Buscar

FENOMENOLOGIA

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 16 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 16 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 16 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

RESUMO
FENOMENOLOGIA=CONCEPÇÃO EPISTEMOLOGICA/ CONHECER COMO NÓS CONHECEMOS (FENOMENOLOGIA É TUDO QUE SE MOSTRA)
O MEU PERCEBER PASSA SER FENOMENO (PERCEPÇÃO)
Teoria psicológica com intenção psicoterapêutica 
*A fenomenologia é uma filosofia e a psicologia é uma ciência empírica
* marca o antipsicologismo
Psicologismo: O psicologismo é uma posição filosófica, segundo a qual a psicologia desempenha um papel central no fundamento ou na explicação de algum outro tipo de fato ou lei não psicológica.
A FENOMENOLOGIA É TER VIVÊNCIAS E TER ACESSO Á ESSAS VIVENCIAS, CONSCIENCIA COMO PERCEPÇÃO INTERNA DAS VIVENCIAS DE SER CONSCIENTE. CONSICENCIA COMO VIVENCIA INTENCIONAL COMO FALAR, PERCEBER...
*A posição de um fenomenologo é ser um observador desinteressado
Husserl diz que é papel do psicólogo desenvolver o fenômeno.
A fenomenologia foi fundada pelo Husserl inicialmente pela lei da intencionalidade de Brentano, mas o conceito de intencionalidade de Brentano era psíquico, e o algo” não estava fora do sujeito, e sim dentro.
O fenômeno árvore é quando percebemos e damos a atenção enquanto fenômeno a árvore” e não a manifestação física (coisa material de uma árvore).
Husserl a priori da correlação leva a intencionalidade para fora. Por isso ele fala de consciência transcendental.
** perceber algo é consciência (ex: perceber a casa)
A correlação é o perceber (ter consciência da coisa percebida)
Platão concebe a realidade sob dois mundos: o mundo sensível e o inteligível. NO PENSAMENTO PLATÔNICO NÓS CHEGAMOS AO CONHECIMENTO PELO MUNDO INTELIGÍVEL, NA ESSENCIA DAS COISAS, SÓ QUE A ESSÊNCIA EXISTE INDEPENDETEMENTE DE MIM. CONTEMPLAR AS IDEIAS QUE EM GREGO É VER COM OS OLHOS DA ALMA.
Há processo de adequação entre o meu conceito e a “coisa”. Algo que já é dado e a racionalidade da alma, captura essa essência e se forma o conceito. O início do conhecimento é na própria coisa, se não existir a “coisa”, não tem o conceito. A essência da coisa precisa existir em si mesma para que eu possa conhecer e formar um conceito e internalizar isto. 
Husserl diz que o princípio da continuidade se vem apenas do tato (em corpo inteiro), da visão temos o princípio da proximidade e distância por onde os fenômenos se manifestam.
Para Husserl a essência é sintetizada, o “EU” é a unidade, mesmos em várias vivências, como falar, andar, sentar. Essas vivências acontecem em um fluxo sintetizado. Esse “eu” justamente acontece aqui, nos atos psíquicos, atos corpóreos, transcendental, ele está presente em todos os atos. Ele dá condição de percepção de si mesmo. 
Os sentidos são universais e singulares e o que garante seu compartilhamento é a sua universalidade.
O movimento de síntese de uma retenção e uma antecipação que se dá. Toda vivência é marcada pela temporalidade como uma vivência originária, por ser uma maneira que a consciência existe temporalmente.
MATERIAL ON LINE
Nesta disciplina, você entrará em contato a Psicologia Fenomenológica, com ênfase nas possibilidades abertas pelo pensamento desenvolvido pelo filósofo Martin Heidegger (1989 – 1976) para a Psicologia. Apoiado na Fenomenologia de Edmund Husserl (1959 – 1938), ele questionou a ontologia metafísica e a tentativa de determinação substancial do ser da existência humana. Destacaremos sua compreensão da existência humana, denominada Dasein (ser-aí).
Edmund Husserl nasce em Prossnitz, na Morávia; atual Prostejov, República Tcheca, em 8 de abril de 1859, filho de comerciantes judeus. Em 1876, inicia seus estudos universitários em Leipzig. Concentra-se na matemática, mas estuda também física, astronomia, filosofia e psicologia com W. Wundt. Em 1882, doutora-se na Universidade de Viena com a tese O Cálculo das Variações. Em 1887, pouco antes de casar-se, defende a tese de habilitação Sobre o Conceito de Número: análise psicológica, na cidade de Halle. 
Na época, a Psicologia era o estudo das faculdades mentais do homem. Até bem pouco tempo, era disciplina especulativa, filosófica. Quando Wundt funda o laboratório de psicologia científica em 1879, começa sua trajetória de ciência aplicada. Husserl acompanhou de perto essa transformação. A filosofia do fim do século XIX dividia-se entre duas vertentes: aqueles que defendiam uma base objetiva para o conhecimento e aqueles que o fundamentavam nas faculdades mentais.
 Os Naturalistas defendiam que a objetividade do conhecimento está na realidade objetiva, externa, “fora” do sujeito. Conhecer a natureza significa saber mensurá-la, a fim de revelar suas leis universais. Essas leis universais, as verdades universais, só são acessíveis através de hipóteses. Para isso, esse modelo de conhecimento dispõe da metodologia de observação, mensuração e classificação.	
Como toda a realidade é objetiva, física, também a consciência, da qual fala a Psicologia, deve ser física. Husserl, como grande pensador, leva ao limite as bases desse pensamento para expor sua contradição: se tudo pode ser reduzido à natureza física, também a concepção de que tudo pode ser reduzido à natureza física é apenas mais um processo físico, incapaz de sustentar-se como verdade universal. 
Do outro lado, os Psicologistas defendiam a mente como fundamento último de todo conhecimento. Para eles, a objetividade é dada pelo sujeito “puro” abstrato. As leis objetivas, o real, são convenções subjetivas explicáveis pelo psicólogo. Levando às últimas consequências essa fundamentação, também a Psicologia mina o conhecimento objetivo e científico-natural, pois, para ela, tudo é processo psicológico. As ciências, como a matemática, tornam-se relativas.
