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Disciplina militar na universidade: a federalização da Escola de Educação Física de Minas Gerais Gabriela Fischer Fernandes Corradi Mestranda em História e Culturas Políticas Universidade Federal de Minas Gerais gabifischer86@gmail.com Resumo O Decreto-lei nº 997, 21 de outubro de 1969, determinou a incorporação das Escolas de Educação Física de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul e a Escola de Serviço Social de Natal às Universidades Federais de seus respectivos Estados. Assim a Escola de Educação Física (EEF) de Minas Gerais passa a ser uma unidade acadêmica da UFMG. O que esse episódio nos diz sobre o momento político no qual se encontrava o Brasil? Esse é o ponto central da minha pesquisa. A EEF se incorpora à UFMG trazendo toda sua estrutura, alunos e, principalmente, seus 32 professores. A EEF foi fundada em Minas em 1952, sendo, no início, 2 escolas – uma do Estado de Minas Gerais e outra das Faculdades Católicas. Pela baixa procura, as duas escolas, praticamente idênticas, se fundem em 1953, passando a ser financiada pelo Estado e administrada pela Universidade Católica. Com 17 anos, a EEF chega à UFMG em pleno funcionamento, ainda que sob uma séria crise. O meu particular interesse pela EEF é o fato de ela abrigar uma estrutura bastante conveniente para a Ditadura e inconveniente para a UFMG. Isso se devia principalmente ao fato de 12 de seus professores serem militares e por terem grande comunicação direta com o governo federal. Essa ligação é fundamental para compreender com quais estratégias a Ditadura Militar tentou entrar na Universidade. A Educação Física foi uma dessas estratégias, pois essa disciplina é historicamente marcada por sua ligação com as forças armadas e com o espírito militar. Essa ligação é bastante explorada no artigo “In Corpore Sano” (1997) de Celso Castro (FGV) que atribui ao exército brasileiro a responsabilidade pela implantação da Educação Física no Brasil. Foucault também evidencia essa ligação ao dizer que a disciplina e o adestramento se alcançam, dentre outras formas, pelos exercícios físicos “única cerimônia que realmente importa” (Vigiar e Punir. Vozes, 2014, p.135). Na UFMG, a EEF cumpriria o papel de estar em todos os cursos, incutindo a moral e disciplina nos jovens, desenvolveria projetos do governo, como o Projeto Brasil (1974) e teria professores alinhados com seus propósitos como contato direto com a universidade, ferindo, segundo minha hipótese, a autonomia que UFMG prega ter exercido durante a Ditadura. Preste a completar 50 anos, a “federalização” da EEF é ainda nebulosa e o interesse militar pela Educação Física é subestimado pela historiografia. Minha intenção é jugar luz sobre esse episódio, deste período tão sombrio de nossa história. Palavras-chave: Ditadura Militar; educação física; universidades. As relações estabelecidas entre a Ditadura Militar e as universidades se inscrevem no contexto das profundas mudanças ocorridas no país e, especialmente, na estrutura do ensino superior no Brasil. Oficializada pela Lei nº 5540, no final de 1968, a reforma universitária já era pauta do governo do presidente deposto João Goulart. Modernizar o ensino superior era uma necessidade, mesmo para o governo instaurado com o golpe de 1964. Mas as mudanças previstas por Goulart, e almejadas por grande parte da comunidade universitária, não se encaixavam nos planos do novo governo que, apesar de não possuir um projeto definido, tinha em sua essência a rejeição a qualquer ideia tida como esquerdista ou comunista, adjetivos comumente atribuídos ao presidente deposto e aos seus projetos de reforma de base. Em uma comparação inevitável, a ditatura militar brasileira se diferenciava essencialmente dos outros regimes autoritários do Cone Sul por ser modernizadora. Segundo Renato Ortiz, além dessa diferença em relação às ditaduras dos vizinhos, o regime militar era radicalmente diferente dos governos anteriores do nosso próprio país, pois, graças à sua natureza autoritária, ele podia