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Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com COMO CITAR ESTE MATERIAL SARDINHA, A. Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde. 1. ed. Rio de Janeiro, 2018. E-book. ISBN: 978-85-924268-2-8. Disponível em: < >. Acesso em: dia/mês/ano. Este e-book é um trabalho autoral de produção independente. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, inclusive quanto às características gráficas e/ou editoriais, sem a devida citação da fonte. A violação de direitos autorais constitui crime (Código Penal, art. 184 e Lei nº 6.895 /1980) sujeitando – se à busca e apreensão e indenizações diversas (Lei nº 9.610/98).” A versão que você adquiriu está também personalizada com seus dados tanto impressos na página do pdf quanto no código das versões para dispositivos eletrônicos. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com SUMÁRIO INTRODUÇÃO 6 SOBRE A AUTORA 9 OS PILARES DA SEXUALIDADE 12 ASPECTOS RELEVANTES PARA A QUEIXA SEXUAL 24 RESPOSTA SEXUAL 31 DISFUNÇÕES SEXUAIS 39 ANATOMIA E FUNCIONAMENTO SEXUAL FEMININO 48 ANATOMIA E FUNCIONAMENTO SEXUAL MASCULINO 58 A SEXUALIDADE NO SÉCULO XXI 64 MEDICAMENTOS E SEXUALIDADE 70 CONTRACEPÇÃO E SEXO SEGURO 75 REFERÊNCIAS 83 Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 6Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde INTRODUÇÃO Imagino que você já deve ter ouvido falar que “todo mundo tem problemas sexuais”, não é mesmo? Entretanto, quantos de nós, psicólogos, profissionais de saúde ou de educação, tem formação específica e segurança sobre a forma mais adequada de abordar a sexualidade dos nossos pacientes e alunos, ou mesmo ajudá-los com as suas dificuldades se- xuais? Foi exatamente assim que eu me senti no início da minha prática clínica. Hoje, depois de mais de 10 anos atuando como psicóloga e supervisora clínica no campo da sexualidade, entendo que é minha missão fazer chegar a um número cada vez maior de profissionais informações de qualidade. Acredito que quan- to mais profissionais tiverem acesso a conhecimentos sobre Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 7Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde sexualidade, melhor será o cuidado e a orientação que eles podem oferecer às pessoas em relação às questões da sexu- alidade. Quem sabe assim, no futuro, menos gente tenha “problemas sexuais”? A Terapia Cognitiva Sexual é uma proposta de psicotera- pia que reúne os elementos centrais das Terapias Cognitivo Comportamentais com as mais recentes evidências científi- cas no campo da sexualidade. Desde que nós apresentamos a Terapia Cognitiva Sexual, a receptividade dos alunos, co- legas e profissionais de diversas áreas foi muito positiva. De lá para cá, já formamos muitos alunos em cursos presenciais no Rio de Janeiro e fui convidada para dar palestras, cursos e workshops em diferentes partes do Brasil. Entretanto, che- gou um momento, em que eu percebi que a demanda pela Terapia Cognitiva Sexual era maior do que a minha capaci- dade de estar presente em todos esses lugares. Foi quando surgiu a ideia de criar este livro e também o Curso Online de Terapia Cognitiva Sexual. Espero que, na medida em que este conteúdo vai estar dis- ponível online, possamos fazer chegar informação de quali- dade sobre sexualidade de norte a sul do Brasil. Além disso, um diferencial deste material é que ele não visa só transmi- tir um monte de informações. Na minha experiência como professora e supervisora, descobri que meus alunos tinham muitas dificuldades em lidar com a sexualidade das pesso- Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 8Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde as. Por isso, nas próximas páginas, eu vou guiar você por uma série de reflexões sobre a prática e a própria formação profissional, com perguntas e exercícios práticos, que vão te permitir compreender melhor de onde vem as suas dificul- dades na abordagem da sexualidade e como superá-las. Vamos embarcar juntos nessa jornada de conhecimento? Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 9Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde SOBRE A AUTORA Aline Sardinha é psicóloga graduada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e Terapeuta Cognitivo Comportamental certificada pela Federação Brasileira de Terapias Cognitivas. É professora do Programa de Pós-Gra- duação em Terapia Cognitivo Comportamental da Univer- sidade Salgado de Oliveira (Universo, RJ) e atua também em clínica particular como psicoterapeuta e supervisora. Tem doutorado e mestrado em Saúde Mental pelo Labo- ratório de Pânico e Respiração do Instituto de Psiquiatria da UFRJ (IPUB/UFRJ) e especialização em psicoterapia de família e casal (PUC-Rio). Tem experiência e interesse nas áreas de Terapia Cognitivo-Comportamental, sexualidade e terapia de casal. É ex-presidente da Associação de Terapias Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 10Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde Cognitivas do Rio de Janeiro (ATC-Rio, www.atc-rio.org. br, 2014-2016), e membro da Diretoria da Federação Brasi- leira de Terapias Cognitivas (FBTC, gestões 2011-atual). É membro do Grupo de Trabalho Pesquisa básica e aplicada em uma perspectiva Cognitivo-Comportamental da Asso- ciação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicolo- gia (ANPEPP). Foi coordenadora e supervisora clínica do Curso de Extensão de Qualificação e Treinamento Profis- sional em Terapia Cognitivo Comportamental do Institu- to de Psiquiatria da UFRJ (IPUB). Já ministrou aulas em cursos de pós-graduação, preparatórios para concursos, atualização e extensão e também palestras e workshops em diversas partes do Brasil. Em 2007, foi pesquisadora visi- tante no Center for Evolutionary Psychology, na University of Califórnia, Santa Barbara (UCSB) na Califórnia, EUA. e “Equipe de Neuropsicologia do Montreal Neurological Ins- titute (McGill), em Montreal, Canadá. Em 2011 foi profes- sora de Psicopatologia, Psicofarmacologia e Neurociência e Comportamento do curso de graduação em Psicologia do Uni-IBMR/Laureate. Em 2012, completou a formação em Coaching pelo Centre for Coaching, Middlesex University, Londres – Inglaterra. É autora do site Pílulas de Bem Es- tar, de divulgação de conhecimento científico sobe psico- logia, saúde e bem estar voltado para o público leigo (www. pilulasdebemestar.com.br). Possui diversos capítulos de li- vro e artigos publicados em revistas científicas brasileiras e estrangeiras indexadas, outros trabalhos já aceitos para Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 11Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde publicação, além de pesquisas apresentadas em congressos nacionais e internacionais. Pelo ISI tem um índice-H de 5 e 69 citações e pelo SCOPUS 26 artigos, índice-H de 8 e 158 citações recebidas. É autora do livro Terapia Cognitiva Sexual: uma proposta integrativa na psicoterapia da sexu- alidade (2017) e do Baralho da Sexualidade: conversando sobre sexo com adolescentes e adultos (2017). Aline Sardinha é autora da Terapia Cognitiva Sexual, uma psicoterapia de abordagem cognitivista e contextual espe- cificamente voltada para o tratamento das questões sexu- ais. Desde que a Terapia Cognitiva Sexual foi apresentada, inúmeros alunos – entre psicólogos e outros profissionais de saúde já foram formados em cursos presenciaisna abor- dagem ou são supervisionados diretamente pela Dra. Aline. Agora, a formação em Terapia Cognitiva Sexual será possí- vel também na modalidade à distância, através do recém- -lançado Curso Online de Terapia Cognitiva Sexual. Para saber mais ou entrar em contato, acesse o site: www.alinesardinha.com Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 12Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde Ao receber uma pessoa com queixa sexual no consultório, o profissional deve ter em mente questões muito diversas, desde aspectos básicos ligados a anatomia e resposta sexual fisiológica até conceitos mais complexos, como de que for- ma as disfunções sexuais são entendidas atualmente e como devem ser observadas do ponto de vista social e cultural. Para começar a compreender esses pacientes, devemos co- nhecer os pilares da sexualidade. A imagem a seguir mos- tra os quatro pilares que dão base à sexualidade humana: o sexo biológico, a identidade de gênero, o papel sexual e a orientação sexual. OS PILARES DA SEXUALIDADE CAPÍTULO 1 Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 13Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde Figura 1: Os pilares da sexualidade. (imagem: Dra Aline Sardinha) O primeiro pilar é o sexo biológico e, durante muito tempo, as diferenças biológicas entre homem e mulher foram utili- zadas para definir a sexualidade e o gênero de uma pessoa. Atualmente, no entanto, consideramos também aspectos subjetivos, fundamentais na prática do profissional. O segundo pilar é a identidade de gênero, que não está rela- cionada apenas a aspectos biológicos, mas também a ques- tões sociais, históricas e políticas. A identidade de gênero tem a ver com como o indivíduo se identifica – por vezes, uma pessoa pode ter anatomia feminina e se identificar como homem, ou ser biologicamente masculino e se iden- Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 14Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde tificar como mulher. Porém, a literatura científica não traz respostas definitivas sobre as questões relacionadas ao gêne- ro, sendo esse um aspecto muito discutido socialmente, mas ainda com poucas respostas do ponto de vista da ciência. Na prática, o gênero é hoje entendido como um grande es- pectro, não sendo necessariamente binário – um indivíduo pode se identificar como homem, como mulher ou como nenhum dos dois. Ainda que essa noção cause estranheza em algumas pessoas, ela é de extrema importância para en- tendermos que o indivíduo pode não se identificar com seu gênero biológico e, portanto, desempenhar um papel social diferente do esperado. E aí estamos diante do terceiro pilar da sexualidade: o papel sexual. Esse papel está relacionado a questões cotidianas, como a maneira de uma pessoa se portar ou vestir, os hobbies que ela cultiva ou até mesmo os brinquedos de que gostava quando criança. Embora já seja possível observar sinais de flexibilização na cultura ocidental – por exemplo, mulheres que atuam na gerência de empresas, meninos que brincam de casinha, e assim por diante –, a sociedade ainda confun- de papel de gênero e orientação sexual. Por vezes, pessoas de um gênero que se identificam com atividades socialmen- te relacionadas a outro gênero – como, por exemplo, uma menina que gosta de jogar futebol – são erroneamente con- sideradas homossexuais. No entanto, esse indivíduo apenas Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 15Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde não apresenta comportamento em conformidade o que é socialmente esperado de seu gênero. É importante saber que não estar em conformidade com o que é esperado de um gênero não diz nada sobre como aquele indivíduo se identifica ou sobre sua orientação sexu- al. Por vezes, a sociedade ou o próprio profissional presume que o indivíduo tenha uma identidade ou orientação sexual determinada por comportamentos que não condizem com seu sexo biológico – essa conclusão precipitada é um dos grandes erros que os profissionais cometem durante o aten- dimento. A orientação sexual é o quarto pilar sexual e considera por que gênero o indivíduo se apaixona ou tem desejo erótico. Essa orientação é fluida e pode se modificar dependendo da situação. Embora a maioria das pessoas esteja acostumada pensar na orientação sexual como uma condição binária – homossexual ou heterossexual –, sabemos que ela, também, pode se parecer mais com um espectro. ✓⃞■ VOCÊ SABIA? Existe uma resolução normativa do Conselho Federal da Psicologia que orienta a prática do psicólogo no que tange ao atendimento relacionado a questões de orientação se- Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 16Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde xual (acesse pelo link http://site.cfp.org.br/wp-content/uplo- ads/1999/03/resolucao1999_1.pdf). A norma não proíbe os psicólogos de atenderem pessoas que queiram reduzir o so- frimento psíquico causado por sua orientação sexual, sejam elas homo ou heterossexuais, e tampouco pretende proibir as pessoas de buscarem atendimento psicológico. De acordo com a regulamentação, “psicólogos devem atu- ar segundo os princípios éticos da profissão, notadamente aqueles que disciplinam a não discriminação e a promoção e bem-estar das pessoas e da humanidade. No art. 2º do Có- digo de Ética Profissional do Psicólogo, veda-se à categoria praticar ou ser conivente com quaisquer atos que caracte- rizem negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade ou opressão. Estão, sim, proibidos os psicólogos de exercer qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas e adotar ação coercitiva que tenda a orientar homossexuais para trata- mentos não solicitados”. Além disso, “a norma aconselha os profissionais da psicologia a não se pronunciarem e nem participar de pronunciamentos públicos, nos meios de co- municação de massa, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como por- tadores de qualquer desordem psíquica.” (Fonte: Conselho Regional de Psicologia de São Paulo - http://www.crpsp.org.br) Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 17Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde A orientação sexual é um pilar que independe do sexo bio- lógico, da identidade de gênero e do papel sexual que uma pessoa tem na sociedade. Um indivíduo pode, por exem- plo, ter nascido com um determinado sexo biológico, se identificar com outro gênero e, ainda assim, sentir desejo pelo sexo oposto. A sociedade ainda enfrenta dificuldades para compreender essa fluidez da orientação sexual, mas os profissionais precisam estar atentos a isso para dar suporte aos pacientes. O desenvolvimento da sexualidade, mesmo quando uma pessoa age conforme a sociedade espera, já é complicado. Quando o comportamento de um indivíduo se distancia daquilo que é esperado socialmente, tudo se torna ainda mais complexo, e é nesse momento que o profissional precisa compreender claramente as nuances da orientação sexual e de gênero, de modo a poder ajudar seus pacientes nesse processo de construção da própria identidade. Os quatro pilares sexuais influenciam, juntos, o comporta- mento sexual, que é como o indivíduo decide se comportar em determinadas situações sexuais. Esse comportamento não é rígido e pode se modificar, mas costuma ser estável. Ele é o foco de abordagem durante a terapia cognitiva sexual. Podemos pensar os pilares sexuais como a base de um ice- berg. Eles não fazem parte das escolhas do indivíduo: não é possívelescolher seu par de cromossomos, com que gênero você se identifica ou sua orientação sexual, e nem mesmo se Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 18Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde suas preferências sobre o que fazer, o que vestir ou como se comportar no dia a dia estão em conformidade com o que a sociedade espera. Já o comportamento sexual, que é a ponta do iceberg, tem a ver com escolha, pois o indivíduo é capaz de decidir como quer se comportar. Nesse contexto, é muito comum que os pacientes apresentem dúvidas sobre o que é um comportamento normal e o que é um comportamento patológico. Para determinar o que é normal ou patológico, o profissional precisa levar em consideração uma série de fatores – do contrário, tende a trazer suas próprias vivências e crenças para orientar o paciente. Mas fique claro: não é papel do profissional determinar o que é normal ou não, agindo como a sociedade ou como os familiares que julgam pacientes com comportamentos não esperados. Uma boa metáfora para entender o conceito de normalida- de é a distribuição gaussiana, utilizada pela estatística. Ela mostra em gráfico que, numa distribuição normal, a maior parte das pessoas tem um comportamento ou uma caracte- rística próxima à média, sendo menos frequente encontrar comportamentos que estão fora da média. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 19Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde Figura 2: Curva gaussiana. (imagem: Augusto R. Amaral/ CC-BY-SA) Se uma pessoa chega ao consultório relatando que gosta, por exemplo, de práticas sadomasoquistas, podemos iden- tificar que, em média, esse não é um comportamento co- mum. Porém, essa prática deve ser considerada patológica e requer tratamento? Para responder questões como essa, o profissional precisa conhecer a relação entre normalidade e patologia. Comportamentos incomuns não são necessaria- mente patológicos. O profissional identifica como psicopatologia o fato de o comportamento sexual atrapalhar o cotidiano de alguém – por exemplo, se o sujeito só consegue fazer sexo em si- tuações de sadomasoquismo, ou se o parceiro se incomo- da com aquela prática. Se o próprio interesse nesse tipo de Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 20Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde atividade impacta o cotidiano, já é possível discutir a ne- cessidade de tratamento. Portanto, para avaliar se um com- portamento sexual é patológico, é preciso considerar, entre outros aspectos, o impacto que esse comportamento tem na função sexual e na vida do indivíduo, e, principalmente, o dano que pode causar a si e a terceiros – incluindo questões como a pedofilia e o sexo com animais, que esbarram no impacto causado a terceiros e na questão fundamental do consentimento. MATERIAL PSICOEDUCATIVO • Pílula de bem estar Dra. Aline Sardinha: “Será que ele é?” http://www.pilulasdebemestar.com.br/site/sexualidade_de- tail.asp?cod_blog=90 • Documentário: “Precisamos falar com os homens” https://www.youtube.com/watch?v=jyKxmACaS5Q • IBGE explica: Informações estatísticas de gênero https://www.youtube.com/watch?v=xMIiMNI6iGU Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 21Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde REFLEXÕES PARA A FORMAÇÃO PROFISSIONAL Considerando o seu próprio sistema de crenças, dê uma nota de 0 (totalmente anormal) a 10 (totalmente normal) sobre o quanto você, como pessoa, considera normal cada uma das situações abaixo: – Um homem de 60 anos se relacionando com uma mulher de 25 anos; – Um homem de 50 anos se relacionando com uma menina de 14 anos; – Uma mulher de 60 anos se relacionando com um homem de 25 anos; – Uma mulher muito atraente casada com um homem mui- to pouco atraente; – Uma mulher obesa casada com um homem muito atraente; – Duas mulheres fazendo sexo; – Duas mulheres fazendo sexo com um homem; – Dois homens fazendo sexo; Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 22Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde – Dois homens apaixonados um pelo outro; – Um relacionamento afetivo entre duas mulheres e um homem; – Um relacionamento afetivo entre dois homens e uma mulher; – Uma criança de 8 anos nascida biologicamente XX que se entende como um menino; – Uma pessoa adulta nascida biologicamente XY que se en- tende como mulher e se submete a procedimentos estéticos e cirúrgicos para alcançar a aparência mais feminina; – Um fazendeiro que eventualmente faz sexo com uma ca- bra de sua fazenda; – Um homem que se excita e se masturba assistindo a víde- os de crianças nuas; – Um homem que nunca quer fazer sexo; – Uma mulher que se masturba diariamente assistindo a pornografia. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 23Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde ● SAIBA MAIS • Estudo recente mostrando evidências sobre a base genéti- ca da homossexualidade masculina: https://www.nature.com/articles/s41598-017-15736-4.pdf • Texto em inglês acerca da normatização dos papéis de gê- nero ao longo do desenvolvimento: http://www.slate.com/ articles/life/the_kids/2017/11/how_to_stop_sexism_and_ raise_a_son_who_respects_women.html Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 24Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde ASPECTOS RELEVANTES PARA A QUEIXA SEXUAL De que informações um profissional precisa para identificar a melhor forma de tratamento para uma pessoa com queixa sexual? Aspectos como o tempo de duração da queixa, in- formações sobre sua origem – orgânica ou psicológica – e fatores determinantes de sua etiologia são importantes para guiar o profissional nesse processo. O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, conhecido como DSM-V (APA, 2013), identifica que, para categorizar uma queixa sexual como disfunção, o problema deve ocorrer há pelo menos seis meses. A queixa pode ser primária, ou seja, estar presente na vida do indivíduo desde sempre, ou ter sido adquirida após determinado evento – nesse caso, é importante entender o contexto de aquisição. CAPÍTULO 2 Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 25Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde Além disso, é preciso identificar em que circunstâncias a queixa ocorre – se, por exemplo, ela se dá em todas situa- ções e com diferentes parceiros ou em momentos particula- res e com um parceiro específico. A queixa também pode ser classificada como de origem or- gânica ou psicológica. Por exemplo, o vaginismo – contra- ção involuntária dos músculos vaginais durante a penetra- ção, causando dor no ato sexual – é uma disfunção causada por um aspecto orgânico (a contração da musculatura), mas também pode ser desencadeado por questões psico- lógicas. O mesmo acontece com a disfunção erétil. Além disso, qualquer condição ou disfunção gera repercussões psicológicas e subjetivas que precisam ser encaradas pelo terapeuta ou profissional de saúde. Geralmente, as queixas dos pacientes são multifatoriais: é pouco provável que uma queixa seja exclusivamente psico- lógica ou orgânica. Por isso, é importante entender o que gera queixa e identificar que equipe multidisciplinar deve lidar com aquele caso. É também fundamental não encarar o sintoma com algo produzido pelo sujeito: ainda que haja aspectos subjetivos, o profissional não deve desqualificar ou menosprezar a queixa. Outro aspecto relevante a consideraré o grau de sofrimento pessoal. O DSM-V coloca que, se uma disfunção não gera Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 26Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde sofrimento, não precisa ser tratada. A assexualidade, por exemplo, pode não causar dano ao sujeito e, se for assim, não precisa ser tratada. Por outro lado, ela pode surgir como dano em situações em que o parceiro demanda uma ativida- de sexual e o sujeito sofre por não querer perdê-lo ou entrar em conflito. Nesse caso, o dano é indireto, não ligado neces- sariamente à sexualidade, mas à relação com o parceiro. Ainda nesse contexto, o DSM-V inova quando trata a dis- função sexual considerando a parceria, ou seja, os aspectos do relacionamento que influenciam a sexualidade. No en- tanto, traz a informação de que não é correto fazer diagnós- tico de disfunção sexual em pessoas que tenham problemas no relacionamento que influenciem a sexualidade – logo, a questão de como usar a parceria para o tratamento ain- da é pouco clara, ainda que seja um aspecto importante a ser considerado. A questão da parceria vai além de consta- tar se os parceiros estão felizes ou não na relação e aborda também como a dinâmica sexual deles impacta a resposta sexual de um ou outro indivíduo. Essa dinâmica trata, por exemplo, da adequabilidade do estímulo, um aspecto que, de acordo com o DSM-V, também deve ser considerado. Ao receber uma pessoa que relata dificuldades em atingir o orgasmo, o profissional deve considerar se o estímulo que o paciente recebe é adequado, já que a resposta sexual não é puramente biológica. Um princípio comportamental básico Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 27Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde é que, se o estímulo não é suficiente, a resposta esperada não será atingida. Ainda que o DSM-V traga diversas orien- tações sobre como lidar com a queixa de falta de resposta sexual, esse manual ainda é heteronormativo e traz infor- mações basicamente sobre relações por coito. Porém, o pro- fissional também precisa considerar se o paciente que, por exemplo, se queixa de não atingir o orgasmo por penetração consegue ter prazer em outras situações, como a mastur- bação. O DSM é limitado, também, em algumas situações menos comuns, como a dor sexual que ocorre em homens ou em situações que não o coito vaginal. Por fim, ainda que o sexo biológico não determine a ex- pressão da sexualidade de uma pessoa, o terapeuta ou pro- fissional da saúde deve considerar fatores fisiológicos que permeiam a queixa. Um aspecto relevante é saber como está o equilíbrio hormonal do indivíduo, já que a queixa pode ter relação com oscilações hormonais relacionadas a pós- -parto, envelhecimento, menopausa, uso de medicamentos, disfunções da musculatura do assoalho pélvico, problemas urológicos ou ginecológicos etc. Nesse sentido, o trabalho multidisciplinar é o que vai proporcionar melhores resul- tados, já que permite que todos esses aspectos possam ser examinados e abordados pelo profissional adequado. Quando dizemos que o profissional deve considerar tudo o que permeia a queixa de uma pessoa, queremos destacar Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 28Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde que sua conduta muda de acordo com cada situação. por exemplo, uma pessoa que se queixa por não ter vida sexual- mente ativa geralmente relata o fato de não sentir o desejo de ter uma vivência sexual com um parceiro, mas isso não elimina a possibilidade de que tenha outras vivências, como a masturbação ou mesmo pensamentos sexuais. Figura 3. Fatores relacionados às queixas sexuais. (imagem: Dra. Aline Sardinha) QUEIXA SEXUAL: O QUE INVESTIGAR? Ao avaliar a queixa sexual, é importante termos uma visão ampla do comportamento sexual, entendendo-o para além do coito, podendo envolver masturbação, desejos, fantasias, Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 29Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde fala, sonhos, práticas, atenção automática e voluntária a es- tímulos sexuais no dia a dia etc. Além disso, precisamos in- vestigar: 1. Cronologia da aquisição Primária Secundária 4. Grau de sofrimento Nenhum Leve Moderado Severo 2. Circunstâncias em que ocorre Situacional Generalizada 5. Contexto Passado Presente Físico 3. Etiologia Orgânica Psicológica Mista 6. Parceria Relacionamento Estimulação adequada REFLEXÕES PARA A FORMAÇÃO PROFISSIONAL Uma das perguntas mais comuns das pessoas é se uma quei- xa sexual é física ou psicológica. Que crenças você imagi- na que permeiam a necessidade de distinguir entre essas duas possibilidades etiológicas? Como isso impacta a visão Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 30Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde do problema e a adesão ao tratamento? Quando pensamos em uma abordagem multidisciplinar da queixa sexual, em que sentido a dicotomia biológico x psicológico se insere? Como responder adequadamente a essa dúvida? ✓⃞■ VOCÊ SABIA? Não podemos categorizar uma disfunção sexual se o estí- mulo sexual necessário para que a resposta sexual ocorra não estiver presente. Isso quer dizer, na prática, que: • Um homem que imagina que precisa estar com o pênis ereto mesmo antes de começar a ser estimulado pela parce- ria pode não ter disfunção erétil. • Uma mulher que não tem desejo sexual espontaneamente, mas que responde sexualmente a carícias da parceria pode não ter um problema de desejo. • Uma mulher que não tem orgasmo durante a relação se- xual e não tem o hábito de se masturbar pode não ter um problema de orgasmo. