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INVESTIGAÇÃO DE RISCOS E FRAUDES CORPORATIVAS AULA 6 Prof. Francisco de Assis do Rego Prof. Guilherme Frederico Tobias de Bueno 2 CONVERSA INICIAL Nesta aula seguiremos com a apresentação da estrutura do Programa de Compliance, iniciada no encontro anterior. Vale lembrar que na última aula discutimos, além de outros assuntos, os seguintes pilares do programa: I. O apoio da alta administração – Tone From The Top; II. Mapeamento e análise de riscos; e III. Códigos de Ética e de Conduta. Da mesma forma como fizemos na aula passada, discutiremos as particularidades dos demais pilares, suas nuances, suas funções e seus objetivos, e seguiremos demonstrando a inter-relação entre eles. Desse modo, na presente aula serão apresentados os seguintes pilares do programa: I. Due Diligence de terceiros; II. Políticas e Controles Internos; III. Comunicação e treinamento; IV. Canal de denúncias; V. Investigação e reporte; VI. Monitoramento, auditoria e revisão periódica. Por fim, vamos evidenciar que a adoção do Programa de Compliance, considerando as exigências mercadológicas e legais existentes que recaem sobre as pessoas jurídicas, pode representar o diferencial determinante que favorecerá o desenvolvimento econômico da companhia de forma sólida e sustentável. TEMA 1 – DUE DILIGENCE DE TERCEIROS O termo due diligence de terceiros significa a adoção da devida diligência prévia à realização de um negócio com parceiros, além do monitoramento periódico no desenvolvimento das atividades específicas e contratadas, visando mitigar os riscos de compliance respectivamente identificados. Isso se dá por meio da realização de uma investigação do terceiro e de levantamento de informações relevantes acerca deste. Como sabemos, a Lei Anticorrupção atribui a responsabilização objetiva da pessoa jurídica para os casos de corrupção, logo, a prática de um ato de 3 corrupção por um agente terceirizado pode ensejar a responsabilização da empresa contratante. Daí a importância de se selecionar bem os parceiros antes da contratação. Os terceiros compreendem qualquer fornecedor de serviços ou produtos para a empresa, tais como os escritórios de contabilidade e advocacia, despachantes, locadores de mão de obra, representantes comerciais, fornecedores de matérias-primas, empresas parceiras em consórcios criados com finalidade específicas, dentre tantos outros. A depender dos riscos identificados na contratação do terceiro, será determinada a profundidade da investigação que deverá ocorrer sobre ele. Ainda, a realização da due diligence é imprescindível antes de operações de fusão, incorporação, cisão e aquisição de outras empresas, também em razão da responsabilização objetiva da pessoa jurídica. Verificaremos que, nem sempre, a ocorrência de uma red flag – sinal de alerta – significa, de forma automática, que a parceria não poderá ser firmada, mas sim que necessitará de uma investigação mais aprofundada para se ter a real dimensão do risco existente e, em seguida, deliberar-se pela contratação ou não. Todos os dados do terceiro obtidos por meio da realização da due diligence devem ser registrados e arquivados pela empresa contratante para fins de comprovação de que todas as cautelas prévias foram adotadas pela empresa contratante. Falaremos a seguir sobre as cláusulas contratuais de anticorrupção; da obrigação do cumprimento irrestrito às Leis, ao Código de Ética e de Conduta da empresa contratante; e da previsão da realização de auditoria, quando da formalização da contratação do terceiro. Por fim, vamos tratar da periodicidade da realização da due diligence em relação aos parceiros contratados, a qual será determinada pelos riscos de compliance envolvidos na parceria. TEMA 2 – POLÍTICAS E CONTROLES INTERNOS A criação e a aplicação das políticas e dos controles internos consistem em medidas administrativas que visam mitigar os riscos de compliance anteriormente detectados. As políticas e os controles internos devem estar em 4 harmonia com as normas do Código de Ética e de Conduta e devem ser seguidas por todos os stakeholders no dia a dia da empresa. Essas medidas devem deixar claros os objetivos pretendidos pela companhia com relação a determinados assuntos e atividades, e os funcionários terão consciência de do tipo de comportamento que é desejado pela empresa (Gonçalves, 2012). As políticas e os controles internos devem conformar às Leis e aos Regulamentos incidentes nas atividades da empresa e de seus parceiros comerciais, aos objetivos da empresa e aos riscos de compliance. Ainda, as políticas internas devem sempre ser documentadas, escritas em linguagem clara e estar sempre acessíveis para consulta. Outrossim, é preciso dar ampla publicidade às políticas internas da empresa e desenvolver treinamentos específicos para os públicos a que se destinam. Os controles internos consistem em processos e procedimentos, definindo quem, quando e como