Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Instituto de Pesquisa, Ensino e Gestão em Saúde - IPGS Programa de Educação Continuada à Distância Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clínica Prof a Karina dos Santos Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Maio de 2018 Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Apresentação A alimentação e o estado nutricional no período reprodutivo feminino impactam expressivamente no perfil de saúde da mulher e de seus descendentes. Diversas adaptações fisiológicas ocorrem para que a gestação progrida de forma adequada, o que requer recomendações nutricionais específicas. O acompanhamento nutricional nesse período apresenta extrema relevância, uma vez que pode garantir melhores desfechos de saúde maternos e infantis, repercutindo, inclusive, em melhores condições de saúde e nutrição a longo prazo. Para tanto, a atuação do nutricionista é fundamental em todas as etapas do ciclo gravídico-puerperal. Nesse contexto, o curso tem como objetivo apresentar os aspectos biofisiológicos e metabólicos da Nutrição em Obstetrícia e oferecer as mais recentes evidências científicas que embasam a conduta nutricional na prática clínica para o atendimento de mulheres, gestantes e puérperas, além de algumas inovações para orientação nutricional nessa área. Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Sumário Módulo I: Aspectos biofisiológicos e metabólicos da Nutrição em Obstetrícia ...... 04 Módulo II: Nutrição na gestação .............................................................................. 11 Módulo III: Nutrição no pós-parto........................................................................... 17 Módulo IV: Tópicos especiais .................................................................................. 22 Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Módulo I: Aspectos biofisiológicos e metabólicos da Nutrição em Obstetrícia Nutrição e fertilidade A fertilidade de mulheres e homens pode ser comprometida pela inadequação do estado nutricional e/ou do padrão alimentar. As mulheres com baixo peso, assim como as atletas, que apresentam reduzida adiposidade corporal, costumam cursar com alterações no ciclo ovariano, uma vez que baixas concentrações de leptina e maiores concentrações séricas de grelina e peptídeo YY (PYY), comuns nesses casos, influenciam a regulação hormonal do eixo hipotálamo-hipófise-ovários (HHO), comprometendo o padrão ovulatório. Por outro lado, a obesidade também impacta negativamente a fertilidade. Além das alterações relacionadas à regulação hormonal do HHO em mulheres obesas, devido à resistência à leptina e perfil de inflamação crônica, a adiposidade corporal excessiva prejudica a integridade dos oócitos, por meio de modificações no desenvolvimento folicular, danos mitocondriais, lipotoxicidade e produção aumentada de espécies reativas de oxigênio. Há menor chance de implantação e desenvolvimento do embrião na parede uterina. De forma semelhante, a obesidade masculina promove desregulação hormonal no eixo hipotálamo-hipófise-testículos (HHT), reduzindo a produção de testosterona e a espermatogênese, portanto, comprometendo a fertilidade. Outra questão importante, é a presença de enzimas que atuam na interconversão de hormônios esteroides nos adipócitos, de forma que, na obesidade, esse mecanismo também influencia o balanço hormonal que regula HHT e HHO. Com relação à influência de nutrientes e do padrão alimentar sobre a fertilidade, recente estudo apresentou uma ampla revisão sobre o assunto, cujos resultados estão sumarizados a seguir (quadros 1 e 2). Nutrientes isolados parecem não influenciar diretamente a fertilidade, mas sim, o padrão alimentar. Frente ao exposto, o cuidado nutricional para adequação do peso, da adiposidade corporal e manutenção de hábitos alimentares saudáveis deve ser contínuo ao longo do período reprodutivo feminino e masculino, com intenção de melhorar as condições de fertilidade dos casais. Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Quadro 1 - Visão geral da literatura sobre a relação entre dieta e fertilidade feminina. Quais as evidências? Quais são as falhas? Suplementos de antioxidantes Suplementos de antioxidantes parecem não ter efeito sobre a fertilidade feminina. Poucos estudos testaram exatamente a mesma intervenção, portanto é difícil chegar a uma conclusão. Ácido fólico, Ácido fólico pode aumentar as taxas de Nenhum ensaio randomizado testou as vitamina B12 fertilidade e número de nascidos vivos doses que apresentaram benefícios em em TRA. Doses maiores que as estudos de observação. recomendadas para a prevenção de DTN podem oferecer maior benefício, assim como a ingestão adicional de vitamina B12. Vitamina D Embora a deficiência de vitamina D possa possivelmente prejudicar a fertilidade, não está claro se níveis séricos acima do suficiente conferem benefício adicional. Grande parte dos trabalhos publicados focaram em mulheres com ingestão de vitamina D ou concentração sérica dentro, ou muito perto, da faixa normal. Um efeito adverso de deficiência grave na fertilidade não pode ser descartado. Gorduras Ácidos graxos trans (mesmo nos níveis São necessários ensaios clínicos de atuais de ingestão nos EUA) estão suplementação de ácidos graxos ômega- relacionados à baixa fertilidade, 3. enquanto ácidos graxos Ômega-3 de cadeias longas têm uma relação oposta. Laticínios Laticínios provavelmente não tem influência significativa na fertilidade. Pouquíssimos estudos abordaram este assunto. Carnes Ingestão de carnes vermelhas ou peixes com altos níveis de contaminação ambiental pode ser preocupante. Pouquíssimos estudos abordaram este assunto. Soja, Ingestão de soja não altera a Apenas um estudo com planejamento isoflavonas capacidade reprodutiva do casal; pré-concepção. entretanto, ingestão de