 	O pensamento de Husserl recebe impulso dessa “crise” insuperável, na tentativa de encontrar solução. Para fundamentar o conhecimento verdadeiro – tarefa da filosofia – Husserl não poderá se apoiar nem no Naturalismo, nem no Psicologismo. A Fenomenologia surge como crítica à pretensão de cientificidade plena das ciências, ao recurso à dedução e à inferência como método de conhecimento (modelo hipotético) e à determinação psicofísica atribuída ao seu sujeito do conhecimento. (Feijoó, 2011)
	A psicologia, num esforço para assegurar a verdade de suas afirmações, recorre ao método científico-natural de investigação. O teste de medição de inteligência desenvolvido por Alfred Binet (1857 -1911) é um exemplo disso; determina-se a inteligência como mensurável e cria-se um instrumento para a medir.
Husserl, por outro lado, identifica a carência de fundamentos das ciências-naturais. É o Naturalismo, descrito anteriormente. Seu objetivo é, então, inaugurar um novo fundamento para a lógica, para a teoria do conhecimento e para a psicologia: uma ciência originária, primeira.
	A chave para a fenomenologia vem dos estudos com Franz Brentano (1838 – 1917). Opondo-se a Wundt, Brentano propõe que os atos mentais são experienciáveis, de modo que a psicologia, através da intuição (observação), é ciência empírica.
Brentano apresenta os atos psíquicos como intencionais. Resgata esse conceito da filosofia de Aristóteles. Na tradução latina da filosofia aristotélica, intentio significa dirigir-se a... (Devemos tomar muito cuidado para não confundir este conceito com a ideia comum de “intenção”, que significa desejo, motivação, etc.) Desta ideia, Husserl desenvolve o a priori da correlação: consciência é consciência de... e todo objeto só é enquanto visado por uma consciência. Intencionalidade significa que toda consciência é de algo e todo algo só é enquanto referido à consciência que se tem dele.
Nessa formulação, Husserl lança mão de um aspecto da Psicologia de Brentano que será característico da fenomenologia e de toda psicologia fenomenológica que nela se inspira: consciência é ato, não é um receptáculo. 
Com o conceito de intencionalidade, Husserl supera o Psicologismo, que prioriza o Sujeito na relação Sujeito-Objeto, e o Logicismo e Naturalismo, que priorizam o mundo objetivo e natural, o Objeto na relação Sujeito-Objeto. Para a fenomenologia, Sujeito e Objeto são intimamente relacionados, indissolúveis. Por isso, Feijoó (2011) afirmaque com a noção de intencionalidade, portanto, escapa-se das articulações metafísicas a partir da fenomenologia e encontram-se possibilidades outras de se tratar o fenômeno psíquico, sem perder a possibilidade de se falar em sentidos e significados psíquicos de maneira rigorosa. 
A Fenomenologia surge como tentativa de elaboração de uma ciência rigorosa, capaz de fundamentar as várias ciências. Por isso, Husserl a chama de Ciência Primeira. O princípio de intencionalidade da consciência rege que toda consciência é consciência de algo e que todo algo só é tal como aparece na consciência. “Consciência”, entretanto, não é um recipiente vazio que se preenche; é um ato. O objeto ao qual se dirige e que surge na relação intencional é sempre significativo.
Entretanto, nós não experienciamos essa relação íntima entre o nosso ver e a coisa vista, entre nosso sentir e a coisa sentida, entre nosso perceber e a coisa percebida. Husserl chama de atitude natural a nossa postura cotidiana de encontrar objetos “fora”, no mundo, como se existissem em si mesmos. A atitude natural pode ser descrita como aquela que consiste em pensar que o sujeito está no mundo como algo que o contém ou como uma coisa entre as demais. As ciências naturais operam sobre essa crença de que existem objetos em si no exterior, que podem ser observados, investigados e descritos a partir de suas propriedades imanentes. A atitude natural é a atitude ingênua.
A fenomenologia busca superar a atitude ingênua suspendendo a crença na realidade da existência em si do mundo exterior, resgatando a consciência como condição de aparição do mundo. Essa etapa do método fenomenológico chama-se epoché e pode ser caracterizada como a colocação entre parênteses da realidade independente da consciência, para que a investigação fenomenológica se volte para a fenomenalização dos fenômenos, isto é, seu aparecer na correlação intencional. Pela redução fenomenológica, a consciência se mostra consciência constituinte de mundo.
A tradição filosófica também deixou definições sobre o que é o homem. As várias abordagens psicológicas são exemplos disso; todas elas definem o que é o humano. Mas a fenomenologia é obrigada a colocar todas essas definições em suspensão. 
Com isso, Heidegger pergunta ao homem pelo seu ser, que seria o primeiro passo na colocação da pergunta pelo sentido de SER em geral. O livro Ser e Tempo torna-se, assim, uma analítica existencial. Heidegger reserva a este o termo Dasein, “ser-aí”, para diferenciá-lo dos demais entes.
 Traduzindo ao pé da letra, Da significa aí. Sein significa Ser. Dasein é ser aí. Mas, Heidegger visa descrever não os homens concretos, mas o ser dos homens. Daí a distinção da fenomenologia existencial entre ôntico – que é dos entes históricos, “concretos” (“existenciário”) – e ontológico, que se refere ao ser dos entes (“existencial”). (DASTUR & CABESTAN, 2015, p.40). 
A analítica do Dasein (ou “analítica existencial”) é uma descrição de aspectos essenciais da existência humana. Heidegger chama esses aspectos de “existenciais”, para diferenciar da palavra “categorias”, usada na filosofia para descrever as propriedades do ser de tudo o que não é humano. 
Ser e Tempo defende que o humano não é como as demais coisas do mundo, pois 1) seu ser está sempre em jogo (ou seja, é uma questão em aberto) e 2) Dasein compreende ser (ou seja, é abertura para ser de coisas, outros e si mesmo).
Medard Boss e Ludwig Binswanger, que desenvolvem a Daseinsanalyse, fundamentam os fenômenos encontrados na clínica nos “existenciais” descritos por Heidegger em Ser e Tempo.
 O conceito de Dasein se refere à constituição ontológica do ser que nós somos, costumeiramente chamados de “humanos”. Porém, Heidegger não utiliza o termo “ser humano” ou “homem” pois são termos que carregam significados não fenomenológicos acumulados ao longo da história do Ocidente. “Humano”, por exemplo, deriva de “húmus”, terra fértil, articulando-se com a tradição judaico-cristã de definição de homem. Por isso, Heidegger reserva o termo Dasein para indicar o ser que somos. (Cf. DASTUR & CABESTAN, 2015, p.34)
 No §9 de Ser e Tempo Heidegger escreve: “O ente que temos a tarefa de analisar somos nós mesmos. O ser deste ente é sempre cada vez meu. Em seu ser, isto é, sendo, este ente se comporta com o seu ser.” (1927, p.77) Isso significa que não há uma “essência” ou “natureza” para além dos modos concretos de existência. O livro Ser e Tempo é uma descrição fenomenológica – livre de pressupostos – da constituição ontológica do Dasein. Essa constituição é formada pelos “existenciais”, que são os caracteres ontológicos do Dasein.
