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Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Clélia Maria Ignatius Nogueira Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Clélia Maria Ignatius Nogueira Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Inclusiva Educação Educação Inclusiva Ficha catalográFica - Serviço de BiBlioteca e documentação – Facimed N778e Nogueira, Clélia Maria Ignatius. Educação inclusiva/ Clélia Maria Ignatius Nogueira. – Cacoal: FACIMED, 2015. 191 p.; il. ISBN: 978-85-92570-19-4 1. Educação especial. 2. Inclusão. 3. Políticas públicas. I. Nogueira, Clélia Maria Ignatius . II. Faculdade de Ciências Biomédicas de Cacoal. III. Título. CDD: 371 CDU: 37.018 Ficha catalográfica realizada pela bibliotecária. Este livro é publicado pelo Programa de Publicações Digitais da Faculdade FACIMED Presidência: Sandra Maria Veloso Carrijo Marques diretor geral: Daniela Shintani nead - núcleo de educação a distância diretoria do nead: Rosani Lenzi direção acadêmica: Fabricio Almeida Barbosa coordenação Pedagógica: Rosana de Oliveira Nunes Neto assessoria: Fernando Jorge Correia de Freitas capa e editoração: Andresa G. Zam; Diego R. Pinaffo; Fernando T. Evangelista; Renata Sguissardi A FACIMED iniciou suas atividades em março de 2002, ocupando posição de destaque no município de Cacoal e na região norte do País; suas ações se pautaram, desde a criação, pela indissociabilidade do Ensino, Pesquisa e Extensão. Deste modo, serve às comunidades gerando conhecimentos e recursos importantes para o desenvolvimento científico, econômico, profissio- nal, social e cultural, não só no município de sua localização como, também, na região em que se localiza, como polo de uma macrorregião do Estado de Rondônia, abarcando um universo de 32 municípios na chamada região cen- tral agrária de Rondônia, além de outros municípios localizados nos Estados de Mato Grosso, Ceará, Paraná, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Paraíba, Pernambuco, Goiás, Amazonas e Acre, objetivando como atividade principal a educação superior, que contempla um significativo conjunto de áreas do conhecimento humano. No Ensino, inicialmente voltada à área de Saúde, a FACIMED ao longo dos anos de sua existência foi expandindo as áreas de atuação, voltando-se às necessidades do mundo e mercado de trabalho local, regional e estaduais. Assim, da área de saúde direcionou-se, também, às licenciaturas e às supe- riores tecnológicas, totalizando uma oferta de 21 cursos atuais de graduação estendidos às áreas de Ciências Exatas e da Terra, Ciências Biológicas, En- genharias, Ciências da Saúde, Ciências Agrárias, Ciências Sociais Aplicadas e Ciências Humanas, além das Superiores de Tecnologia. Paralelamente aos cursos de graduação e atendendo aos requisitos da educação continuada a FACIMED formulou e implantou cursos de pós-gradu- ação, em modalidades condizentes com as graduações superiores oferecidas, totalizando, atualmente, cerca de 35 cursos, dos quais a maioria com turmas de várias edições. Oferece, ainda, a FACIMED, no âmbito do Instituto Superior de Educação – ISE, o Programa Especial de Formação Pedagógica de Professores - PREFOPE, destinado aos profissionais que estão no exercício do magistério. Na Pesquisa, a instituição possui como linhas a Saúde Coletiva (Programas de Saúde; Epidemiologia; Saúde e Sociedade Vigilância da Saúde; Cultura e Humani- zação do Cuidado; Saúde Corpo e Mente);a Educação e Formação Profissional (Ser Humano no Ambiente Regional; Educação Inclusiva; Práticas Docentes;Educação Infantil, Práticas Lúdicas e Multiculturalismo; Pedagogia, Formação e Prática Docen- tes Política; Financiamento e Gestão da Educação); e a Análise do Comportamento Humano (Culturas e Migração Regional; Biologia, Ecologia e Tecnologias de mo- nitoramento da Flora e Fauna Rondoniense; Avaliação de Sistemas, Programas e Serviços de Saúde e Ambiente). Na Extensão, a FACIMED atua em múltiplos projetos que abrangem 10 linhas de ações: Comunicação; Cultura; Direitos Humanos e Justiça; Educação; Meio Am- biente; Saúde; Tecnologia e Produção; Trabalho; Relações Étnico-raciais e História e Cultura Afro-Brasileira, Africana e Indígena. Assim se faz justiça ao lema “a Faculdade que já nasceu no século XXI”, para a promoção de uma sociedade mais justa e equânime, compromissada com a res- ponsabilidade social no tocante à cidadania, à saúde, à educação, à democracia e à pluralidade cultural. ApresentAção Educação Inclusiva Clélia Maria Ignatius nogueira Minha caminhada como professora teve início já na infância, quando tinha como brincadeira preferida “dar aulas” aos muitos animais de estimação que sempre fizeram parte de minha vida, aos bonecos de pelúcia ou a caricaturas desenhadas com aquarelas nas paredes da casa paterna, representando rostos de personalidades em destaque, que se tornavam “meus alunos”. Na hora da es- colha do curso superior, nenhuma dúvida sequer: ser professora de Matemática. Do curso de licenciatura feito na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Tupã, São Paulo, à grande aventura do mestrado em Matemática Pura na Univer- sidade de São Paulo, a USP, e um início de caminhada nesta área, na Universidade Estadual de Maringá, caminhada esta que foi redirecionada pela vida. Com a che- gada dos cinco filhos, dos quais duas são surdas, a educação, particularmente a dos pequenos, passou a ocupar o centro das minhas preocupações, com a cons- trução do número pela criança constituindo o tema central do meu Doutorado em Educação, realizado na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, a UNESP. Foram longos anos de estudos e pesquisas sobre o ensino de Matemática para crianças, sempre fundamentados na teoria piagetiana, que continua sendo o centro de meus estudos que englobam ainda estudos desenvolvidos, pesquisas na área da Educação Matemática e na Educação de Surdos. ApresentAção Aliados aos estudos e pesquisas, os esforços para concretizar a educação de minhas filhas surdas em uma época em que a inclusão era apenas uma utopia me proporcionaram uma dupla visão acerca da educação de crianças e jovens com necessidades especiais: a de estudiosa e pesquisadora, portanto de “produtora”, e a de mãe de crianças especiais, ou seja, de “consumidora” da educação agora denominada inclusiva. É esta experiência que pretendo compartilhar com você, neste livro, organizado em quatro unidades, que se constitui no texto base da disciplina Educação Inclusiva, cuja ementa é: “A educação inclusiva nos aspectos históricos, filosóficos, sociais e psicológicos. Caracterização dos vários grupos de indivíduos com deficiências e necessidades educacionais. Educação inclusiva: política e suas implicações organizacionais e pedagógicas”. Na primeira unidade, intitulada Inclusão: o difícil caminho até aqui, introdu- zimos o tema Inclusão, abordando a importância de se utilizar a terminologia correta quando se pretende atuar em uma perspectiva inclusiva; apresentamos os princípios da Educação Especial e da Educação Inclusiva e estabelecemos as relações entre a concepção de deficiência em determinado momento histórico e a educação ofertada a estes sujeitos. Para isto, esta unidade é composta pelos seguintes textos: A força dos termos; Princípios da Educação Especial e Educa- ção Inclusiva e Concepção de deficiência ao longo da História. A segunda unidade, Legislação e Políticas Públicas da Educação Inclusiva Bra- sileira, conforme o próprio título indica, tem por objetivo caracterizar a educação inclusiva no Brasil e, para isso, os aspectos legais, as diretrizes políticas e a formação do professor sãoabordados em três textos: Educação Especial e Edu- cação Inclusiva no contexto educacional brasileiro; Política Nacional de Educação Especial e A formação do professor na e para a Educação Inclusiva. As Deficiências e Necessidades Educacionais Especiais são estudadas na ter- ceira unidade, que tem este mesmo título e por objetivo caracterizar as diferentes deficiências, as altas habilidades e os diferentes transtornos, destacando as res- pectivas necessidades educacionais especiais, finalizando com a discussão das condições de inclusão desses educandos. Para isto, a unidade III é composta, seguindo o modelo das unidades anteriores, de três textos, a saber: Deficiências; Altas habilidades/Superdotação; Transtornos e Condições para Inclusão. Na quarta e última unidade, intitulada Atendimento Educacional Especia- lizado, abordamos como deve ser o atendimento destinado aos educandos com necessidades educativas especiais e, para isso, também o subdividimos nos textos: Aspectos legais; AEE – deficiências sensoriais e motoras e AEE – déficit cognitivo e transtornos. Por fim, trabalhar com crianças com necessidades educativas especiais não é uma tarefa fácil e exige do professor mais do que conhecer diferentes meto- dologias. Primeiramente, é fundamental que o professor desenvolva uma atitude diferenciada, que considere cada um de seus alunos como um educando com necessidades especiais, afinal, cada criança é um universo e, muitas vezes, ativi- dades que são pensadas para uma maioria podem não favorecer a aprendizagem de um aluno específico. É necessário que o professor enriqueça seu repertório teórico para subsidiar, de maneira consistente, seu fazer pedagógico e poder, primeiramente, reconhecer as dificuldades da criança e, na sequência, ser capaz de adaptar e propor atividades direcionadas àquela criança em particular. Embora diversas variáveis possam estar associadas a – e mesmo produzirem –dificuldades escolares de muitos alunos, nenhuma é mais abrangente do que a sumário formação do professor, pois grande parte dos problemas referentes aos proces- sos de ensinar e de aprender pode ser superada pela mediação docente, afinal, cabe ao professor desempenhar o papel de mediador entre o conhecimento e o aluno na construção do conhecimento por este último. Mas, nenhum conhecimento teórico será suficiente para uma ação docente eficaz se o professor não acreditar, de fato, nas possibilidades de aprendizagem de cada estudante. Bons estudos! sumário unidade 1: inclusão: o difícil caminho até aqui 13 A força dos termos ................................................................................. 