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conceitos e processos Alfabetização e Letramento Luciane Rolim de Moura Vilain Inglyde Vieira A lfa b etiza çã o e L etra m en to co n ceitos e p ro cessos In g lyd e V ie ira / L u cian e R o lim d e M o u ra V ilain conceitos e processos Alfabetização e Letramento Luciane Rolim de Moura Vilain Inglyde Vieira A lfa b etiza çã o e L etra m en to co n ceitos e p ro cessos In g lyd e V ie ira / L u cian e R o lim d e M o u ra V ilain conceitos e processos Alfabetização e Letramento Luciane Rolim de Moura Vilain Inglyde Vieira A lfa b etiza çã o e L etra m en to co n ceitos e p ro cessos In g lyd e V ie ira / L u cian e R o lim d e M o u ra V ilain Esta obra traz as informações básicas para a compreensão geral da alfabetização e do letramento, com aporte teórico que possibilita reflexões para uma prática cada vez mais consciente e significativa. O objetivo deste livro não é fornecer receitas ou fórmulas prontas, tampouco apontar o melhor ou o pior método de alfabetização. A intenção é fazer emergir reflexões e discussões recentes sobre o tema, abordando e analisando o que os principais autores da área têm a nos ensinar. Código Logístico 58805 Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-85-387-6520-2 9 7 8 8 5 3 8 7 6 5 2 0 2 Alfabetização e letramento: conceitos e processos IESDE 2019 Inglyde Vieira Luciane Rolim de Moura Vilain Todos os direitos reservados. IESDE BRASIL S/A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br © 2019 – IESDE BRASIL S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito das autoras e do detentor dos direitos autorais. Capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: diignat/Shutterstock CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ V715a Vieira, Inglyde Alfabetização e letramento : conceitos e processos / Inglyde Vieira, Luciane Rolim de Moura Vilain. - 1. ed. - Curitiba [PR] : IESDE, 2019. 100 p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-85-387-6520-2 1. Alfabetização. 2. Letramento. 3. Prática de ensino. I. Vilain, Luciane Rolim de Moura. II. Título. 19-59234 CDD: 372.416 CDU: 37.091.33:028.1 Inglyde Vieira Mestre em Linguagem e Tecnologia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). Graduada em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Participou do Grupo de Pesquisa em Linguística Aplicada (GRUPLA), no campo da análise dialógica de discurso. É editora de material didático. Luciane Rolim de Moura Vilain Especialista em Educação Infantil pela Universidade Positivo (UP). Licenciada em Pedagogia pelo Centro Universitário de Maringá (UniCesumar) e em Letras – Português pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Atualmente, é editora e autora de livros didáticos de Língua Portuguesa e de Produção Textual para a educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental, incluindo alfabetização e letramento. É professora de educação infantil e dos anos iniciais do ensino fundamental na rede particular de ensino. Sumário Apresentação 7 1. A trajetória dos conceitos de alfabetização e letramento 9 1.1 Histórico da prática alfabetizadora no Brasil 10 1.2 Métodos sintéticos e globais 19 1.3 O letramento como um caminho possível 24 2. Concepções e implicações atuais dos conceitos de alfabetização e letramento 31 2.1 A escolarização dos conceitos de alfabetização e letramento 32 2.2 Modelos de letramento 36 2.3 Práticas de alfabetização 39 3. Ressignificando os processos de ensinar e aprender 49 3.1 Letramento, cultura escrita e sociedade 50 3.2 A oralidade e a construção da leitura 55 3.3 A leitura e a escrita para além do código 57 4. Os desafios do processo de aquisição da língua escrita 63 4.1 Apropriação do sistema de escrita alfabética 63 4.2 Distúrbios de aprendizagem e de linguagem 67 4.3 Tipos de avaliação 73 5. O alfabetizador e a busca por sua identidade 81 5.1 Um diálogo entre a teoria e a prática 81 5.2 Como letrar e alfabetizar ao mesmo tempo? 85 5.3 O papel do professor alfabetizador 87 Gabarito 95 Apresentação Os temas alfabetização e letramento são, ao mesmo tempo, instigantes e desafiadores. Isso porque eles envolvem não apenas as descobertas que as crianças fazem da língua escrita, mas também os desafios enfrentados pelo professor no intuito de mediar tais descobertas. A exemplo do menino João, personagem clássico de Ruth Rocha na obra O menino que aprendeu a ver, a aquisição da leitura e da escrita abre portas, amplia horizontes e proporciona a leitura do mundo. Entretanto, o processo de alfabetização, embora represente uma grande satisfação ao professor, também é carregado de desafios. Não é por acaso que existem tantas controvérsias no meio acadêmico e nas políticas públicas sobre o assunto. Além disso, na prática, muitas vezes a teoria parece cair por terra, pois as crianças aprendem em diferentes ritmos, e o professor sofre por desejar que nenhum de seus alunos fique para trás. Nesse sentido, o objetivo desta obra não é fornecer receitas ou fórmulas prontas, tampouco apontar o melhor ou o pior método de alfabetização. Na verdade, a intenção é fazer emergir reflexões e discussões recentes sobre o tema, abordando e analisando o que os principais autores da área têm a nos ensinar. Para isso, cada capítulo é destinado à discussão de um subtema, considerado de conhecimento imprescindível a todo profissional da área da educação. Começaremos com um breve panorama histórico, passando pela conceituação básica de termos importantes, pelas implicações da alfabetização e 8 Alfabetização e letramento: conceitos e processos do letramento na escola e pelos estudos mais recentes sobre o assunto. Abordaremos, inclusive, a Política Nacional de Alfabetização (PNA), de 2019, que tem sido bastante debatida na academia e no meio escolar. Em suma, esta obra traz as informações básicas para a compreensão geral da alfabetização e do letramento, com aporte teórico que possibilita reflexões para uma prática cada vez mais consciente e significativa. Bons estudos! 1 A trajetória dos conceitos de alfabetização e letramento Inglyde Vieira Diante do desafio de discorrer sobre a sequência didático-teórica dos conceitos de alfabetização e letramento, logo vem à mente a necessidade de se construir um levantamento histórico-conceitual desses temas que tanto direcionam a prática pedagógica do professor quanto indicam os caminhos teóricos a serem percorridos. Muito se discutiu sobre os métodos de alfabetização, e esses conflitos envolvendo a escolha do método mais eficiente para garantir a inserção dos sujeitos na cultura letrada geraram diversas discussões, estudos e pesquisas que tinham como norte investigar os problemas que envolviam o tema. Nesse sentido, é de extrema importância que compreendamos o percurso da alfabetização e, posteriormente, do letramento, principalmente os estudos teóricos que foram construídos ao longo do tempo, bem como a trajetória dos documentos oficiais do país que direcionaram todas as mudanças até os dias atuais. Observando e interpretando o discurso científico brasileiro atual das mais diferentes áreas do conhecimento que lidam direta ou indiretamente com o tema, podemos nos questionar: quais foram as principais transformações que o conceito de alfabetização passou desde o período colonial até os dias de hoje e quais são as implicações disso? Em qual momento o conceito de letramento entrou em cena? É em busca de algumas respostas para essas e outras questões que faremos um breve histórico a respeito do tema. 10 Alfabetização e letramento: conceitos e processos 1.1 Histórico da prática alfabetizadora no Brasil Existem muitas contradições a respeito do processo de alfabetizaçãono Brasil. São cinco séculos de construção desse saber repassado, a começar pela chegada dos portugueses aqui, dominando a arte do “saber ler” e do “saber