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 31Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde RESPOSTA SEXUAL CAPÍTULO 3 Na década de 1960, os pesquisadores William Masters e Vir- ginia Johnson (1966) realizaram uma série de experimentos que dificilmente poderiam ser feitos hoje. Em seu laborató- rio, eles mediram a resposta sexual de voluntários enquanto esses tinham relação sexual ou se masturbavam. Os resulta- dos foram surpreendentes e embasam muito do que se sabe atualmente sobre como ocorre a resposta sexual humana. A dupla de cientistas desenvolveu diversos conceitos sobre o que é funcional ou não na sexualidade e sobre como as fases da resposta sexual são categorizadas. Como se pode ver na figura, o modelo de resposta sexual de Masters e Johnson descreve quatro fases: excitação, platô, orgasmo e resolução. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 32Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde Figura 4. Modelo de resposta sexual de Masters e Johnson. (imagem: Wikimedia Commons) A fase de excitação caracteriza o início do processo que leva à resposta sexual e, conforme o estímulo continua, uma sé- rie de mudanças fi siológicas ocorrem para preparar o corpo para as fases seguintes. No caso das mulheres, nota-se au- mento do fl uxo sanguíneo na região genital, aumento da lu- brifi cação vaginal, enrijecimento dos mamilos e maior sen- sibilidade de algumas áreas erógenas. No homem, a marca Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 33Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde importante é a ereção, quando uma série de mecanismos fisiológicos faz com que válvulas presentes no pênis permi- tam que mais sangue flua até o órgão, concentrando-se nos corpos cavernosos. Nesse momento, o pênis muda de for- mato e torna-serígido, sendo capaz de penetrar a vagina da mulher. Além disso, os homens também sofrem modifica- ção da musculatura do assoalho pélvico, sensibilidade dos mamilos e maior sensibilidade em outras áreas do corpo. Todas essas mudanças levam o corpo a se preparar para o coito, que ocorre quando o indivíduo entra na fase chamada platô, a qual dura até que seja atingido o orgasmo, momen- to de clímax de todo o processo. No homem, o orgasmo coincide com a ejaculação, que é a liberação do sêmen e de outras substâncias que compõem o liquido seminal, de função reprodutiva. O orgasmo também resulta em contra- ções musculares e sensações de prazer, tanto para a mulher quanto para o homem. Nas mulheres, além do prazer, há uma série de contrações do assoalho pélvico, do útero e da musculatura do canal vaginal, o que faz com que o sêmen se movimente com mais agilidade. O ciclo sexual termina com a fase de resolução, um mo- mento de relaxamento em que não é possível começar o processo novamente – período de latência entre o orgasmo e um novo período de excitação. A duração dessa fase varia entre as pessoas, sendo, em média, mais curta para as mu- Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 34Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde lheres do que para os homens. Embora pioneiro, o modelo de Masters e Johnson não abor- dou a fase que vem antes do sexo: o desejo. Na década de 1980, a psicanalista e sexóloga Helen Kaplan (1979) come- çou a questionar o que motiva as pessoas a fazerem sexo e propôs um novo modelo, complementar ao anterior, mas com três fases: desejo, excitação e orgasmo. Kaplan trouxe a ideia do desejo como algo que aumenta a partir da absti- nência de sexo e que pode ser despertado pelos estímulos sexuais. Seu modelo trouxe também a ideia de que o desejo antecede a relação sexual, a qual persistiu por muito tempo. Recentemente, outra pesquisadora, chamada Rosemary Basson (2000), propôs um novo modelo de ciclo sexual co- erente com os anteriores, mas revolucionário ao propor que o desejo não precisa anteceder as demais fases e pode acon- tecer e se misturar com os momentos de excitação e prazer sexual. Basson propõe que, numa situação de neutralidade e conforto emocional e sexual, um indivíduo que ainda não está com desejo pode ser estimulado a experimentar uma situação sexual – vale destacar a importância do confor- to emocional, uma vez que, em situações de estresse, por exemplo, o corpo do sujeito acaba por não conseguir cum- prir funções fisiológicas básicas, como dormir, comer ou mesmo ter desejo sexual. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 35Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde Modelo trifásico de Kaplan (1979) Modelo responsivo de Basson (2000) Figura 4. Modelos de ciclo sexual de Kaplan e Basson (imagem: Dra. Aline Sardinha) Enquanto Kaplan propôs que o desejo apareceria como con- sequência da abstinência, Basson mostrou que o desejo não precisa ser espontâneo e pode ser estimulado. Isso condiz com o que se ouve nos consultórios: casais relatam ao pro- fi ssional que, em situações simples do cotidiano, um par- ceiro estimulou o outro e a relação sexual ocorreu. Muitos pacientes relatam, também, que o desejo nem sempre surge de forma espontânea no dia a dia, quando estão, por exem- plo, dirigindo ou trabalhando. Há casais ainda que relatam ter uma vida sexual mais ativa durante as férias – nesse caso, o desejo espontâneo surge por estarem longe da situação de estresse. Esse novo entendimento do desejo é um marco dos Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 36Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde anos 2000 e, ainda que no começo tenha sido muito utili- zado para entender a libido feminina, o modelo de Basson também pode ser usado para entender o desejo masculino. REFLEXÕES PARA A FORMAÇÃO PROFISSIONAL Variações na expressão da sexualidade são transtornos psi- quiátricos? Configuram, assim, doenças que requerem tra- tamento? Por que essas condições estão listadas no Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Psiquiátricos (DSM)? Como isso impacta a nossa prática clínica e a pes- quisa em sexualidade? ● SAIBA MAIS • Assexualidade é uma expressão da sexualidade em que a pessoa não tem interesse na prática sexual. Ao contrário do celibato, que é um comportamento escolhido, ou do trans- torno do desejo sexual, que é uma patologia, a visão predo- minante hoje é a de que a assexualidade é apenas uma expres- são normal da sexualidade. Por muito tempo considerados pessoas problemáticas, os assexuados lutam hoje para ser Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 37Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde reconhecidos como indivíduos normais, que não precisam de tratamento médico ou psicológico. Muitas comunidades e grupos de apoio foram criados para aumentar o senso de per- tencimento desses indivíduos, como a Comunidade Assexual (ver http://www.assexualidade.com.br/). Para aprofundar seus estudos sobre este tema, sugerimos a leitura do artigo de re- visão de Brotto e Yule, disponível no link https://link.springer. com/article/10.1007%2Fs10508-016-0802-7 (acesso pago). • Nem toda dor sexual é vaginismo! Uma condição que afeta a sexualidade da mulher causando dor e que tem sido bas- tante estudada nos últimos anos é a vulvodínia. Neste link, você encontra informações simples que podem ser usadas para informar seus pacientes sobre o problema: http://www. sbed.org.br/lermais_materias.php?cd_materias=378&friur- l=_-Vulvodinia-_. A terapia cognitivo-comportamental tem sido usada com sucesso dentro de uma abordagem multi- disciplinar no tratamento da vulvodínia, como podemos ver no artigo de Dunkley e Brotto, disponível no link http:// onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/jclp.22286/abstract (acesso pago). ✓⃞■ VOCÊ SABIA? • William Masters e Virgina Johnson foram um casal de pes- quisadores, ele ginecologista e ela psicóloga, que revolucio- Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 38Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde naram o entendimento da sexualidade nos anos 1960. Em seu laboratório, eles observaram e quantifi caram a resposta sexual de dezenas de indivíduos. A partir disso, elaboraram uma teoria (usada até hoje) sobre o ciclo da resposta sexual, composto pelas fases de excitação, platô, orgasmo e resolu- ção. Os estudos de Masters e Johnson foram um divisor de águas na ciência da sexualidade, ao desvendar a fi siologia da resposta sexual e ao questionar muitas crenças errôneas sobre o assunto entre os próprios cientistas. Para saber mais sobre a vida e a obra desses autores, sugerimos uma biogra- fi a deles (traduzida para o português), e também uma série de televisão, em inglês, com o mesmo título: Maier, T. (2014). Masters of sex. Ed. Leya Casa da Palavra. 