apontar as metas a serem atingidas com maior eficácia e racionalização (ORTIZ, 2014, p.113). Por sua composição heterogênea, o grupo vitorioso de 1964 acabou por desenvolver uma política de controle que visava ao amortecimento de conflitos sociais e políticos entre diversos grupos, tanto quanto fosse possível. Paradoxalmente, o sucesso dessa política dependia da existência de um aparato repressivo eficiente. Assim, as ações do governo podem ser traduzidas pela ideia de modernização conservadora ou autoritária, o que traduz as contradições que muitas vezes puderam ser percebidas nas políticas do regime – O período militar combina repressão política e expansão econômica, ação policial e modernização da máquina do Estado e incentivo às atividades empresariais (ORTIZ, 2014, p.114). É nesse pacote de modernizações conservadoras que as universidades vão passar pelas reestruturações que fizeram delas o que conhecemos hoje. A modernização era também uma demanda dos embaixadores estadunidenses, aliados do novo governo. A influência norte-americana foi uma das responsáveis pela inclusão das universidades na lista das reformadas, os acordos estabelecidos entre o Brasil e os EUA – os acordos MEC-Usaid 1 – foram muito importantes para o desenvolvimento acadêmico no Brasil. Antes das reformas as faculdades se organizavam em torno dos professores catedráticos, figuras poderosas, com cargos vitalícios, que eram apontados como os grandes responsáveis pela fraca produção científica do país. Os professores inferiores na hierarquia eram pouco produtivos, pois eram mal remunerados e não tinham autonomia, tendo suas atividades determinadas pelos professores catedráticos de suas áreas. Além disso, o número de vagas ofertadas para os cursos superiores era muito reduzido. 1 MOTTA, 2014b, p.110 e sgts. As propostas para as reformas eram muitas e muito distintas, assim como eram os grupos dos componentes e apoiadores da ditadura. Assim, apesar de se tratar de um governo autoritário, o regime militar acabou não optando por um único projeto de reforma, acomodando diferentes pressões e opiniões em uma reforma que combinava elementos, por vezes, conflitantes e contraditórios 2 . A UFMG foi pioneira nas reformas, que nela já estavam em curso antes de ser promulgada a Lei nº 5.540, de 28 de novembro de 1968. Pouco tempo antes do golpe, assume a reitoria o professor Aluísio Pimenta (1964-1967), que foi responsável por várias mudanças, melhorando, por exemplo, a gestão orçamentária, destinando uma parte significativa dos recursos para um fundo de pesquisa. Por estar incluída, em sua ampla base de apoio, a esquerda, a gestão de Pimenta foi interrompida por uma intervenção militar, que fez com que um coronel fosse nomeado interventor durante quatro dias. Ainda que Pimenta tenha reassumido o cargo, essa era uma amostra do tom que seria dado à relação da ditadura militar com as universidades. Como a única pauta que o unia claramente os vitoriosos de 1964 era o anticomunismo, a primeira preocupação deste governo foi o expurgo dos inimigos derrotados – na chamada Operação Limpeza 3 – que nas universidades fez com que muitos professores, funcionários e alunos fossem perseguidos, expulsos e presos imediatamente após o golpe. Nessa onda de perseguições, a UFMG era uma das universidades mais visadas por possuir muitos intelectuais e estudantes envolvidos com organizações de esquerda 4 . Mas muitos professores acabaram sofrendo perseguições, ainda que não fossem comunistas, “por defenderem a ordem democrática e a liberdade de expressão, sendo taxados como colaboradores de grupos „subversivos‟” (FERNANDES, 2013, p.4). A ditadura não foi um período fácil para as universidades que, apesar da inquestionável modernização, sofreu com uma diversidade de açõesrepressivas e de censura. Findada a ditadura militar, ou pelo menos os anos de chumbo dela, teve início um movimento de reconstrução das memórias de vários grupos em relação à ditadura, especialmente das esquerdas. Naquele momento “toda a sociedade civil parecia ser oposicionista e democrática” (NAPOLITANO, 2014, p.14). Assim também aconteceu com a memória da UFMG sobre suas posições diante do governo ditatorial dos militares. Ao tratar das memórias sobre a UFMG durante a ditadura militar 5 , Iara Silva analisa e questiona a ideia de que a universidade era completamente autônoma em relação ao regime e resistente a ele. 2 MOTTA, 2014a, p.21. 