escrever” a partir do século XVI. Inicialmente, é importante saber que as primeiras instituições de formação de professores foram iniciadas por uma organização de cunho religioso chamada Companhia de Jesus, que, em 1549, de acordo com Ferreira (2007), tinha como objetivo primeiro catequizar os índios, porém as suas atuações foram além dessas ideias iniciais. Segundo o autor, no plano educacional, a Companhia de Jesus formou colégios com quatro níveis de ensino: “primeiras letras (elementar), curso de humanidades, curso de artes e o curso de teologia” (FERREIRA, 2007, p. 25). O público-alvo desses cursos abrangia os filhos da nobreza, que iniciavam os estudos ali e depois partiam para fora do país. Nesse sentido, a educação jesuítica, que teve sua atuação no período de 1549 a 1749, era a porta de entrada da elite colonial e, por outro lado, era a responsável por instruir e catequizar os indígenas. “Assim, a atuação jesuítica, em seus primeiros anos no Brasil, caracteriza-se pelo dualismo: formar a elite para o exercício das funções nobres da colônia e catequizar os índios” (CARVALHO, 2015, p. 14). Até aqui, percebemos que, no âmbito da educação, os religiosos jesuítas foram os primeiros a alavancar um saber pedagógico e atuavam no ensino de forma secundária, geralmente envolvendo aspectos como norma e doutrina. Inicialmente, tinham diretrizes e saberes pedagógicos próprios, mais vinculados à religião, mas aos poucos foram aprimorando suas práticas e definindo melhor os saberes que envolvem o “ser professor”. A trajetória dos conceitos de alfabetização e letramento 11 Após esse período de educação jesuítica surge o movimento pombalino, que mostrava claramente se opor ao modelo de educação até então dominante, buscando, dessa forma, “dar lugar a novos currículos, novos métodos de ensino, nova estrutura da educação escolar [...] e alavancar a economia portuguesa1, livrando Portugal da dominação” (FERREIRA, 2007, p. 25). Assim, conforme o autor, essas mudanças buscavam direcionar e introduzir uma nova ideologia. Para isso, o objetivo era substituir os ideais do feudalismo, até então dominantes na sociedade, pelos do capitalismo, aumentando, portanto, o poder de atuação do Estado. Dessa maneira, a reforma promovida por Pombal tinha a necessidade de diminuir a atuação das organizações que pudessem representar algum risco para a execução dos novos ideais, no caso, a Companhia de Jesus. De acordo com Moll (2011), nesse contexto, o período pombalino de escolarização colonial resultaria em uma desestruturação na organização escolar jesuítica e, consecutivamente, em um retrocesso para o país. Ou seja, pode-se dizer que houve uma interrupção na forma como a educação jesuítica era vista, passando a ser encarada como uma ameaça. Conforme a autora, no auge dessas transformações, durante o período de 1776 até por volta de 1805, passou-se a oferecer cursos e matérias isoladas bem parecidos com os do modelo da Universidade de Coimbra (Portugal). Com a expansão da industrialização e a mudança do Império para a República, iniciava-se um novo ciclo de olhares para o ensino, uma vez que, agora, a demanda por trabalhadores também demandava conhecimento para os novos desafios da industrialização e expansão do país. Com essas mudanças, os brasileiros passaram a 1 Vale lembrar que o Brasil, até então, era uma colônia portuguesa, portanto os interesses de Portugal em relação ao Brasil voltavam-se para a melhoria da própria economia. 12 Alfabetização e letramento: conceitos e processos ser reconhecidos em seu papel de cidadãos, exercendo direitos e deveres proporcionados por suas condições sociais e políticas. Além dessas mudanças, a língua nacional brasileira é oficializada (língua portuguesa), acaba-se o tráfico negreiro e todos passam a ser considerados iguais conforme a Constituição de 1891. Nesse sentido, no âmbito educacional são criadas duas modalidades de ensino: a Inspetoria Geral da Instrução Primária e Secundária; estabelecem-se as normas para o exercício da liberdade de ensino e cria-se um sistema de preparação do professor primário; reformulam-se os estatutos da Academia de Belas Artes de Comércio da Corte e reorganiza-se o Conservatório de Música. (MOLL, 2011, p. 19) Ainda de acordo com a autora, nesse contexto de educação primária e secundária, surge uma reforma que declara o nível primário de ensino como obrigatório para crianças maiores de 7 anos, colocando nos pais ou responsáveis a responsabilidade pelo cumprimento da lei. Uma outra reforma amplia as discussões instituídas nesta, e estabelece, pelo Decreto n. 7.247, de 19 de abril de 1879, “a obrigatoriedade de frequência às escolas primárias dos sete aos 14 anos, para ambos os sexos, e destina verbas públicas para escolas particulares que organizem cursos de ensino primário aos adultos analfabetos” (MOLL, 2011, p. 19). Além disso, foram determinadas a gratuidade do ensino público e a obrigatoriedade do ensino primário. Para a autora, apesar de bem- -intencionadas, essas reformas foram consideradas superficiais, uma vez que não houve modificações significativas na área educacional. O que comprova essa afirmação “são os dados contidos no Recenseamento Geral do Brasil de 1920 [...], que demonstram para 1872 o índice de 814 analfabetos por 1000 habitantes e para 1890, 815 analfabetos por 1000 habitantes” (MOLL, 2011, p. 20). Nessa Primeira República, a ideia de expandir o ensino era apenas das A trajetória dos conceitos de alfabetização e letramento 13 redes escolares, com o intuito de alfabetizar essa grande massa que estava aquém desse conhecimento. Posteriormente, foi iniciado um movimento de críticas relacionadas aos ideais liberais, em contraposição aos ideais do pensamento católico-conservador. Esses ideais liberais estavam associados à ideia de que a educação não deve estar a serviço de nenhuma classe, de nenhum privilégio financeiro, bem como de nenhum credo político ou religioso, portanto a educação deveria ser laica. Já o pensamento católico-conservador considerava os ideais liberais uma abertura perigosa para os princípios da ordem, do progresso e dos valores. Apesar das ideias contrárias nesse quesito, os dois grupos tinham em comum o impulso de alavancar a educação no país. Como resultado desse impasse, foi criada mais uma reforma, decretada em 1890 e direcionada “por princípios de liberdade e laicidade do ensino, gratuidade da escola primária e descentralização do sistema educacional. Segundo esta reforma, a escola organizar-se-ia em duas categorias, isto é, de 1° grau para crianças de sete a 13 anos e de 2° grau para crianças de 13 a 15 anos” (MOLL, 2011, p. 21). Esses princípios direcionados pela nova reforma colocavam em evidência um ensino baseado nos fundamentos da ciência em contraponto com as ideias da tradição humanística clássica, aquela que enxergava a necessidade de transmissão dos fatos passados para os mais jovens e retomava os valores continuamente, de geração em geração, trazendo uma reflexão crítica para o presente. De acordo com Moll (2011), esses dois posicionamentos oscilaram por muitos anos e percorreram várias outras reformas entre 1901 e 1925. Assim, de um lado ficavam as discussões teóricas e do outro os direcionamentos político-governamentais. Com isso, “o acesso ao saber escrito mantém-se como privilégio de poucos, pois o advento do século XX não traz consigo avanços significativos na área 14 Alfabetização e letramento: conceitos e processos educacional” (MOLL, 2011, p. 21), como resultado de discussões que não refletiam na mudança real do dia a dia escolar. De acordo com Moll (2011), em 1915, ainda no contexto da Primeira República, foi criado um movimento chamado Liga brasileira contra o analfabetismo, organizado em umareunião formal em um clube militar do Rio de Janeiro, como forma de remediar os índices de