17 princípios da educação especial e educação inclusiva ..................... 25 Concepção de deficiência ao longo da história ................................. 34 unidade 2: legislação e políticas públicas da educação inclusiva brasileira 53 educação especial e educação inclusiva no contexto educacional brasileiro ................................................................................................... 58 Leis .......................................................................................................... 77 Decretos ................................................................................................. 78 portarias .................................................................................................. 79 resoluções ............................................................................................. 79 Aviso ........................................................................................................ 79 política nacional de educação especial ............................................... 80 A formação do professor na e para a educação inclusiva ............... 86 unidade 3: deficiências e necessidades educacionais especiais 97 Deficiências .............................................................................................. 100 Altas habilidades/ superdotação e transtornos ................................. 119 Condições para inclusão ...................................................................... 135 unidade 4: atendimento educacional especializado 143 Aspectos legais do aee ......................................................................... 146 Aee – deficiências sensoriais e motoras ............................................ 150 Aee – deficiência intelectual, transtornos e superdotação .............. 167 conclusão 179 referências 184 U N ID A D E Inclusão: o difícil caminho até aqui Clélia Maria Ignatius Nogueira ObjEtIvOs DE AprENDIzAgEm • Utilizar os termos específicos referentes aos alunos com necessidades educativas especiais em uma perspectiva inclusiva. • Compreender os princípios da Educação Especial em geral e da Educação Inclusiva em particular. • Conhecer as diferentes concepções de deficiência ao longo da História e sua in- fluência na Educação. plANO DE EstUDO Serão abordados os seguintes tópicos: • A força dos termos • Princípios da Educação Especial e Educação Inclusiva • Concepção de deficiência ao longo da História 1 15 Unidade 1 INTRODUÇÃO Em qualquer congresso, palestra, atividades de formação continuada ou grupo de estudos desti- nados a professores da Educação Básica, de maneira direta ou indiretamente, atualmente, se fala de escola inclusiva. Embora a inclusão diga respeito a qualquer estudante que encontra barreiras para aprender ou ter acesso ao que a escola oferece – em qualquer momento da escolarização –, de manei- ra geral, a maioria das pessoas envolvidas ou não com a educação acredita que a escola inclusiva se destina apenas às crianças com necessidades educativas especiais. Uma razão para isso é que nessas crianças, as diferenças são mais evidentes e exigem ações peda- gógicas específicas, para as quais os professores em geral julgam estar despreparados. Outra razão para esta compreensão equivocada ou incompleta do que seja inclusão e, consequen- temente, de como deve ser uma escola que se pretenda inclusiva é que, apesar de já se encontrar em vigor, a educação inclusiva ainda não está incorporada ao fazer pedagógico dos professores, embora a proposta educacional inclusiva seja a concretização de uma antiga “bandeira” defendida por toda comunidade educacional: a da universalização e democratização do ensino. Podemos dizer que a luta pela “universalização e democratização do ensino” alcançou seu ob- jetivo, pois, em 1991, 95% das crianças brasileiras residentes em zonas urbanas e em idade escolar possuíam vagas em escolas públicas (Revista do IEA/USP, v.6, nº14, jan./abr.1992). No que se refere à ampliação das vagas escolares, não apenas a comunidade educacional partici- pou dessa luta, pois essa “universalização” do ensino aconteceu como uma resposta às lutas das classes trabalhadoras. No entanto, o acesso à escola não se traduziu em efetiva socialização do conhecimento, 16 Unidade 1 o que fez com que o processo social de universalização da escolarização viesse acompanhado pelo fracasso escolar. Isto porque, segundo Esteban (2006, p.23), com o acesso à escola “[...] de crianças oriundas dos segmentos menos favorecidos da sociedade [...] cresce o número daqueles que não con- seguem responder adequadamente às exigências escolares” e, assim, as dificuldades de aprendizagem não se constituem em particularidades exclusivas das crianças com necessidades educativas especiais. Mas como diversas outras variáveis, além da falta de vagas, contribuem para a exclusão escolar, a este movimento seguiu-se outro, o da “Escola para todos”, ou da “Escola Inclusiva”, que é a “bandeira” do momento. Na contramão dos outros movimentos, esta proposta encontra maior ressonância nas políticas governamentais do que entre a comunidade escolar, a qual parece não ter compreendido bem os pressupostos inclusivistas e, assim,de maneira equivocada ou incompleta, conforme men- cionamos anteriormente, considera que o paradigma da inclusão se destina apenas às crianças com necessidades educativas especiais. Inclusão significa o combate a qualquer tipo de exclusão e discriminação, bem como promoção da participação, tanto na escola como na família e na comunidade, e diz respeito a qualquer estudante que encontra barreiras para aprender ou ter acesso ao que a escola oferece – em qualquer momento da escolarização. Isso implica em melhorar a escola para todos e combater qualquer forma de exclusão, segre- gação e discriminação no contexto escolar. Ao mesmo tempo, diz respeito à promoção de opor- tunidades igualitárias de participação. Numa escola inclusiva, todos são considerados iguais e têm o mesmo valor. Assim, a escola que é inclusiva está em contínuo processo de mudança para assegurar a aprendizagem a todos os seus educandos e o acolhimento de cada um dos alunos e dos membros da comunidade escolar. 17 Unidade 1 Nesta unidade, aprofundaremos estes estudos, iniciando com destaque à importância de se uti- lizar a terminologia correta para uma atuação com perspectivas inclusivistas não apenas na escola, mas em toda sociedade para, em seguida, apresentarmos os princípios da Educação Especial e da Educação Inclusiva, finalizando com uma discussão sobre como o atendimento educacional destina- do às pessoas com necessidades educativas especiais é influenciado pela concepção de deficiência em determinado momento histórico. A FORÇA DOS TERMOS Apesar de aparentemente não ter importância a denominação ou a palavra escolhida para desig- nar um único ou um grupo de indivíduos, o termo empregado revela a concepção de quem o utiliza sobre a pessoa, o grupo ou o fenômeno a que se refere. Usar corretamente os termos técnicos não é uma questão sem importância, se desejamos falar ou escrever construtivamente, numa perspectiva inclusiva, sobre seres humanos. A terminologia correta é especialmente importante quando falamos de assuntos que envolvem pessoas com deficiência, que tradicionalmente revelam preconceitos, estigmas e estereótipos. Os termos utilizados para designar as pessoas ou as deficiências acompanham os valores de cada sociedade e em cada época e passam a ser incorretos quando esses valores e conceitos vão sendo subs- tituídos por outros, o que exige o uso de outras palavras. Na maioria das vezes, as “novas” palavras já existem na língua falada e escrita, mas passam a significar uma coisa nova. O maior problema decorrente do uso de termos incorretos reside no fato de os conceitos obso- letos, as ideias equivocadas e as informações inexatas serem inadvertidamente reforçados e perpe- tuados. Este fato pode ser a causa da dificuldade ou excessiva demora com que o público leigo e os 18 Unidade 1 profissionais mudam seus comportamentos, raciocínios e conhecimentos em relação, por exemplo, à situação das pessoas com deficiência (SASSAKI, 1997, p. 161). Usar as palavras corretas, especialmente pelos professores, é muito importante, pois a perma- nência de terminologias inadequadas ou superadas pode fortalecer a resistência à mudança de paradigmas, como a que, segundo Sassaki (1997, p. 162) está acontecendo, por exemplo, “[...] na mudança que vai da integração para a inclusão em todos os sistemas sociais comuns”. A própria expressão “pessoas com deficiência” vem sendo modificada. Inicialmente, utilizava-se apenas a palavra “deficiente” que, a partir de 1981, ano que a ONU – Organização das Nações Unidas instituiu como o Ano Internacional da Pessoa Deficiente – AIPD, a palavra “pessoa” passa a acompa- nhar a palavra deficiente, com o firme propósito de que os antes considerados apenas como “deficien- tes” passem a serem considerados também como “pessoas”. Entretanto, em função da noção embutida na palavra deficiente, que parece indicar o que não é eficiente, embora a palavra que se oponha à eficiência seja ineficiência, esta expressão evolui para “pessoas portadoras de deficiência – PPD” e, posteriormente, com o entendimento de que a pessoa “não porta”, ou seja, “não carrega” a deficiência, como algo que pudesse simplesmente deixar de ser carregado, mas a pessoa TEM uma deficiência, pas- sou-se a utilizar a expressão “pessoa com deficiência”, que é a expressão que utilizamos no momento. Outro exemplo da evolução da denominação se refere às pessoas com déficit cognitivo que, com a crescente compreensão desta dificuldade, muda da antiga denominação de retardadas, para excep- cionais, depois para deficiente mental e atualmente, usa-se déficit de inteligência ou déficit cognitivo. Vamos exemplificar em detalhes como a compreensão que os estudos e pesquisas acerca de um determinado fenômeno, no nosso caso, a deficiência, implica mudança da terminologia utilizada para designar este fenômeno, considerando a surdez. 