* ONTOLÓGICO: Relativo à ou próprio da ontologia, a investigação teórica do ser. No heideggerianismo, relativo ao ser em si mesmo, em sua dimensão ampla e fundamental, em oposição ao ôntico, que se refere aos entes múltiplos e concretos da realidade
 Resumindo a concepção de Dasein de Ser e Tempo, podemos afirmar que o homem é um ser que é aí, no mundo (ser-no-mundo). E ser no mundo significa ser sempre uma relação significativa consigo mesmo, com os outros e com coisas (mesmo que essas relações estejam implícitas). A analítica do Dasein revela que o homem é ontologicamente no-mundo e com-os-outros. Ser e Tempo não se detém nas descrições dos diversos modos concretos em que nos relacionamos com os outros, pois não é essa a tarefa de Heidegger. 
 Sendo inacabado, o Dasein é ontologicamente possibilidade, ele se realiza em possibilidades. Isso significa que ninguém nasce pronto, mas precisa se realizar. Heidegger chama esse existencial de cura ou cuidado (Sorge, em alemão). O “realizar-se” é sempre situado em relação aos demais e à significatividade compartilhada. Não sendo pronto e acabado, o Dasein precisa sempre realizar-se como uma possibilidade; ao Dasein sempre está faltando algo. Heidegger diz que ele é sempre culpado. 
 A palavra culpa, em alemão, é Schuld, que significa também débito. Sendo inacabado, a existência está sempre em dívida consigo mesma de realizar-se. A única possibilidade que encerra a culpa e que só pode ser vivida por cada qual singularmente é sua própria morte. O Dasein se relaciona constantemente com essa sua própria possibilidade. Entretanto, essa possibilidade nunca é vivenciada por cada um, pois, quando acontece, não estamos mais aí para vivenciá-la.
Conteúdo 4 modulo 2
O projeto fenomenológico de Heidegger
A constituição ontológica da existência (Dasein)
 	O livro de Heidegger, Ser e Tempo, publicado em 1927, tem como tarefa a elaboração da fenomenologia como filosofia. E filosofia é, para ele, perguntar pelo SER, isto é, o que é a realidade? 	Quem somos nós? Tal como feito por toda a história ocidental. O método fenomenológico exige que se suspendam os pressupostos. Assim, Heidegger “coloca entre parênteses” as definições de SER legadas pela tradição filosófica. Precisa perguntar ao SER mesmo o que é. Para isso, começa seu perguntar pelo “ente que compreende ser”, que é o homem. Isto é, a existência é por ele assumida não como animal racional, nem como psiquismo, mas como abertura para coisas, si mesmo e outros serem. Somente o homem pergunta o que é o mundo? O que são as coisas? O que sou eu? 
A tradição filosófica também deixou definições sobre o que é o homem. As várias abordagens psicológicas são exemplos disso; todas elas definem o que é o humano. Mas a fenomenologia é obrigada a colocar todas essas definições em suspensão. 
Com isso, Heidegger pergunta ao homem pelo seu ser, que seria o primeiro passo na colocação da pergunta pelo sentido de SER em geral. O livro Ser e Tempo torna-se, assim, uma analítica existencial. Heidegger reserva a este o termo Dasein, “ser-aí”, para diferenciá-lo dos demais entes.
A condição humana descrita pela fenomenologia existencial
 O conceito de temporalidade é um conceito-chave na fenomenologia existencial. Heidegger escolhe-o para diferenciá-lo do conceito de tempo, que na tradição filosófica e no nosso uso comum já ficou associadoao tempo cronológico, o tempo do relógio. O tempo cronológico é uma sequência linear e infinita de “agoras”, que se inicia no passado e caminha em direção ao futuro. A modo de ser temporal do Dasein é outro.
 Heidegger se depara com essa questão quando se pergunta pela possibilidade de ser todo do Dasein. Ser todo significa: como o Dasein se completa? Dasein se completa quando realizou todas as suas possibilidades. Neste caso, o Dasein só seria todo quando deixa de ser, porém, deixando de ser, não realiza essa possibilidade. O Dasein que somos pode, por outro lado, experimentar-se como ser finito. É o que Heidegger chama de “decisão antecipadora” da morte. Devemos tomar cuidado com esta ideia, pois não significa que o Dasein imagina a sua morte, menos ainda que a procure. Significa que o Dasein se assume como um ser finito, isto é, que não pode tudo e que "tem" um tempo limitado para ser. Ao fazer isso, abre-se para sua facticidade, isto é, para o ente intramundano junto ao qual já se encontra. Numa interpretação mais livre, podemos dizer que o Dasein reconhece a singularidade e finitude da situação na qual se encontra.
 O Dasein existe, então, sendo em relação com o que ele ainda não é, mas pode ser. Um sapateiro, por exemplo, encontra seus instrumentos como instrumentos para o conserto do sapato, que ainda não está consertado, mas “pode” estar. Do mesmo modo, o ser-no-mundo se compreende a partir de possibilidades (futuras) próprias. Antecipa-se a si mesmo. Ao antecipar-se (futuro) presentifica seu mundo, no qual já estava. Um sapateiro, antecipando o consertar e antecipando-se como sapateiro, encontra-se com seu mundo naquela situação. Porvir (o termo que Heidegger usa para se referir ao futuro, protegendo-o das significações já cristalizadas), ser-sido (o termo que Heidegger usa para se referir ao passado, pelo mesmo motivo) e presentificação acontecem juntos; não há separação entre passado, presente e futuro.
 Por isso, a analítica do Dasein distinguirá dois modos de temporalização do Dasein: o próprio e o impróprio. Resumidamente, na temporalização imprópria o ser-no-mundo “vem a si”, compreende-se, a partir do que lhe acontecerá. Dessa forma, esquiva-se do peso do ter-que-ser, que a antecipação da morte desvela, esperando algo. Na temporalização própria, Dasein vem a si mesmo como ser finito, lançado e responsável por ser. 