analfabetismo da população. Entretanto, mesmo em meio a esse “entusiasmo pedagógico” e “otimismo pedagógico”, o final dessa década é marcado por um índice de 75% de analfabetos na população brasileira. Na década de 1930, a economia do país continua crescendo e a demanda por mão de obra qualificada acompanha esse ritmo, mas, conforme Moll (2011), havia um desequilíbrio entre o modelo econômico e o desenvolvimento social, que se refletia na educação. Em outras palavras, esse desequilíbrio apresentava- -se “quantitativamente (pela pequena oferta, baixo rendimento e discriminação social do sistema) e estruturalmente (pela inadequação do tipo de ensino às novas necessidades de expansão da economia)” (MOLL, 2011, p. 24). Acompanhando o desenvolvimento do país, de acordo com Carvalho (2015), a partir de 1950 as taxas de urbanização e industrialização aumentaram e, consequentemente, o número de matrículas nas escolas cresceu, o que não indicava uma diminuição nos níveis de analfabetismo, principalmente em áreas mais distantes, como as rurais. Assim, o governo federal criou várias campanhas de alfabetização para jovens e adultos cujo objetivo maior era ensinar a decifrar palavras e frases simples [...], mas a produção contínua de analfabetos causada por sistemas escolares inadequados e condições sociais de extrema desigualdade não cessou. (CARVALHO, 2015, p. 16) Nesse contexto de não alcance dos objetivos para a redução dos níveis de analfabetismo surge a escola nova, colocada como única A trajetória dos conceitos de alfabetização e letramento 15 saída para o desenvolvimento do país. Essa proposta acaba por alinhar-se ao ideal liberal da época “na medida em que não releva as consequências do modo de produção capitalista nas diferentes condições de acesso e permanência na escola para o conjunto da população” (MOLL, 2011, p. 25). Ainda nesse contexto surge o governo de Getúlio Vargas, que demonstra preocupação com o ensino no país em virtude das necessidades econômicas já apontadas. De acordo com Moll (2011), é nesse governo que são criados o Ministério da Saúde, o Ministério da Educação, o Conselho Nacional de Educação e os Conselhos Estaduais de Educação. Além disso, uma Assembleia Nacional Constituinte se reúne, estabelecendo o art. 150 da Constituição de 1934 (BRASIL, 1934), que garantia o ensino primário integral, gratuito e de frequência obrigatória estendido para adultos. Não duraram muito esses ares democráticos, pois surge o período ditatorial logo após (1937-1945), com o movimento de redemocratização do país, “o Estado Novo vai representar, no contexto econômico, uma reorganização das elites pelo rompimento com os ‘coronéis’ do eixo Minas Gerais – São Paulo e educar integral e gratuitamente o povo não está nos projetos dessas elites” (MOLL, 2011, p. 27). Nos anos 1970, ainda no contexto da ditadura militar, o tecnicismo tomou proporções ainda maiores, pois, nesse contexto, a educação buscava atender às demandas do governo militar. Consequentemente, “proliferou o que se chamou de ‘tecnicismo educacional’, inspirado nas teorias behavioristas da aprendizagem e da abordagem sistêmica do ensino, que definiu uma prática pedagógica altamente controlada e dirigida pelo professor” (BRASIL, 1997, p. 31). Assim, o direcionamento da formação de professores era “se distanciar das questões mais urgentes no âmbito educacional e social” (FERREIRA, 2007, p. 105). De acordo com o autor, 16 Alfabetização e letramento: conceitos e processos os estados tinham autonomia para propor grades curriculares optativas ou complementares, e, assim, eram priorizadas as disciplinas de formação técnico-pedagógicas. Ainda conforme Ferreira (2007, p. 105), buscou-se, nesse período, “aprimorar os meios pelos quais seriam atingidos os objetivos escolares, quais seriam as melhores técnicas de avaliação e como poderiam ser utilizados novos recursos tecnológicos dentro da escola”. Ou seja, pensava-se na educação como uma porta para o desenvolvimento socioeconômico do país. Em 1980, segundo Ferreira (2007), houve o processo de democratização do país e o início da abertura política, fazendo com que os movimentos em prol da educação, da pesquisa e do avanço científico e tecnológico se intensificassem. Assim, o desenvolvimento de programas de formação continuada se estabeleceu como uma “intensa mobilização dos educadores para buscar uma educação crítica a serviço das transformações sociais, econômicas e políticas, tendo em vista a superação das desigualdades existentes no interior da sociedade” (BRASIL, 1997, p. 31). Nesse contexto, pensava-se na formação continuada como forma de aprimoramento da prática do professor. Nessa época, foram criados os Centros de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério (Cefam). De acordo com Ferreira (2007), os Cefam tinham como objetivo transformar os centros de formação técnica em centros de formação inicial e continuada de professores. O Programa propunha, entre outras coisas, parceria entre a universidade e escolas de 1º grau. Apesar disso, em muitos centros os objetivos não foram alcançados ou sequer almejados. [...] Entendia-se [...] a importância desses programas como forma de responder às demandas mais específicas do professorado e como meio de garantir aprimoramento permanente dos conhecimentos e ações docentes. (FERREIRA, 2007, p. 106-107) A trajetória dos conceitos de alfabetização e letramento 17 Tais programas de formação continuada desenvolvidos por centros específicos foram os primeiros impulsos para a formação universitária, que visava ao avanço das pesquisas. Na década de 1990, entra em cena, oficialmente, a concepção da universidade como agência formadora – exemplo disso é a criação da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope) – e inicia-se o cenário de qualificação profissional do professor e da defesa da formação continuada. Nesse sentido, defende-se que “a formação dos professores aconteça na universidade, mais inclinada à pesquisa e à produção do conhecimento, portanto, com um cabedal aprimorado sobre a questão sócio-histórica da educação” (FERREIRA, 2007, p. 107). Busca-se, assim, considerar o “ser professor” como um processo identitário, ou seja, centrado no papel social que o docente desempenha e em sua prática como a base de sua identidade profissional, o que inclui os seus desafios concretos do dia a dia e o exercício de sua profissão. Magalhães (2001), ao fazer um resumo do ponto de vista histórico da formação de professores, afirma que, na década de 1970, privilegiou-se a dimensão técnica do processo de formação de professores; na década de 1980 houve um avanço nessa questão, quando a preocupação se voltou para a profissionalização em serviço. De acordo com Carvalho (2015), embora alguns trabalhos sobre propostas didáticas alternativas fossem produzidos, a produção de conhecimento teórico-prático decresceu consideravelmente nas décadas de 1970 e 1980. Há duas explicações plausíveis para o desinteresse científico em relação às metodologias: de um lado, os métodos tradicionais (fossem analíticos ou sintéticos) não deram conta de alfabetizar os grandes contingentes de alunos que acorriam às escolas; por outro, a intensa divulgação e o elevado prestígio acadêmico das ideias de Emilia Ferreiro fizeram com que o interesse sobre como o professor ensina 18 Alfabetização e letramento: conceitos e processos se deslocasse para a questão como a criança aprende, o que gerou mudanças importantes nos paradigmas de pesquisa e nos temas tratados pelos teóricos. (BORGES, 1998 apud CARVALHO, 2015, p. 19, grifos no original) Na década de 1990 surgiu, no âmbito da formação de professores, a ideia de educação continuada. De acordo com Magalhães (2001, p. 241, grifo nosso), “a educação continuada não seria a tradicional justaposição entreformação inicial e aperfeiçoamento, mas