isoflavonas Diferentes doses em estudos de TRA pode aumentar a taxa de nascidos vivos mostraram efeitos similares. em TRA. Padrões Dietas saudáveis foram Definição de saudável e não saudável dietéticos consistentemente relacionadas a maior muda ligeiramente de estudo para fertilidade e maiores taxas de nascidos estudo. Não há ensaios randomizados até vivos em TRA, em diversos estudos. a data. (Em geral: carnes brancas, grãos Dietas não saudáveis apresentam integrais, frutas, hortaliças). relação oposta. Álcool, cafeína A maioria dos grandes estudos não Porque ensaios randomizados com detectou associação entre alto consumo álcool/ cafeína provavelmente serão de álcool ou cafeína com baixa julgados como antiéticos, há a fertilidade. necessidade de grandes estudos de coorte prospectivos para esclarecer essa questão. TRA: terapia de reprodução assistida, DTN: defeitos do tubo neural Fonte: traduzido e adaptado de GASKINS; CHAVARRO, 2017. Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Quadro 2 - Visão geral da literatura sobre a relação entre dieta e fertilidade masculina. Qual o ponto principal? Quais são as falhas? Suplementos de antioxidantes Suplementação de antioxidantes para homens em casais que estão fazendo TRA pode aumentar a taxa de nascidos vivos. Baseado na literatura atual, não é possível dizer quais antioxidantes (ou combinações) ou quais doses são responsáveis por este benefício.Padrões dietéticos Dietas saudáveis tem sido consistentemente relacionadas a melhor qualidade do sêmen em várias populações. Dietas não saudáveis apresentam a relação oposta. Definição de saudável e não saudável muda ligeiramente de estudo para estudo. Não há ensaios randomizados até a data. Efeito na qualidade do sêmen não implica em efeito na fertilidade do casal. Gorduras Ingestão de gorduras saturadas e trans têm sido consistentemente relacionadas a sêmen de baixa qualidade e outros marcadores de má função testicular. Não há ensaios randomizados até a data. Efeito na qualidade do sêmen não implica em efeito na fertilidade do casal. Álcool, cafeína Álcool e cafeína não têm impacto importante na qualidade do sêmen dentro das quantidades usuais de ingestão. A exceção é a ingestão de álcool em níveis associados à doença hepática. Efeito na qualidade do sêmen não implica em efeito na fertilidade do casal. TRA: terapia de reprodução assistida Fonte: traduzido e adaptado de GASKINS; CHAVARRO, 2017. Influência da nutrição materna/paterna no desenvolvimento embrionário e fetal As interações entre nutrição e genoma humano ocorrem desde o início do desenvolvimento embrionário e fetal, em que o padrão alimentar e/ou o estado nutricional materno são capazes de modular a expressão gênica de seus descendentes ainda no ambiente intrauterino. Esse processo, conhecido como programação metabólica, ocorre por meio de mecanismos epigenéticos, configurando o campo da epigenômica nutricional. A restrição alimentar na gestação - com consequente desnutrição energético-proteica, o excesso alimentar - desencadeando obesidade, bem como a inadequada ingestão de nutrientes e compostos bioativos de alimentos (CBA) desencadeiam respostas preditivas adaptativas do feto para tais condições. Essas respostas são modulações no nível epigenético, que promovem ativação ou silenciamento de genes, especialmente os envolvidos em processos metabólicos. Com isso, após o nascimento e ao longo da sua vida, o indivíduo pode ter maior risco de desenvolvimento de doenças crônicas, como obesidade, diabetes mellitus tipo 2, doenças cardiovasculares e câncer. Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Evidências mais recentes apontam a influência da nutrição paterna no epigenoma embrionário/fetal. Não somente a baixa qualidade do padrão alimentar materno, mas também paterno, no período periconcepcional, relacionam-se com maior risco para síndrome metabólica em seus descendentes. O mesmo verifica-se para a inadequação do estado nutricional, especialmente a obesidade. Portanto, novamente ressalta-se a importância do cuidado nutricional para homens e mulheres em idade reprodutiva, promovendo adequado consumo energético e de macro e micronutrientes, evitando que doenças crônicas tenham maior prevalência nas próximas gerações. Adaptações fisiológicas na gestação Alterações anatômicas, fisiológicas e psicológicas acontecem na gestação a fim de regular o metabolismo materno, promover o crescimento fetal e preparar a mãe para o trabalho parto e a lactação. Os sistemas endócrino, imune e nervoso atuam de forma sinergética para assegurar a homeostase do binômio mãe-filho. A gestação é um período de expressivas alterações hormonais, cujos efeitos são imprescindíveis para o seu progresso. Logo após a implantação do embrião no endométrio, há um aumento nas concentrações da porção beta do hormônio hCG (gonadotrofina coriônica humana – β-hCG), o que estende a duração da fase lútea, a fim de que a secreção de esteroides se mantenha em níveis suficientes para impedir que se inicie um novo ciclo ovulatório. A placenta começa, então, a se formar, constituída pela camada mais externa do trofoblasto e a decídua. A placenta será o principal órgão endócrino durante a gestação, além de manter as funções metabólicas e as trocas materno-fetais. Os fluxos sanguíneos materno e fetal são independentes, de forma que todas as trocas ocorrem através da membrana placentária. Os principais hormônios envolvidos nos ajustes fisiológicos da gestação, bem como suas funções, estão descritos no quadro 3. Em relação às alterações no metabolismo materno, são percebidos aumento de taxa metabólica basal, síntese proteica, débito e frequência cardíacos, volume plasmático, taxa de filtração glomerular e ventilação pulmonar. Há aumento da lipólise para oxidação de ácidos Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância graxos como substrato