Angústia e finitude do Dasein
Bibliografia básica: SAPIENZA, B.T. Encontro com a Daseinsanalyse: A obra Ser e tempo, de Heidegger, como fundamento da terapia daseinsanalítica. São Paulo: Escuta, 2015, Pg. 48-95.
As considerações de Heidegger acerca da temporalidade se desdobram na finitude do Dasein. Como vimos, a finitude não coincide com a morte. “Antecipação da morte” não significa imaginar-se morrendo. Até o contrário. Antecipação da morte significa assumir-se como um ser único, insubstituível, destinado a ser. Existir é tarefa. Essa ideia de Heidegger se faz presente no Existencialismo de Sartre através da ideia de que o homem é condenado a ser livre.
 O conceito de temporalidade, como já vimos, expressa o modo mais originário da existência de lidar com tempo; mais precisamente, de lidar com o próprio tempo. Embora Dasein lide cotidianamente com o tempo como uma sequência infinita de agoras (tempo cronológico), seu tempo mais original é aquele que reconhece sua finitude. Lançada na facticidade, a existência é um intervalo entre dois nadas.
 O nada se manifesta na angústia. É a dissolução do mundo, que revela ao Dasein seu ser como cuidado. Como cuidado, existir é tarefa que só se completa quando o Dasein realiza sua derradeira possibilidade. Heidegger lembra que a possibilidade da impossibilidade não pode ser confundida com a morte biológica. Numa passagem de Ser e Tempo, comenta que a morte biológica pode interromper possibilidades, assim como tardar a chegar.
 A temporalidade do Dasein traz muitas implicações para a compreensão dos fenômenos que interessam ao psicólogo. A primeira e mais radical é de que a existência humana não pode ser compreendida como um desenvolvimento linear do passado em direção ao futuro. Isto abre um forte debate com as psicologias explicativas. O pensamento natural-científico faz coincidir o sentido do fenômeno com sua causação temporalmente anterior. Ao observar um fenômeno psicológico, não se interessa por o que ele revela (seu sentido), mas imediatamente pergunta por que se dá dessa maneira, buscando sua resposta na sequencia temporal. 
Se for preciso indicar uma ênfase na temporalidade para a fenomenologia existencial, será o futuro, que Heidegger chama de porvir exatamente para diferenciar das significações já cristalizadas de futuro.
 O porvir é uma possibilidade de ser si mesmo que o Dasein assume como sua. A partir dessa possibilidade advém a si a sua história e os entes pertinentes. Em outras palavras, eu sou o que posso ser. É por isso que as psicologias humanistas, que se inspiram na fenomenologia-existencial (Não confundamos Psicologia Humanista com Daseinsanalyse!!!), enfatizam os projetos do ser humano, ao invés de buscar explicações em seu passado.
 O conceito de temporalidade traz grandes repercussões na psicopatologia. Os primeiros psicopatologistas fenomenológicos (Jaspers, Minkowski) elaboraram descrições das vivências psicopatológicas tendo em vista a temporalidade. Por exemplo, a depressão é um encurtamento no porvir, de modo que para o deprimido vem a ser apenas a perpetuação da dor e da tristeza.
 Talvez a mais importante implicação seja a nova ênfase dada aos conceitos de angústia e morte na prática clínica. A Daseinsanalyse coloca esses conceitos como centro de sua preocupação, reconhecendo nos fenômenos “psicológicos” modos de lidar com a própria finitude, antecipada, e com a angústia, enquanto perda de mundo e de si mesmo.
A concepção de história pessoal (historiobiografia) de Dulce Critelli
Bibliografia básica: CRITELLI, D. História Pessoal e Sentido da Vida – Historiobiografia. São Paulo: EDUC, 2012.
 A filósofa Dulce Critelli fundamenta suas reflexões nas filosofias de Martin Heidegger e Hannah Arendt, que, por sua vez, fornecem importantes compreensões para psicologia fenomenológica existencial. Para a autora, ambos os pensadores são complementares, mas há uma diferença notável entre eles no que tange ao sentido da filosofia. Enquanto para Heidegger a filosofia exige descomprometimento com a vida cotidiana, para a ex-aluna de Heidegger radicada nos EUA, a filosofia é a capacidade de avaliar a vida e de modificá-la. Para Arendt, a filosofia mantém uma relação íntima com a ação. Segundo Critelli (2012), “Quando pensamos, transformamos nossas crenças e, consequentemente, transformamos nosso jeito de viver.” (p.17)
 Por ação, Arendt se refere à condição humana. Existir é ser iniciador. Fiel ao princípio fenomenológico existencial de suspensão radical de quaisquer a priori que substancializam a existência, Arendt concebe o ser-no-mundo-com-os-outros como ação e palavras. A ação inicia algo novo mundo. Seu sentido vai se desvelando nas repercussões, consequências e desdobramentos. Por isso, o sentido de todo gesto humano depende dos outros. Nas palavras de Critelli (2013),
Nossos atos e palavras não são autosignificantes. Se eles ganham impulso nas nossas intenções, raramente as realizam. De um lado, porque à medida que se destinam aos outros (por condição humana, iniciadores como nós), eles podem interferir neles e modificar seu sentido. De outro lado, porque o sentido e o significado de nossos atos e palavras sé se completam pelos efeitos e consequências que provocam. (p.36)
 Assim, a existência, que é concomitantemente singular (eu sou) e plural (no mundo com os outros), pode perder a autoria de sua história. Como atora dos próprios gestos, seus significados podem ser transformados pelos outros. A fala é a capacidade de explicitar o sentido intencionado, preservando a autoriada ação.
 Essas reflexões são muito importantes para a psicologia fenomenológica existencial, pois esta suspende as noções de psiquismo, sujeito e indivíduo, reconhecendo o outro como existência singular e plural, no mundo com os outros, constitutivamente estando em jogo a autoria de sua biografia.
Historiobiografia e Sentido da Vida
Bibliografia básica: CRITELLI, D. História Pessoal e Sentido da Vida – Historiobiografia. São Paulo: EDUC, 2012.
 A filósofa Dulce Critelli nomeia Historiobiografia a “abordagem terapêutico-pedagógica que tem por intenção a redescoberta do sentido da vida através da compreensão da história pessoal.” (p.12) Esse termo é composto por história e biografia, apontando para dois aspectos fundamentais do existir humano.