19 Unidade 1 Ainda é comum entre as pessoas a utilização da expressão surda-muda para designar a pessoa que apresenta comprometimentos auditivos. Entretanto, mesmo considerando apenas as limitações que esta pessoa possui, quando se refere ao surdo, a palavra mudo não corresponde à realidade dessa pessoa, pois ela não é muda, no sentido de possuir comprometimentos no sistema fonoarticulatório, mas, na maioria das vezes, a pessoa surda não se expressa oralmente porque não consegue aprender, uma vez que não possui o feedback auditivo. Há casos de pessoas que ouvem (portanto, não são surdas), mas têm um distúrbio da fala (ou deficiência da fala) e, em decorrência disso, não falam, assim como existem pessoas surdas, que após um longo período de atendimento fonoaudiológico se expressam oralmente. A definição de surdez, até meados do século XX, seguia o estabelecido pela OMS – Organização Mundial da Saúde, ou seja, a concepção de surdez era de patologia, de doença que poderia ser minimi- zada com o auxílio de próteses auditivas ou de cirurgias, como a dos implantes cocleares. Esta concep- ção de surdez obedece ao que denominamos de Modelo Médico de caracterização das deficiências. De acordo com o Modelo Médico, a pessoa com deficiência é considerada como um problema; ela pre- cisa adaptar-se e adequar-se ao mundo como ele é e, caso não consiga, ela é colocada numa instituição es- pecializada ou isolada em casa, onde a maioria de suas necessidades básicas é cuidada. A ênfase de qualquer atendimento, seja educacional, seja de saúde, está na dependência com a pessoa com deficiência sendo de- terminada pelas suas limitações do que pelas necessidades e, principalmente, pelas possibilidades da pessoa. Para este modelo, a incapacidade das pessoas com deficiência é um pressuposto e, assim, ela não teria condições de gerenciar a própria vida, com os profissionais e os familiares decidindo o que seria melhor para eles. Neste modelo, se privilegia o assistencialismo e, assim, a educação das pessoas com deficiência quase sempre era realizada por instituições não governamentais, criadas por iniciativa dos familiares. 20 Unidade 1 No caso dos surdos, por exemplo, até o final do século passado, a decisão acerca de que aborda- gem educacional seria mais adequada à sua escolarização sempre ficou a cargo dos ouvintes (profes- sores, fonoaudiólogos etc.), e esta decisão sempre privilegiou o oralismo, ou seja, que o surdo deveria necessariamente aprender a se expressar oralmente, a ler lábios, sendo proibido de utilizar a língua de sinais. Quando esta decisão coube aos surdos, eles optaram pelo bilinguismo (utilização de duas línguas diferentes), como abordagem educacional, ou seja, os surdos lutaram pelo direito de serem educados em sua língua natural, a língua de sinais, que seria a primeira língua e a língua oral, preferen- cialmente na modalidade escrita, como segunda língua. Considerando, então, o Modelo Médico, a compreensão da surdez se efetiva pela seguintecaracterização: Deficiência auditiva ou surdez é a incapacidade parcial ou total de audição. Pode ser de nascen- ça ou causada posteriormente por doenças. A rigor, do ponto de vista médico, diferencia-se entre defi- ciência auditiva parcial (quando há resíduo auditivo) e surdez (quando a deficiência auditiva é total). A “surdez é a ausência, dificuldade ou inabilidade para ouvir sons específicos (tons puros), ambientais (ruídos familiares) e os sons da fala humana (tons complexos)”.(SILVANA MAIA SILVA DIAS,p.23, 1995) Deficiência Auditiva é a perda total ou parcial, congênita ou adquirida da capacidade de compre- ender a fala através do ouvido. Manifesta-se como: Deficiência leve/moderada: perda auditiva de até 70 decibéis, que dificulta, mas não impede a pes- soa de se expressar oralmente, bem como de perceber a voz humana com ou sem a utilização de um aparelho auditivo. 21 Unidade 1 Deficiência severa/profunda: perda auditiva acima de 70 decibéis, que impede a pessoa de enten- der, com ou sem aparelho auditivo, a voz humana, bem como de adquirir, naturalmente, o código da língua oral. Os alunos portadores de deficiência auditiva necessitam de métodos, recursos didáticos e equipa- mentos especiais para correção e desenvolvimento da fala e da linguagem (Bureau International d”Au- diophonologie). A expressão deficiente auditivo está ligada ao período que refletia a concepção do Modelo Médico, que entendia o surdo como deficiente e, para torná-lo eficiente, a ênfase no trabalho se dava sobre a reabilitação (trabalho de reabilitar a audição e a oralização na tentativa de minimizar os efeitos provocados pela alteração auditiva). Nas últimas décadas do século XX, ganha força o Modelo Social ou socioantropológico de carac- terização das pessoas com deficiência. Neste modelo, considera-se que os termos, quando utilizados no cotidiano, não representam apenas a definição médica, mas, e principalmente, a concepção social que se tem dele. O Modelo Social reconhece que a deficiência causa dificuldades reais a quem a possui, po- rém, a posição de pessoas incapazes e a discriminação em relação a elas são criadas pela so- ciedade e tem pouco a ver com suas deficiências. O Modelo Social considera que a pessoa de- ficiente é sempre levada a crer que é sua própria culpa o fato de que ela é diferente e que esta diferença é que alguma parte, ou partes de seu corpo ou mente têm limitações com relação ao seu funcionamento, isto é, uma deficiência. Para o Modelo Social a maioria das pessoas na sociedade não são educadas para aceitarem os deficientes como eles são e assim, através do medo, da ignorância e do preconceito são desenvol- vidas barreiras, atitudes e práticas discriminatórias que acabam incapacitando os deficientes. 22 Unidade 1 É a compreensão deste processo de incapacitação que permitiu e permite às pessoas com deficiência se sentirem capazes e com poder de lutarem pelos seus direitos e passem a deter- minar suas necessidades. Para minimizar este problema, de acordo com o Modelo Social, é necessária a reestruturação da sociedade. Atualmente, dentro da concepção socioantropológica da surdez, defendida por diversos autores como Carlos Skliar, Ronice Quadros, Lucinda Ferreira-Brito, Paula Botelho, entre outros, a surdez é entendida muito mais como uma “diferença” do que como deficiência. A pessoa com surdez seria então aquela que apresenta uma diferença linguística, isto é, aquele que se comunica mediante a língua de sinais e, a palavra surdo, indicaria não apenas o indivíduo que tem comprometimentos auditivos, mas que possui uma diferença linguística. O termo surdo implica outro olhar a respeito deste sujeito, compartilhando das palavras de Poker (1995), a expressão “surdo” é a que melhor permite enfatizar o significado da surdez na duplicidade de sua condição orgânica e social. Além disso, é [...] a autodenominação escolhida pelos próprios surdos, que desejam ser aceitos não como pessoas deficientes, ou seja, como “ouvintes” que têm ausência de algo, mas como pessoas que teriam muito mais de igual do que de diferente, pessoas igualmente capazes e que se diferenciam dos ouvintes por desenvolverem sua linguagem através de outros recursos mais relacionados à natureza viso-motora (linguagem orofacial, gestual, datilológico, etc.) (POKER, 1995, p. 2). Da mesma forma que um ambiente físico não adaptado, sem rampas ou elevadores pode aumen- tar a deficiência de um cadeirante, não é, em geral, a limitação biológica e sim as relações sociais e cul- turais que determinam a limitação de uma pessoa com deficiência ou, de acordo com Laborit (1994), é a sociedade que torna os indivíduos deficientes. 23 Unidade 1 Infelizmente, o povo surdo tem sido encarado em uma perspectiva exclusivamente fisiológi- ca (déficit de audição) dentro de um discurso de normalização e medicalização, cujas nome- ações, como todas as outras, imprimem valores e convenções na forma como o outro é signi- ficado e representado. Cabe ressaltar, por outro lado, que não é apenas a escolha acertada de um termo que elimina os preconceitos sociais. Os preconceitos podem estar disfarçados nos discursos que dizem assumir a diferença e a diversidade. Mas o deslocamento conceitual é preciso e urgente, e vem ocorrendo em primeira instância na reflexão e problematização dos conceitos de que fazemos uso ao nomear o outro (GESSER, 2009, p.46). Desta forma, olhada pelo viés cultural, a surdez definitivamente não é uma deficiência. “A surdez como deficiência pertence a uma narrativa assimétrica de poder e saber: uma “invenção/produção” do grupo hegemônico que, em termos sociais, históricos e políticos, nada tem a ver com a forma como o grupo se vê ou se representa” (GESSER, 2009, p.67). Segundo os estudiosos que entendem a surdez como uma diferença e não como deficiência, a surdez é uma experiência visual “e isso significa que todos os mecanismos de processamento da informação, e todas as formas de compreender o universo em seu entorno, se constroem como experiência visual” (SKLIAR, 1998, p.28). No passado, costumava-se achar que a surdez era acompanhada por algum tipo de déficit de inte- ligência. Entretanto, com a inclusão dos surdos no processo educativo, compreendeu-se que eles, em sua maioria, não tinham a possibilidade de desenvolver a inteligência em virtude dos poucos estímu- los que recebiam e que isto era devido à dificuldade de comunicação entre surdos e ouvintes. Porém, o desenvolvimento das diversas línguas de sinais e o trabalho de ensino das línguas orais permitiram aos surdos os meios de desenvolvimento de sua inteligência. 