uma formação voltada para o desenvolvimento profissional dos professores sempre em evolução e continuidade”. No âmbito dos métodos, contudo, as pesquisas e publicações dessa época sobre metodologias foram colocadas em segundo plano, e a produção acadêmica de 1990 tornou-se praticamente inexistente. Por um lado, então, tínhamos grandes movimentações focando o olhar na formação do professor, por outro, tínhamos as metodologias como segundo plano, deixando, assim, uma lacuna que se reflete até os dias de hoje. A Figura 1, a seguir, demonstra a evolução vista até o momento em relação à educação no Brasil. Figura 1 – Principais marcos da educação no Brasil 1960 e 1970 1980 1990 aos dias atuais Aumento das taxas de industrialização e urbanização que não representaram avanços nas taxas de alfabetização. Aumento do conhecimento teórico-prático das metodologias, deslocando o foco da reflexão sobre como o professor ensina para a questão como a criança aprende, o que trouxe mudanças significativas. Educação continuada como aprimoramento e desenvolvimento profissional. Menor foco nas pesquisas e nas metodologias de ensino, o que resulta nas lacunas atuais. Fonte: Elaborada pela autora. A trajetória dos conceitos de alfabetização e letramento 19 Tendo compreendido todo o histórico apresentado até agora, torna-se necessário observar os níveis da taxa de analfabetismo ainda existentes na educação do país. Tal informação está demonstrada no Gráfico 1 a seguir. Gráfico 1 – Taxa de analfabetismo das pessoas de 10 a 14 anos de idade por sexo no Brasil 2007 0,0 1,0 2,0 3,0 % 5,0 4,0 2008 Total Homens Mulheres 2009 2011 2012 2013 2014 2015 Fonte: IBGE, 2019. No Gráfico 1, vemos que, mesmo em idades que, de acordo com as leis e diretrizes da educação, as crianças deveriam estar alfabetizadas, ainda há uma lacuna a ser preenchida. Tratando a situação por sexo, vemos uma incidência maior de analfabetismo entre homens. 1.2 Métodos sintéticos e globais Tratando de métodos de ensino, uma das discussões que envolveu a trajetória da alfabetização no país foi a escolha dos métodos, que, até o final do Império, nas famosas “aulas régias”, ofereciam condições difíceis e o ensino dependia muito do desempenho dos 20 Alfabetização e letramento: conceitos e processos professores e dos alunos. Para a iniciação do ensino da leitura eram utilizadas as chamadas cartas do ABC. O livrinho apresenta primeiro os alfabetos de letras maiúsculas e minúsculas de imprensa e de letras cursivas. Seguem-se nove “cartas do ABC”, ou seja, listas compostas de sílabas de diferentes padrões silábicos. A ideia é ensinar os três tipos mais comuns de sílabas existentes em Português, como consoante-vogal (ba, na, ma), vogal-consoante (al, ar, an), consoante-consoante-vogal (fla, bla, tra). A oitava carta tem palavras compostas de três letras, a nona tem dissílabos. Na última página, sob o título Exercício, há uma lista de palavras por ordem alfabética: baba, bebe, bife, bolo, etc. (CARVALHO, 2015, p. 22) Esse método da cartilha do ABC, de acordo com a autora, tinha como objetivo a soletração a partir da combinação de letras e sons regulares da língua escrita. Nesse sentido, o método utiliza-se de estímulos visuais e auditivos visando à associação com as letras do alfabeto, tomando a memorização como recurso didático, assim, com base em uma imagem, o nome da letra é associado, depois, aprende-se as sílabas de cor e, por último, formam-se as palavras de forma isolada da realidade, ou seja, descontextualizadas. Um outro método conhecido é o método fônico, que direciona o trabalho do professor para a dimensão sonora da língua, isto é, “para o fato de que as palavras, além de terem um ou mais significados, são formadas por sons, denominados fonemas [...], unidades mínimas de sons da fala, representados na escrita pelas letras do alfabeto” (CARVALHO, 2015, p. 24). A autora cita, como os mais conhecidos, o método da abelhinha e o método da casinha feliz, que atualmente evoluíram bastante com o olhar da psicologia alinhado ao da linguística. O método da abelhinha consiste na apresentação de uma série de histórias cujos personagens estão associados a letras e sons. Os sons são apresentados como “barulhos” que ocorrem, o mesmo acontecendo com a reunião de dois sons em sílabas. Da reunião de dois sons, a criança passa a três, e vai lendo palavras cada vez mais extensas; depois expressões, sentenças e historinhas. (CARVALHO, 2015, p. 26) A trajetória dos conceitos de alfabetização e letramento 21 Esse método, de acordo com a autora, é considerado um misto do tipo fonético e parte da decodificação, ou seja, da leitura, por meio de um código (personagens) como um caminho para decifrar o que está escrito (associação de letras e sons). Já o método da casinha feliz consiste no uso de jogos e teatro como forma de livre expressão. Esse método foi criado por Iracema Meireles2, na década de 1950, e utilizava a associação das letras a figuras do universo infantil, assim, a forma da letra era associada a um personagem que representava um som. Ambos os métodos fônicos, de acordo com Carvalho (2015), propõem aos alunos associações visuais e auditivas com a forma e o som das letras e buscam na utilização de histórias e personagens o despertar do interesse. Esses métodos refletiam o papel da consciência fonológica no processo de alfabetização e, nos dias atuais, têm sido investigados por pesquisadores de diversas áreas, como a linguística aplicada e a alfabetização, como forma de redescoberta dos métodos, ainda que o cenário atual seja diferente dos anos 1950. Todos esses métodos sintéticos são considerados por Soares (2018) associacionistas. Assim, para a perspectiva associacionista, o método é apontado como fator essencial do processo de aprendizagem da língua escrita, uma vez que é tido como determinante para essa aprendizagem. Após os métodos sintéticos, surgem, na primeira década republicana – da escola nova –, os métodos analíticos ou globais, que, diferentemente dos métodos sintéticos, defendiam que o ensino da leitura deveria ser iniciado pelo “todo” para depois se analisar as partes que constituem as palavras. Ainda nesse período, no final da 2 Criadora do método, acreditava na aprendizagem com base em jogos, e que a sala de aula era um espaço criativo e livre. 22 Alfabetização e letramento: conceitos e processos década de 1920, o termo alfabetização passou a designar o ensino inicial da leitura e da escrita. Assim, a Escola Nova, que valorizava a leitura, as bibliotecas e o gosto pelos livros, trouxe uma inovação importante para os alfabetizadores: a defesa dos métodos globais. A fundamentação teórica desses métodos é a psicologia da Gestalt ou psicologia da forma: a crença segundo a qual a criança tem uma visão sintética (ou globalizada) da realidade, ou seja, tende a perceber o todo, o conjunto, antes de captar os detalhes. (CARVALHO, 2015, p. 32) Um dos métodos globais mais antigos foi o método de contos, que, de acordo com Carvalho (2015), consistia no trabalho de leitura com base em pequenas histórias, após a apresentação da história completa. Dessa forma, o texto deveria ser recortado em partes menores, para que facilitasse o reconhecimento global da história, e a criança passasse a repeti-la, como uma forma de pré-leitura. Depois, ela aprende a reconhecer as palavras presentes naquela história, que geralmente apresenta repetição, facilitando a memorização. De acordo com a autora, esse método, no Brasil, não chegou a ser aplicado em ampla escala. Um outro método global conhecido foi o método ideovisual de Decroly, um dos mais conhecidos métodos globais, que consistia no ensino desenvolvido por centro de interesse, e não por disciplinas isoladas, como era feito nas escolas tradicionais. De acordo com Carvalho (2015), nesse método os conteúdos das disciplinasbásicas