 História significa tanto o “conjunto de conhecimentos relativos ao passado da humanidade” (HOUAISS, 2013), quanto uma narrativa. Esses dois sentidos de articulam na existência humana. Somos seres históricos, isto é, lançados em contextos significativos históricos compartilhados já dados, e biográficos, isto é, que constituímos nossa história pessoal ao longo do existir. Por isso, quem é alguém só pode ser dito quando já foi; a todo momento nossas ações podem inaugurar novos sentidos, que reverberam no já vivido.
 A todo o momento é possível uma reflexão sobre a história que está em andamento. Isso é necessário, pois existir é estar em risco de perder o próprio ser (a autoria da própria vida) nas interpretações do senso comum. Também é fundamental para cuidar das possibilidades porvindouras, realizando a possibilidade humana de lançar-se em direção ao que ainda não é, mas pode ser (POMPEIA, 2012), cuidando para que a vida seja melhor.
Critelli (2012) indica três “guias de viver”: 1) Relatos, 2) Historietas e 3) Histórias. Diferenciam-se pela abrangência temporal e pela complexidade de cada um. A identidade pessoal se costura pelos fios dessas formas de narrativa.
Noções básicas da Daseinsanalyse de L. Binswanger
Bibliografia básica: DASTUR, F. & CABESTAN, P. (2015) “A obra fundadora de Ludwig Binswanger (1881-1966)”, cap. II.A, pg.64-101
 Ludwig Binswanger (1881 – 1966) é da terceira geração de psiquiatras em sua família responsáveis pelo sanatório de Bellevue. Após formar-se em medicina, faz residência psiquiátrica na clínica de Burghözli, chefiada por Eugen Bleuler (que cunha a esquizofrenia), sob supervisão de Carl Jung. 
A psiquiatria dessa época era ou organicista, ou psicanalítica (Freud). Em Burghözli, a psicanálise florecia, sendo Bleuler um importante disseminador das ideias de Freud e Jung, então, importante entusiasta. Durante a residência Binswanger aprofunda seus estudos na psicanálise, o que o leva a iniciar correspondência com Freud que perdura até falecimento deste. Mas o interesse pela psicanálise e a proximidade com seu fundador não impedem que Binswanger, desde cedo, questione o naturalismo da psicanálise. Encontra fundamentação para sua crítica primeiro na fenomenologia de Husserl e sua concepção de consciência intencional e, em seguida, na descrição da existência empreendida por Heidegger em Ser e tempo. Daí a ser o primeiro a desenvolver uma Daseinsanalyse voltada para o sofrimento existencial (não “psíquico”) manifesto na psicopatologia.
Da analítica existencial, Binswanger recolhe a noção de ser-no-mundo, a fim de buscar uma compreensão dos modos de ser psicopatológico como modificação nessa estrutura. Ou seja, na experiência psicopatológica, mundo estrutura-se diferentemente que na experiência saudável.
O início da influência de Heidegger em sua obra se faz notar a partir de 1930, quando publica o artigo Sonho e Existência. Esse artigo, cuja tradução para o francês foi prefaciada por Michel Foucault, encontra-se traduzido para o português1. Nele, Binswanger discute a experiência onírica, tema tão caro à psicanálise, contrapondo à hipótese freudiana genética e simbólica a ideia de que o sonhar é um modo de existir. Cabe ao investigador fenomenólogo compreender a experiência manifesta no sonho e, principalmente, o “espaço afinado” que nele se apresenta. Isto é, o sonho revela o mundo espacial e temporal peculiar ao sonhador. Como afirmam DASTUR & CABESTAN (2015, p.72), “É o tema que o Dasein se dá no sonho que é importante, não o que ele simboliza, e é, então o conteúdo desse drama, dessa ação que é o sonho, que constitui seu elemento decisivo.” O sonho não é produzido por uma subjetividade, como propunha Freud, mas um acontecimento, uma visitação; “vem a mim um sonho”. 
Do filósofo pré-socrático Heráclito Binswanger retoma a oposição entre mundo privado (idion) e mundo comum (koinon). Em vigília, a existência compartilha com os demais um mesmo mundo (koinon), ao passo que dormindo, está solitário (idios). Essa oposição se articula à compreensão de Binswanger da experiência psicopatológica como envolvimento com o mundo próprio em detrimento da experiência compartilhada. 
Ao contato cotidiano com o sofrimento psicopatológico, Binswanger acrescenta uma preocupação epistemológica e metodológica com a psiquiatria, que deveria, na sua concepção, fundamentar-se numa visão clara e correta sobre a existência, que o discurso científico não é capaz de fornecer.
 A primeira fase daseinsanalítica da psiquiatria de Binswanger apoia-se na analítica existencial de Ser e tempo, de Heidegger, conforme discutido acima. O primeiro marco desse trabalho é o artigo “Sonho e Existência”, que discute os fenômenos de ascensão e queda como modos de a existência especializar-se. 
 Em 1942 o psiquiatra publica sua principal obra, Formas fundamentais e conhecimento do Dasein, na qual enuncia sua “visão de homem”. Recorre à analítica existencial de Heidegger, mas substitui o cuidado como essência do Dasein pela relação dual Eu-Tu (descrita por Martin Buber).1 Elabora, assim, uma fenomenologia do amor, que, a seu ver, é o fundamento do ser si-mesmo do Dasein. Explicam Dastur & Cabestan (2015): Encontram-se repetidas vezes alusões a essa diferença fundamental de ponto de vista, sendo o ponto de partida da análise existencial de Heidegger a Jemeingkeit, a qualidade do que é sempre a cada vez meu, ao passo qie o da antropologia biswangueriana é a Ursrigkeit, a nostridade. (p.80)
 Em razão dessa diferença, o pensamento de Binswanger distancia-se de Heidegger e retorna à fenomenologia de Husserl, mais precisamente à questão da consciência interna do tempo.
 A análise fenomenológica da consciência do tempo empreendida por Husserl mostra que tempo não é algo objetivo, cronológico, externo à consciência. A consciência do tempo diz respeito à articulação a cada momento do que já foi objeto da consciência (e permanece como retido – “retenção”) e o que é antecipado (“protenção”). Dito em termos menos precisos, passado e futuro estão presentes a cada momento. Binswanger retoma essa análise husserliana para considerar modificações estruturais na consciência de tempo na psicopatologia. Por exemplo, no melancólico o futuro é vivenciado como já vivido; “a proteção está infiltrada de momentos retentivos.” (DASTUR & CABESTAN, 2015, p.92). No maníaco, retenções e protenções cedem lugar ao instante atual, de modo a vivenciar somente o presente, a momentaneidade. No esquizofrênico, a estrutura temporal esfalece-se, aniquilando a experiência vivida. 