448p. Masters e Johnson (imagem: Domínio público) Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 39Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde DISFUNÇÕES SEXUAIS CAPÍTULO 4 O DSM-V, lançado em 2013, traz um novo conceito de dis- função sexual, definindo como um grupo heterogêneo de transtornos que causam perturbação clinicamente signifi- cativa na capacidade de o sujeito ter resposta sexual ou ex- perimentar prazer sexual. Uma pessoa cujo comportamen- to não se adequa ao que é esperado dentro do ciclo sexual possui uma disfunção em uma ou mais das fases anterior- mente discutidas, e isso tem um impacto no prazer que ele sente em relação ao sexo. Outra inovação do DSM-V foi pensar na disfunção sexualde acordo com o gênero: pela primeira vez, foram descri- tas as disfunções sexuais femininas e as disfunções sexuais masculinas. As disfunções sexuais femininas já incorporam Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 40Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde o modelo proposto por Basson, enquanto as masculinas ainda estão alinhadas com os modelos anteriores, de Mas- ters e Johnson e de Kaplan. As disfunções femininas podem ser categorizadas em três domínios principais: dor sexual, domínio do interesse e da excitação e domínio do orgasmo. A dor sexual pode ocor- rer por uma série de motivos, podendo ter ou não relação com o comportamento sexual – pode surgir como sintoma de uma doença, por exemplo. Como já vimos, ela pode de- correr da contração da musculatura vaginal, impedindo ou dificultando a penetração. No DSM-V, vaginismo e dispa- reunia são transtornos classificados em conjunto como dor sexual. Além disso, qualquer dor na região genito-pélvica resultante ou não de vaginismo e que esteja associada como resultado ou complicador da penetração é categorizada como dor sexual. A proposta do DSM-V de classificar todos os transtornos relacionados à dor numa mesma disfunção facilita o diag- nóstico, já que, muitas vezes, é difícil saber se a dor é con- sequência da contração muscular do vaginismo ou se o vaginismo surge por conta da dor. Essa dor também pode aparecer quando a mulher não se encontra suficientemente confortável e sexualmente excitada e tenta realizar a pene- tração. Como o corpo não está preparado para a penetra- ção, não há lubrificação suficiente e a relação pode ser dolo- Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 41Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde rosa. Dor sexual, desejo e prazer estão intimamente ligados. No segundo domínio, o interesse sexual surge junto com a excitação. O fato de uma mulher não ter desejo espontâneo não necessariamente significa que ela precisa de tratamen- to, pois, caso ela responda ao ser estimulada sexualmente, considera-se que não há disfunção. Embora o imaginário popular entenda que o fato de uma mulher não ter desejo espontâneo implica um transtorno ou disfunção, na prática clínica entendemos que, se essa mulher for estimulada e a excitação surgir, há um desejo predominantemente respon- sivo e não espontâneo – uma condição bastante comum, principalmente em mulheres em relacionamentos longos. Por fim, o domínio do orgasmo está relacionado ao fato de uma mulher experimentar ou deixar de experimentar o clímax. Diversas situações precisam ser consideradas ao se fazer um diagnóstico de transtorno do orgasmo, mas as principais são que a mulher não tenha orgasmo na maior parte das vezes em que busca por ele e que a ausência des- sa resposta cause sofrimento significativo para ela e para o parceiro ou parceira. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 42Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde Figura 5. Disfunções sexuais femininas, segundo o DSM-V. (imagem: Dra. Aline Sardinha) Uma disfunção sexual que o DSM-V destaca tanto para ho- mens quanto para mulheres é a disfunção sexual induzida por substância. Tal transtorno parece simples de tratar, já que a substância responsável poderia ser retirada ou subs- tituída, mas muitos pacientes utilizam medicamentos dos quais não podem prescindir e que interferem na função sexual, como, por exemplo, anticoncepcionais, antidepres- sivos e anti-hipertensivos. Logo, é importante perguntar aos pacientes se fazem uso de algum desses medicamentos. Nem sempre é possível pedir que o médico retire ou troque Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 43Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde o medicamento, mas o profissional precisa considerar as al- ternativas e práticas relacionadas à terapia cognitiva sexu- al que podem melhorar a satisfação do paciente mesmo na presença da substância em questão. Em relação à sexualidade masculina, o manual estabelece dois domínios relacionados à disfunção: o domínio do de- sejo e da excitação e o domínio do orgasmo e da ejacula- ção. Aqui, considera-se ainda o modelo trifásico anterior, segundo o qual o desejo surgiria antes da relação. Caso isso não ocorra da maneira esperada, o homem pode ser diag- nosticado com Transtorno do Desejo Hipoativo Masculino. De acordo com o DSM-V, o transtorno erétil pode ocorrer tanto quando o homem não consegue ter a ereção, quanto quando ele não consegue manter a ereção da forma e pelo tempo que gostaria. Essa classificação é interessante por ser subjetiva e depender do que o paciente espera da relação sexual, mas pode ser complicada para o clínico, já que nem sempre o fato de não conseguir manter uma ereção até a parceira ter orgasmo, por exemplo, significa que o paciente tem necessariamente um transtorno erétil. A antiga ejaculação precoce, hoje chamada de ejaculação prematura, consiste em o indivíduo ejacular em qualquer tempo maior do que um minuto de penetração e antes do que ele gostaria – aqui, o DSM-V também faz uso de uma Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 44Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde classificação subjetiva, que depende do que o paciente espe- ra da relação sexual. É importante que o profissional saiba como olhar para essa queixa. Ainda que a ejaculação pre- matura seja uma disfunção significativa, é preciso saber em que contexto a queixa surge, considerando, por exemplo, o que o indivíduo espera, se essa expectativa é realista, há quanto tempo a queixa persiste etc. Outra queixa comum é a ejaculação retardada, ou seja, ho- mens que não conseguem ou que levam um tempo muito longo para ter a ejaculação com penetração. São homens que podem ter ejaculação em outras situações, como a mas- turbação, mas que levam mais tempo do que eles ou a par- ceira gostariam para ter a ejaculação com penetração – uma queixa semelhante ao transtorno do orgasmo feminino. Ainda que seja relatada na literatura e na clínica, a dor sexu- al masculina não é ainda categorizada no DSM-V. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 45Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde Figura 6. Disfunções sexuais masculinas, segundo o DSM-V. (imagem: Dra. Aline Sardinha) ✓⃞■ VOCÊ SABIA? Além das disfunções sexuais, o DSM-V inclui outras con- dições relacionadas à sexualidade, como as parafilias. A no- vidade desta edição é que foi proposta a distinção entre o comportamento sexual atípico e o comportamento decor- rente de um transtorno, que é aquele que causa sofrimen- to, ameaça física ou psicológica para si ou para o bem-estar Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 46Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde de outros indivíduos. De acordo com a nova classificação, a maioria das pessoas com interesses sexuais atípicos não tem um transtorno mental. Para o diagnóstico do transtor- no parafílico, o DSM-V requer que a pessoa com interesses sexuais atípicos: • sinta angústia pessoal sobre o seu interesse sexual, não ape- nas sofrimento resultante da desaprovação da sociedade; ou • tenha desejo ou comportamento sexual que envolva o so- frimento psicológico, lesões ou morte de outra(s) pessoa(s), ou prática sexual que envolva pessoas que não querem ou que sejam incapazes de dar o seu consentimento legal. Este artigo, que está disponível gratuitamente online, traz as principais categorias de parafilias consideradas atualmente: http://files.bvs.br/upload/S/1413-9979/2014/v19n2/a4147.pdf● SAIBA MAIS No início dos anos 2000, foi realizado no Brasil um grande estudo populacional sobre os hábitos e comportamentos se- xuais do brasileiro. Este trabalho traz estatísticas e informa- ções interessantes para o nosso uso clínico e também para Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 47Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde compreendermos como os brasileiros entendem as questões mais atuais relacionadas à sexualidade. Os dados podem ser encontrados no livro Estudo da vida sexual do brasileiro, de C.H.N. Abdo (editora Bregantini, 2004). Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 48Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde ANATOMIA E FUNCIONAMENTO SEXUAL FEMININO Quantas mulheres conhecem toda a anatomia externa de sua genitália? Quantos homens conhecem anatomia da ge- nitália feminina? Ainda que pareça um conhecimento bási- co, muitas questões que chegam ao consultório esbarram na falta de informações sobre a anatomia da genitália. A genitália feminina começa pelos grandes lábios, que são formados de tecidos conjuntivo e gorduroso e são respon- sáveis por proteger a vulva. Na vulva, estão presentes os pe- quenos lábios, formados por uma mucosa sensível que re- veste também a parte interna da vagina. Essa mucosa segue até a abertura do canal vaginal, onde ocorre a penetração do pênis durante o coito vaginal. Logo acima, localiza-se a uretra, região por onde sai a urina. Muitas mulheres não CAPÍTULO 5 Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 49Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde conseguem distinguir bem a localização da uretra, mas essa informação é importante, já que, por vezes, infecções urina- rias podem estar relacionadas à relação sexual. Figura 7: Anatomia externa da vagina, órgão reprodutor feminino. (imagem: Domínio público) Os pequenos lábios revestem também o capuz do clitóris, que é facilmente identifi cável na junção desses lábios dentro da vulva. O clitóris é