítulo 3 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Fig. 3.12 — Cortes longitudinal (A) e transversal (B) mostrando valva mitral (setas) com abertura normal. (Continua) Apesar de alguns estudos terem mostrado a possibilidade de visualizar a porção inicial das artérias coroná- rias, a resolução das imagens obtidas não é adequada para esse tipo de análise até o momento. Mais recentemente, a ecocardiogra- fia de estresse tem desempenhado papel relevante no diagnóstico e de- terminação do prognóstico da doen- ça coronariana. Essa técnica se baseia na detecção e determinação da exten- são de alterações da contração ven- tricular durante exercício ou infusão de drogas como a dobutamina ou dipiridamol. A excelente correlação Capítulo 3 • 51 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. dos achados da ecocardiografia de estresse com a medicina nuclear, associado ao menor custo e maior disponibilidade, contribuiu para a expansão de seu uso na última dé- cada. MIOCARDIOPATIAS As diferentes formas de car- diomiopatia, dilatada, hipertrófica e restritiva, podem ser facilmente diagnosticadas pela ecocardiografia Fig. 3.12 — Cortes longitudinal (C) e transversal (D) mostrando valva mitral (setas) com abertura reduzida na estenose mitral. 52 • Capítulo 3 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. (Fig. 3.14). A dilatação do ventrícu- lo esquerdo com redução da função, grau e extensão da hipertrofia ven- tricular e presença ou não de gradi- ente intraventricular, restrição ao en- chimento ventricular são alguns achados comuns nas miocardiopatias dilatada, hipertrófica e restritiva, res- pectivamente. PERICARDIOPATIAS A ecocardiografia permite a aná- Fig. 3.13 — Corte apical quatro câmaras modificado em paciente com comunicação inter- ventricular (seta) pós-infarto agudo do miocárdio, medindo 1,64cm. O mapeamento de fluxo em cores mostra fluxo turbulento pelo septo interventricular. Capítulo 3 • 53 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. lise adequada das afecções do peri- cárdio. O derrame pericárdico pode ser facilmente diagnosticado pela presença de espaço livre de ecos Fig. 3.14 — A — Corte longitudinal paraesternal em paciente com cardiomiopatia hipertrófica. Observa-se um aumento acentuado da espessura do septo interventricular e espessura nor- mal da parede posterior do ventrículo esquerdo. B — Corte apical quatro câmaras modifi- cado em paciente com endomiocardiofibrose. Observa-se preenchimento da ponta do ven- trículo direito (setas) por tecido muito ecogênico (fibrose) e grande dilatação do átrio direito. A B 54 • Capítulo 3 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEULTDA. posterior à parede posterior do ven- trículo esquerdo (Fig. 3.15). O uso do ecocardiograma bidimensional possi- bilita melhor análise da localização es- pacial e extensão do derrame pericár- dico, assim como sua quantificação. No tamponamento cardíaco pode-se observar o colapso diastólico das câmaras direitas devido à grande pressão existente no pericárdio. A presença de espessamento intenso e, em certos casos, de calcificação peri- cárdica associada a enchimento ventri- cular anormal ao Doppler, caracteri- za a pericardite constritiva. A Tabela 3.1 resume os achados Fig. 3.15 — Cortes longitudinal e transversal paraesternal em paciente com aneurisma da aorta ascendente e derrame pericárdico (setas). Capítulo 3 • 55 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Tabela 3.1 Achados Ecocardiográficos nas Cardiopatias Estenose mitral: aumento do átrio esquerdo, espessamento das cúspides da valva mitral, redução da mobilidade e da abertura valvar mitral, redução do orifício valvar mitral. Insuficiência mitral: aumento do átrio esquerdo (crônica), aumento do ventrículo esquerdo (crônica), presença de fluxo sistólico do ventrículo para o átrio esquerdo (ao Doppler). Estenose aórtica: espessamento das válvulas aórticas, redução da abertura valvar, aumento da espessura das paredes do ventrículo esquerdo. Insuficiência aórtica: aumento do ventrículo esquerdo, anormalidades da valva aórtica, vibrações diastólicas da valva mitral, fluxo diastólico turbulento na via de saída do ventrículo esquerdo (Doppler). Infarto do miocárdio: alteração da contração segmentar (hipocinesia, acinesia ou discinesia), diminuição da fração de ejeção, trombo intracavitário, aneurisma ventricular, rotura septal (ao bidimensional ou Doppler), rotura do músculo papilar, regurgitação mitral (Doppler), rotura da parede livre do ventrículo esquerdo, derrame