 Binswanger é fenomenológico na concepção de realidade que subjaz às análises da psicopatologia. Para ele, “o mundo real reside apenas na pressuposição constantemente prescrita de que a experiência continuará constantemente a se desenrolar segundo o mesmo estilo constitutivo.” (BINSWANGER, 1993, apud DASTUR & CABESTAN, 2015, p.90) Ou seja, mundo é uma trama de sentido que tende a permanecer a mesma. Mas, na experiência psicopatológica, esse apoio se perde. 
Apresentação da Daseinsanalyse desenvolvida por Medard Boss
Bibliografia Básica: EVANGELISTA, P. A Daseinsanalyse de Medard Boss. In: EVANGELISTA, P. (org.) Psicologia fenomenológico-existencial,pp. 139 – 158.
Medard Boss (1903 – 1990) é o psiquiatra suíço que realizará mais plenamente a interlocução entre a analítica existencial (ontológica) de Heidegger e a prática clínica. Ele se forma médico em Zurique e logo inicia análise didática com Freud (1925) para se tornar psiquiatra psicanalista. Faz residência na clínica de Bulghözli, chefiada então por Eugen Bleuler (que conceitua a esquizofrenia, cunhando esse termo), na mesma época em que Carl Jung trabalha lá. É nessa clínica que ele entra em contato com o pensamento de Binswanger, que vai ao encontro de sua própria sensação de que as ciências do homem erram ao pressupor uma cisão entre existência e mundo (sujeito e objeto). Como já visto, isso era para Binswanger “o verdadeiro câncer da ciência”.
A II Guerra é ocasião para Boss ler Ser e tempo, de Heidegger, e iniciar troca de correspondências que levará a uma amizade pessoal. As cartas, assim como protocolos dos encontros realizados na casa de Boss em Zollikon foram publicados sob o título Seminários de Zollikon (Petrópolis: Vozes, 2009) e fornecem ao estudioso da psicologia fenomenológico-existencial referências muito importantes. Segundo Boss, Heidegger viu no contato com o psiquiatra a possibilidade de que a fenomenologia da condição humana pudesse contribuir para as formas de cuidado com a existência.
Apoiando-se na ontologia fundamental de Ser e tempo, Boss assume como tarefa entender o que e como acontece a relação psicoterapêutica sem recorrer a hipótese. Ou seja, assume da fenomenologia a suspensão (epoché) como passo necessário para que os fenômenos se mostrem tal como são. Como Boss é psiquiatra e psicanalista, ele suspende os pressupostos médicos e psicanalíticos a fim de conhecer a relação que se estabelece entre médico/psicanalista e paciente. É disso que tratam suas principais obras, como Psicanálise e Daseinsanalyse (1957), Fundamentos Existenciais da Medicina e da Psicologia (1971): uma refundação na fenomenologia existencial dos fenômenos clínicos e dos modos de ser-sadio e adoecer da existência.
Indicação dos existenciais pertinentes ao Dasein
Bibliografia Básica: EVANGELISTA, P. A Daseinsanalyse de Medard Boss. In: EVANGELISTA, P. (org.) Psicologia fenomenológico-existencial, pp. 139 – 158.
 A descrição fenomenológica da existência como ser-no-mundo possível é o fundamento da psicologia fenomenológico-existencial (Daseinsanalyse). O psicólogo que fundamenta o seu trabalho nesta abordagem está interessado em compreender junto ao(s) outro(s) como é seu mundo e como se lança nesse que é o seu mundo, resgatando sua condição ontológica de ser-possível.
Assim, Boss recorre a processos psicoterapêuticos próprios e de supervisionandos para pesquisar o que acontece na relação entre terapeuta e paciente costumeiramente chamado de “cura”. Esse termo tem forte viés médico e significa, nesse contexto, remissão de sintomas. Na Daseinsanalyse, “cura” significa o resgate da liberdade para dispor de si, podendo aceitar e recusar solicitações dos entes que vêm ao encontro. Ou seja, os modos de ser-doente são momentos de restrição na vida da existência, nos quais se encontra impedida de assumir possibilidades existenciais.
Exemplos disso são os chamados sintomas histéricos tão discutidos pela psicanálise. Enquanto a teoria de Freud os explica como resultantes do acúmulo de energia sexual e consequente descarga, a fenomenologia existencial não pode recorrer a uma explicação que hipotetize o funcionamento psíquico como um aparelho hidráulico. Assim, pergunta quais são os modos de ser, as possibilidades existenciais que se realizam e como se realizam nesses chamados sintomas histéricos. Uma mulher que, andando na rua, vê um homem a quem se sente atraída e suas pernas se paralisam é alguém que sente, ao mesmo tempo, atração e repulsa, isto é, motivação para aproximar-se e distanciar-se. A paralisaria é o modo como realiza esses movimentos opostos simultaneamente. Incapaz de assumir seu desejo, pois em seu mundo o que é do âmbito do sensual e do sexual é vivido como pecaminoso, não deixa essas possibilidades existenciais serem.
Vale lembrar que os sintomas não são interpretados como entidades diferentes que se instalam no paciente. São modos de ser, isto é, modos de realizar possibilidades existenciais, com a especificidade de que tais possibilidades não são abertamente assumidas como próprias.
Para tecer suas análises, Boss recorre à descrição fenomenológica da existência realizada em Ser e tempo por Heidegger, que apresenta os existenciais, ou seja, a constituição ontológica da existência. Os existenciais indicam modos de a existência acontecer, sendo que se dão no mundo, à luz de possibilidades concretas. Em outras palavras, Heidegger descreve a existência como ser-no-mundo, ser-com-outros, finitude, espacialidade, temporalidade, etc., conforme já visto no livro de SAPIENZA (2015). Como cada existência é com outros, como especializa-se, como são seus mundos varia para cada um.
Com análises assim, Boss cuida para que a experiência do paciente possa se manifestar sem o recurso a teorias hipotéticas, cumprindo, assim, o imperativo fenomenológico de voltar às coisas mesmas.
Concepção de uma Psicoterapia daseinsanalítica
Bibliografia básica: JARDIM, L.E. Ação e Compreensão na clínica fenomenológico-existencial. In: EVANGELISTA, P. (org.) Psicologia fenomenológico-existencial, pp. 45 – 76.