deveriam ser organizados com base em um tema de interesse do público, no caso, o infantil. Assim, os temas deveriam envolver conhecimentos diretamente ligados ao contexto de vivência da criança “suas necessidades básicas (de alimento, abrigo, proteção e ação) no meio em que vive. O estudo do meio incluía as relações entre a criança e a família, a escola, as plantas, os animais, o sol, a lua e as estrelas, a terra (água, ar e minerais)” (CARVALHO, 2015, p. 35). A trajetória dos conceitos de alfabetização e letramento 23 O método natural Freinet foi outro método global desenvolvido que no Brasil também não teve tanta repercussão. Consistia na escrita livre de textos, uma vez que considerava que é a experiência e o contato com a leitura e a escrita em si que definem a aprendizagem. Assim, a criança imerge na escrita e aprende a escrever; tem contato com a leitura e começa a ler, por tentativas. Uma característica do método natural é que ele não consiste em fases ou etapas, como em outros métodos, mas desenvolve-se em situações sociais de uso da leitura e da escrita. Existiram outros métodos globais além dos mencionados, como o da metodologia de base linguística e psicolinguística, que põe em destaque a leitura por meio de orações que contam com os saberes da criança, formando operações sintáticas. Ainda, o método das etapas de uma unidade, cuja aplicação se divide em unidades didáticas, em que uma unidade funciona como “um conjunto integrado que começa pela criação de um clima propício à expressão verbal, prosseguindo pela escolha das frases, das palavras-chave e de estratégias para reconhecimento das relações entre sons e letras”. (CARVALHO, 2015, p. 40). Assim, quando se conclui uma, inicia-se outra por meio de novas orações ou palavras. Existe também o método da palavração ou da alfabetização a partir de palavras-chave, que propõe o ensino das primeiras letras por meio de palavras-chave que se desmembram em sílabas e proporcionam a formação de novas palavras. Um outro método considerado de palavração, de acordo com Carvalho (2015), é o método Paulo Freire, “com a importante diferença que as palavras geradoras (palavras-chave) apresentadas aos adultos analfabetos são pesquisadas no universo vocabular deles próprios” (CARVALHO, 2015, p. 43). Esses temas gerados são relacionados a discussões dos aspectos político-sociais do Brasil. Paulo Freire ficou bastante conhecido internacionalmente por sua contribuição teórico-prática para a educação de jovens e adultos no país. 24 Alfabetização e letramento: conceitos e processos Atrelada à capacidade de ler, escrever e fazer uso desses conhecimentos em situações reais de uso da língua, hoje surge a ideia de alfabetizar letrando, garantindo uma aprendizagem muito mais significativa. De acordo com Soares (2004, p. 12): alfabetizar letrando ou letrar alfabetizando pela integração e pela articulação das várias facetas do processo de aprendizagem inicial da língua escrita é sem dúvida o caminho para superação dos problemas que vimos enfrentando nessa etapa da escolarização; descaminhos serão tentativas de voltar a privilegiar esta ou aquela faceta como se fez no passado, como se faz hoje, sempre resultando no reiterado fracasso da escola brasileira em dar às crianças acesso efetivo ao mundo da escrita. Como vimos, vivenciamos uma crise de paradigmas, os métodos de abordagem tradicional e/ou tecnicista não conseguem dar conta das demandas atuais e os de abordagens globais, como o construtivismo, na maioria das vezes, continuam sendo utilizados de forma equivocada, isso quando são utilizados. Vejamos, então, como o letramento se relaciona com a necessidade de uma nova abordagem que complemente as teorias já existentes na seção a seguir. 1.3 O letramento como um caminho possível Na sociedade em que vivemos, que gira em torno da escrita, o letramento possui um papel central, uma vez que a todo instante a escrita se faz presente nas relações interpessoais e no processo de interpretação dessa interação. O termo letramento vem sendo investigado por diversos autores e as definições apontam para o estudo de usos e práticas sociais de linguagem mediadas pela escrita. Em virtude disso, estudos atuais apresentam eventos e práticas de letramento como instrumentos de estudo e como unidades básicas constituintes do fenômeno do letramento. Assim, os eventos e as práticas de letramento constituem-se como parte de uma mesma realidade interacional. A trajetória dos conceitos de alfabetização e letramento 25 Essa visão se diferencia da simples visão de alfabetização, que não considera os usos e as práticas sociais da linguagem. Conceitualmente, “eventos são episódios que emergem das práticas e são definidos por elas” (BARTON; HAMILTON, 1998, p. 8, tradução nossa). Nesse sentido, podemos entender, em termos estruturais, que os letramentos dão lugar às práticas e estas dão lugar aos eventos. Os eventos, como afirma Kleiman, exigem a mobilização de diversos recursos e conhecimentos por parte dos participantes das atividades. Isso significa que alguns eventos de letramento voltados para a resolução de alguma meta da vida social criarão, sem dúvida alguma, inúmeras oportunidades de aprendizagem para os participantes, todas elas diferentes entre si, segundo as diferenças existentes entre os indivíduos participantes. (KLEIMAN, 2007, p. 15) As práticas de letramento, por sua vez, são um conceito mais abrangente, envolvendo não só os eventos, como também se referindo, segundo Street (2014), tanto ao comportamento quanto à conceituação social e cultural, conferindo significado à leitura e/ou à escrita. Da mesma forma, as práticas de letramento dizem respeito à maneira como um grupo faz uso da língua escrita e revelam as suas concepções, ideias, crenças, valores a respeito da escrita vinculados a um dado grupo social. São, sobretudo, “múltiplas e diversas, pois dependem das formas como as pessoas e grupos sociais integram a língua escrita em seu cotidiano e dos processos e estratégias interpretativas utilizadas pelos participantes de um processo de interação” (MORTATTI, 2004, p. 106). Soares (2003) define práticas de letramento como sendo “comportamentos exercidos pelos participantes em um evento de letramento, onde as concepções sociais que o configuram determinam sua interpretação e dão sentido aos usos da leitura e/ou escrita naquela situação particular” (STREET, 1995 apud SOARES, 26 Alfabetização e letramento: conceitos e processos 2003, p. 105). Tal conceito é exemplificado por Silveira, Rohling e Rodrigues (2012), quando afirmam que parece-nos interessante mencionar uma metáfora criada por Hamilton (2000) para diferenciar práticas e eventos de Letramento. Segundo ela, as práticas de letramento são comparáveis à base de um iceberg que se encontra abaixo da superfície, portanto, submersas; os eventos correspondem ao topo desse mesmo iceberg, o que está acima da superfície. O topo do iceberg – os eventos de Letramento – é visível e pode ser fotografado; porém a base submersa – as práticas – não pode ser fotografada, ainda que ali se estruture o iceberg. As práticas, que têm raízes profundas, constituídas sócio-historicamente, são então depreendidas a partir da análise dos eventos de letramento (daquilo que é visível). (HAMILTON, 2000 apud SILVEIRA; ROHLING; RODRIGUES, 2012, p. 101) Assim, eventos e práticas de letramento são constituintes de uma mesma situação comunicativa e materializam-se na forma de diversos gêneros escritos. Dessa forma, é possível enxergar o letramento como um caminho possível, que toma como ponto de partida situações de uso real da língua, dentro dos contextos de uso dos alunos, que vão aprendendo a interagir em situações menos complexas para as mais complexas, e vão se constituindo como sujeitos pertencentes a um lugar sócio-histórico. Considerações finais Por meio dos estudos aqui sintetizados, pudemosperceber como foi a trajetória da alfabetização no país, assim como os métodos que perpassaram todo esse trajeto. Diversas foram as políticas movidas para levantar essa problemática, que acomete o ensino no país até os dias de hoje, mas graças aos grandes estudiosos e aos esforços que têm sido empregados no intuito de buscar melhores caminhos, soluções têm sido alcançadas por meio da reflexão acerca do que deu certo. A trajetória dos conceitos de alfabetização e letramento 27 O letramento, portanto, apresentou-se como um desses caminhos, pois visa dar maior significado ao processo de alfabetização, uma vez que considera os eventos e as práticas sociais de uso da linguagem, tornando a aprendizagem significativa e centrada nos usos reais da língua. Ampliando seus conhecimentos • CENTRAL do Brasil. Direção: Walter Salles Júnior. Produção: Martire de Clermont-Tonnerre e Arthur Cohn. [S. l.]: Le Studio Canal; Riofilme; MACT Productions, 1998. 