deve ser feita uma certa atividade, visando à padronização de comportamentos e decisões, o que se reflete na mitigação de riscos. Cada uma das etapas do Programa de Compliance deve possuir as suas próprias políticas e controles, os respectivos processos e procedimentos para consecução das ações correspondentes, para fins de estruturação do programa de integridade e seu funcionamento efetivo. Deverão ser destacados alguns temas que envolvem riscos de compliance e, por isso, devem fazer parte do programa: Política de Conflito de Interesses; Política de Confidencialidade; Política de não Retaliação; Política de Presentes e Hospitalidades; Política de Doações e Patrocínio; Política de Contratação com Terceiros; Política de Aquisições e Joint Ventures; Política de Relacionamento com Agentes e Órgãos Públicos e Política de Prevenção à Lavagem de Dinheiro. Assim, restará demonstrado que as Políticas e os Controles Internos estabelecem as diretrizes de atuação dos funcionários e dos parceiros da empresa e são ferramentas que visam mitigar os riscos, atuando na prevenção de fraudes internas e corrupção. 5 TEMA 3 – COMUNICAÇÃO E TREINAMENTO A implantação do Programa de Compliance pela empresa implica na mudança de comportamentos anteriores, por isso é preciso que haja o envolvimento e a aceitação das novas regras por parte de todos. O atingimento desse objetivo depende das ações de comunicação e o treinamento de todos os públicos da empresa sobre as diretrizes do Programa de Compliance. Primeiramente, é preciso que as pessoas envolvidas com a empresa compreendam as razões que levaram à adoção do programa de integridade. Depois, é preciso esclarecer sobre os benefícios que o programa pode gerar e os riscos a que a organização está exposta. Assim, o desenvolvimento de ações de comunicação e a realização de treinamentos periódicos acerca da nova cultura da empresa visam ao convencimento geral para a aceitação dos novos paradigmas. A comunicação, para ser eficiente, deverá ocorrer no sentido horizontal, entre o Setor de Compliance e os demais setores da empresa, e no sentido vertical, entre o Setor de Compliance e a alta administração. A comunicação possui um caráter geral e poderá ocorrer de diversas formas: reuniões periódicas, folhetos explicativos, mensagens eletrônicas pela rede interna, quadro de avisos, banners, cartazes, mala direta, jornal mensal, página da internet, aplicativos de celular etc. Ainda, deverá ser periódica e se apresentar em linguagem clara e apropriada ao público-alvo. As ações de treinamentos, por seu turno, são mais específicas e devem ser utilizadas sempre que houver a implantação de novas políticas e/ou controles internos ou, até mesmo, alterações/atualizações significativas destes. Os treinamentos também devem ser periódicos epodem ser presenciais ou na modalidade à distância. Eles se desenvolvem, normalmente, por meio de palestras, workshops e cursos. As ações de comunicação e treinamento devem ser devidamente registradas e arquivadas, para fins de demonstração, de forma objetiva, do cumprimento dos requisitos legais do Programa de Compliance. 6 TEMA 4 – CANAL DE DENÚNCIAS E INVESTIGAÇÃO E REPORTE O canal de denúncias é a principal ferramenta de detecção de fraudes. Por isso, deve ser muito bem estruturado e acessível a todos os públicos. Para que ele funcione efetivamente, deverá ser garantido o sigilo do denunciante e a garantia da não retaliação, a fim de incentivar e encorajar as pessoas a relatarem os ilícitos de que têm conhecimento. As fraudes produzem prejuízos às finanças e à imagem das empresas, e o canal de denúncias é um mecanismo que permite à companhia identificar a sua ocorrência em tempo reduzido e a adotar as medidas para saná-las, reduzindo os danos decorrentes dos ilícitos. Segundo o relatório da Association of Certified Fraud Examiners (ACFE), as denúncias espontâneas, por meio do canal de denúncias, respondem, em média, por 47,3% dos casos de detecção de fraudes. Nas empresas onde não há canal de denúncias, a detecção de fraudes pela denúncia espontânea cai para 28,2%. O canal de denúncias pode funcionar de várias formas: por meio do contato direto com o Compliance Officer da empresa, por telefone, por carta, por mensagem eletrônica, ou por sistema informatizado. Ele deve ser gerenciado e as informações recebidas devem ser classificadas de acordo com os parâmetros estabelecidos e encaminhados ao Setor de Compliance para apuração. Todas as denúncias recebidas devem ser arquivadas para fins de comprovação da existência do canal de denúncias e da sua efetividade, porém, é preciso cautela para manter o sigilo dessas informações, tendo em vista que o seu vazamento pode comprometer a sua credibilidade e efetividade, além de gerar outros danos à empresa. Os casos de suspeita de fraude e corrupção devem ser apurados para verificar se são procedentes e quem são os responsáveis pelo ilícito, o que se faz por meio da instauração do processo investigativo interno. A investigação pode ser realizada pelo Setor de Compliance ou por consultoria externa especializada. Ela deve ser conduzida com muita habilidade e discrição por parte do investigador, e sempre deve correr sob sigilo. O processo de investigação deve ser todo documentado e mantido em local seguro. 