3 Estima-se que entre 20 e 30 mil pessoas tenham sido detidas no momento do golpe. MOTTA, 2014b, p.26. 4 FERNANDES, 2013, p. 4. 5 SILVA, 2017. Ao criticar essa memória de resistência, ela reforça que “é fundamental destacar que os dirigentes da UFMG tampouco eram colaboradores do regime e não eram entusiastas da perseguição a estudantes, funcionários e docentes” (SILVA, 2017, p.56), mas que um determinado grupo de docentes foi capaz de permanecer por um período considerável no poder dentro da universidade “por estarem bem articulados no interior da instituição e, também, por conseguirem manter relações, ainda que conflituosas em alguns momentos, de diálogo com a ditadura” (SILVA, 2017, p.21). No contexto a UFMG recebe, por decreto, a Escola de Educação Física de Minas Gerais como sua nova unidade acadêmica. O caso dessa incorporação é importante para a compreensão das relações estabelecidas entre a ditadura e a UFMG, pois pode ser entendido como um caso de intervenção do regime na universidade. Segundo Celso Castro, a introdução da educação física no Brasil foi uma iniciativa militar, quando “a Educação Física era vista pelo Exército e por amplos setores do Estado e da sociedade civil como uma atividade militar” (CASTRO, 1997, p.62). Em 1929, a Educação Física passou a ser obrigatória em todos os estabelecimentos de ensino, para todos os estudantes, de ambos os sexos, a partir da idade de 6 anos, o que aumentava a demanda por professores. Em 1933 foi criada a Escola de Educação Física do Exército (EsEFEx), que, em 1938, formava, em caráter de emergência, professores civis “incutindo-lhes o espírito de ordem e disciplina” (CASTRO, 1997, p.67). Em 1939 é criada a Escola Nacional de Educação Física e Desportos (ENEFD), na Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro, que se baseava no modelo da Escola do Exército. Antes da criação das primeiras Escolas na capital mineira, os professores só se formavam em cursos superiores de Educação Física se saíssem do Estado, sendo a ENEFD o principal destino. Para os que desejavam se formar professores sem sair de Minas Gerias havia duas maneiras. A formação das professoras se dava através de cursos de aperfeiçoamento, oferecidos às normalistas que apresentassem maior vigor físico e habilidades para a área. Os homens se formavam entre os jovens militares mais dispostos para as atividades esportivas. Normalmente, eram militares de baixa patente e origem mais humilde6. Em 1952 foram inauguradas duas Escolas de ensino superior de Educação Física – uma do Estado e outra das Faculdades Católicas de Minas Gerais. Mas, a baixa procura e os 6 “Fazia-se, pois, necessário encontrar pessoas de classes menos favorecidas, que fossem capazes de se submeterem ao trabalho árduo de ensinar natação. Fundamentava-se, com certeza, na associação do ensino da natação – e por extensão, da Educação Física – ao trabalho manual, impróprio para a elite”. SOUSA, 1994, p.112. [grifo meu] altos custos para a manutenção de duas escolas praticamente idênticas 7 , acabou levando as duas escolas a se fundirem, em 1953 8 . Com a subida dos militares ao poder em decorrência do golpe de 1964, a educação e a educação física passam por significativas mudanças, especialmente a partir de 1968. Para Marcus Taborda, que investiga as políticas estatais para a educação física escolar no período da ditadura militar 9 , houve mudanças na formação dos professores da Educação Física, uma vez que a disciplina, com essas políticas, passou a ser reduzida aos códigos das instituições esportivas. Ainda que reduzida ao esporte, o novo regime promovia uma valorização da área e neste momento o campo adquiria os contornos acadêmicos que tanto