pericárdico. Cardiomiopatia dilatada: aumento dos diâmetros ventriculares, espessura normal das paredes, redução da função ventricular Cardiomiopatia hipertrófica: diâmetro ventricular normal ou reduzido, aumento regional ou global da espessura miocárdica, disfunção diastólica (Doppler), gradiente intraventricular (nas obstrutivas). Cardiomiopatia restritiva: diâmetro ventricular normal ou reduzido, aumento dos átrios, aumento da espessura miocárdica (p.ex.: na amiloidose), preenchimento da ponta do(s) ventrículo(s) por fibrose (na endomiocardiofibrose), alteração do enchimento ventricular (Doppler), função ventricular sistólica geralmente normal. ecocardiográficos em cada uma das situações discutidas. BIBLIOGRAFIA 1. American Society of Echocardio- graphy Commitee on Standards. Recommendations for quantitation of the left-ventricle by two-dimen- sional echo-cardiography. J Am Soc Echocardio-graphy 2:358, 1989. 2. Feingenbaum H. Echocardiography. 4th ed. Philadelphia: Lea and Febiger, 1986. 3. García-Fernández MA, Zamorano JL. Practica de la ecocardiografia de contraste. 1st ed. Madrid: Ene edi- ciones, 1999. 4. Morcef FAP. Ecocardiografia uni- bidimensional, transesofágica e Doppler. 2a ed. Rio de Janeiro: Li- vraria e Editora Revinter, 1996. 5. Roelandt JRTC, Pandian NG. Multi- plane transesophageal echo-cardio- graphy. 1st ed. New York: Churchil Livingstone Inc., 1996. 6. Skorton DJ, Schelbert HR, Wolf GL, Brundage B H. Cardiac Imaging: a companion to Braunwald’s Heart Disease. 2nd ed. Philadelphia: W.B. Saunders Company, Volume 1, 1996. 56 • Capítulo 3 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Capítulo 4 • 57 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Cineangiocardiografia Pedro Alves Lemos Neto Eulógio Emílio Martinez Filho Capítulo 4 A angiografia cardíaca é um dos principais métodos diagnósticos uti- lizados na prática cardiológica atual, permitindo a análise anatômica e funcional de estruturas vasculares e das cavidades e valvas cardíacas. Para a realização do estudo angiográfico, o acesso vascular (arterial e/ou venoso) é obtido, após anestesia local, por dissecção cirúrgica ou punção vas- cular, sendo utilizados habitualmente os vasos braquiais ou femorais, respec- tivamente. Um cateter apropriado é introduzido e manipulado por fluo- roscopia (raios X) até as regiões a serem avaliadas, onde são realizadas injeções de contraste radiológico. Apesar da obtenção das imagens em quadros separados, a aquisição em alta velocidade (15 a 60 quadros por segundo) permite a reprodução da seqüência com aspecto de movi- mento (cineangiografia). A documen- tação dinâmica proporcionada pela cineangiografia possibilita a análise detalhada da estrutura estudada du- rante todas as fases do ciclo cardía- co. Após a aquisição das imagens, os exames são gravados em filme radio- lógico ou, mais modernamente em outros tipos de dispositivos (p. ex.: CD-ROM). As indicações clínicas do estudo angiográfico são amplas. De maneira geral, pode ser recomendado quan- do for relevante determinar a presença ou a extensão de doença cardíaca em situações em que os métodos diagnós- ticos não-invasivos não forem sufi- cientemente elucidativos. Atualmente a maioria dos pacientes pode subme- ter-se ao exame em regime ambulato- rial devido ao baixo índice de com- plicações observado. No entanto, alguns grupos específicos apresentam risco mais elevado, justificando aten- ção especial na indicação do proce- dimento e nos cuidados pré e pós- procedimento destes indivíduos [Ta- belas 4.1 e 4.2]. 58 • Capítulo 4 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Tabela 4.1 Mortalidade Após Cateterismo Cardíaco Diagnóstico Características Mortalidade (%) Mortalidade global após cateterismo cardíaco 0,14 Idade • < 1 ano 1,80 • > 60 anos 0,25 Padrão coronariano • Uniarterial 0,03 • Triarterial 0,16 • Tronco coronário esquerda 0,86 Insuficiência cardíaca • Classe funcional I ou II (NYHA) 0,02 • Classe funcional IV (NYHA) 0,67 Valvopatia 0,28 NYHA=New York Heart Academy Modificado de ACC/AHA Ad Hoc Task Force on Cardiac Catheterization. ACC/AHA Guidelines for cardiac catheterization and cardiac catheterization laboratories. J Am Coll Cardiol, 18(5): 1149-1182, 1991. Tabela 4.2 Pacientes com Necessidade de Monitorização Especial Após Cateterismo Cardíaco Diagnóstico Caquexia, deficiência mental ou doença sistêmica grave Doença vascular periférica grave Anticoagulação ou discrasia sangüínea Hipertensão arterial sistêmica descontrolada Diabete melito descompensado