5 rolos de filme (106 min), son., color., 35 mm. Uma dica interessante para você ampliar a discussão sobre a importância da leitura e da escrita e sobre o impacto destas no contexto brasileiro é o filme Central do Brasil, o qual conta a história de Dora, que escreve cartas para analfabetos na Estação Central do Brasil, no centro do Rio de Janeiro. • A MENINA que roubava livros. Produção: Karen Rosenfelt e Ken Blancato. Direção: Brian Percival. [S. l.]: Fox Filmes, 2014. 132 min, son., color. Uma outra dica importante é o filme A menina que roubava livros, que retrata uma experiência valiosa com o processo de leitura e de escrita, evidenciando os impactos, principalmente da leitura, em contextos difíceis. Atividades 1. Como um resumo geral da trajetória da alfabetização no país, quais eram os dois grandes paradigmas? 2. De acordo com o que foi estudado, é possível concluir que há um método ideal para alfabetizar os nossos alunos? 28 Alfabetização e letramento: conceitos e processos 3. De que maneira o letramento pode ser considerado um caminho possível? Referências BARTON, D.; HAMILTON, M. Local literacies. Reading and writing in one community. London: Routledge, 1998. BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 16 de julho de 1934. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 16 jul. 1934. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ constituicao/constituicao34.htm. Acesso em: 5 ago. 2019. BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais: introdução aos parâmetros curriculares nacionais. Brasília, DF: Ministério da Educação/ Secretaria de Educação Fundamental, 1997. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf. Acesso em: 5 ago. 2019. CARVALHO, M. Alfabetizar e letrar: um diálogo entre a teoria e a prática. 12. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2015. FERREIRA, D. J. (org.). Os significados do letramento: uma nova perspectiva social da escrita. Campinas: Mercado de Letras, 1995. (Coleção Letramento, Educação e Sociedade). FERREIRA, D. J. Universidade e formação continuada de professores: entre as possibilidades e as ações propositivas. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade Federal Fluminense, 2007. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Brasil em síntese. Rio de Janeiro: IBGE, 2019. Disponível em: https://brasilemsintese.ibge.gov.br/ educacao/taxa-de-analfabetismo-das-pessoas-de-10-a-14-anos-ou-mais. html. Acesso em: 5 ago. 2019. KLEIMAN, A. B. Letramento e suas implicações para o ensino de língua materna. Signo, Santa Cruz do Sul, v. 32, n. 53, p. 1-25, dez. 2007. Disponível em: https://online.unisc.br/seer/index.php/signo/article/view/242/196. Acesso em: 5 ago. 2019. A trajetória dos conceitos de alfabetização e letramento 29 MAGALHÃES, L. M. Modelos de Educação Continuada: os diferentes sentidos da formação reflexiva do professor. In: KLEIMAN, A. B. (org.) A formação do professor. Campinas: Mercado de Letras, 2001. MOLL, J. Alfabetização possível: reinventando o ensinar e o aprender. São Paulo: Mediação, 2011. MORTATTI, M. R. L. Educação e Letramento. São Paulo: UNESP, 2004. (Coleção Paradidáticos; Série Educação). SILVEIRA, A. P. K. D.; ROHLING, N.; RODRIGUES, R. H. A análise dialógica dos gêneros do discurso e os estudos de letramento: um glossário para leitores iniciantes. Florianópolis: DIOESC, 2012. SOARES, M. Alfabetização e letramento. São Paulo: Contexto, 2018. SOARES, M. Alfabetização e letramento: caminhos e descaminhos. In: XVII ENCONTRO LATINO AMERICANO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA; XIII ENCONTRO LATINO AMERICANO DE PÓS- GRADUAÇÃO, n. 29, 2004, São José dos Campos. Anais... São José dos Campos: Universidade do Vale do Paraíba, 2004. SOARES, M. Letramento e escolarização. In: RIBEIRO, V. M. (org.). Letramento no Brasil. São Paulo: Global, 2003. p. 89-113. STREET, B. V. Letramentos sociais: abordagens críticas do letramento no desenvolvimento, na etnografia e na educação. Trad. de Marcos Bagno. São Paulo: Parábola, 2014. 2 Concepções e implicações atuais dos conceitos de alfabetização e letramento Luciane Rolim de Moura Vilain Você já presenciou ou soube de alguma situação em que uma pessoa adulta que, mesmo não sendo alfabetizada, conseguia agir com autonomia, por exemplo, distinguindo nomes de linhas de ônibus ou de remédios? Ou, ainda, que sabia criar e recitar poemas? Em se tratando de crianças, você já teve contato com alguma que, mesmo antes de saber ler e escrever, conhecia uma diversidade de histórias e, ao folhear um livro, passava o dedo indicador sobre as palavras, imitando o comportamento leitor? Exemplos como esses nos permitem admitir a existência de separação entre os conceitos de alfabetização e letramento, pois é possível que alguém seja letrado antes (ou independentemente) de ser alfabetizado. O contrário também é possível, ou seja, alguém ser alfabetizado, mas por razões diversas se manter alheio às práticas sociais de leitura e escrita. Ainda que possível, a última hipótese é menos recorrente que a primeira, sobretudo porque vivemos em uma sociedade grafocêntrica, em que somos constantemente chamados, em diferentes escalas, ao contato com a escrita e seus usos sociais – o manuseio de um smartphone e a troca de mensagens instantâneas por aplicativo, por exemplo, requerem determinado grau de letramento, assim como outras ações cotidianas, tais como ler uma receita, uma notícia ou um post em rede social e escrever um comentário. Não são incomuns, entretanto, situações em que uma pessoa alfabetizada é grafocêntrico: centrado na escrita, que privilegia a escrita. 32 Alfabetização e letramento: conceitos e processos incapaz, por exemplo, de compreender o fato central de uma notícia ou de produzir um simples bilhete. Tendo tudo isso em vista, o objetivo deste capítulo é discorrer sobre as implicações atuais dos conceitos de alfabetização e letramento, investigando possíveis caminhos para uma ação pedagógica que articule o alfabetizar e o letrar. 2.1 A escolarização dos conceitos de alfabetização e letramento Muito se fala na necessidade de alfabetizar letrando, e que a ação pedagógica para o letramento precisa estar articulada ao trabalho específico e explícito do sistema de escrita (alfabetização). Mas no que realmente isso consiste? Soares (2017, p. 35, grifos do original) nos dá pistas valiosas, asseverando que: em sua dimensão pedagógica, isto é, em sua prática em contextos de ensino, a aprendizagem inicial da língua escrita, embora entendida e tratada como fenômeno multifacetado, deve ser desenvolvida em sua inteireza, como um todo, porque essa é a natureza real dos atos de ler e escrever, em que a complexa interação entre as práticas sociais da língua escrita e aquele que lê ou escreve pressupõe o exercício simultâneo de muitas e diferenciadas competências. É o que se tem denominado alfabetizar letrando. Para Santos e Albuquerque (2005, p. 97), propiciar aos aprendizesa vivência de práticas reais de leitura e escrita não se reduz a levar para a sala de aula exemplares de textos que circulam socialmente. É necessário haver a intenção de atender à determinada finalidade – a qual deve ser clara e explícita – para que a situação de leitura e produção de texto seja real e significativa. Para exemplificar esse requisito, podemos pensar na produção de um bilhete em uma turma de 1º ano. Se a professora simplesmente chegar na sala de aula e disser para a turma: “Hoje vamos escrever Concepções e implicações atuais dos conceitos de alfabetização e letramento 33 um bilhete!”, imediatamente os alunos farão questionamentos do tipo: “Para quem, professora?”; “Por quê?”; “Para quê?”