24 Unidade 1 Desta forma, com a constatação de que a mudez se refere ao aparelho fonoarticulatório, o que significa que surdez e mudez não são comprometimentos associados, e também com a mudança de concepção sobre a surdez, que passa de patologia (no Modelo Médico) para diferença (no Modelo Socioantropológico), a denominação das pessoas com dificuldades de audição evolui de surdo-mudo e deficiente auditivo para simplesmente surdo. É importante destacar que a expressão surdo-mudo não é adequada nem de acordo com o Modelo Médico, que considera que os surdos não falam por não possuírem o feedback auditivo que lhes permitiriam adquirir a fala, e nem de acordo com o Modelo Socioantropológico, pois, ao assumir a surdez como diferença, considera-se que o surdo fala, de uma maneira diferente, fala com as mãos e, portanto, não é mudo. Da mesma forma que a terminologia, a atenção educacional evolui de acordo com a concepção que se tem da deficiência. Na China antiga, os soldados chineses matavam deficientes; na Alemanha, Hitler, na década de 1940, não apenas matou judeus, na busca da raça perfeita, como também negros e alemães deficientes. Na Idade Média, as feiticeiras matavam os bebês com deficiência, queimando-os, como forma de “pagaros pecados” e, mesmo na atualidade, algumas religiões pregam que a deficiência é um castigo por causa dos pecados dos pais. Atualmente, a Educação Inclusiva é uma realidade em muitos países. Fato ressaltado na Declaração de Salamanca que culminou com uma nova tendência educacional e social decorrente das concep- ções atuais acerca da deficiência, que é o assunto do último texto desta primeira unidade. 25 Unidade 1 PRINCÍPIOS DA EDUCAÇÃO ESPECIAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Atualmente, as recomendações governamentais e dos especialistas recomendam a inclusão como a principal estratégia educacional para as pessoas com deficiência. Da maneira como são apresentadas as propostas de inclusão, temos a impressão de que elas são resultados apenas dos estudos científicos ou são “bondade” dos governantes. Isso não é verdade. A proposta de inclusão que hoje ocupa o centro das discussões da educação especial é resultado de longas e difíceis batalhas das pessoas com deficiência ao longo da história. Para melhor compreender a inclusão educacional, primeiro, vamos caracterizar aqui a Inclusão como princípio da Educação Especial. Para isso, apresentamos, primeiramente, uma caracterização do que seja Educação Especial e, em seguida, os princípios de Normalização e de Integração, por serem estes os princípios que sustentam o princípio da inclusão. A Educação Especial é uma modalidade de educação escolar integrante da educação geral direcio- nada a indivíduos com necessidades especiais. Educação Especial, segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – lei 9394/96, é a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino para educandos que por possuírem necessidades próprias e diferente dos demais alunos no domínio das aprendizagens curriculares correspondentes a sua idade, requer recursos peda- gógicos e metodologias educacionais específicas e adaptadas para que possam apropriar-se dos conhecimentos oferecidos pela escola. As diferenças ocorrem em função de altas habili- dades, condutas típicas, deficiência física motora, visual, auditiva, mental, bem como condi- ções de vida material precária (SHIMAZAKI, s/d, p.1, grifos nossos). 26 Unidade 1 Observe que a LDB estabelece que a Educação Especial deve ser ofertada, preferencialmente, na rede regular de ensino, ou seja, a Educação Especial não se opõe à escola regular. Existe um equí- voco muito grande neste sentido, pois as pessoas consideram que a escola que não é especial seria a escola regular. Nem a escola especial se opõe à escola regular. Uma escola é regular quando oferece o ensino seriado, isto é, todos (ou alguns) anos referentes à Educação Básica (Ensino Fundamental e Médio). Temos escolas especiais que são regulares, como o Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), especializado na educação de surdos que oferece ensino regular desde a Educação Infantil até o Ensino Superior. A modalidade de educação que se opõe ao ensino regular é o ensino supletivo, que se caracteriza por não ser seriado e, sim, pode ser concretizado por meio de componentes curri- culares ou disciplinas isoladas. Assim, a educação de pessoas com deficiência pode ser realizada no Brasil em escolas regulares especiais; escolas comuns, escolas supletivas comuns, escolas supletivas especializadas ou, como se pretende atualmente, em escolas inclusivas. No Brasil, podemos dizer que a Educação Especial tem origem com a criação, por D. Pedro II, em 1854, do Imperial Instituto dos Meninos Cegos. Em 1857, é criado o Imperial Instituto de Surdos-Mudos (1857), hoje, respectivamente, Instituto Benjamim Constant e Instituto Nacional de Educação para Surdos. Desde este período, até 1956, a Educação Especial brasileira se caracteriza por iniciativas isoladas, sejam elas particulares ou oficiais. É só a partir de 1957 que começam a ser desenvolvidas iniciativas governamentais em âmbito nacional. O início da Educação Especial no Brasil coincide com o final do segundo momento da história da Educação Especial, período caracterizado pela segregação institucional que compreende os anos finais do século XVIII e começo do século XIX. De acordo com Shimazaki (s/d, p.4), foi nesse perí- odo que a Educação Especial realmente teve início no mundo todo, “[...] quando parte da sociedade 27 Unidade 1 admite a necessidade de prestar alguma assistência às pessoas com deficiências”. Apesar da filosofia assistencialista, filantrópica e segregacionista das instituições educacionais que continuavam discri- minando, marginalizando e excluindo as pessoas com deficiência, este período foi importantíssimo para o desenvolvimento técnico e científico da Educação Especial, que começa a se fundamentar em princípios norteadores, dos quais, destacamos os princípios da normalização, integração e individua- lização. A partir da década de 1990, começa também a ser considerado o princípio da inclusão. A “Política Nacional de Educação Especial”, estabelecida pelo Ministério da Educação do Brasil, em 1994, define normalização como: Princípio que representa a base filosófico-ideológica da integração. Não se trata de normali- zar as pessoas, mas sim o contexto em que se desenvolvem, ou seja, oferecer, aos portadores de necessidades especiais, modos e condições de vida diária o mais semelhantes possível às formas e condições de vida do resto da sociedade (BRASIL,1994, p.22). De acordo com Pereira (1980, p. 1), o princípio de Normalização surgiu na Dinamarca, com uma Lei de 1959 que estabelecia: “É necessário criar condições de vida para a pessoa retardada mental, semelhantes, tanto quanto possível, às condições normais da sociedade em que vive”. O espírito da lei se refere a criar condições normais da sociedade e não do indivíduo, porém, diferentes interpretações, a maioria equivocadas, passaram a aplicar o princípio da normalização à pessoa com deficiência, ou seja, a normificação e, assim, a Educação Especial buscava tornar a criança especial “o mais normal possível”. No caso específico da surdez, isso significava que o surdo deveria aprender a falar, e o oralis- mo passou a ser a principal metodologia de trabalho para com os surdos. 28 Unidade 1 A defesa da normalização como objetivo a ser alcançado, através do processo de integração, gerou muitas discussões com interpretações equivocadas, resultando nas mais variadas prá- ticas pretensamente integracionistas. Não raras vezes praticou-se a normificação em vez da normalização, isto é, os deficientes foram encorajados a passar por normais, administrando informações a seu respeito, no sentido de não tornar conhecida a sua condição de excepcio- nalidade (OMOTE, 1999, p.4). Apesar dessas interpretações equivocadas, o princípio da normalização foi muito importante para o desenvolvimento da educação especial e novos estudos realizados a partir do princípio da Normalização foram surgindo, fazendo com que as pessoas com deficiência, que naquela época eram chamadas de excepcionais, fossem enxergadas com direitos e deveres iguais e que passam a “exigir” as mesmas condições de vida dos demais seres humanos. Na década de 1970, passou-se a falar, então, em Integração, como um novo princípio, o que foi questionado pelos estudiosos. Para eles, Normalização era o objetivo, e a Integração era o processo, isto é, como se poderia conseguir a Normalização. De acordo com Shimazaki (S/d, p.5), o princípio da integração busca [...] o estabelecimento de condições que facilitem a participação da pessoa PNEE (portado- ra de necessidades educativas especiais) na sociedade, obedecendo aos valores democráticos de igualdade, participação ativa e respeito a direitos e deveres socialmente estabelecidos. Isto significa gerar meios para que o aluno com deficiência se integrasse à escola graças ao aten- dimento que lhe era oferecido e, assim, o aluno é que deveria adequar-se à escola,mediante o que Rodrigues (2006) considera como “participação