energético materno, com objetivo de maior disponibilização de glicose e aminoácidos para nutrição do feto. A hemodiluição é uma característica da gestação, devido à hipervolemia associada a menores concentrações séricas de albumina. Com isso, há maior chance de formação de edemas. Náuseas, vômitos e anorexia estão presentes, principalmente, no início da gestação, devido às alterações hormonais. As adaptações anatômicas, conforme crescimento do feto no útero, associadas à ação da progesterona na diminuição da motilidade intestina, costumam desencadear constipação, também sendo comuns relatos de pirose e refluxo gastroesofágico. Quadro 3 – Principais hormônios envolvidos nos ajustes fisiológicos da gestação hCG (gonadotrofina coriônica humana) Manutenção da secreção de hormônios esteroides em níveis que impedem o início de novo ciclo ovulatório, por meio da extensão da fase lútea. Cortisol Regulação do crescimento fetal e maturação de órgãos. Progestorona Implantação do embrião na parede uterina; Supressão da resposta imune materna aos antígenos fetais; Inibe contração uterina prematura (ação no miométrio); Ativa centro respiratório, aumentando ventilação pulmonar e preservando frequência respiratória basal; Reduz motilidade intestinal; Estimula arborização dos ductos e desenvolvimento dos alvéolos no tecido mamário e edemaciamento das mamas. Estrogênio Promove vasodilatação, favorecendo fluxo de trocas placentárias; Estimula contratilidade cardíaca: aumento do débito cardíaco; Retenção hídrica e de eletrólitos: aumento do volume plasmático; Estimula síntese hepática de proteínas transportadoras de hormônios; Estimula contratilidade uterina; Prolifera musculatura e sistema vascular uterinos; Promove aumento das mamas –ductos e deposição de gordura; Aumenta a pigmentação das aréolas. Lactogênio placentário humano (HPL) Concentração aumenta na segunda metade da gestação; Promove resistência à insulina materna (efeito diabetogênico); Promove lipólise e elevação dos níveis de ácidos graxos livres. Prolactina Preparo do organismo materno para o aleitamento. Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância O trabalho de parto tem estímulos hormonais e físicos. A relaxina, secretada por ovários e placenta, promove o amolecimento do colo do útero. O feto, devido ao seu crescimento, empurra o colo do útero, estimulando as contrações uterinas e secreção de ocitocina. Com isso, um ciclo de retroalimentação positiva para aumento das contrações uterinas se segue até o nascimento do bebê, acompanhado de adaptações anatômicas que possibilitam o parto. Durante toda a gestação, estímulos endócrinos atuam na preparação e maturação das glândulas mamárias para a lactação. Após o parto, o principal estímulo para ejeção do leite é a sucção realizada pelo bebê no seio, que promove respostas do sistema nervoso central para secreção do leite e contração do músculo liso mamário. Altas concentrações de prolactina atuam de forma inibitória sobre o HHO, porém, o tempo para restabelecimento do ciclo ovulatório feminino depende de frequência e quantidade do aleitamento materno, dentre outras características individuais. Apostila do Curso Nutriçãoem Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Referências Anselmo-Franci JA, Spritzer PM, Franci CR. Fisiologia da Reprodução. In: Aires MM (org). Fisiologia. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. p. 1163-1174. Bornia RG, Barbosa MM, da Silva ERM. Modificações do organismo materno. In: de Sá RAM, Oliveira CA (Orgs). Hermógenes: Obstetrícia Básica. 3 ed. São Paulo: Atheneu, 2015. p. 77-88. Broughton DE, Moley KH. Obesity and female infertility: potential mediators of obesity's impact. Fertil Steril. 2017 Apr; 107(4):840-847. Craig JR et al. Obesity, male infertility, and the sperm epigenome. Fertil Steril. 2017 Apr; 107(4):848-859. Dunford AR, Sangster JM. Maternal and paternal periconceptional nutrition as an indicator of offspring metabolic syndrome risk in later life through epigenetic imprinting: A systematic review. Diabetes Metab Syndr. 2017 Dec; 11 (Suppl 2): S655-S662. Fontelles CC et al. Nutrição e epigenética. In: Dal Bosco SM, Genro JP (Orgs). Nutrigenética e implicações na saúde humana. São Paulo: Atheneu, 2014. p. 179-200. Gaskins AJ, Chavarro JE. Diet and fertility: a review. Am J Obstet Gynecol. 2017 Aug 24. pii: S0002-9378(17)30945-6. Giviziez, CR et al. Obesity and anovulatory infertility: A review. JBRA Assist Reprod. 2016 Oct-Dec; 20(4): 240–245. Hart RJ. Physiological aspects of female fertility: role of the environment, modern lifestyle, and genetics. Physiol Rev. 2016; 96: 873–909. Mathew H, Castracane VD, Mantzoros C. Adipose tissue and reproductive health. Metabolism. 2017 Nov 16. pii: S0026-0495(17)30309-8. Montenegro CAB, Rezende Filho J. Anexos do embrião e do feto. In: Montenegro CAB, Rezende Filho J (Orgs). Rezende Obstetrícia. 13 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017. p. 41-55. Montenegro CAB, Rezende Filho J. Endocrinologia da gravidez. In: Montenegro CAB, Rezende Filho J (Orgs). Rezende Obstetrícia. 13 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017. p. 56-62. Oliveira AMN, Oliveira MMS, Zajdenverg L. Endocrinologia da gestação. In: de Sá RAM, Oliveira CA (Orgs). Hermógenes: Obstetrícia Básica. 3 ed. São Paulo: Atheneu, 2015. p. 63- 76. Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Saunders C. Ajustes fisiológicos da gestação. In: Accioly E, Saunders C, Lacerda EMA (Orgs). Nutrição em Obstetrícia e Pediatria. 2 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009. p. 89-101. Schanton M et al. Involvement of leptin in the molecular physiology of the placenta. Reproduction. 2018 Jan; 155(1): R1-R12. Silverthorn DU. Reprodução e desenvolvimento. In: Silverthorn DU. Fisiologia humana: uma abordagem integrada. 