Insuficiência renal (creatinina ≥ 2,0mg%) Doença pulmonar obstrutiva crônica grave Antecedente de alergia a contraste iodado Fração de ejeção do ventrículo esquerdo < 35% Prótese valvar mecânica Cardiopatia congênita complexa Modificado de ACC/AHA Ad Hoc Task Force on Cardiac Catheterization. ACC/AHA Guidelines for cardiac catheterization and cardiac catheterization laboratories. J Am Coll Cardiol, 18(5): 1149-1182, 1991. Capítulo 4 • 59 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Três tipos de contrastes radioló- gicos são atualmente disponíveis para uso intravascular: 1) iônico hiperos- molar, 2) iônico não-hiperosmolar e 3) não-iônico (baixa osmolaridade). Além do poder osmótico (1.600- 2.000mOsm/kg, 600-800mOsm/kg e 300-800mOsm, respectivamente), ou- tras diferenças têm sido descritas entre os tipos de contraste. Os contrastes não-iônicos estão associados a menor incidência de complicações alérgicas (manifestações cutâneas e raramen- te broncospasmo e hipotensão) e têm menor efeito depressor da con- tratilidade miocárdica. Além disso, possuem propriedades trombóticas in vitro, em oposição aos efeitos an- ticoagulantes dos contrastes iônicos. Todos os tipos de contrastes radio- lógicos podem precipitar insuficiên-cia renal, principalmente em pacien- tes diabéticos, hipovolêmicos ou com disfunção renal prévia. No entanto, possivelmente os contrastes não- iônicos têm menor efeito nefrotóxico. A cineangiocoronariografia, a ven- triculografia esquerda e a aortografia ascendente são os estudos angio- gráficos mais freqüentemente reali- zados. CINEANGIOCORONARIOGRAFIA A cinecoronariografia é realizada através de injeções seletivas de con- traste radiológico nas artérias coro- nárias. Depois da cateterização dos óstios das coronárias pelas técnicas de Sones (acesso pelo membro supe- rior) ou de Judkins (acesso femoral), as imagens são obtidas em diversas projeções com angulações diferen- tes para delimitação da anatomia co- ronária. Podem ser analisados o flu- xo coronário, a presença e a extensão de obstruções arteriais, além do es- tudo da circulação colateral e de imagens intravasculares (p. ex.: trom- bos, dissecções) ou outras anomalias (p. ex.: fístulas, malformações con- gênitas). A coronária direita origina-se do seio de Valsalva direito, logo acima do plano valvar aórtico, e percorre o sulco atrioventricular direito, emitin- do diversos ramos ao longo do seu trajeto. O ramo do cone, que irriga o infundíbulo ventricular direito (via de saída do ventrículo direito), apre- senta-se como primeira ramificação da coronária direita em 40-60% dos pacientes [Fig. 4.1]; no restante dos casos, origina-se diretamente da aorta em óstio separado [Fig. 4.2]. Em al- guns pacientes, o ramo do cone pode se constituir em uma importante fonte de circulação colateral tanto para a coronária esquerda como para a pró- pria coronária direita. Ainda no ter- ço inicial da coronária direita, em 50% dos pacientes encontra-se o ramo do nó sinusal [Fig. 4.1e 4.2]; no restante da população a irrigação do nó sinusal é proveniente da artéria circunflexa. Com origem na porção média da co- ronária direita, a irrigação da pare- de livre do ventrículo direito é rea- lizada por um ou mais ramos marginais direitos [Fig. 4.1 e 4.2]. Em indivíduos com dominância direita (85% dos casos), a coronária direita atinge o crux cordis na região poste- rior do coração, onde se originam a artéria do nó atrioventricular e o ramo descendente posterior, o qual irriga a porção posterior do septo interven- tricular. Ultrapassando o crux cordis, continua a percorrer o sulco atrioven- tricular esquerdo em extensão variá- vel, emitindo um ou mais ramos ventriculares posteriores, que irrigam a parede posterior do ventrículo es- querdo [Fig. 4.3]. A coronária esquerda possui um curto segmento inicial (tronco da coronária esquerda), logo dando ori- gem às artérias circunflexa e interven- tricular (ou descendente) anterior [Fig. 4.4A]. Em aproximadamente 20% dos indivíduos, o tronco da coronária esquerda encontra-se trifurcado, com o ramo diagonalis (ramus intermedius) originando-se entre as outras duas artérias [Fig. 4.4B]. A artéria des- 60 • Capítulo 4 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. cendente anterior percorre o sulco in- terventricular anterior em direção ao ápex do ventrículo esquerdo; emite ramos septais, responsáveis pela nutrição da porção anterior do septo interventricular, e ramos diagonais, que irrigam a parede anterolateral do ventrículo esquerdo [Fig. 