tutelada”. O Plano Nacional de Educação Especial brasileiro, de 1994, estabelece que a integração 29 Unidade 1 educativo-escolar refere-se ao processo de educar-ensinar, no mesmo grupo, crianças com e sem neces- sidades especiais durante uma parte ou na totalidade do tempo de permanência na escola (MEC,1994). Uma escola que se dizia integrativa na verdade era uma escola tradicional em que os alunos com deficiência recebiam algum tipo de tratamento diferenciado, na maioria das vezes em “classes espe- ciais”. Classes especiais são salas de aula multisseriadas em escolas regulares comuns que contam com professores especializados que utilizam métodos, técnicas e recursos pedagógicos especializados e, quando necessário, equipamentos e materiais didáticos específicos. Um aspecto importante a ser destacado é que na proposta integracionista apenas as deficiências eram consideradas, as demais dificuldades de aprendizagem, como distúrbios do comportamento, por exemplo, hiperatividade, não recebiam nenhum tratamento diferenciado. As crianças especiais passaram, então, a partir da proposta de Integração, a frequentarem, senão classes comuns, pelo menos classes especiais em escolas comuns, embora, na maioria das vezes, com horários de entrada e de saída diferentes dos demais alunos. As classes especiais não ofereciam esco- larização regular e era comum que alunos, particularmente os surdos, passassem anos em uma classe especial e, quando deixavam a escola, depois de mais de dez anos de estudo, não recebiam nenhum certificado, pois não se sabia qual “série” haviam concluído. Para se determinar o nível de escolaridade do aluno surdo, ele precisava se submeter a um exame classificatório, que era realizado pelas Secretarias Estaduais, o que nem sempre acontecia e, quando acontecia, o surdo educado segundo o oralismo e sem acesso a tratamentos fonoaudiológicos ou a uma prótese adequada, quase sempre não conseguia certificação além dos anos iniciais do Ensino Fundamental. A situação era tão desanimadora que se dizia que uma criança surda entrava na educa- ção pela porta da classe especial e nunca mais saía! 30 Unidade 1 Este modelo integracionista orientou a Educação Especial brasileira até recentemente, e o seu principal ponto negativo é que ele nega a questão da diferença. O aluno especial é inserido no contex- to escolar e é exigido dele a adaptação, mediante aquilo que lhe era oferecido pela escola. Dito de ou- tra forma, a escola não se modificava em nada, apenas aceitava receber a criança e, preferencialmente, continuava segregando-a em classes especiais. No modelo integrativo “[...] a sociedade em geral ficava de braços cruzados e aceitava receber os portadores de deficiência desde que eles fossem capazes de moldar-se aos tipos de serviços que ela lhes oferecia; isso acontecia inclusive na escola” (SASSAKI, 1997, p. 32). Com a consolidação do Modelo Social de caracterização das deficiências, as diferenças individuais passam a ser valorizadas e respeitadas, constituindo o princípio da individualização. “Individualizar o ensino significa atender às necessidades de cada um, dar o que cada um precisa para seu desenvolvi- mento pleno”, o que pressupõe “[...] a adequação do atendimento educacional a cada um, respeitando seu ritmo e características pessoais” (SHIMAZAKI, s/d, p.6). A prática da Integração, com todas as suas dificuldades e problemas, foi um fator importante para fazer surgirem estudos e pesquisas no campo da Educação Especial, tanto nos aspectos administra- tivos quanto nos que se referem aos processos de ensino e de aprendizagem, os quais, aliados ao princípio da individualização, dão origem ao princípio da Inclusão ou à proposta da escola inclusiva, que estamos vivenciando atualmente. De maneira bastante ampla, podemos dizer que, quando se trata de inclusão, o que se espera é que a sociedade, de maneira geral, e a escola, de maneira particular, é que necessitam se modificar para receber a criança especial em seu meio. De acordo com Stainback e Stainback (1999, p. 21), a educa- ção inclusiva pode ser definida como “[...] a prática da inclusão de todos – independentemente de seu 31 Unidade 1 talento, deficiência, origem socioeconômica ou cultural – em escolas e salas de aula provedoras, onde as necessidades desses alunos sejam satisfeitas”. Particularmente no que se refere à surdez, isto significa garantia de currículo adaptado; critério di- ferenciado para a correção de provas discursivas e de língua portuguesa, além do principal: a presença do intérprete de Libras, que é a língua de sinais do surdo brasileiro. O princípio da Inclusão, dentro da Educação Especial, é o de que todos os alunos façam parte do mesmo contexto escolar, participando das mesmas atividades comuns, embora adaptadas para aten- der as diferenças individuais. Esse é o novo paradigma educacional, estabelecido na Política Nacional de Educação Especial na perspectiva inclusiva, estabelecida pelo MEC em 2008 que pressupõe que a escola regular comum acolha estudantes que compreendem toda a diversidade de pessoas existentes em nossa sociedade, incluindo aqui alunos com necessidades especiais. A Educação Inclusiva constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de di- reitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola. De acordo com a Política Nacional de Educação Especial – PNEE, de 2008, a inclusão educacio- nal é uma ação política, cultural, social e pedagógica, desencadeada em defesa do direito de todos os alunos de estarem juntos, aprendendo e participando, sem nenhum tipo de discriminação. Princípio fundamental da escola inclusiva é o de que todas as crianças devem aprender jun- tas, sempre que possível independentemente de quaisquer dificuldades ou diferenças que elas possam ter. Escolas inclusivas devem reconhecer e responder às necessidades diversas de seus alunos, acomodando ambos os estilos e ritmos de aprendizagem e assegurando uma 32 Unidade 1 educação de qualidade a todos através de um currículo apropriado, arranjos organizacionais, estratégias de ensino, usam de recurso e parceria com as comunidades. Na verdade, deveria existir uma continuidade de serviços e apoio proporcional ao contínuo de necessidades es- peciais encontradas dentro da escola (BRASIL, 1994, p. 5). A educação brasileira atualmente é explicitamente considerada na perspectiva inclusiva e, como consequência, entre 2003 e 2010, o número de alunos com deficiência nas escolas regulares comuns aumentou 234%, sendo que o censo escolar de 2010 aponta que 95% das crianças com deficiência de seis a 14 anos estão na escola. Esta realidade tem inquietado a comunidade escolar que não se sente preparada para atender às necessidades educacionais de todos os alunos, lhes garantindo um ensino de boa qualidade conforme o princípio norteador da escola inclusiva, que é propiciar acesso a tudo o que a escola oferece. Para que todos os alunos sejam atendidos com a mesma qualidade, é fundamental que as diferen- ças não sejam desprezadas ou mesmo disfarçadas, ao contrário, elas devem ser legitimadas mediante a adoção de currículos e práticas pedagógicas diferenciadas em uma mesma sala de aula para favo- recer o acesso de todos os alunos ao conhecimento. Desta forma, o principal princípio da Educação Inclusiva é legitimar as diferenças! Este é o principal desafio do professor que pretende atuar peda- gogicamente de acordo com a perspectiva inclusiva. O ponto de partida para vencer este desafio é o docente reconhecer que respeitar as diferenças de seus educandos e destacá-las é mais do que simplesmente favorecer o acesso de todos os alunos, mesmo que pordiferentes vias, ao conhecimento, é um fator de enriquecimento de sua ação docente e de todo processo educacional. A sensibilização e conscientização do professor é fator primordial, pois é sua tarefa minimizar as barreiras existentes no tratamento dos conhecimentos em sala de aula, 33 Unidade 1 buscando tanto o auxílio de tecnologias assistivas quanto diversificar sua metodologia. Isto implica em modificações importantes na ação docente e em toda prática educativa, com o desenvolvimento de uma pedagogia centrada na criança e com condições de atender às necessidades de TODAS as crianças. O sucesso da Educação Inclusiva depende, em grande parte ou, melhor dizendo, quase que no seu todo, da atuação do professor. A Educação Inclusiva é, pois, uma ruptura com os valores da escola tradicional [...]