7 A caracterização dos fatos e do responsável pelo ilícito se dará por meio das provas colhidas na investigação, sendo que o investigador escolherá os meios pelos quais elas serão produzidas: documental, testemunhal e/ou prova pericial. Com as provas produzidas, o investigador passará a analisá-las, cruzando as informações levantadas e identificando as inconsistências que possam caracterizar o ilícito e o responsável pela fraude. A conclusão da investigação deverá constar do relatório final elaborado pelo investigador, indicando a autoria e materialidade, em sendo o caso, e qual a sanção que se aplica à conduta detectada, sempre de forma fundamentada. Esse relatório deverá ser submetido à análise da alta administração, que decidirá sobre o caso. TEMA 5 – MONITORAMENTO, AUDITORIA E REVISÃO PERIÓDICA O monitoramento e a auditoria são mecanismos que visam garantir a efetividade do Programa de Compliance, certificando que as políticas e os controles internos estão sendo aplicados e mensurando os respectivos resultados. Além disso, servirá para a detecção e correção de eventuais falhas detectadas, no intuito de aprimorar o programa de integridade. A revisão periódica visa melhorar a eficiência do Programa de Compliance, por meio do aprimoramento de processos, para alcançar resultados satisfatórios em menor tempo e com o menor custo. Assim, o objeto de monitoramento, auditoria e revisão periódicas são as políticas e os controles internos da empresa, inclusive as políticas referentes aos pilares do programa, cujos resultados devem ser consolidados e documentados para, posteriormente, serem reportados à alta administração. O monitoramento se dá de forma periódica (2 a 3 meses) e aleatória, por meio de amostragens, e somente identifica a não conformidade após a falha ter sido cometida, sempre reportando o caso à alta administração. A Auditoria do programa, por seu turno, é realizada em periodicidade mais espaçada (1 ou 2 anos) e deverá avaliar o Programa de Compliance com base na implantação dos seus requisitos de acordo com as políticas e os controles internos e os respectivos resultados, cujo relatório deverá ser submetido ao Setor de Compliance e, posteriormente, à alta administração. 8 NA PRÁTICA Para fins práticos, é preciso traçar um panorama das mudanças de paradigmas ocorridas no mercado nacional após a entrada em vigor da Lei Anticorrupção no Brasil e da Operação Lava Jato, as quais demonstram que “ser íntegro” passou a ser um ótimo negócio para as empresas e seus gestores. A Petrobras passou a exigir que todos os seus fornecedores possuam Programa de Compliance, ou seja, somente as empresas dotadas de programa de integridade poderão fornecer para essa gigante empresa estatal, sob pena de descredenciamento. Os contratos de financiamento junto ao Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) passaram a incluir uma cláusula anticorrupção. Por fim, é importante refletirmos sobre os efeitos dos acordos de leniência das grandes construtoras brasileiras. FINALIZANDO Nesta aula finalizamos a apresentação da estrutura do Programa de Compliance, em que foram abordados os aspectos dos seguintes pilares: I. Due Diligence de terceiros; II. Políticas e Controles Internos; III. Comunicação e treinamento; IV. Canal de denúncias; V. Investigação e reporte; VI. Monitoramento, auditoria e revisão periódica. Demonstramos mudanças de paradigmas ocorridas no mercado nacional após a entrada em vigor da Lei Anticorrupção no Brasil e da Operação Lava Jato, por meio de exemplos práticos envolvendo a empresa Petrobras, o banco BNDES e construtoras que firmaram acordos de leniência com as autoridades públicas. 9 REFERÊNCIAS BRASIL. Decreto n. 8.420, de 18 de março de 2015. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 19 mar. 2015. ______. Lei n. 12.846, de 1º de agosto de 2013. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2 ago. 2013. CANDELORO, A. P. P.; RIZZO, M. B. M. de; PINHO, V. Compliance 360º: estratégias, conflitos e vaidades no mundo corporativo. São Paulo: Trevisan Editora Universitária, 2012. GIOVANINI, W. Compliance: excelência na prática. São Paulo: [editora independente], 2014. GONÇALVES, J. A. P. Alinhando processos, estrutura e compliance à Gestão Estratégica. São Paulo: Atlas, 2012. GONSALES, A. et al. Compliance: A nova regra do jogo. São Paulo: Pauligrafi, 2016. SANTOS, J. A. A.; BERTONCINI, M.; CUSTÓDIO, U. Comentários à Lei 12.846/2013: Lei anticorrupção. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2014. SERPA, A. da C. Compliance descomplicado: um guia simples e direto sobre programas de compliance. [s.l], 2016.