almejava. A modernização autoritária, marca das reformas do Regime, atendia ao clamor da Educação Física por sua cientificização e investia em uma área estratégica, capaz de dar conta do tempo livre dos alunos, ao mesmo tempo em que desumanizando sua prática, valorizando o desenvolvimento técnico em detrimento do desenvolvimento crítico e completo 10 . Em 21 de outubro de 1969 a Escola de Educação Física de Minas Gerais foi federalizada pelo Decreto-lei nº 997, deixando de ser uma escola do Estado de Minas Gerais, agregada à Universidade Católica (UCMG), passando à UFMG. A federalização era um desejo antigo da Escola, que vinha passando por sérias dificuldades desde meados dos anos 1950. Mas a incorporação à UFMG não resolveu de imediato os problemas enfrentados até então. O decreto que federalizou a EEFMG transferiu, como consequência, toda sua estrutura e todo seu quadro de funcionários para a UFMG. O curto documento tratava apenas de incorporar as escolas 11 mencionadas às Universidades Federais de seus estados, mas não trazia nenhuma informação sobre como proceder para integrar total e efetivamente as escolas federalizadas, deixando toda a iniciativa para a integração por conta dos Reitores das instituições que estavam recebendo essas escolas. 7 O currículo das duas escolas só se diferenciava pela presença da cadeira de Cultura Religiosa ofertada apenas na unidade das Faculdades Católicas. Com a fusão das escolas, o currículo adotado foi o das Faculdades Católicas, mantendo o ensino religioso. 8 A fusão se deu em acordo firmado entre D. Cabral, então arcebispo de Belo Horizonte e Reitor da UCMG, e JK, então governador do Estado. A escola passou a funcionar de forma híbrida – mantida com recursos estaduais e administrada pela UCMG. 9 OLIVEIRA, 2004. 10 “O que se vê no interior da Revista [Brasileira de Educação Física] é um debate em torno da desumanização da sociedade e das práticas culturais em geral. (…) A “modernização” – mote da ditadura militar – tinha chegado pra ficar”. (OLIVEIRA, 2004, p.04). 11 O decreto incorporava às universidades federais de seus estados três escolas: as Escolas de Educação Física de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul, e a Escola de Serviço Social de Natal. Foram integrados ao quadro de pessoal da UFMG 32 professores 12 vindos da Escola de Educação Física da UCMG. Alguns deles já atuavam há mais de 30 anos como professores de Educação Física, muitos eram fundadores do curso superior em Minas Gerais. Destes professores, 14 eram, na UCMG, professores catedráticos, transformados em titulares com a Reforma Universitário de 1968. Todos os professores esperavam que, ao serem incorporados à UFMG, teriam seus cargos mantidos sem grandes problemas. Mas, todos os titulares foram enquadrados como Professores Adjuntos. Esse enquadramento, que “rebaixava” os titulares à posição de adjuntos, pegou os professores de surpresa, que, desapontados, abriram um processo solicitando que os cargos originais fossem reestabelecidos. Em 1971, quase dois anos após o Decreto 997, o Processo nº045 é aberto no Conselho de Graduação, com o objetivo de resolver a questão do enquadramento do pessoal docente da EEFMG. O processo se arrastou por mais 2 anos passando por cinco órgãos diferentes. Uma Comissão Especial foi criada em 1973 para realizar os estudos pertinentesao caso e realizar o enquadramento dos professores. O primeiro parecer e o último 13 sobre o caso são os únicos favoráveis à reivindicação dos professores da EEF. Os relatores de outros órgãos que produziram algum documento referente ao processo traziam sempre as mesmas (in)conclusões: os relatores se declaravam incapazes de julgar os títulos e méritos dos professores da unidade, pois, nos currículos apresentados por estes professores, os títulos seriam “diversos e revestidos de peculiaridades especiais” 14 . Mas, o que havia de tão peculiar na formação destes professores? Dos 33 docentes da Escola de Educação Física, 13 tinham formação considerada superior em Educação Física. Nove eram médicos. Seis tinham