. Rompe com o conceito de um desenvolvimento curricular único, com o aluno padrão estandardiza- do, de aprendizagem como transmissão, de escola como estrutura de reprodução. É, assim, muito ambiciosa como objetivo. Os professores, apesar de serem muitas vezes apontados como “bodes expiatórios” da inclusão, são a esperança dela (RODRIGUES, 2005, p.60). Em 1990, o direito de TODOS à educação foi confirmado na Declaração Mundial sobre Educação Para Todos, promulgado em Jontien, na Tailândia, independentemente de suas diferenças particula- res. É reforçado pelas diversas declarações das Nações Unidas, que culminaram na Declaração de Igualdade de Oportunidades para as Pessoas com Deficiência, assinado em 1993 e publicado em 1994, garantindo que a educação de pessoas deficientes seja parte integrante do sistema educativo (SHIMAZAKI, s/d). Mas, o principal documento de abrangência mundial acerca da Educação Inclusiva é a Declaração de Salamanca, um documento de princípios, política e prática para as necessidades educativas espe- ciais elaborada e promulgada em junho de 1994, durante uma conferência realizada pelo governo espanhol e UNESCO com a participação de mais de 300 representantes de 95 governos e de 25 orga- nismos internacionais. O objetivo deste documento é promover uma educação para todos, garantida pelos Estados e que faça parte integrante do sistema educativo. O Brasil não assinou este documento, 34 Unidade 1 entretanto, as discussões realizadas por professores, pesquisadores, familiares e, principalmente pelas pessoas com deficiência, que desde 1981, o Ano Internacional da Pessoa Deficiente se organizavam em associações de pessoas com deficiência, com base neste documento, mudaram a concepção a res- peito da educação dessas pessoas e que tem seu coroamento na PNEE de 2008, que é abordada na unidade II deste livro. No próximo e último texto desta unidade I, abordamos a trajetória das concepções sobre deficiên- cia ao longo da História, finalizando com um resumo da luta das pessoas com deficiência para terem seus direitos reconhecidos, principalmente no Brasil. CONCEPÇÃO DE DEFICIÊNCIA AO LONGO DA HISTÓRIA Em um ensaio intitulado Aspectos históricos da apreensão e da educação dos considerados deficien- tes, publicado como capítulo no livro “Um olhar sobre a diferença: Interação, trabalho e cidadania”, organizado por Lucídio Bianchetti e Ida Maria Freire, cuja sétima edição foi publicada pela editora Papirus, em 2006, Bianchetti alerta ao leitor, que, para orientar a elaboração de seu trabalho, partiu de uma questão ou tema que ele, Bianchetti, considera essencial para se compreender as diferentes con- cepções sobre deficiência ao longo da História, qual seja: “[...] de que tipo de corpo, cada classe social dominante, nos diversos momentos históricos, precisou? Que tipo de corpo valorizou e estabeleceu como modelo ou como padrão?” (BIANCHETTI, 2006, p.23). Essa questão é essencial, pois é exatamente a partir deste “padrão de corpo”, deste “estereótipo” que a sociedade “classifica” as pessoas. Atualmente, por exemplo, o padrão é magro, jovem, “sarado”. Modelo amplamente difundido e valorizado pela mídia, mas que pode ser alcançado por poucos e é perseguido por muitos, ou quase todos. 35 Unidade 1 Para Bianchetti (2006, p.23), a forma como a sociedade tratou e continua tratando o corpo, no decorrer da História da humanidade, “[...] revestiu-se e reveste-se de uma total irracionalidade”, com a pessoa humana concebida de forma fragmentada ou com esta irracionalidade revelada “[...] numa certa padronização, estabelecida por diferentes critérios, em diferentes momentos da história”. O autor destaca a importância da História para se compreender o presente e, para isto, recorre ao alerta de Apple e Teitelbaun (1991, p. 64)1: “A História tem o hábito de não permanecer no passa- do”, ou seja, eventos e fenômenos costumam se repetir. Mas, para que possamos entender a História da humanidade, precisamos, segundo Bianchetti (2006, p.24), “[...] apreender, como, nos diferentes momentos históricos, os homens foram atendendo a suas necessidades básicas, isto é, como foram construindo sua existência”. Isto porque, na falta de um ambiente específico da espécie, como acontece com os demais ma- míferos superiores, o homem adapta-se a diferentes habitat, com o organismo humano se tornando capaz de realizar uma imensa variedade de atividades, para poder sobreviver tanto na aridez dos de- sertos quanto nas regiões glaciais. Além disso, ao contrário dos animais, que “[...] atendem a suas necessidades de forma repetitiva, instintiva, candidatando-se à extinção”, os humanos possuem a ca- pacidade de preconceber o que vão fazer e assim, “[...] potencialmente podem resolver os problemas de alimentação, vestuário, transporte, educação, de formas infinitamente recriadoras”, que dependem do ambiente e, particularmente da cultura (BIANCHETTI, 2006, p.24). Desta forma, para que qualquer problema seja considerado como objeto de estudo e tenha sua solução procurada e exigida pela sociedade como um todo, é preciso que ele se constitua em uma 1 APPLE, M.; TEITELBAUN, K. Está o professor perdendo o controle de suas qualificações e do currículo?”; Teoria & Educação. n. 4.; 1991; PP. 62-73. 36 Unidade 1 necessidade básica. A educação das pessoas com deficiência não foi entendida como necessidade. A compreensão da diferença e o estabelecimento da necessidade de educação das pessoas consideradas “deficientes” foram construídos no decorrer da História, dependendo de como “[...] os homens e mulheres vieram atendendo a suas necessidades básicas e, em decorrência, vieram construindo sua existência” (BIANCHETTI, 2006, p.24). Esta nossa introdução ao tema deste artigo, que pretende apresentar e discutir as diferentes concep- ções de deficiência no processo histórico da humanidade, objetivou conscientizar você da importância de se conhecer o desenvolvimento do conceito de deficiência, para compreender o momento atual. Para isto, vamos estabelecer, de maneira breve, como os indivíduos que não se enquadram nos padrões ou modelos considerados “normais” eram concebidos pela sociedade nos diferentes momentos históricos. Nas sociedades primitivas, tanto as que se constituíram no início da humanidade, quanto as mais próximas de nós, como algumas tribos que ainda resistem culturalmente, a forma de tratar as pessoas com deficiência varia. De acordo com Shimazaki (s/d, p.2), algumas tribos aceitavam as crianças ou adultos com deficiência porque “[...] acreditavam que os maus espíritos habitavam essas pessoas para tornar a todos os demais membros normais” Nos tempos mais antigos, a maioria das tribos era nômade e para atender às suas necessidades básicas dependiam totalmente da natureza para se alimentar e se abrigar, o que exigia deslocamentos constantes sendo, portanto, indispensável que cada um cuidasse de si mesmo e ainda colaborasse com o grupo. Assim, abandonavam os idosos, doentes e os deficientes, porque essas pessoas geralmente não conseguiam acompanhar o ritmo de caminhadasdo grupo, sem que isso causasse nenhum senti- mento de culpa, tão característicos de nossa fase histórica. 37 Unidade 1 Na Antiguidade, havia duas posturas em relação às pessoas doentes, idosas ou deficientes: uma postura era de aceitação, tolerância; outra, majoritária, que optava pela eliminação, menosprezo ou destruição, em nome do equilíbrio e da organização política. Os chineses, na Antiguidade, lançavam as pessoas com deficiência ao mar; os gauleses as sacrifi- cavam aos deuses. No Egito antigo, fortemente místico, havia relativa tolerância para com as pessoas com deficiência. Os surdos, por exemplo, eram considerados pessoas especiais, escolhidas e protegi- das pelos deuses, em função, principalmente do silêncio em que viviam, pois se acreditava que eles se comunicavam em segredo com os deuses, servindo de mediadores entre eles e os faraós. “Havia um forte sentimento humanitário e respeito, protegiam e tributavam aos surdos à adoração, no entanto, os surdos tinham vida inativa e não eram educados” (STROBEL, 2009, p.17). Como as sociedades gregas, na Grécia Antiga, desenvolveram um forte senso estético que privilegiava a beleza e, além disso, estavam constantemente em guerra, era exigido de seus cidadãos quase que a per- feição física e, assim, exterminavam todos os indivíduos que desviassem do modelo por eles escolhido. Na sociedade espartana, na Grécia Antiga, as crianças com deficiência, ou que se desviassem dos padrões estéticos estabelecidos eram mortas. “A infortunada criança era prontamente asfixiada ou tinha sua garganta cortada ou era lançada de um precipício para dentro das ondas. Era uma trai- ção poupar uma criatura de quem a nação nada poderia esperar” (BERTHIER, 1984, p.165, apud NASCIMENTO, 2006, p.257). Em Roma, também em função desta busca pela “perfeição física”, era comum que crianças com algumas imperfeições, fossem jogadas nos rios, para morrerem afogadas. Entre os hebreus toda doen- ça crônica ou deficiência simbolizava impureza ou pecado. Assim, nas mais remotas sociedades, era comum que as crianças com deficiência fossem mortas. 38 Unidade 1 Com o advento do cristianismo, a concepção de deficiência se altera. As crianças com deficiência eram consideradas também “criaturas de Deus” e, portanto, não deveriam ser mortas, pois como cria- turas de Deus, possuíam alma. Todavia, as “anormalidades” eram atribuídas a causas sobrenaturais e associadas ao pecado, das próprias pessoas com deficiência ou de seus pais. Como exemplo, no final da Idade Antiga, Santo Agostinho (354 – 430) afirmava que se os filhos eram surdos, era porque estavam pagando por algum pecado que seus pais haviam cometido. Essa concepção que relaciona deficiência com pecado nos permite compreender a segregação e estigmatização dessas pessoas durante séculos. Para Bianchetti (2006, p.33), a Igreja Católica considerava que as pessoas com deficiência, os loucos, os leprosos “[...] eram instrumentos de Deus para alertar os homens e as mulheres sobre com- portamentos adequados ou para lhes proporcionar a oportunidade de fazer caridade”. Assim, as pes- soas com deficiência passam a receber cuidados com alimentação e abrigo em instituições religiosas, particularmente nos monastérios, sem nenhuma preocupação com seu desenvolvimento e educação. As pessoas com deficiência passam a ficar segregadas, longe dos olhos da sociedade, sob os cuidados dos religiosos, ou seja, permitindo que esses (os religiosos) praticassem a caridade. A concepção de deficiência agora deixava de ser teológica, ou seja, ligada à religião, para ser científica. No século XVI, por influência de médicos como Paracelso (1493-1541) e Cardamo (1501-1576), este último teve um filho surdo, a deficiência passa a ser considerada um problema de ordem médica, uma “doença”, o que isenta de culpa a pessoa com deficiência e seus familiares. Além disso, no século XVI, com o “[...] gradativo predomínio de uma produção voltada para o mercado [...] o desenvolvimento de uma ciência e de tecnologias que garantirão o domínio do ho- mem sobre