. Nesse exemplo, é necessário que haja um destinatário e um motivo, uma justificativa para que o bilhete seja escrito. Uma das possibilidades é aproveitar alguma demanda ou comunicado aos familiares. Nesse caso, a professora pode convidar os alunos a compor o bilhete de maneira coletiva e colaborativa e, assim, eles poderão perceber quais são os elementos composicionais desse gênero (destinatário, vocativo, corpo do texto, saudação e assinatura), além de algumas convencionalidades da escrita. Por exemplo, há uma correspondência entre o escrito e a pauta sonora, deve haver espaço entre as palavras, escreve-se da esquerda para a direita e de cima para baixo, entre outras. Outras possibilidades são: aproveitar a ocorrência de algum evento ou festividade para pedir aos alunos que produzam um convite; havendo falta de materiais na sala de aula, os alunos podem ser chamados a contribuir com a elaboração de uma lista de compras ou um pedido à coordenação; registrar as parlendas ou as adivinhas preferidas da turma, confeccionando um livro que pode ser enviado aos familiares rotativamente; entre outras atividades possíveis. No que tange ao ensino sistemático da alfabetização, é preciso que nesses momentos de leitura e produção de textos seja oportunizada aos estudantes a compreensão do registro linguístico, das características e dos elementos composicionais pertinentes a cada um dos diferentes gêneros textuais. Ademais, como ressaltam Santos e Albuquerque (2005), é também imprescindível que os alunos se apropriem da escrita utilizada ao escrever textos, ou seja, que se apropriem da escrita alfabética, pois tem pouca serventia o fato de o indivíduo saber identificar a que gênero o texto se refere e para que ele serve se ele não for capaz de lê-lo, isto é, de recuperar sozinho as marcas registradas no papel. 34 Alfabetização e letramento: conceitos e processos Para as autoras, alfabetizar letrando é, portanto, “oportunizar situações de aprendizagem da língua escrita nas quais o aprendiz tenha acesso aos textos e a situações sociais de uso deles, mas que seja levado a construir a compreensão acerca do funcionamento do sistema de escrita alfabético” (SANTOS; ALBUQUERQUE, 2005, p. 98). As autoras prosseguem, elucidando no que consiste um trabalho docente que articule o alfabetizar e o letrar. Em uma situação de aprendizagem na qual os alunos ainda não dominam o sistema de escrita alfabético, faz-se necessário que o professor atue como mediador, seja lendo, seja registrando por escrito os textos produzidos oralmente pelos alunos. No entanto, não se pode deixar para que o aluno produza escritos ou leia apenas quando já dominar o nosso sistema de escrita. É importante que eles possam, desde o início do processo de alfabetização, testar suas hipóteses a respeito da escrita. Se o conhecimento que esses têm da escrita ainda não é suficiente para que leiam ou produzam textos extensos, pode-se levá-los a ler textos memorizados, tais como cantigas, quadrinhas, assim como tentar escrevê-los na íntegra ou parte deles. (SANTOS; ALBUQUERQUE, 2005, p. 98) É necessário ressaltar, conforme pontuam Batista et al. (2006, p. 31-32), que não se trata de trabalhar primeiro a alfabetização e depois o letramento, ou vice-versa, como se fossem níveis ou prerrequisitos um do outro. Em outras palavras, cuidar da dimensão linguística, visando a alfabetização, não implica excluir da sala de aula o trabalho voltado para o letramento. Consequentemente, as atividades cotidianas precisam possibilitar o contato com textos escritos, de modo que as crianças formulem hipóteses sobre sua utilidade, seu funcionamento e sua configuração. (BATISTA et al., 2006, p. 31) Por isso, a proposta desses autores (BATISTA et al., 2006, p. 32) é que o professor organize as atividades em sala de aula de maneira a: Concepções e implicações atuais dos conceitos de alfabetização e letramento 35 • possibilitar aos alunos o constante acesso a diferentes portadores e maneiras de interagir com textos escritos, de forma a ampliar o rol de experiências e conhecimentos sobre a leitura e a escrita, tendo sempre em mente a necessidade de consolidação do domínio das relações entre os grafemas e os fonemas e outras capacidades consideradas importantes para o processo de alfabetização; • viabilizar o contato com diferentes gêneros textuais em situações significativas para os alunos, as quais sejam porta de entrada para análises linguísticas e ampliação das habilidades de leitura e escrita; • explorar separadamente as capacidades básicas do processo de alfabetização, ainda que isso seja feito com base em mais de um texto; • utilizar diferentes estratégias e agrupamentos variados: ora as atividades podem ser realizadas coletivamente, ora por grupos diferenciados (por exemplo, enquanto a maioria dos alunos desenvolve uma atividade de maneira independente, o professor acompanha diferentes subgrupos em tarefas específicas). Nota-se, diante do que foi exposto até aqui em relação à simultaneidade de alfabetizar e letrar, que existem algumas ideias preconcebidas do que seria esse processo, porém, sem o devido aprofundamento. Uma dessas opiniões equivocadas seria de que a conciliação entre alfabetização e letramento privilegiaria práticas espontaneístas, por meio das quais, supostamente, a apropriação da língua escrita aconteceria sem a intervenção do professor, pois os alunos descobririam tudo sozinhos. Isso ocorre em razão de a proposta que integra a alfabetização e o letramento fugir à lógica adultocêntrica de que o professor é o único detentor do conhecimento, passando a valorizar os conhecimentos prévios, as tentativas, as dúvidas e até mesmo os erros dos aprendizes. 36 Alfabetização e letramento: conceitos e processos Ao contrário do espontaneísmo, para que a proposta de alfabetizar letrando se dê de forma plena e satisfatória, ela pressupõe uma intervenção consciente e repleta de intencionalidade por parte do professor, que deve atuar como mediador e, assim, pode ajudar os aprendizes a reconstruir as propriedades do sistema de escrita alfabética (SEA) e, consequentemente, a se apropriar da leitura e da escrita, conforme será tratado na seção 2.3. 