4.5]. A ar- téria circunflexa percorre o sulco atrioventricular esquerdo e emite ra- mos marginais esquerdos que irrigam a parede lateral do ventrículo esquer- do [Figs. 4.6 e 4.7]. Nos pacientes com dominância esquerda (7% dos casos), a artéria circunflexa atinge o crux cordis e origina a artéria descen- dente posterior [Fig. 4.6A]. Nestes pa- cientes a coronária direita é curta e irriga quase que exclusivamente o ventrículo direito [Fig. 4.6B]. Em 8% dos casos, encontra-se o padrão de dominância balanceada [Fig. 4.7], onde a coronária direita origina o ramo descendente posterior, mas não emite ramos ventriculares posteriores, os quais são originados da artéria circun- flexa. Em pacientes com aterosclerose coronariana, o grau de estenose luminal (percentagem de redução da luz vascular) é o fator que isolada- mente mais contribui para a diminui- ção do fluxo coronário e isquemia miocárdica. O fluxo de sangue é mantido por mecanismos regulatórios locais até que o diâmetro da luz do vaso seja reduzido em aproximada- mente 40%. A partir deste valor, ocorre perda progressiva da capaci- dade de fluxo máximo; em pacientes Fig. 4.1 — Coronária direita em projeção oblíqua anterior esquerda, sendo demonstrados o ramo do cone (RC), o ramo do nó sinusal (RNS), o ramo marginal direito (MgD) e o ramo descendente posterior (DP). Capítulo 4 • 61 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Fig. 4.2 — Coronária direita e ramo do cone com origens separadas. Em A (projeção oblí- qua anterior esquerda), nota-se a ausência do ramo do cone na porção proximal da coroná- ria direita (CD). São demonstrados os ramos do nó sinusal (RNS) e marginal direito (MgD). Em B, o ramo do cone (RC) é demonstrado através da canulação seletiva de seu óstio. 62 • Capítulo 4 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. com estenoses maiores ou iguais a 90% do diâmetro do vaso, a habili- dade para aumentar o fluxo de san- gue em resposta à elevação da deman- da é praticamente abolida. A análise da extensão da doença obstrutiva coronária é um importan- te índice prognóstico. Padrões de acometimento vascular uni, bi ou triarterial, de acordo com o número de artérias epicárdicas principais envolvidas, divide os pacientes em categorias de gravidade crescente [Figs. 4.8 e 4.9]; indivíduos com obs- truções multiarteriais e extensas áreas de isquemia, especialmente quando associadas à disfunção contrátil do ventrículo esquerdo, possuem alto risco de eventos mórbidos. Além disso, obstruções localizadas em seg- mentos proximais das artérias coro- nárias são associadas a maior grau de comprometimento isquêmico, pois li- mitam o fluxo de sangue nos ramos distais ao local da lesão. Os pacien- tes com estenose do tronco da coro- nária esquerda [Fig. 4.10], e conse- qüente redução da irrigação da maior parte do ventrículo esquerdo, possu- em alta taxa de mortalidade, neces- sitando habitualmente revasculariza- ção cirúrgica do miocárdio. Através da cinecoronariografia, são também analisadas a presença, loca- lização e intensidade de circulação colateral em pacientes com obstrução coronária. O desenvolvimento de vasos colaterais geralmente só é ve- rificado em regiões nutridas por ar- térias severamente estenóticas ou Fig. 4.3 — Coronária direita dominante em projeção oblíqua anterior esquerda. Note que a coronária ultrapassa a região do crux cordis, onde emite o ramo descendente posterior (DP), e percorre o sulco atrioventricular esquerdo originando ramos ventriculares posteriores (VP) para a irrigação da parede posterior do ventrículo esquerdo. Capítulo 4 • 63 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. totalmente ocluídas [Fig. 4.11]. Ori- ginam-se de um ou mais vasos adja- centes ou das porções proximais da coronária com obstrução. Quando presente, a circulação colateral pode minimizar o grau de isquemia imposta pela redução de fluxo na artéria com estenose, agindo como um mecanis- Fig. 4.4 — Coronária esquerda em projeção oblíqua anterior esquerda caudal (projeção spider). Em A, o tronco da coronária esquerda (TCE) se bifurca, originando as artérias des- cendente anterior (DA) e circunflexa (CX). Em B, o TCE encontra-se trifurcado, com o ramo diagonalis (Dgls) posicionado entre a DA e a CX. 64 • Capítulo 4 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. mo de “proteção” do músculo envol- vido. A análise da patência dos enxer- tos coronários (p. ex.: ponte de veia safena) é fundamental para o estudo completo da
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