a natureza”, a humanidade deixa de ser guiada apenas para suprir suas necessidades bá- sicas de subsistência, passando a ansiar por liberdade, que culmina com a Revolução Francesa, em 39 Unidade 1 1789, cuja lema foi: Liberdade, Igualdade e Fraternidade (BIANCHETTI, 2006, p.34). Com a visão mecanicista do Universo estabelecida por Isaac Newton (1642-1727), o corpo também passa a ser compreendido como uma máquina em funcionamento. Desta visão, segundo Bianchetti (2006, p.36), surge uma concepção desastrosa para a diferença “[...] se o corpo é uma máquina, a excepcionalidade ou qualquer diferença, nada mais é do que a disfunção de alguma peça dessa máquina”. Assim, a concepção de diferença/deficiência, que na Idade Média estava associada ao pecado, agora passa a ser relacionada ao defeito. Apesar dos avanços, particularmente na Europa, civilizações afastadas ainda sacrificavam as pes- soas com deficiência. Segundo Jimenez (1994), entre os séculos XVII e XVIII, os Esquimós deixavam os velhos e deficientes em locais estratégicos para serem devorados pelos ursos brancos. Mesmo nas demais partes do mundo, no período compreendido entre os séculos XVII e XVIII, a pessoa com deficiência, agora considerada sob a ótica da disfuncionalidade ou defeito, não recebia nenhuma atenção educacional. Nesta época, as pessoas com deficiência formavam uma classe ignora- da, rejeitada e, até mesmo, explorada. Com o filósofo John Locke (1632-1704), se difunde a ideia de que nada é inato, ou seja, a de que todos os indivíduos teriam a mesma capacidade de aprender, apresentou, posteriormente, interessan- tes repercussões na educação das pessoas com deficiência. De acordo com Leonel (2015, p.20), o humanismo renascentista, que marcou o período de 1700 a 1860, “[...] preconizava o valor das pessoas como seres humanos e seu direito à oportunidade de desenvolver ao máximo suas potencialidades” e provocou, ainda que de forma tímida, uma mudança de atitude em relação à pessoa com deficiência. “Era defendida a igualdade de direitos e os deficientes não estavam excluídos, passando a gerar ações, no sentido de dar assistência [...]”. 40 Unidade 1 Com o final do século XVIII e o começo do século XIX, podemos dizer que temos, finalmente, o início da Educação especial. Este período é caracterizado pela segregação institucional, ou seja, a educação era realizada em forma de internato. Este atendimento educacional, de fortes características assistencialistas, surge em função da compreensão de parte da sociedade a respeito da necessidade de prestar alguma assistência às pessoas com deficiências. Essas instituições eram não governamentais, filantrópicas, em sua maioria religiosa, que funcionavam com autorização do governo, mas sem ne- nhum auxílio de qualquer natureza. O período de 1860 a 1890 é marcado pela forte concepção de transmissão genética da deficiência, ou seja, os “[...] traços individuais eram herdados e que a evolução humana era baseada principalmen- te na transmissão genética”, e assim, “[...] a segregação e a esterilização dos deficientes passaram a ser vistos como forma de proteção à sociedade” (LEONEL, 2015, p.20). Desta forma, buscando proteger a pessoa normal da não normal, e vice-versa, são criadas esco- las e instituições que a princípio teriam como objetivo atender essa clientela, porém, na realidade, priorizavam a segregação, gerando um retrocesso em algumas conquistas alcançadas anteriormente, particularmente em função das ideias de Locke, que mencionamos anteriormente e de outro educa- dor importante, o francês Jean Jacques Rousseau (1712 -1778), que, de maneira bastante simplista, podemos dizer, defendia a necessidade de se ensinar aquilo que os alunos são capazes de aprender e que tenha utilidade e desperte seus interesses. No período compreendidoentre 1890 a 1925, as descobertas de Mendel acerca das leis da heredi- tariedade (atualmente bastante contestadas) reforçavam as ideias de controle genético. O diagnóstico médico é que caracterizava a deficiência, embora, já fossem aplicados os testes padronizados desen- volvidos por Alfred Binet (1857-1911) para “classificar” as pessoas com deficiência mental. 41 Unidade 1 Embora o mau uso dos chamados “testes de inteligência” tenham provocado a exclusão escolar de muitos indivíduos, a psicometria criada por Binet reforçou a necessidade de se criar recursos educa- cionais para se atender os alunos cujos resultados nos testes padronizados não se enquadravam nos padrões considerados “normais”. Com o final da I Guerra Mundial, em 1918, veio a necessidade de atendimento aos soldados que adquiriram graves deficiências e foram criados centros de reabilitação e muitos esforços e recursos fo- ram investidos. Afinal, os soldados anteriormente eram indivíduos “normais”, cidadãos que se tornaram deficientes em defesa da Pátria e assim, diferentemente daqueles que nasceram com deficiência e nunca alcançaram o status de cidadãos, mereceriam todo apoio governamental para sua reabilitação. Os resulta- dos obtidos com a reabilitação dos soldados impulsionaram a criação de serviços para atender crianças com deficiência, proporcionando assim as primeiras perspectivas de Educação Especial com caráter não exclusivamente assistencialista. O mesmo acontece com o final da Segunda Guerra Mundial, em 1945. Entre os anos de 1950 a 1960, observa-se uma crescente aceitação das pessoas com deficiência, com mais atendimentos, particularmente nos países mais desenvolvidos que se envolveram nas guer- ras mundiais. As famílias passam a exercer maior pressão sobre os governos e os profissionais come- çam a se interessar em melhorar cada vez mais o atendimento às pessoas com deficiência. A principal causa para isto foi a mudança de concepção em relação à deficiência. Ressalte-se, todavia, que os ser- viços educacionais não atendiam às todas as deficiências. Ficavam excluídas principalmente as defici- ências múltiplas e as que apresentavam graves limitações. Esta situação, em maior ou menor intensi- dade, continua até hoje, pois ainda é raro encontrar atendimento especializado para essas deficiências. Os anos entre 1960 e 1970 foram marcados pelo movimento dos direitos humanos, prin- cipalmente nos países desenvolvidos e nos que eram influenciados por eles. Nesta época, 42 Unidade 1 intensificaram-se as pesquisas multidisciplinares que contribuíram muito para uma maior com- preensão das várias deficiências. O fortalecimento do movimento pelos direitos humanos e o final da Guerra do Vietnã, em 1970, com o retorno não glorioso dos soldados norte-americanos, dão novo impulso ao atendimen- to, principalmente médico e social, às pessoas com deficiência. Nesta década de 1970, surge nos Estados Unidos, exatamente em resposta aos anseios dos soldados mutilados na Guerra do Vietnã, o Movimento de Vida Independente, em que as pessoas com deficiência buscam nos recursos tec- nológicos resgatar o controle da própria vida, particularmente na realização de tarefas cotidianas, impulsionando fortemente as pesquisas na área. A consolidação das conquistas do movimento pelos direitos humanos e os resultados da reabili- tação dos soldados proporcionados pelo avanço das pesquisas refletiram no atendimento às pessoas com deficiência, em particular, às crianças, fazendo que esses dez anos compreendidos entre 1970 e 1980 fossem fundamentais para a Educação Especial. Diversos países, seguindo o exemplo dos Estados Unidos, promulgaram leis para garantir o atendimento educacional irrestrito para as pessoas com deficiência, inclusive para as múltiplas e as que acarretam comprometimentos mais graves. Até meados da década de 1970, a questão da deficiência no Brasil sempre foi encaminhada pelos técnicos ou responsáveis considerados especialistas na área. A meta principal do grupo era o atendi- mento assistencialista das pessoas com deficiência em instituições especializadas, que se caracteriza- vam, particularmente, por serem constituídas por pessoas “ditas normais” que decidiam sobre a vida das pessoas com deficiência. Neste texto, denominamos estas entidades ou instituições como entida- des PARA pessoas com deficiência, diferenciando-as daquelas que são constituídas por pessoas com deficiência, que assumem o controle sobre a própria vida, como entidades DE pessoas com deficiência. 43 Unidade 1 As primeiras entidades PARA pessoas com deficiência a se organizarem em nível nacional foram o Conselho Brasileiro para o Bem-Estar dos Cegos, fundado em 1954; a Federação Nacional das APAES, criada em 1962; a Federação Nacional das Sociedades Pestalozzi, em 1970; e a Federação Brasileira de Instituições de Excepcionais, a FEBIEX, fundada em 1974. No que se refere ao atendimento educacional, as iniciativas são bem anteriores, datando da época do Segundo Império, com D. Pedro II, que fundou, em 1854, na cidade do Rio de Janeiro, o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, hoje denominado Instituto Benjamin Constant. Em 1857, D. Pedro II fundou, também no Rio de Janeiro, o Imperial Instituto dos Surdos-Mudos, hoje denominado Instituto Nacional de Educação de Surdos. Ainda no Segundo Império, em 1874, na Bahia, o Hospital Estadual de Salvador, hoje Hospital Juliano Moreira, iniciou a assistência aos deficientes mentais. Em 1979, acompanhando um movimento em nível mundial detonado pela ONU ao instituir para 1981 o Ano Internacional das Pessoas Deficientes – AIPD, alguns grupos organizados dirigidos por porta- dores de deficiência das várias áreas começaram a se reunir para preparar o segmento. Como consequência, em 1980, em Brasília, aconteceu o I Encontro Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes que contou com a presença de cerca de mil participantes, representantes de cegos, surdos, deficientes físicos e