uma área muito sensível, mais ainda do que, por exemplo, o olho humano – é fácil comprovar isso pelo toque. No entanto, pouca gente sabe que o clitó- ris não é formado apenas por essa ponta na junção dos pe- Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 50Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde quenos lábios: trata-se de um grande órgão que se ramifica internamente por toda a região da vulva e do canal vaginal. Atualmente, sabe-se que o clitóris é composto por uma sé- rie de estruturas nervosas e que tem bulbos que se enchem de sangue. Durante a fase de excitação, esses bulbos ficam eretos devido ao aumento do fluxo sanguíneo, de modo semelhante ao que ocorre com o pênis. Isso permite uma abertura mais confortável da entrada da vagina e compri- me o clitóris, fazendo com que a estimulação tanto externa quanto interna dessa região seja mais prazerosa. É comum que pacientes acreditem que o órgão sexual fe- minino seja a vagina, mas, na verdade, a vagina é o órgão reprodutivo feminino. O verdadeiro órgão sexual da mu- lher é o clitóris, que pode ser ativado tanto diretamente pela parte externa (capuz do clitóris) quanto pela parte interna. A maior parte dos livros de anatomia e de educação sexual não detalha as informações sobre o clitóris e muitas mulhe- res não tem uma relação íntima ou não conhecem bem esse órgão. Logo, essas mulheres não entendem o clitóris como órgão sexual, o que pode repercutir nas disfunções sexuais – como o órgão feito para gerar prazer é pouco conhecido, dificilmente a mulher terá a resposta sexual que poderia ou gostaria de ter. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 51Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde Figura 8: Anatomia do clitóris, o órgão sexual feminino. (imagem: Domínio público) Pouca gente sabe que a vulva, apesar de ser menos visível que o pênis, pode ser melhor explorada a partir de diferen- tes técnicas. Informação é, portanto, o primeiro caminho para tentar reduzir a insatisfação sexual. Vale notar, também, que muitas práticas que são esperadas do papel do gênero feminino podem ter impacto negativo sobre a saúde da vulva, como alguns tipos de depilação que deixam a área muito exposta e sujeita à ação de microrga- nismos, ou o uso de sabonetes íntimos que, no intuito de Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 52Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde modificar o odor, mudam a flora bacteriana da região. Essas práticas podem gerar infecções recorrentes, como a candi- díase, e interferir na saúde sexual da mulher. Todas essas questões devem ser consideradas pelo profissional ao rece- ber no consultório uma mulher com queixa sexual. Outro ponto importante a ser considerado quando se trata da anatomia feminina é o ponto G. Ainda que haja muita discussão sobre a sua importância para a satisfação sexual, não há evidências científicas de que ele exista ou de que seja anatomicamente distinto. Isso precisa ficar claro para que a mulher não acredite que possui um problema ou se sinta inadequada caso procure e não encontre o ponto G. O ponto G foi descrito por alguns especialistas como um tecido espesso localizado no interior da vagina, a aproxi- madamente seis centímetros da entrada do canal vaginal. Essa região é, de fato, altamente inervada por ser adjacente ao clitóris e, por isso, é muito sensível, gerando prazer na penetração. Aliás, é este o motivo pelo qual a extensão do pênis não faz diferença para o prazer feminino: a área sen- sível fica bem próxima à abertura do canal vaginal. Prova disso é o fato de que, se uma mulher coloca um absorvente íntimo no local adequado, perto do colo do útero, ele fica imperceptível, já que essa região não é tão sensível quanto a entrada do canal, onde o absorvente causaria incômodo. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 53Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde No fim das contas, sabemos que o ponto G pode ser identi- ficado como um tecido espesso em algumas mulheres, mas não se trata, necessariamente, de um tecido especial para sentir prazer. É possível que o estímulo dessa região gere prazer por ela estar tão próxima ao clitóris e estimulá-lo in- diretamente. Portanto, reafirmamos que o órgão específico do prazer feminino é o clitóris, e mulheres que não sentem prazer pelo estímulo vaginal não necessariamente apresen- tam uma disfunção. Por fim, o desejo tem uma relação especial com a anatomia feminina, pois é ele que dispara a lubrificação imprescin- dível para a penetração. No entanto, nem sempre a mulher inicia uma relação sexual a partir do desejo: há diversas motivações que podem influenciá-la, como a vontade de se sentir mais próxima do parceiro, o fato de estar no dia fértil e querer engravidar, ou o fato de ser uma profissional do sexo e esse ser o seu trabalho. Na ausência da lubrificação natural, é possível lubrificar a vagina artificialmente – uma prática corrente desde a Idade Média, quando eram usados lubrificantes à base de gordura vegetal ou animal. É interessante notar que o comportamento sexual femini- no, na história da humanidade, se deslocou do desejo por uma questão de possibilidade anatômica – diferentemente do que acontece com os homens, para quem a falta de ere- ção impede a atividade sexual com penetração. Atualmente, Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 54Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionaisde saúde porém, com a valorização recente do desejo feminino e das ideias de engajamento e motivação para estar numa rela- ção sexual, é cada vez mais comum que mulheres surjam no consultório com dúvidas sobre seu próprio desejo, questio- nando se o seu comportamento é normal em relação ao que a sociedade espera. Ao profissional de saúde, cabe escutar a paciente e entender o que permeia seu desejo. O fato de uma mulher ter difi- culdade para chegar ao orgasmo, por exemplo, leva a uma frustração que diminui sua motivação para fazer sexo, o que não necessariamente diminui seu desejo sexual. O orgasmo feminino, como dito anteriormente, está ligado à estimulação do clitóris. Logo, é muito importante desmis- tificar a ideia de que o orgasmo feminino precisa ser vagi- nal. Em 1966, Masters e Johnson mostraram que o orgasmo feminino é clitoriano. No entanto, toda a tradição judaico- -cristã persiste na relação entre prazer feminino e penetra- ção para que o homem tenha lugar na relação sexual. Sigmund Freud (1905), em sua teoria, tentou abarcar o or- gasmo vaginal como um amadurecimento da sexualidade feminina, o que não tem nenhum embasamento fisiológico, mas acabou se espalhando pelo imaginário popular. Assim, muitas pacientes ainda chegam ao consultório relatando não ter prazer sexual e, quando o profissional questiona se a Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 55Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde paciente tem orgasmo clitoriano, muitas não sabem nem a localização do órgão. Persiste a crença de que a mulher de- mora a atingir o orgasmo, enquanto o homem obtém a res- posta sexual com mais facilidade – mas hoje sabemos que isso ocorre porque, pela penetração, o estimulo ao clitóris é indireto, enquanto o homem é diretamente estimulado. Em termos fisiológicos, as mulheres chegam ao orgasmo na mesma rapidez que os homens, bastando que a estimulação seja adequada às suas necessidades. Por fim, outro tema recorrente são os orgasmos múltiplos. De fato, as mulheres podem atingir a resposta sexual mais vezes num espaço de tempo mais curto que os homens. Porém, isso não é verdadeiro para todas as mulheres e tem a ver com a intensidade do orgasmo alcançado – caso uma mulher tenha um orgasmo muito intenso, pode demorar muito mais para atingir o seguinte, mas, se tiver pequenos picos menos intensos, é mais fácil obter vários orgasmos. Na escuta do paciente, é importante considerar o caráter normativo que essas informações ganham, fazendo com que muitas mulheres questionem sua normalidade por não terem orgasmos múltiplos ou que vários homens questio- nem sua função sexual caso sua parceira não tenha diversos orgasmos. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 56Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde ● SAIBA MAIS • Documentário: “Clitóris – o prazer proibido” https://www.youtube.com/watch?v=yYXKE1iCam8 • Documentário: “Le clitoris” https://vimeo.com/222111805 • Ted Talk: Peggy Orenstein: “Crenças femininas sobre o próprio prazer sexual” https://www.ted.com/talks/peggy_orenstein_what_young_ women_believe_about_their_own_sexual_pleasure MATERIAL PSICOEDUCATIVO • Pílula de bem estar Dra. Aline Sardinha: “Ela precisa respirar” http://www.pilulasdebemestar.com.br/site/corpo_detail.asp?- cod_blog=92 • HEIMAN, J. R. & LOPICCOLO, J. (1992). Descobrindo o prazer: uma proposta de crescimento sexual para a mulher. 2a. Ed. São Paulo: Summus. 267p. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 57Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde ● SAIBA MAIS Para aprofundar alguns dos conceitos trabalhados neste ca- pítulo, sugerimos a leitura dos seguintes textos: • Carvalho, A.C. & Sardinha, A. (2017). Terapia Cognitiva Sexual: uma proposta integrativa na psicoterapia da sexu- alidade. Rio de Janeiro: Cognitiva. Capítulo 4: sexualidade feminina • Artigo original sobre a anatomia do clitóris: https://www. ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/16145367 • HITE, S. (1985). O relatório Hite. 17ª Ed. São Paulo: DI- FEL. 487p. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 58Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde ANATOMIA E FUNCIONAMENTO SEXUAL MASCULINO O pênis masculino troca sangue com o corpo continuamen- te. Porém, no momento da excitação, uma série de mecanis- mos aumentam esse aporte e promovem a retenção de san- gue na região, gerando a ereção. O sangue chega aos corpos cavernosos do pênis, um tecido que funciona como uma esponja e possui válvulas que se fecham para reter o sangue. Ali, o sangue se concentra e fica retido, fazendo com que o pênis fique ereto e rígido. É nesse mecanismo que os me- dicamentos desenvolvidos para disfunção erétil vão atuar. A ereção tende a se manter enquanto o estimulo erótico é mantido, até que ocorra o clímax da ereção e do prazer, le- vando ao orgasmo. CAPÍTULO 6 Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 59Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde Figura 9: Anatomia do aparelho sexual masculino (imagem: Domínio público) A ereção não ocorre apenas pelo estímulo sexual e pode acontecer de forma refl exa quando algo encosta no pênis ou durante o sono, no fenômeno conhecido como tumescência noturna. Embora a maioria das pessoas acredite que a ere- ção é o ponto de partida da relação sexual, na verdade, é o estímulo sexual o gerador da excitação, o que, por sua vez, gera a ereção. Por isso, não há razões para acreditar que um homem que ainda não apresenta ereção não está excitado sexualmente. Essa é uma questão que gera constrangimento em muitos casais. Por isso, é importante entender de uma pessoa que se queixa de problemas de ereção o que exatamente ele es- pera que aconteça. O profi ssional deve informar o paciente Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 60Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde sobre a fisiologia sexual masculina, mostrando como a ere- ção acontece como parte da excitação e não como ponto de partida para ela, da mesma maneira que a lubrificação feminina. Outro aspecto importante sobre a sexualidade masculina é a ejaculação. A maioria das pessoas tem a ideia de que o sexo é apenas coito vaginal e que esse precisa durar tem- po suficiente para que ambos tenham orgasmo. Para isso, o homem precisa manter a ereção e não chegar à ejaculação, já que aí entrará em período refratário e terá de aguardar o próximo período de ereção. Tudo isso causa grande pressão para o homem, que precisa focar no controle ejaculatório. Na juventude, os homens têm menor controle da ejacula- ção, mas, com o tempo, aprendem a controlar toda a re- lação sexual de forma a prolongar o tempo entre o início da ereção e a ejaculação. O mesmo vale para as mulheres: caso o estimulo ao clitóris seja muito intenso, elas podem chegar ao orgasmo muito rápido. Essa queixa, no entanto, é menos comum para as mulheres porque o sexo com pene- tração gera estímulo indireto, sendo mais comum que elas, na verdade, demorem a ter resposta sexual. Para os homens, como o estímulo é diretamente feito na glande, parte mais sensível do pênis, as chances de ter uma ejaculação antes do desejado são maiores. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 61Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde É importante conscientizar os pacientes de que eles terão que manobrar a situação para fazer com que a relação sexu- al dure o quanto desejam. O indivíduo que tem ejaculação prematura não necessariamente tem prazer com o orgasmoque ocorre com a ejaculação, já que era algo que esse indiví- duo não esperava naquele momento e gera frustração pelo término precoce do ciclo sexual. Muitos homens se queixam, por outro lado, da ejaculação retardada. Isso acontece pela falsa expectativa de, por es- tarem com o pênis ereto, eles estejam no ápice do desejo e prontos para a relação sexual – da mesma forma que uma mulher que usa lubrificante artificial não necessariamente está fisiologicamente pronta para a relação. Fato é que al- guns homens podem demorar a chegar ao orgasmo, e essa informação isolada não é suficiente para diagnosticar uma disfunção. É comum, ainda, que os homens relatem que não gostam de usar preservativo, com medo de perder a ereção por não conseguirem se manter focados no estímulo erótico ou pela redução da sensibilidade do pênis. Alguns deles, inclusive, retiram a camisinha no momento da relação, sem consen- timento de sua parceira – o que, obviamente, tem aspectos éticos complicados, considerando a possibilidade de uma gravidez indesejada ou mesmo da transmissão de uma do- ença. Enfim, o incômodo de muitos homens em relação ao Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 62Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde uso do preservativo não é novo, mas precisa ser vencido. Da mesma forma que as mulheres podem aprender a atingir o orgasmo com penetração vaginal (mesmo quando o método mais fácil é a estimulação direta do clitóris), os homens tam- bém podem adquirir a capacidade de chegar ao clímax usan- do camisinha. O preservativo deve ser incorporado à prática sexual de forma a favorecer o prazer, e não impedi-lo. ● SAIBA MAIS Assista ao documentário "Meu primeiro Viagra" (em in- glês, “Erectionman”), lançado em 2009 pelo diretor Mi- chael Schaap. O trailer está disponível em: https://vimeo. com/21229280. MATERIAL PSICOEDUCATIVO • Pílula de bem estar Dra. Aline Sardinha: “Quando ele falha” http://www.pilulasdebemestar.com.br/site/sexualidade_de- tail.asp?cod_blog=34 • Cartilha Sociedade Brasileira de Urologia: Guia de infor- Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 63Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde mações sobre a saúde do homem http://portaldaurologia.org.br/pdf/CARTILHA_UROLOGICA.pdf ● SAIBA MAIS Para aprofundar os conceitos trabalhados acima, sugerimos a leitura de: Carvalho, A.C. & Sardinha, A. (2017). Terapia Cognitiva Sexual: uma proposta integrativa na psicoterapia da sexu- alidade. Rio de Janeiro: Cognitiva. Capítulo 5: sexualidade masculina Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 64Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde A SEXUALIDADE NO SÉCULO XXI Ao longo da história, os papéis sexuais sempre tiveram um código de conduta rígido e bem definido. Apesar de este co- rolário de regras ir se alterando com o tempo e da aparente liberdade que temos hoje, nossos pacientes ainda estão su- jeitos a demandas e expectativas relacionadas ao papel se- xual de cada gênero, que continuam igualmente exigentes. Historicamente, os homens tiveram maior liberdade sexual do que as mulheres. No entanto, essa liberdade sempre veio acompanhada de responsabilidades. A sociedade sempre permitiu, por exemplo, que os homens expressassem seu desejo por relação sexual quando quisessem. No entanto, hoje, a sociedade criou uma expectativa de que o desejo sexu- al esteja sempre presente nos homens. Um homem que recu- CAPÍTULO 7 Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 65Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde sa o convite para uma relação sexual acaba sendo mal visto. Atualmente, a ideia de performance sexual é muito presen- te. Exige-se que os homens estejam sempre prontos, com desejo, ereção e controle ejaculatório, o que não condiz com a sua realidade fisiológica. Espera-se que o homem, inde- pendentemente de como se sente, sempre responda a um estimulo erótico com ereção, no entanto, para que a res- posta sexual se dê, as condições emocional e fisiológica de- vem ser de conforto, e toda a pressão pela resposta sexual e performance traz, na verdade, um desconforto. Além disso, observa-se um aumento da valorização do prazer femini- no, sendo esse associado a uma habilidade masculina – em outras palavras, se uma mulher não tem um orgasmo, as- socia-se isso a uma incapacidade ou fracasso da parceria, que “não sabe como dar prazer”. A mulher, ainda que tenha mais liberdade para expressar seu desejo, continua sendo colocada num lugar passivo, alguém cujas necessidades se- xuais devem ser supridas pelo outro – o que coloca sobre o homem as responsabilidades pelas fases do ciclo sexual tanto da mulher quanto dele mesmo. A maior liberdade sexual feminina também veio com uma série de atribuições. Espera-se, por exemplo, que as mu- lheres sintam desejo e obrigatoriamente tenham orgasmo numa relação. Uma mulher sem orgasmo passa a se sentir inadequada e, muitas vezes, procura os serviços de saúde Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 66Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde e a psicologia. Mesmo reconhecendo que a busca por aju- da profissional é importante, é preciso entender a motivação que leva essa mulher ao consultório, já que algumas mulheres buscam melhorar a própria performance sexual apenas para manter uma relação ou para não frustrar a parceria, o que pode não ser o suficiente para favorecer a resposta sexual. Outro aspecto curioso é que, principalmente em casais mais jovens, espera-se que a mulher expresse com clareza seu desejo sexual para a parceria. No entanto, nem sempre a mulher aprende sobre os próprios mecanismos de prazer. Se, por um lado, os meninos, ainda na juventude, são esti- mulados a descobrir seu corpo por meio da masturbação, as meninas geralmente são