formação em outras áreas, como Letras, Jornalismo, Direito e Teologia. Mas, sobre a formação acadêmica destes professores, o mais surpreendente é que 6 deles não possuíam nenhuma formação superior, sendo que 3 destes eram professores Titulares na UCMG. Outro ponto interessante é que nenhum dos 33 professores possuía mestrado ou doutorado, nem mesmo os médicos. Apesar disso, os currículos apresentados pelos professores são extensos e detalhados, mostrando inúmeros feitos, publicações e cursos. Mas, em sua maioria, as qualificações profissionais, os méritos destes professores, especialmente os que ocupavam cadeiras de 12 No processo constam sempre 33 professores, mas foram trazidos da UCMG 32. O professor Fernando Antônio Grosso foi contratado em 1971, em meio ao processo de enquadramento. Assim, me refiro durante todo o restante do texto aos 33 professores presentes nos documentos que compõe o processo, meu objeto. 13 Um em 1970 outro em 1973, ambos pelo mesmo professor, Amaro Xisto de Queiroz, e ambos solicitados diretamente pelo reitor, Marcello de Vasconcellos Coelho. 14 Trecho do parecer final da Comissão Especial da Coordenação de Ensino e Pesquisa, criada para realizar o exame dos títulos dos professores da EEF para fins de enquadramento. EEFFTO/CEMEF-Fundo Escola de Educação Física da Universidade Federal de Minas Gerais (1969-1979) – CX.01/PT.07. ensino de esportes, eram baseados em conquistas esportivas – medalhas, prêmios como atleta ou como treinador e a produção de manuais de regras esportivas. Além da formação um tanto particular, havia o que é ponto o mais interessante, dado o contexto político da época: muitos destes professores eram militares – 12 dos 33 professores, metade dos homens que lecionavam na EEF pertenciam às Forças Armadas Brasileiras ou à Polícia Militar de Minas Gerais. Esse pertencimento fica muito aparente nos currículos destes professores, pois alguns dos méritos apresentados eram os feitos militares – medalhas, patentes e atuação em órgãos militares. A inserção da Escola de Educação Física na UFMG é um indicativo da conturbada relação estabelecida entre esta universidade e o regime. A Escola chegou à UFMG com 32 professores em plena atuação. Mas, ao serem incorporados à UFMG, estes professores se viram sem condições de administrar devidamente a unidade, pois sem titulares não havia Congregação, órgão fundamental para a administração das escolas 15 . O que parece ter havido neste caso foi uma tentativa, por parte de setores da UFMG, de impedir integração efetiva da escola, impedindo também seu funcionamento regular, o que era sentido pelos professores. Mas, essa tentativa de impedir o enquadramento não se deu como resistência frontal ao decreto. Havia apenas uma protelação que parecia não ter fim. Além da composição peculiar deste corpo docente, a EEF possuía uma estreita relação com o Departamento de Educação Física e Desporto do MEC. Desta relação vinham para a escola financiamentos diversos, inclusive uma vultosa verba para a construção da sede no campus 16 . As vantagens desta relação para o regime viriam através do importante papel que a escola desempenharia em seu favor dentro da UFMG: De acordo com a Resolução n. 5/70, da Coordenação de Ensino e Pesquisa, a prática de Educação Física na Universidade Federal de Minas Gerais será ministrada ou orientada pela Escola de Educação Física. Todos os professores de Educação Física das escolas, faculdades e institutos que compõe a UFMG, deverão pertencer ao Departamento de Educação Física desta Escola, a ser instalado. Dirigindo, coordenando ou orientando todas as atividades de educação física e dos desportos na Universidade Federal de Minas Gerais, nossa Escola desempenhará o papel de verdadeiro elo de 15 Em ofício de abril de 1973, o então diretor da EEF, Pedro ad‟Víncula Veado Filho relata a importância da resolução do caso para a unidade: “Várias questões, de interesse vital para a administração da unidade, estão a espera da constituição de sua congregação e esta, por sua vez depende da solução do assunto em pauta”. EEFFTO/CEMEF-Fundo Escola de Educação Física da Universidade Federal de Minas Gerais (1969-1979) – CX.01/PT.07. 