5 ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. p. 828-867. Sugestões de leituras complementares Howell KR, Powell TL. Effects of maternal obesity on placental function and fetal development. Reproduction. 2017 March;153(3): R97–R108. Ideraabdullah FI, Zeisel SH. Dietary modulation of the epigenome. Physiol Rev. 2018; 98: 667–695. Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Módulo II: Nutrição na gestação Assistência pré-natal A assistência à saúde para o público materno-infantil está no cerne dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), iniciativa da Organização das Nações Unidas para melhorar as condições globais de vida e saúde até 2030. Assegurar o acesso à saúde sexual e reprodutiva e promover a redução das taxas de mortalidade materna, neonatal e infantil fazem parte desses objetivos. Para isso, a qualidade da atenção ao pré-natal é fundamental. Dentre diversos aspectos a serem aprimorados, destaca-se o cuidado nutricional, pois são amplamente conhecidos na literatura científica os desfechos maternos e infantis desfavoráveis relacionados ao estado nutricional inadequado e/ou ao ganho de peso gestacional insuficiente ou excessivo, dentre eles: síndromes hipertensivas da gestação e diabetes mellitus materna, retenção de peso pós-parto com propensão para obesidade futura da mulher, dificuldade na amamentação, restrição de crescimento intrauterino, parto prematuro, parto cirúrgico, criança pequena ou grande para a idade gestacional e propensão para obesidade e doenças crônicas futuras nas crianças/adultos. A atuação do nutricionista no atendimento de pré-natal pode ser decisiva frente a tais condições. Para tanto, o acompanhamento deve ser iniciado o mais precocemente possível e seguido ao longo da gestação, estendendo-se ao pós-parto. Avaliação nutricional Na primeira consulta, uma avaliação clínica e nutricional cuidadosa precisa ser realizada, e reavaliada nas consultas seguintes. Alguns itens relevantes serão comentados a seguir. Idade gestacional (IG): não havendo acesso à ultrassonografia, a IG pode ser calculada como a diferença entre a data da consulta e o primeiro dia da última menstruação (DUM). Exemplo: DUM: 20/01/2018, data da consulta: 03/03/2018 IG em dias = 42 dias, IG em semanas (dividir por 7) = 42 / 7 = 6 semanas Data provável do parto (DPP): considerar 280 dias ou 40 semanas após a DUM. Anamnese: utilizar o instrumento para conhecer a gestante, sua rotina, seu histórico clínico e obstétrico. Precisa ser ajustado ao tempo de consulta, lembrando que quanto mais o Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância profissional conhecer seu paciente, mais fácil será a criação de vínculo e melhor será a adesão às orientações. Realizar aferição da pressão arterial. Exames bioquímicos: analisar todos os dados que estiverem disponíveis. Quando possível, e se necessário, solicitar exames específicos para condições observadas na anamnese e na avaliação do consumo alimentar. Minimamente, como padrão no serviço público, devem ser solicitados hemograma e glicemia de jejum. Hemoglobina < 11g/dl caracteriza anemia. Glicemia de jejum ≥ 126mg/dl caracteriza diabetes mellitus prévio à gestação, enquanto valores entre 92 e 125 caracterizam diabetes mellitus gestacional (DMG). Avaliação do consumo alimentar: utilizar instrumento pertinente ao tempo de consulta e informações consideradas principais para o atendimento. Importante observar rotina alimentar, número de refeições realizadas, quantidades, preferências, etc. Assim poderá ser estimado o consumo de macro e micronutrientes e conhecido o padrão alimentar adotado. Avaliação antropométrica: calcular o IMC pré-gestacional (peso pré-gestacional (PPG)/estatura² (m). Classificar o estado nutricional pré-gestacional para adequada programação de ganho de peso. Considerar como PPG o registro do cartão da gestante, prontuário ou autorrelato, desde que referente a até 2 meses pré-concepção, ou o primeiro peso aferido no trimestre inicial da gestação. Na ausência desse dado, classificar o IMC gestacional pelo gráfico ou tabela de Atalah. Programação do ganho de peso gestacional A programação do ganho de peso gestacional (GPG) será realizada com base no estado nutricional pré-gestacional, conforme o quadro 4. Quadro 4 – Recomendação de ganho de peso gestacional semanal e total (kg), de acordo com o IMC pré-gestacional. IMC pré- gestacional (kg/m²) Ganho de peso (kg) total no 1° trimestre Ganho de peso semanal (kg) durante 2° e 3° trimestres Ganho de peso (kg) total na gestação Ganho de peso mínimo (kg/semana) < 18,5 Baixo peso 2,0 0,51 (0,44 – 0,58) 12,5 – 18,0 0,44 18,5 a 24,9 Adequado 1,5 0,42 (0,35 – 0,50) 11,5 – 16,0 0,35 25,0 a 29,9 Sobrepeso 1,0 0,28 (0,23 – 0,33) 7,0 – 11,5 0,23 ≥ 30,0 Obesidade 0,5 0,22 (0,17 – 0,27) 5,0 – 9,0 0,17 Fonte: adaptado de Institute of Medicine (2009) por Saunders et al. (2012) e validado por Padilha et al. (2014). Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia:da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Idade (anos) Atividade leve Atividade moderada Atividade intensa 10-11 1,45 1,70 1,95 11-12 1,50 1,75 2,00 12-13 1,50 1,75 2,00 13-14 1,50 1,75 2,00 14-15 1,50 1,75 2,00 15-16 1,50 1,75 2,00 16-17 1,50 1,75 2,00 17-18 1,45 1,70 1,95 Adicional energético da gestação (AEG) 1° trimestre = 85 kcal/dia 2° trimestre = 285 kcal/dia 3° trimestre = 475 kcal/dia Ou individualizado: Para ganho de 1 kg = 6.417 kcal Recomendações nutricionais Cálculo do VET pela FAO/OMS Cálculo da taxa metabólica basal (TMB) 10 a 18 anos – TMB = 13,384 x P(kg) + 692,6 18 a 30 anos – TMB = 14,818 x P(kg) + 486,6 30 a 60 anos – TMB = 8,126 x P(kg) + 845,6 VET = (TMB x NAF) + AEG Conforme IMC pré-gestacional ou inicial Eutróficas: P = peso pré-gestacional ou peso desejável Baixo peso: P = peso desejável Sobrepeso/obesidade: P = peso pré-gestacional Peso desejável = IMC x estatura² (m) Adultas: IMC de 21 ou conforme avaliação Adolescentes: IMC percentil 50 para idade Quadro 5 – NAF: Nível de atividade física para adultas. Categoria/estilo de vida NAF Sedentário ou leve 1,40 a 1,69 (média 1,53) Ativo ou moderadamente ativo 1,70 a 1,99 (1,76) Vigoroso ou moderadamente vigoroso 2,00 a 2,40 (2,25) Quadro 6 – NAF: Nível de atividade física para adolescentes. Cálculo do VET pelo IOM VET = EER + AEG Adolescentes < 19 anos, IMC < 25 kg/m² EER = 135,3 - (30,8 x idade[anos]) + FA x [(10 x peso[kg]) + (934 x altura[m])] + 25 Adolescentes < 19 anos, IMC ≥ 25 kg/m² EER = 389 – (41,2 x idade[anos]) + FA x [(15 x peso[kg]) + (701,6 x altura[m])] Mulheres ≥ 19 anos, IMC < 25 kg/m² EER = 354 - (6,91 x idade[anos]) + FA x [(9,36 x peso[kg]) + (726 x altura[m])] Mulheres ≥ 19 anos, IMC ≥ 25 kg/m² EER = 448 – (7,95 x idade[anos]) + FA [(11,4 x peso[kg]) + (619 x altura [m])] Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Adicional energético da gestação (AEG) 1° trimestre = 0 2° trimestre = 340 kcal/dia 3° trimestre = 452 kcal/dia Observação: se IMC <25, PPG ou P aceitável; se IMC ≥ 25, PPG Quadro 7 - Fator atividade física (FA). Quadro 8 - Recomendações diárias de micronutrientes na gestação. 14 a 18 anos 19 a 30 anos 31 a 50 anos Vitamina A (µg) 750 770 770 Vitamina C (mg) 80 85 85 Vitamina D (µg) 15 15 15 Vitamina E (mg) 15 15 15 Vitamina K (µg) 75 90 90 Tiamina (mg) 1,4 1,4 1,4 Riboflavina (mg) 1,4 1,4 1,4 Niacina (mg) 18 18 18 Vitamina B6 (mg) 1,9 1,9 1,9 Folato (µG) 600 600 600 Vitamina B12 (µg) 2,6 2,6 2,6 Ácido pantotênico (mg) 6 6 6 Biotina (µG) 30 30 30 Colina (mg) 450 450 450 Cálcio (mg) 1300 1000 1000 Cromo (µg) 29 30 30 Cobre (µg) 1000 1000 1000 Flúor (mg) 3 3 3 Iodo (µg) 220 220 220 Ferro (mg) 27 27 27 Magnésio (mg) 400 350 360 Manganês (mg) 2 2 2 Molibdênio (µg) 50 50 50 Fósforo (mg) 1250 700 700 Categoria <19 a, IMC <25 kg/m² <19 a, IMC ≥25 kg/m² >19 a, IMC <25 kg/m² >19 a, IMC ≥25 kg/m² Sedentária 1 1 1 1 Pouco ativa 1,6 1,18 1,12 1,16 Ativa 1,31 1,35 1,27 1,27 Muito ativa 1,56 1,6 1,45 1,44 Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Selênio (µg) 60 60 60 Zinco (mg) 12 11 11 Potássio (g) 4,7 4,7 4,7 Sódio (g) 1,5 1,5 1,5 Cloro (g) 2,3 2,3 2,3 Fonte: adaptado de Institute of Medicine, 2011. Quadro 9 – Recomendações diárias de água, macronutrientes e fibras na gestação. 14 a 18 anos 19 a 30 anos 31 a 50 anos Água total (l) 3 3 3 Carboidratos(g) 45 a 65% do VET 175 175 175 Proteínas (g) 1,1g/kg; 10 a 35% do VET 71 71 71 Lipídios 20 a 35% do VET ND ND ND Fibras totais 28 28 28 ND: não definido. Fonte: adaptado de Institute of Medicine, 2011. Suplementação A suplementação mínima recomendada para o período gestacional está descrita no quadro 10. Quadro 10 - Suplementação mínima (diária) recomendada para o período gestacional. Ácido fólico 400 µg; 30 dias pré-concepção Ferro + ácido fólico 40 mg ferro elementar + 400 µg ácido fólico; durante a gestação Cálcio (somente em populações com baixo consumo); especialmente quando há risco elevado para pré-eclâmpsia 0,5 a 2 g; após a 20ª semana gestacional, até o fim da gestação. Vitamina A Somente em populações com alto risco para hipovitaminose A, mediante avaliação. Altas doses são teratogênicas. Fonte: adaptado de Ministério da Saúde, 2013; Organização Mundial da Saúde, 2011; 2016. Suplementação de outros nutrientes, de forma isolada ou conjunta, não tem recomendação oficial da Organização Mundial da Saúde. Porém, estudos apontam para necessidade de avaliação individualizada, com possíveis benefícios em alguns casos. Gestantes que não consomem alimentos de origem animal devem utilizar suplementação diária de vitamina B12, com 2,6 µg. Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Referências Institute of Medicine. Nutrient recommendations: dietary reference intakes. Disponível em: < https://ods.od.nih.gov/Health_Information/Dietary_Reference_Intakes.aspx>. Acesso em: 05 mai 2018. Institute of Medicine. Nutrition during lactation. Washington: The National Academies Press, 1991. Institute of Medicine. Nutrition during pregnancy and lactation. Washington: The National Academies Press, 1992. Institute of Medicine. Weight gain during pregnancy: Reexamining the guidelines. Washington: The National Academies Press, 2009. Kominiarek MA, Rajan P. Nutrition Recommendations in Pregnancy and Lactation. Med Clin North Am. 2016 Nov; 100(6): 1199–1215. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Atenção ao pré-natal de baixo risco: Série A. Normas e Manuais Técnicos. Cadernos de Atenção Básica, n° 32. Brasília, DF, 2013a. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Programa nacional de suplementação de ferro: manual de condutas gerais. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. Organização das Nações Unidas. Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Disponível em: < https://nacoesunidas.org/pos2015/>. Acesso em: 05 mai 2018. Saunders C, Padilha PC, D’Ambrosio Bessa TCC. Aspectos nutricionais. In: de Sá RAM, Oliveira CA (Orgs). Hermógenes: Obstetrícia Básica. 3 ed. São Paulo: Atheneu, 2015. p. 131-161. World Health Organization. WHO recommendations for prevention and treatment of pre- eclampsia and eclampsia. Geneva: World Health Organization, 2011. World Health Organization. WHO recommendations on antenatal care for a positive pregnancy experience. Geneva: World Health Organization, 2016. Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Modulo III: Nutrição no pós-parto Avaliação nutricional e retenção de peso pós-parto Retenção de peso pós-parto (RPPP) é a diferença entre o peso da mulher em determinado momento após o parto e o peso pré-gestacional. A RPPP predispõe a mulher a maior chance de desenvolver obesidade futura, e essa associação é proporcional à sua magnitude. Quanto maior a RPPP, maior o risco para o acúmulo de peso e adiposidade corporais ao longo dos anos reprodutivos. E quanto maior o ganho de peso gestacional, maior a RPPP. Após seis semanas do parto, a RPPP pode ser atribuída principalmente ao aumento do tecido mamário, devido à lactação, e à massa remanescente de gordura adquirida durante a gestação. Entretanto, não há consenso na literatura quanto ao intervalo de tempo ideal para que essa avaliação seja realizada. Também não há um protocolo para avaliação antropométrica com pontos de corte específicos para mulheres no período pós-parto, sendo utilizadosos parâmetros para mulheres adultas em geral. Anamnese: além dos aspectos já destacados para a anamnese no pré-natal, devem ser avaliados: histórico da gestação, adaptação à nova rotina com o bebê, amamentação e sinais de depressão. Realizar aferição da pressão arterial. Exames bioquímicos: não há valores de referência específicos para mulheres no período pós-parto, utilizando-se os indicados para mulheres não gestantes. Entretanto, dependendo do tempo de puerpério, podem estar presentes alterações relacionadas aos ajustes fisiológicos. Resultados devem ser observados com cautela e, sempre que disponível, comparados a resultados anteriores da mulher. Avaliação do consumo alimentar: utilizar instrumento pertinente ao tempo de consulta e informações consideradas principais para o atendimento. É importante observar rotina alimentar, número de refeições realizadas, quantidades, preferências, etc. Assim, poderá ser estimado o consumo de macro e micronutrientes e conhecido o padrão alimentar adotado. É fundamental a avaliação da ingestão hídrica durante a lactação. Avaliação antropométrica: calcular o IMC (peso/estatura² (m)) e a RPPP (peso atual – peso pré-gestacional). É indicada a aferição da circunferência da cintura para mulheres adultas. Adicionalmente, outros métodos podem ser adotados para avaliação da composição Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Adicional energético da lactação (AEL) 1° semestre = 500 kcal/dia 2° semestre = 400 kcal/dia Avaliar uso do AEL em SOB e OB. corporal, como bioimpedância, dobras cutâneas etc. Deve-se considerar possíveis alterações relacionadas ao período puerperal Recomendações nutricionais Até 6 semanas após o parto, espera-se que ocorra a perda do peso de produtos da gestação, exceto tecido mamário. A perda esperada de peso remanescente (RPPP), sem intervenção, é de 0,5 a 1kg/mês nos primeiros 6 meses de lactação. Mulheres com sobrepeso ou obesidade podem ter perda saudável de até 2 kg mensais. Observação importante: Pode ser aplicada restrição energética de até 500 kcal após o primeiro mês de lactação para mulheres com sobrepeso e obesidade, desde que o VET se mantenha superior a 1800-1900 kcal. Cálculo do VET pela FAO/OMS Cálculo da taxa metabólica basal (TMB) 10 a 18 anos – TMB = 13,384 x P(kg) + 692,6 18 a 30 anos – TMB = 14,818 x P(kg) + 486,6 30 a 60 anos – TMB = 8,126 x P(kg) + 845,6 VET = (TMB x NAF) + AEL Verificar NAF nos quadros 5 e 6. SOB: sobrepeso, OB: obesidade Cálculo do VET pelo IOM VET = EER + AEG Adolescentes < 19 anos, IMC < 25 kg/m² EER = 135,3 - (30,8 x idade[anos]) + FA x [(10 x peso[kg]) + (934 x altura[m])] + 25 Baixo peso: P = peso desejável Peso desejável = IMC x estatura² (m) Adultas: IMC de 21 ou conforme avaliação Adolescentes: IMC percentil 50 para idade Adolescentes < 19 anos, IMC ≥ 25 kg/m² EER = 389 – (41,2 x idade[anos]) + FA x [(15 x peso[kg]) + (701,6 x altura[m])] Adicional energético da lactação (AEL) 1° semestre = 675 kcal/dia (sem estoque energético) OU 505 kcal/dia para eutróficas com RPPP (perda de 0,8/mês) OU 175 kcal kcal/dia (SOB/OB, restrição de 500 kcal) 2° semestre = 460 kcal/dia (avaliar em SOB/OB) Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Mulheres ≥ 19 anos, IMC < 25 kg/m² EER = 354 - (6,91 x idade[anos]) + FA x [(9,36 x peso[kg]) + (726 x altura[m])] Mulheres ≥ 19 anos, IMC ≥ 25 kg/m² EER = 448 – (7,95 x idade[anos]) + FA [(11,4 x peso[kg]) + (619 x altura [m])] Observação: se IMC <25, usar P desejável Verificar FA no quadro 7. Quadro 11 - Recomendações diárias de micronutrientes na lactação. 14 a 18 anos 19 a 30 anos 31 a 50 anos Vitamina A (µg) 1200 1300 1300 Vitamina C (mg) 115 120 120 Vitamina D (µg) 15 15 15 Vitamina E (mg) 19 19 19 Vitamina K (µg) 75 90 90 Tiamina (mg) 1,4 1,4 1,4 Riboflavina (mg) 1,6 1,6 1,6 Niacina (mg) 17 17 17 Vitamina B6 (mg) 2 2 2 Folato (µG) 500 500 500 Vitamina B12 (µg) 2,8 2,8 2,8 Ácido pantotênico (mg) 7 7 7 Biotina (µG) 35 35 35 Colina (mg) 550 550 550 Cálcio (mg) 1300 1000 1000 Cromo (µg) 44 45 45 Cobre (µg) 1300 1300 1300 Flúor (mg) 3 3 3 Iodo (µg) 290 290 290 Ferro (mg) 10 9 9 Magnésio (mg) 360 310 320 Manganês (mg) 2,6 2,6 2,6 Molibdênio (µg) 50 50 50 Fósforo (mg) 1250 700 700 Selênio (µg) 70 70 70 Zinco (mg) 13 12 12 Potássio (g) 5,1 5,1 5,1 Sódio (g) 1,5 1,5 1,5 Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Cloro (g) 2,3 2,3 2,3 Fonte: adaptado de Institute of Medicine, 2011. Quadro 12 – Recomendações diárias de água, macronutrientes e fibras na lactação. 