 Do ponto de vista dos procedimentos, a psicoterapia daseinsanalítica acontece como aquela que a inspirou, a psicanalítica. Medard Boss defende o uso do divã, a análise de sonhos, a relação terapêutica como foco do processo. (Evangelista, 2015) Mas a fundamentação é outra. A Daseinsanalyse assume que terapeuta e paciente são existências e que o paciente, que procura o psicólogo, encontra-se restrito na liberdade para assumir certas possibilidades existenciais. Tais restrições manifestam-se como modos de ser que incomodam o paciente, pois ele não se reconhece neles. Ademais, considera-os “sintomas”, “problemas”, “desajustamentos” e espera que o psicólogo possa os eliminar, restaurando os modos de ser anteriores ao surgimento dos mesmos.
No modelo científico-natural, causal, de pensamento, caberia ao psicólogo investigar a etiologia dos incômodos para, de posse das causas, planejar e implementar uma intervenção. Esse é o modo de proceder da Era da Técnica, que visa a produção no menor tempo possível. Uma psicoterapia que correspondesse a esse modo de ser produziria efeitos planejados pelo terapeuta, isto é, conduziria o paciente ao modo de ser concebido pelo psicólogo como o melhor para ele. O paciente, por sua vez, coloca-se passivo nesse processo, no sentido de que recebe orientações e, enfim, o tratamento. Pompeia & Sapienza explicam que, numa época em que toda experiência é controlada, o que o paciente espera é conseguir controlar, dominar, o sofrimento que o está controlando e dominando. (Pompeia & Sapienza, 2011)
Não é esse objetivo do processo psicoterapêutico. A ação do psicólogo deve ser pensada como ação clínica. Ação clínica aproxima-se do sentido etimológico de técnica (tekhné), que significa o deixar vir à luz algo que permanecia oculto. Ou seja, a ação clínica não conta antecipadamente com resultados, pois o futuro não pode ser controlado pela existência. A ação clínica como tekhné propicia o surgimento de algo que pode ou não vir a acontecer, cria um terreno fértil em que pode ou não vir à luz novo modo de ser da existência. Que modos podem vir à luz? Cada existência precisa ouvir-se, aproximar-se do que o incomoda, ao invés de tentar eliminá-lo a todo custo, dominando-o. Pompeia & Sapienza (2011) jogam com o sentido etiológico de “dominar”, que é o termo em latim domus, que significa casa. Ao invés de dominar o que aflige, o convite da terapia daseinsanalítica é aproximar-se, deixar-se sentir em casa, com o o que aflige, a fim de escutar seu sentido e, quiçá, experimentar novos modos de ser mais livres. Isso ocorre por meio da compreensão.
Aproximando-se do mundo do paciente,este e o psicoterapeuta buscam compreender o sentido do que se passa consigo. Essa compreensão já é a ação clínica, pois é a experiência de aproximar-se de si e deixar o sentido, que permanece oculto, aparecer.
Ação e compreensão na clínica fenomenológico-existencial
A partir da caracterização de psicoterapia acima, a concepção de fenomenologia enquanto um arcabouço teórico não se sustenta e esta passa a ser entendida como uma postura do terapeuta que favorece ao paciente revelar-se como fenômeno.
A postura do terapeuta exige, portanto, a escuta atenta e um demorar-se nas situações relatadas, visando explicitar os sentidos vividos pelo paciente nas descrições de suas experiências.
A compreensão, na analítica do dasein, é um aspecto fundamental da condição de estar lançado do homem implicando na condição de ser-no-mundo. O ser-aí habita o mundo faticamente em sua abertura constitutiva. Assim, a ação clínica enquanto disponibilidade para a compreensão do existir se configura como oportunidade para explicitação dos sentidos.
Paciente e terapeuta, no processo de psicoterapia, cohabitam um "aí" (abertra de mundo) no do qual os modos concretos de ser do paciente se mostram e podem ter seus sentidos des-velados. As tonalidades afetivas que tingem cada experiência podem ser reconhecidas e o paciente pode se ver responsável pelas escolhas que faz.
Desse modo a ação clínica em uma perspectiva fenomenológico-existencial não está ocupada em resolver problemas, retirar sintomas ou adequar o paciente a referências alheias, mas sim, está comprometida em oferecer uma experiência de retomada do próprio acontecer histórico; do já vivido, do atual e do porvir, recolocando o existir do paciente no processo de ser.
A psicóloga Carmem Barreto, estudiosa da ação clínica na perspectiva fenomenológica existencial, define-a assim:
Assim, a atitude clínica mostra-se intimamente associada à própria atitude fenomenológica de suspensão das objetivações da existência e abertura à experiência de si e do outro como ser-no-mundo-com, como cuidado ontológico, condição de possibilidade para o acontecimento de uma transformação não produzida tecnicamente, mas emergente em forma de reflexão sobre o sentido. Esse novo “olhar”, essa quebra do habitual, pode ter início a partir dos estranhamentos ecoantes nas brechas de nossa existência superficial via “acontecimentos” que, ao provocarem ruptura e transição, destroçam e fundam horizontes de mundo, se e quando cedemos ao apelo dos traços fundantes e constitutivos (ontológicos) do nosso ser si-mesmo próprio e singular. Tal rompimento possibilita mudança e transformação ao abrir a crise que dissolve e leva o “aí” a constituir-se outro. (SÁ & BARRETO, 2011, p.393)
Aspectos da psicoterapia fenomenológico-existencial
A psicóloga Ana Maria Feijoo (2011) delimita pontos fundamentais para uma psicologia fenomenológico-existencial. A condição existenciária descrita por Heidegger em Ser e tempo e a concepção da “realidade” como desvelamento (aletheia) são o núcleo desta psicoterapia.
O existenciário ser-para-a-morte indica a radical finitude da existência, ou seja, que está singular e insubstituivelmente entregue à tarefa de ser (ou seja, “realizar sua existência”) e que seu desdobrar-se é temporal. Por mais que cotidianamente submeta a tutela da existência ao “a gente”, tal submissão nunca é total; é, outrossim, ilusória, pois a tutela da existência cabe unicamente a cada um.