16 “A construção da nova sede é a principal meta da atual administração da Escola e contou desde logo com o apoio do Departamento de Educação Física e Desportos do Ministério da Educação e Cultura, que já destinou ao empreendimento vultosa verba”. Trecho do documento intitulado “A Escola de Educação Física no „campus‟ Pampulha”, de 30 de outubro de 1972, produzido pelo então diretor da Escola Pedro ad‟Víncula Veado Filho. EEFFTO/CEMEF-Fundo Escola de Educação Física da Universidade Federal de Minas Gerais (1969-1979) – CX.01/PT.07. congraçamento e integração estudantil, numa posição de extraordinária importância na vida universitária 17 . [grifo meu] Conclusão Com a definição do processo de enquadramento dos professores, a Escola de Educação Física pôde, nos anos seguintes, exercer suas atividades pedagógicas e administrativas devidamente. Durante o restante da década de 1970 a escola experimentou grandes avanços e conquistas para si própria e para o campo em geral. O ano de 1974 foi de trabalho intenso para os professores da EEF. Para começar, era preciso realizar uma reforma curricular. Desde a federalização, e devido a Reforma Universitária, e escola havia apenas adaptado seus currículos ao sistema de créditos, mas não havia ainda o reestruturado para se adequar ao novo perfil do ensino universitário que a Reforma vinha implantar. Nesse mesmo ano a Escola apresentou sua proposta de reforma ao CEP e acabou se envolvendo em mais um episódio de tensão com a universidade. A proposta foi rejeitada e a EEF só conseguiria aprovar um novo currículo em 1976. Neste mesmo ano a EEF desenvolveu um dos projetos mais importantes para a análise que esta pesquisa pretende fazer, na busca pelos elementos de ligação entre a Ditadura Militar e Educação Física no país. O Projeto Brasil foi realizado pela Ditadura Militar durante o ano de 1974, com coordenação central no Laboratório de Fisiologia do Exercício da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LABOFISE/UFRJ) e fazia parte um projeto ainda maior chamado Campanha Nacional de Esclarecimento Desportivo. O Projeto Brasil tinha como principal objetivo realizar estudos diversos sobre as condições físicas dos cidadãos brasileiros, para ser vir de base ao desenvolvimento de políticas para saúde e educação. A EEF, dentro da UFMG desenvolveu as atividades do Projeto Brasil, realizando medições e estudos sobre o corpo de diversos cidadãos mineiros, apresentando seus relatórios para o DED/MEC. O Projeto representou um importante avanço para o desenvolvimento científico do campo e da própria escola, pois resultou na inauguração de seu primeiro laboratório de pesquisa, o Laboratório de Fisiologia do Esforço, o LAFISE 18 , em 1976. Os alunos da 17 Correspondência do diretor da EEF, Pedroad‟Víncula Veado Filho, destinada ao diretor do Departamento de Educação Física e Desportos do MEC, Coronel Eric Tonico Marques, em janeiro de 1971. EEFFTO/CEMEF- Fundo Escola de Educação Física da Universidade Federal de Minas Gerais (1969-1979) – CX.01/PT.07. 18 Hoje, Laboratório de Fisiologia do Exercício, mantendo a sigla. Na época, o termo “esforço” era bastante utilizado para dar um ar mais científico para os estudos dos efeitos do movimento proveniente das práticas esportivas. EEF/UFMG também estiveram presentes, que realizaram colônias de férias do Projeto Rondon 19 em Barreiras, na Bahia, e em Iguatu, no Ceará, entre 1972 e 1976 20 . Assim, entendo que a Educação Física se desenvolveu a passos largos durante o regime militar, por ser área estratégica, merecendo, assim, grande atenção por parte de um governo. Isso porque ela era uma importante ferramenta para a consolidação de um projeto educacional que fosse favorável à manutenção do regime, especialmente pelo seu caráter potencialmente disciplinador, aproximando a sociedade civil dos valores militares. Bibliografia AMATO, Gabriel. 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