14 a 18 anos 19 a 30 anos 31 a 50 anos Água total (l) 3,8 3,8 3,8 Carboidratos(g) 45 a 65% do VET 210 210 210 Proteínas (g) 1,1g/kg; 10 a 35% do VET 71 71 71 Lipídios 20 a 35% do VET ND ND ND Fibras totais 29 29 29 ND: não definido. Fonte: adaptado de Institute of Medicine, 2011. Suplementação O Ministério da Saúde recomenda a continuidade da suplementação diária de ferro (40 mg de ferro elementar) por 3 meses após o parto. A suplementação de outros nutrientes deve ser avaliada individualmente, não havendo recomendação para uso geral. Aspectos relacionados à lactação A alimentação materna parece influenciar a composição do leite, porém os estudos sobre esse assunto apresentam resultados controversos. Entretanto, evidências indicam que ácidos graxos ômega-3, vitaminas lipossolúveis e vitamina C têm suas concentrações aumentadas no leite quando há maior consumo pela mulher. Tais nutrientes apresentam associação com melhores padrões de desenvolvimento físico e cognitivo da criança. A composição do leite materno é única, completa e específica para cada fase do desenvolvimento e da mamada do lactente. Devido a seus inúmeros benefícios, a promoção ao aleitamento materno deve ser conduta de todo profissional de saúde, desde o início do pré- natal. De acordo com o Ministério da Saúde, são restrições para o aleitamento materno: mães infectadas pelo HIV; mães infectadas pelo HTLV1 e HTLV2 (vírus da leucemia humana T-cell); mães em uso de medicamentos incompatíveis com a amamentação, como por exemplo os antineoplásicos e radiofármacos, usados no tratamento contra o câncer. criança portadora de galactosemia, doença rara em que não pode ingerir leite humano ou qualquer outro que contenha lactose. Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Referências Gilmore LA, Klempel-Donchenko M, Redman LM. Pregnancy as a window to future health: Excessive gestational weight gain and obesity. Semin Perinatol. 2015 June; 39(4): 296–303. Institute of Medicine. Nutrient recommendations: dietary reference intakes. Disponível em: < https://ods.od.nih.gov/Health_Information/Dietary_Reference_Intakes.aspx>. Acesso em: 05 mai 2018. Institute of Medicine. Nutrition during lactation. Washington: The National Academies Press, 1991. Institute of Medicine. Nutrition during pregnancy and lactation. Washington: The National Academies Press, 1992. Institute of Medicine. Weight gain during pregnancy: Reexamining the guidelines. Washington: The National Academies Press, 2009. Kominiarek MA, Rajan P. Nutrition Recommendations in Pregnancy and Lactation. Med Clin North Am. 2016 Nov; 100(6): 1199–1215. Lovelady, C. Balancing intake and output: food v. exercise. Balancing exercise and food intake with lactation to promote post-partum weight loss. Proc Nutr Soc. 2011; 70: 181–184. Ministério da Saúde. Aleitamento materno. Disponível em: < http://portalms.saude.gov.br/saude-para-voce/saude-da-crianca/aleitamento-materno/restricoes-ao-aleitamento-materno>. Acesso em 05 mai 2018. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Atenção ao pré-natal de baixo risco: Série A. Normas e Manuais Técnicos. Cadernos de Atenção Básica, n° 32. Brasília, DF, 2013a. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Programa nacional de suplementação de ferro: manual de condutas gerais. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. Nogueira JL, Saunders C, Leal MC. Métodos antropométricos utilizados na avaliação da retenção do peso no período pós-parto: uma revisão sistemática. Cien Saude Colet. 2015; 20(2): 407-420. http://portalms.saude.gov.br/saude-para-voce/saude-da-crianca/aleitamento- Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Módulo IV: Tópicos especiais Manejo clínico e nutricional em condições de risco Obesidade: Sobrepeso e obesidade apresentam prevalências altas e crescentes entre brasileiras em idade reprodutiva. Na gestação, tal condição associa-se a piores desfechos, como diabetes gestacional, síndromes hipertensivas, necessidade de parto cirúrgico (com complicações), dificuldade na amamentação, anomalias congênitas, abortamento, maior mortalidade neonatal e infantil, prematuridade, macrossomia e maior risco para desenvolvimento de doenças crônicas futuras. O ideal é que as mulheres sejam orientadas a diminuírem o peso antes da gestação. No pré-natal, o aconselhamento nutricional deve ser constante e cuidadoso para adequação do ganho de peso gestacional (de 5 a 9 kg totais) e controle metabólico. No período pós-parto, é recomendado o acompanhamento para lactação e perda de peso gradual. Diabetes na gestação: Após a metade da gestação, há maior risco para desenvolvimento de diabetes mellitus gestacional (DMG), devido aos ajustes metabólicos hormonais. Todas as gestantes devem fazer o teste de rastreamento para DMG. O diabetes na gestação configura situação de risco e indica acompanhamento pré-natal por equipe multidisciplinar especializada. A adesão às orientações nutricionais nas primeiras duas semanas de diagnóstico é decisiva para o controle glicêmico, que indicará a necessidade, ou não, de início da insulinoterapia. As recomendações nutricionais são semelhantes às da gestação de risco habitual, podendo haver pequena redução no percentual de carboidratos do VET (40 a 55%), o que deve ser avaliado individualmente e conforme adesão da mulher. Síndromes hipertensivas da gestação (SHG): As SHG são classificadas em hipertensão arterial crônica, hipertensão gestacional, pré-eclâmpsia, eclâmpsia e hipertensão arterial crônica com pré-eclâmpsia sobreposta. Todas caracterizam-se pela hipertensão arterial sistólica e/ou diastólica (pressão arterial sistólica ≥ 140 mmHg; pressão arterial diastólica ≥ 90 mm Hg), podendo apresentar proteinúria (pré-eclâmpsia) e evoluir para quadros convulsivos (eclâmpsia). Essas síndromes são condições de risco, pois implicam em expressivo aumento da morbimortalidade materna e fetal. Obesidade e diabetes aumentam o risco para SHG, enquanto a prevenção se dá com adequado GPG, alimentação completa em macro e micronutrientes e prática de atividades físicas quando Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância não há contraindicações. O consumo de cálcio (e/ou suplementação) previne ocorrência de pré-eclâmpsia. O tratamento medicamentoso é adotado conforme prescrição médica. Gestação na adolescência: Meninas com menos de 20 anos de idade costumam apresentar condições comportamentais e socioeconômicas desfavoráveis, além de estruturas biológicas imaturas. Por se tratar de período crítico de crescimento e desenvolvimento, há maior prevalência de baixo peso e anemia na gestação. As adolescentes gestantes devem ter sua altura aferida em todas as consultas de