julgadas negativamente caso o façam. Poucas mulheres se sentem à vontade para expres- sar seu desejo, enquanto, para os homens, isso é estimulado desde cedo. O resultado é que, ainda que o parceiro espere que a mulher fale sobre suas preferências, é preciso consi- derar que as mulheres nem sempre sabem o que as leva ao orgasmo ou mesmo o que motiva seu desejo. Com o aumento da liberdade sexual feminina, gostar de sexo, para as mulheres, deixou de ser algo proibido para depois passar a ser um direito e, mais recentemente, uma obrigação. Hoje, é exigido que elas gostem de sexo e tenham desejo. Uma mulher que não gosta de fazer sexo com fre- quência passa a ser vista como uma mulher que precisa de Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 67Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde ajuda por não ter uma resposta sexual adequada. Obvia- mente, é preciso valorizar e buscar a necessidade de prazer dessa mulher, mas sem deixar de considerar o estigma que ela carrega no contexto social atual. As meninas jovens também estão passando por uma mu- dança: precisam ter relação sexual antes do casamento. Esse padrão, que era iminentemente masculino, traz uma nova pressão social para a mulher, pois se exige dela uma expe- riência sexual. Embora a possibilidade do sexo antes do ca- samento seja sinal de liberdade para muitas meninas, para outras o fato de terem 20 anos e não terem ainda iniciado a vida sexual as torna vulneráveis, levando a uma relação que ocorre não a partir do desejo, mas por pressão social. Portanto, hoje a sociedade migra, na questão sexual, de um padrão proibitivo para um padrão permissivo, mas que com ele traz atribuições e pressões tanto para o homem quanto para a mulher. Isso leva ao aparecimento de maispacien- tes buscando o serviço de saúde para obter medicamentos e tratamentos que estimulem a resposta sexual. Atualmente, vemos uma grande procura por soluções terapêuticas para me- lhorar a libido feminina, assim como os homens buscam o ser- viço de saúde para obter medicamentos que favoreçam a ereção. Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 68Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde MATERIAL PSICOEDUCATIVO Pílula de bem estar Dra. Aline Sardinha: “Homem que é homem” http://www.pilulasdebemestar.com.br/site/sexualidade_de- tail.asp?cod_blog=77 Pílula de bem estar Dra. Aline Sardinha: “O novo manual do sexo” http://www.pilulasdebemestar.com.br/site/sexualidade_de- tail.asp?cod_blog=20 ✓⃞■ VOCÊ SABIA? O duplo-padrão sexual é definido como duplicidade no jul- gamento, nas atitudes e nas normas face a várias práticas sexuais, que se traduz em uma menor permissividade na avaliação dos comportamentos e atitudes sexuais das mu- lheres e em uma atitude mais permissiva, porém mais exi- gente, em relação aos homens. O conceito de duplo-padrão sexual foi primeiramente in- Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 69Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde troduzido por Reiss (1960, 1967) visando descrever a mu- dança no comportamento sexual pré-matrimonial das mu- lheres. Atualmente, vemos uma migração gradual da visão sobre a sexualidade feminina em direção ao padrão masculino, na medida em que existe maior permissividade sobre a expres- são da sexualidade feminina, que vem acompanhada também de maior exigência de desempenho por parte das mulheres. REFLEXÕES PARA A FORMAÇÃO PROFISSIONAL Como a mudança no padrão sexual impacta a queixa sexual masculina e feminina que chega ao consultório? Que efeito ela tem sobre o comportamento de buscar tratamento para as dificuldades sexuais e como isso se reflete na demanda clínica dos pacientes? Como você imagina que o duplo padrão sexual a as novas demandas sexuais impactam a sexualidade em relaciona- mentos homoafetivos? Será que os indivíduos homossexu- ais enfrentam as mesmas pressões que os pacientes hete- rossexuais? Quais as exigências e expectativas que recaem sobre o parceiro nessas situações? Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 70Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde MEDICAMENTOS E SEXUALIDADE Desde a década de 1990, os homens têm acesso a drogas que estimulam a performance sexual. Boa parte delas tem efeito rápido e eficaz, atuando geralmente no mecanismo de au- mentar o fluxo sanguíneo para o pênis, numa manipulação química da ereção. O exemplo mais famoso é o Viagra, que surgiu como solução para a exigência social sofrida pelo ho- mem de mostrar a ereção como símbolo de virilidade. Com o surgimento da medicação, a disfunção erétil sofreu uma mudança de perspectiva, sendo, então, normalizada, já que havia uma medicação que solucionaria o problema. Nos consultórios dos profissionais, o resultado dessa nor- malização foi a chegada de pacientes preocupados porque, mesmo fazendo uso de medicamento, não conseguiam atin- CAPÍTULO 8 Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 71Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde gir a ereção. Isso ocorre porque a disfunção erétil envolve não apenas aspectos químicos e fisiológicos, mas também questões subjetivas e do contexto social. Muitos pacientes utilizam a medicação como mecanismo de segurança – até mesmo homens jovens que não precisam do remédio pas- saram a utilizá-lo. Homens que fazem sexo com preserva- tivo fazem uso do Viagra para conseguir uma ereção que acreditam não ser possível atingir por conta da sensibili- dade diminuída. De alguma maneira, a promessa da droga que favorece a resposta erétil masculina passou a ser inte- ressante para os homens e eles passaram a usá-la de forma corriqueira, com uma resposta sexual condicionada ao me- dicamento. O problema no uso indiscriminado do Viagra ou outros si- milares é que, em algum momento, os homens podem se tor- nar dependentes da droga, só conseguindo a resposta sexual a partir dela. Nesses casos, a terapia pode ajudar o paciente a recuperar a resposta sexual sem precisar do remédio. O medicamento torna-se perigoso quando o paciente passa a associar a ereção apenas ao consumo da droga: na medida em que há uma forma química de estimular a resposta se- xual, as condições e contextos eróticos deixam de ser neces- sários. No entanto, vale lembrar que a droga provoca a ere- ção, mas não necessariamente o orgasmo, já que seu papel é apenas aumentar o fluxo de sangue no pênis. A medicação Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 72Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde é, portanto, importante, mas deve ser utilizada como recur- so dentro de uma abordagem crítica que leve em considera- ção todos os aspectos que precisam estar presentes para que a relação sexual ocorra. Por fim, outro tratamento médico que merece atenção aqui é a reposição hormonal, antes exclusiva das mulheres, mas hoje disponibilizada também para os homens. Embora seja útil para minimizar incômodos como a redução da lubri- ficação vaginal após a menopausa, a reposição hormonal, em qualquer dos sexos, não deve ser usada apenas para me- lhorar o desejo sexual, até porque não se descobriu, ainda, uma droga realmente eficiente para isso – uma limitação que deve ser enxergada como oportunidade para descobrir e dominar os mecanismos naturais de prazer. Por fim, é preciso que o profissional esteja atento a medica- mentos que possam causar efeitos colaterais na resposta do prazer. Um exemplo é a pílula contraceptiva, que cria uma si- tuação hormonal artificial no corpo feminino e pode resultar na queda do desejo sexual. Algumas mulheres foram expos- tas à pílula desde a primeira relação e nem conhecem como funciona o seu desejo sexual sem o uso do medicamento. Igualmente relevantes são os antidepressivos e outros psi- cotrópicos, cujo uso é bastante comum entre pessoas que frequentam os consultórios de psicologia. Boa parte dos an- Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 73Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde ticonvulsivantes, antidepressivos e antipsicóticos tem efeito sobre a libido, a ereção e o orgasmo. Da mesma forma, pa- cientes que fazem uso de anti-hipertensivos e outras drogas também podem sofrer efeitos na resposta sexual. Portanto, é muito importante que o profissional considere como é possível atuar no sentido de favorecer a satisfação sexual, pensando em soluções e adaptações que permitam ao paciente ter a resposta sexual mesmo durante o uso do medicamento, que muitas vezes não pode ser trocado ou suspenso. O profissional tem um papel de favorecimento da qualidade de vida e precisa pensar o indivíduo de forma inte- gral, trabalhando de forma eficaz numa equipe multidisciplinar. ● SAIBA MAIS • Notícia sobre a liberação da pílula do desejo feminino nos EUA: https://globoplay.globo.com/v/4403705/ • Reportagem sobre a pílula do desejo feminino: http://epoca.globo.com/vida/noticia/2016/03/o-fracasso-do-a- ddyi-o-viagra-feminino-e-manipulacao-do-feminismo.html Transaction: HP17615329969276 e-mail: ernani-gomes@hotmail.com 74Aline Sardinha Como abordar a queixa sexual: um guia para psicólogos, educadores e profissionais de saúde • Reportagem sobre antidepressivos e desejo sexual: http://vogue.globo.com/moda/moda-news/noticia/2014/02/ sexo-nao-obrigada-como-os-antidepressivos-estao-acaban- do-com-libido.html • Impacto dos contraceptivos orais na
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