hanse- nianos, vindos de todo o Brasil. As entidades DE e não PARA deficientes começam a se fortalecer. Neste encontro, aprovou-se a primeira pauta de lutas do grupo, criou-se a primeira entidade re- presentativa – Coalizão Nacional – englobando todas as áreas e definiu-se a política a ser adotada no ano seguinte, o AIPD. A principal característica do movimento que surgia era a representação pelas próprias pessoas com deficiência e não mais pelos especialistas ou familiares. O ano de 1984 foi decisivo para o movimento, pois foram fundadas a FEBEC – Federação Brasileira de Entidades de Cegos; a ONEDEF – Organização Nacional de Entidades de 44 Unidade 1 Deficientes Físicos; a FENEIS – Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos; e o MORHAN – Movimento de Reintegração dos Hansenianos. Além disso, em dezembro de 1984, criou-se o Conselho Brasileiro de Entidades de Pessoas Deficientes, para reunir as quatro entidades e substituir a Coalizão Nacional, sendo toda esta estrutura organizada e gerida pelos próprios deficientes, sob o lema o AIPD – “Plena Participação e Igualdade”, lançando no Brasil o movimento de autoajuda em torno de um grupo até então tutelado pelo Estado e pelas instituições assistenciais. Atualmente, existe o CONADE – Conselho dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência. Em 1985, fundou-se a Sociedade Brasileira dos Ostomizados e, em 1987, os paralisados cerebrais, antes representados pelas entidades de deficientes físicos ou mentais, fundaram a APCB – Associação de Paralisia Cerebral do Brasil. Como consequência das reivindicações desse movimento de autoajuda, o Governo começou a se estruturar estabelecendo uma política favorecendo as pessoas com deficiência e, em 1987, foi criada a CORDE – Coordenadoria Nacional para a Integração das Pessoas Portadoras de deficiência, recriada pelo congresso em1989 pela Lei 7.853. No nível dos governos estaduais e municipais, surgem órgãos de apoio às pessoas com defici- ência, com a participação ativa dos representantes do movimento. Dentro dos partidos políticos, surgem candidaturas de pessoas com deficiência, muitos ocupando cargos, atualmente, nos três níveis do Legislativo. Durante os anos 1980, o movimento se expandiu em nível internacional, com a ONEDEF pas- sando a representar o Brasil junto ao Disable Peolple’s Internacional, através de seu Conselho Latino- Americano. Os cegos passam a acompanhar os avanços mundiais da área, mediante a filiação à UMC 45 Unidade 1 - União Mundial dos Cegos, à ULAC – União Latino-Americana de Cegos e a FENEIS, que liga os surdos ao World Federation of Deaf – Federação Mundial de Surdos, ampliando sua atuação política e amadurecendo suas lideranças. O trabalho dessas lideranças foi decisivo para uma das principais etapas da luta travada nos anos 1980: uma mudança de postura em relação às pessoas com necessidades especiais. O paternalismo da- ria lugar à equiparação de oportunidades. A tutela teria de ser substituída pela cidadania. Com intensa participação de todos os segmentos das pessoas com necessidades especiais, essa postura transparece na nova Constituição Brasileira, promulgada em outubro de 1988. Das reivindicações apresentadas pelo movimento, praticamente apenas a não adoção da Libras como língua oficial do Brasil não acon- teceu naquele momento, embora em 2002 isto tenha sido aprovado pelo Congresso Nacional A Constituição brasileira é uma das mais avançadas do mundo na área e, em todos os capítulos que tratam do Direito do Cidadão e do Dever do Estado, apresenta artigos específicos em relação aos deficientes. Compete a cada um de nós, fazer que a lei se torne efetiva na prática. Em 2015, foi aprova- do, pelo Congresso Nacional, depois de décadas de discussões, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, que a exemplo de seus congêneres, Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, aprovado na década de 1990, e o Estatuto do Idoso, objetiva direcionar e normatizar as ações do Estado e da sociedade em geral em relação à pessoa com deficiência. CONSIDERAÇÕES FINAIS Toda essa mobilização em torno da deficiência reflete o início de um processo de conscientização social, não apenas da comunidade em geral, mas, particularmente, das próprias pessoas com defi- ciência. Exemplos simples como a garantia do direito de ir e vir, como a construção de rampas de 46 Unidade 1 acesso, como a oferta de transporte coletivo adaptado, como a remoção de barreiras arquitetônicas, como o direito ao intérprete, ao estacionamento especial, ao sistema Braille em bancos e restaurantes, enfim, são várias as conquistas concretas que podem ser notadas a partir da participação dos próprios deficientes, não mais como objetos das políticas traçadas para a área, mas, sim, como sujeitos desta transformação social. No campo do mercado do trabalho, várias empresas têm aberto suas portas para a pessoa deficien- te física ou sensorial e leis garantem a reserva de vagas nas empresas públicas e privadas. A educação conseguiu avançar e hoje já é possível encontrar pessoas com deficiência cursando universidades, tendo o seu acesso (concurso vestibular) regulamentado mediante portaria do MEC. É crescente o número de pessoas com deficiência em cursos de pós-graduação stritu sensu, realizando mestrado e doutorado. Embora ainda incipiente, a inclusão educacional de crianças com deficiência no ensino regular comum tem alterado o comportamento de crianças e jovens frente a estas pessoas, contribuindo para a consolidação da concepção de deficiência como diferença, conforme preconiza- do pelo Modelo Social. No campo esportivo, o desporto paraolímpico vem ganhando cada vez mais destaque e nomes de peso, como o campeão olímpico Lars Grael, que vem lutando para reforçar a área. Com a rea- lização dos Jogos Paraolímpicos no Rio de Janeiro, em 2016, os atletas paraolímpicos brasileiros conquistaram grande espaço na mídia, o que favorece também a consolidação da concepção de deficiência como diferença, deixando cada vez mais distante a ideia de deficiência associada ao pecado, ao defeito ou incapacidade. Na área da saúde, além dos avanços da medicina, como o implante coclear para surdos, atualmente coberto pelo SUS, a política de ofertas de órteses e próteses pelo sistema de saúde já é uma realidade. 47 Unidade 1 Na área social, há o Benefício de Prestação Continuada, o BPC, a criação dos Conselhos da Pessoa Portadora de Deficiência, em níveis municipal, estadual e federal, que oferece auxílio de um salário mínimo mensal às pessoas com deficiência oriundas de famílias de baixa renda. A discrimi- nação passa a ser considerada crime e o Ministério Público é incumbido da defesa dos interesses do deficiente, com a criação da Promotoria de Defesa dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência. Porém, todas essas conquistas não chegam a significar, de fato, uma melhoria para as condições de vida dos portadores de deficiência e seus familiares, pois a maioria desses recursos nem chega ao conhecimento da população diretamente interessada. A informação é instrumento valiosíssimo para a melhoria da qualidade de vida e para a luta das pessoas deficientes pelos seus direitos e cidadania. Neste aspecto, o papel do professor é fundamental e extrapola as ações docentes. É ao professor que cabe informar a família de seus direitos. Finalmente, toda esta luta, no que se refere à Educação, culmina com a busca por uma escola inclusiva de boa qualidade, que é o momento histórico presente, deixando evidenciado o difícil cami- nho trilhado pelas pessoas com deficiência até aqui. 48 Unidade 1 FIQUE POR DENTRO Para conhecer, de maneira mais aprofundada a história do movimen- to das pessoas com deficiência no Brasil, procure no YOUTUBE por “História do Movimento Político das Pessoas com Deficiência no Brasil”. Você vai encontrar um conjunto de cinco vídeos produzidos pela Secretaria dos Direitos Humanos do Governo Federal em 2011. REFLITA Considerando, por exemplo, que em uma comunidade em que todos soubessem a Língua de Sinais, os sur- dos não teriam nenhuma dificuldade de socialização, você concorda com a seguinte afirmação: são as relações sociais e culturais que determinam a limitação de uma pessoa com deficiên- cia e não sua limitação biológica. Dito de outra forma, a sociedade tornaria as pessoas mais ou menos deficientes. INDICAÇÃO DE LEITURA Título: Educação Inclusiva e Necessidades Educacionais Especiais Autores: David Rodrigues; Ruy Krebs e Soraya Napoleão Freitas (Org.) Editora: Editora da Universidade Federal de Santa Maria – Editora UFSM: 2005. Sinopse: Este livro tem como objetivo principal discutir questões relacionadas à Educação Inclusiva (E I), como, o que diferencia a 49 Unidade 1 EI da simples integração de crianças de crianças com necessidades especiais na rede regular comum de ensino? Como a escola pode ser inclusiva em uma sociedade em que predomina a exclusão? Como transformar os belos ideais da EI em estratégias reais de ensino? Como as pessoas que historicamente foram excluídas posicionam-se frente à EI? Para isto, o livro foi organizado em duas partes: na pri- meira parte, o que é evidenciado pelos três capítulos que a compõem são os aspectos conceituais e políticos referentes à Educação Inclusiva e, na segunda parte, mais extensa, composta de nove capítu- los, mediante estudos de caso, são discutidos resultados de pesquisas acerca da inclusão educacional e seus atores. AtividAde de Autoestudo 1) O que você entende por inclusão educacional? 2) Qual é a concepção de deficiência preconizada pelo Modelo Médico? 3) Qual é a diferença entre o princípio da Normalização e o da Normificação? 4) Qual é a diferença entre Entidades PARA pessoas
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