pré-natal e o IMC calculado conforme protocolo da OMS, específico para essa faixa etária. O VET será calculado utilizando as fórmulas preditivas adequadas para a idade. As recomendações nutricionais (DRI) também apresentam valores específicos para as gestantes adolescentes. Gestação múltipla: Há maior chance de ocorrer gestação múltipla na idade materna avançada e na reprodução assistida. As principais complicações são o parto pré-termo e elevada morbimortalidade materna, fetal e neonatal. Dentre os riscos maternos, estão hiperêmese, DMG, SHG, anemia, hemorragia, parto cesáreo e depressão pós-parto. As recomendações específicas para gestação gemelar ainda são limitadas. A programação de ganho de peso gestacional, conforme o Institute of Medicine, é orientada conforme descrito no quadro 13. Cirurgia bariátrica: As mulheres que passam por cirurgia bariátrica devem aguardar de 12 a 24 meses para iniciar uma gestação. Há maior risco para parto pré-termo e nascimento de crianças pequenas para idade gestacional. As principais carências nutricionais relacionadas ao pós-cirúrgico são de proteínas, ferro, vitamina B12, folato, vitamina D e cálcio, que devem, preferencialmente, ser corrigidas em período prévio à concepção. A monitorização detalhada no pré-natal é fundamental para garantir a saúde da mulher e da criança. A suplementação de vitaminas e minerais é rotina após a cirurgia bariátrica, porém há baixa adesão. Portanto, é preciso avaliar o uso e quantidade para realizar a adequação às necessidades do período gestacional. Quadro 13 – Programação do ganho de peso gestacional para gestação gemelar. IMC pré-gestacional 2 a 13 semanas (kg/semana) 14 a 26 semanas (kg/semana) 27 semanas ao parto (kg/semana) Total (kg) 18,5 – 24,9 Eutrofia 0,12 – 0,49 0,64 – 0,94 0,50 – 0,83 16,8 – 24,5 25 – 29,9 Sobrepeso 0,03 – 0,39 0,57 – 0,87 0,42 – 0,81 14,1 – 22,7 ≥ 30 Obesidade 0,08 – 0,34 0,24 – 0,63 0,34 – 0,70 11,4 – 19,1 Fonte: Institute of Medicine, 2009. Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Inovações para orientação nutricional na área da Nutrição em Obstetrícia Nas últimas décadas, a ampliação do acesso à informação, por meio das tecnologias de informação e comunicação (TIC) e, especialmente, do acesso à internet, modificou o comportamento dos indivíduos frente às buscas por respostas para suas dúvidas sobre saúde e nutrição. O uso das TIC na saúde é denominado e-health. Mais recentemente surgiu a denominação m-health, para o acesso utilizando dispositivos móveis, como os smartphones. As mulheres aumentam seus acessos à internet para buscar informações relacionadas à nutrição durante a gestação e início da maternidade. Entretanto, muitas vezes se deparam com conteúdos de fontes não confiáveis, que podem influenciar seus comportamentos de forma prejudicial. Portanto, é importante que os profissionais de saúde, incluindo os nutricionistas, conheçam e acompanhem as questões que surgem no meio virtual, a fim de orientar as gestantes e puérperas para que obtenham informações de forma segura. Algumas dicas para os nutricionistas são: • conhecer sites, blogs, aplicativos e páginas/perfis de mídias sociais disponíveis e utilizados pelo seu público; • testar, recomendar ou contraindicar determinadas fontes de informação; • conversar sobre o assunto nas consultas, questionar o uso, esclarecer dúvidas; • utilizar recursos tecnológicos em seus atendimentos, quando possível; • utilizar ferramentas de comunicação para reforço e incremento de orientações nutricionais, receitas, dicas culinárias etc. Vale ressaltar que essas são medidas complementares ao acompanhamento nutricional e devem respeitar a privacidade e o código de ética do nutricionista. Apostila do Curso Nutrição em Obstetrícia: da fisiologia à prática clinica Ensino a Distância Referências Institute ofMedicine. Weight gain during pregnancy: Reexamining the guidelines. Washington: The National Academies Press, 2009. American College of Obstetricians and Gynecologists. ACOG practice bulletin no. 105: bariatric surgery and pregnancy. Obstet Gynecol. 2009 Jun;113(6):1405-13. Braga A. Gravidez na adolescência. In: Montenegro CAB, Rezende Filho J (Orgs). Rezende Obstetrícia. 13 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017. p. 1011-1018. Saunders C, Padilha PC, D’Ambrosio Bessa TCC. Aspectos nutricionais. In: de Sá RAM, Oliveira CA (Orgs). Hermógenes: Obstetrícia Básica. 3 ed. São Paulo: Atheneu, 2015. p. 131-161. Stang J, Huffman LG. Position of the Academy of Nutrition and Dietetics: Obesity, Reproduction, and Pregnancy Outcomes. J Acad Nutr Diet. 2016 Apr; 116(4):677-91. Montenegro, CAB; Rezende Filho, J. Gravidez gemelar. In: Montenegro CAB, Rezende Filho J (Orgs). Rezende Obstetrícia. 13 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017. p. 371-388. Harpel T. Pregnant Women Sharing Pregnancy-Related Information on Facebook: Web-Based Survey Study. J Med Internet Res. 2018 Mar; 20(3): e115. Overdijkink SB et al. The Usability and Effectiveness of Mobile Health Technology-Based Lifestyle and Medical Intervention Apps Supporting Health Care During Pregnancy: Systematic Review. JMIR Mhealth Uhealth. 2018 Apr 24; 6(4):e109. Sayakhot P, Carolan-Olah M. Internet use by pregnant women seeking pregnancy-related information: a systematic review. BMC Pregnancy and Childbirth 2016; 16:65. Sociedade Brasileira de Cardiologia. VII Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arq Bras Cardiol. 2016; 107(3), Suppl 3. Sociedade Brasileira de Diabetes. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2015-2016. São Paulo: A.C. Farmacêutica, 2016. Organização Pan-Americana da Saúde. Ministério da Saúde. Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. Sociedade Brasileira de Diabetes. Rastreamento e diagnóstico de diabetes mellitus gestacional no Brasil. Brasília: OPAS/OMS, 2017.
Compartilhar