Sendo fenomenológica, a psicologia clínica na perspectiva fenomenológico-existencial compromete-se com o exercício hermenêutico nos atendimentos psicológicos, buscando o desvelamento dos sentidos das vivências ônticas do paciente/cliente. Ou seja, não há um modelo psicológico, nem ideal de saúde ou doença ‘psicológica’, pois cada existência é sua própria medida.
Este compromisso da clínica fenomenológico-existencial considera que as experiências de sofrimentos são articuladas com a restrição do poder-ser do homem, portanto a realização da existência é aproximar-se do seu ser-próprio. Assim, a prática clínica nesta abordagem está comprometida com a desconstrução das identificações restritivas. Essa desconstrução não é apenas teórico-cognitiva, pois, para que possa se dar, exige uma tonalidade afetiva que rompa as determinações (‘identidades’) cotidianas: angústia (dissolução dos nexos significativos) ou tédio (falta de sentido).
A compreensão é entendida enquanto ação na clínica fenomenológica, pois compreender possibilita esclarecer o modo de ser-no-mundo dos pacientes. O esclarecimento contribui para que o paciente possa se tornar responsável por suas escolhas, ou seja, assumindo sua condição de poder-ser.
A psicoterapia fenomenológico-existencial não está comprometida em tratar, adequar ou fazer com que o paciente se adapte ao mundo, mas, sim, oferecer espaço para que o cuidado pela própria existência possa ser assumido pelo paciente. Por esse motivo, Pompeia & Sapienza (2013) a definem como “procura, via poiesis, pela verdade que liberta para a dedicação ao sentido.” (p.169)
 Poiesis é o termo grego, origem da palavra poesia. Significa pro-dução, isto é, realização de algo que antes não existia, condução de algo possível ao aberto do mundo. Poiesis está associado a techné, que é a ação que propicia o surgimento de algo. Poiesis é uma modalidade de discurso: a fala poiética. Nesse modo de discurso, algo se apresenta e pode ser abarcado, compreendido, compartilhado. O discurso poiético está no polo oposto do discurso lógico, persuasivo.
 Para compreendermos ‘liberdade’, precisamos desdobrá-la em ‘liberdade de...’ e ‘liberdade para...’ O senso comum entende liberdade como ausência de solicitações (liberdade de...). Em geral, quando alguém procura terapia está querendo se livrar de algo que oprime e restringe. Mas a terapia age na direção da liberdade para ouvir, compreender e poder (obedecer, de ob-audire) lidar com as solicitações do existir.
 Na concepção latina, verdade vem do étimo veritas, que significa a correspondência entre a ideia (conceito) e o objeto. Ao longo da história filosófica ocidental, a correspondência é garantida pelo método, que deve seguir as regras lógicas de demonstração. Assim, a verdade (veritas) é demonstrável. Mas, veritas é a tradução latina para o termo grego aletheia, que significa des-velamento, des-ocultação. Heidegger (1927/1998) resgata o sentido original de verdade como o mostrar-se algo. Esta verdade (aletheia) é reconhecida, compreendida, pois se refere ao como algo se mostra para mim.
 Sentido é aquilo que na “hora em que falta, todos nós sabemos de que se trata.” (Pompeia, 2010, p.164) Sendo fundamentalmente possibilidade, o ser-no-mundo só existe enquanto encontra a significância das coisas, dos outros e de si mesmo, à luz dos projetos nos quais está lançado. É a dedicação ao projeto de sentido (que Pompeia chama de ‘sonhos’) que está comprometida quando a existência está restrita. Por isso, a psicoterapia daseinsanalítica visa resgatar a possibilidade de escutar o que o existir solicita (sentido) para poder ser.
Psicoterapia infantil fenomenológica existencial
Bibliografia básica: FEIJOÓ, A. M. “3.1. Considerações acerca da criança e a clínica psicológica infantil.” A Existência para além do Sujeito, pp. 90 – 107
 Para compreender o atendimento psicoterapêutico fenomenológico-existencial com crianças é necessário que deixemos de lado as “teorias tradicionais acerca do desenvolvimento, da personalidade, da aprendizagem da criança,” (Feijoo, pp. 91) que postulam a chegada de um bebê ao mundo como um ser autocentrado e/ou encapsulado. Ou seja, é necessário realizar uma epoché de pressupostos já presentes no nosso entendimento científico e/ou do senso comum.
Para a fenomenologia-existencial o ser-aí da criança já se constitui como um Dasein. O nascimento biológico do ser humano delimita a inauguração da existência e, portanto, da condição de estar lançado no mundo. Assim, o ser-aí da criança é entendido enquanto um ente com caráterindeterminado, lançado no mundo tendo de ser.
Para aprofundar a compreensão do ser-aí da criança é necessário retomar a noção de intencionalidade proposta por Husserl. Nela a consciência é considerada em sua imanência, ou seja, se realiza enquanto uma ação de dirigir-se a... e constitui a cooriginalidade de homem e mundo. Todo ato é tido como intencional, incluindo os atos de sugar, chorar e dormir do bebê que podem ser, equivocadamente, entendidos enquanto reflexos. Com isso, afastamo-nos das determinações biológicas ou sociais e aproximamo-nos da ideia que o mundo oferece possibilidades para a criança ser do seu modo. O ser-aí do bebê é marcado pela quietude, calor, alimentação e estado de sono. Porém, o ato de assustar-se com algum barulho já evidencia a articulação do bebê com o espaço, pois é um modo de responder ao que lhe solicita na abertura de mundo que ela é. O sentido desse gesto acontece no ser-no-mundo-com-outros, tal como descrito por Critelli em Historiobiografia (2012)
Por fim, temos que considerar que a responsabilidade e liberdade são dimensões constitutivas do ser-aí para a psicologia fenomenológico-existencial, porém, na vida das crianças, tais dimensões estão sob tutela temporária dos adultos responsáveis por elas. Esta peculiaridade do modo de ser da criança estabelece objetivos claros para o atendimento psicológico infantil, pois a psicoterapia, neste contexto, deve oferecer espaço para que a criança possa preencher com seus significados e experimentar na sessão sua responsabilidade para ser, sendo acompanhada no desenrolar do processo. Desse modo, a criança pode experimentar as dimensões ontológicas e cuidar de si.
Neste sentido, o atendimento psicológico infantil não deve ser confundido com psicodiagnóstico ou trabalho pedagógico como reforço escolar. O psicólogo não deve ocupar o lugar dos pais ou da escola que assumem a tutela temporária das responsabilidades da criança, pois esta ainda não pode assumi-las por completo.

Continue navegando