2.2 Modelos de letramento Inicialmente, é necessário retomar os conceitos de eventos de letramento e de práticas de letramento. Por estarem estreitamente relacionados, Street e Castanheira (2019) abordam esses conceitos conjuntamente: a expressão eventos de letramento refere-se aos elementos mais observáveis das atividades que envolvem a leitura e a escrita, enquanto o conceito de práticas de letramento distancia-se do contexto imediato em que os eventos ocorrem, para situá-los e interpretá-los em contextos institucionais e culturais a partir dos quais os participantes atribuem significados à escrita e à leitura, e aos eventos de que participam. O uso do plural em ambos os conceitos (eventos e práticas) indica que a atribuição de valor social aos usos da escrita varia de um grupo social para outro, é objeto de disputa e depende do jogo de forças econômicas, religiosas e políticas num determinado contexto, ou entre um contexto local e contextos mais distantes. A proposição desses dois conceitosassenta-se na compreensão da natureza social do letramento, que teve origem e desenvolvimento em um conjunto de pesquisas denominado Novos Estudos do Letramento (New Literacy Studies). Práticas e Eventos de letramento são modelos analíticos utilizados por pesquisadores que buscam compreender os usos e os significados da escrita e da leitura para diferentes grupos sociais e as consequências educacionais, políticas e sociais de tais usos e significados para os indivíduos e para os grupos a que pertencem. (STREET; CASTANHEIRA, 2019, grifos do original) Concepções e implicações atuais dos conceitos de alfabetização e letramento 37 De acordo com os referidos autores, os eventos de letramento ocorrem em diferentes espaços sociais, assumem diferentes formas e têm funções variadas. Eles citam como exemplo, no cotidiano de uma sala de aula, as situações em que professor e alunos conversam sobre um livro lido pela turma ou sobre uma notícia de jornal comentada por um aluno, além daquelas que são próprias do dia a dia, como o registro no quadro, pelo professor, do nome dos aniversariantes, da rotina diária ou os nomes dos alunos “bagunceiros”. Fora da escola, os eventos de letramento exemplificados pelos autores, entre outros, são: a participação em um ritual religioso, a leitura de um livro para os filhos, a anotação de uma lista de compras e a leitura de e-mails (STREET; CASTANHEIRA, 2019). Com relação aos eventos intra e extraescolares, Kleiman (2008, p. 18) afirma que o letramento “extrapola o mundo da escrita tal qual ele é concebido pelas instituições que se encarregam de introduzir formalmente os sujeitos no mundo da escrita”. O ambiente escolar é, portanto, um dos contextos específicos em que se promove o letramento. Todavia, ainda que se busque contemplar práticas de escrita significativas e que se aproximem do real (o que é bastante salutar e altamente recomendado), as práticas de linguagem privilegiadas pela escola são limitadas, razão pela qual é possível afirmar a existência de um letramento escolar, que é diverso do letramento social. Em razão dessa valorização de algumas práticas pela escola, mais recentemente o letramento foi tomando outras roupagens e, consequentemente, o conceito vem evoluindo. De acordo com Rojo (2016), pode se falar em letramentos (no plural), assim como em multiletramentos e em novos letramentos. Para a pesquisadora, é necessário que a escola amplie o recorte das práticas e usos sociais da escrita, passando a valorizar a cultura local, o que implica acolher e incluir os diferenciados contextos culturais do alunado, além das 38 Alfabetização e letramento: conceitos e processos múltiplas linguagens (multimodalidades) e da cultura digital. A esse respeito, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é explícita: ao componente Língua Portuguesa cabe, então, proporcionar aos estudantes experiências que contribuam para a ampliação dos letramentos, de forma a possibilitar a participação significativa e crítica nas diversas práticas sociais permeadas/constituídas pela oralidade, pela escrita e por outras linguagens. As práticas de linguagem contemporâneas não só envolvem novos gêneros e textos cada vez mais multissemióticos e multimidiáticos, como também novas formas de produzir, de configurar, de disponibilizar, de replicar e de interagir. [...] Eis, então, a demanda que se coloca para a escola: contemplar de forma crítica essas novas práticas de linguagem e produções, não só na perspectiva de atender às muitas demandas sociais que convergem para um uso qualificado e ético das TDIC – necessário para o mundo do trabalho, para estudar, para a vida cotidiana etc. –, mas de também fomentar o debate e outras demandas sociais que cercam essas práticas e usos. [...] Dessa forma, a BNCC procura contemplar a cultura digital, diferentes linguagens e diferentes letramentos, desde aqueles basicamente lineares, com baixo nível de hipertextualidade, até aqueles que envolvem a hipermídia. Da mesma maneira, imbricada à questão dos multiletramentos, essa proposta considera, como uma de suas premissas, a diversidade cultural. Sem aderir a um raciocínio classificatório reducionista, que desconsidera as hibridizações, apropriações e mesclas, é importante contemplar o cânone, o marginal, o culto, o popular, a cultura de massa, a cultura das mídias, a cultura digital, as culturas infantis e juvenis, de forma a garantir uma ampliação de repertório e uma interação e trato com o diferente. (BRASIL, 2017, p. 67-70, grifos do original) Nesse aspecto e diante de todo o exposto, o(s) letramento(s) se mostra(m) como um conceito muito mais amplo do que o de alfabetização e se estende(m) por toda a escolarização e, por que não, por toda a vida, visto que a todo momento surgem novas formas e meios de se comunicar, sobretudo no que diz respeito à tecnologia. Concepções e implicações atuais dos conceitos de alfabetização e letramento 39 2.3 Práticas de alfabetização A alfabetização pode ser definida como o processo de aprendizagem do sistema alfabético e de suas convenções, ou seja, a aprendizagem de um sistema notacional que representa os fonemas (sons) da fala por meio de grafemas (letras). Soares (2008, p. 15) define etimologicamente a alfabetização como “levar à aquisição do alfabeto”, ou seja, “ensinar o código da língua escrita, ensinar as habilidades de ler e escrever”. Ainda de acordo com a referida autora, a análise do duplo significado que os verbos ler e escrever têm na língua portuguesa auxiliam a compreender o debate básico existente em relação ao conceito de alfabetização. Os exemplos de Soares (2008, p. 15) são os seguintes: 1) Pedro já sabe ler. Pedro já sabe escrever; 2) Pedro já leu Monteiro Lobato. Pedro escreveu uma redação sobre Monteiro Lobato. Segundo a autora, no exemplo (1), ler e escrever significam o domínio da “mecânica” da língua escrita; nessa perspectiva, alfabetizar significa adquirir a habilidade de codificar a língua oral em língua escrita (escrever) e de decodificar a língua escrita em oral (ler). A alfabetização seria um processo de representação de fonemas em grafemas (escrever) e de grafemas em fonemas (ler) [...] No exemplo (2), ler e escrever significam apreensão e compreensão de significados expressos em língua escrita (ler) ou expressão de significados por meio da língua escrita (escrever). (SOARES, 2008, p. 15-16, grifos do original) Soares (2008) explica que os métodos de alfabetização podem ser classificados conforme a ênfase dada a um ou a outro desses dois pontos de vista. O método fônico, exemplificado por ela, fundamenta-se primordialmente no primeiro ponto de vista. Já o método global, segundo a autora, tem como pressuposto básico o segundo ponto de vista. 40 Alfabetização e letramento: conceitos e processos Ainda nesse sentido, a autora ressalta que essa dicotomia de significados dos verbos ler e escrever não implica veracidade ou falsidade de um ou de outro significado, e o mesmo se dá quanto às formas de se enxergar a alfabetização. Sem dúvida, a alfabetização é um processo de representação de fonemas em grafemas, e vice-versa, mas é também um processo de compreensão/expressão de significados por meio do código escrito. Não se considera “alfabetizada” uma pessoa que fosse apenas capaz de decodificar símbolos visuais em símbolos sonoros, “lendo”, por exemplo, sílabas ou palavras isoladas, como também não se consideraria “alfabetizada” uma pessoa incapaz de, por exemplo, usar adequadamente o sistema o sistema ortográfico de sua língua, ao expressar-se por escrito. [...] Em seu sentido pleno, o processo de alfabetização deve levar à aprendizagem não de uma mera tradução do oral para o escrito, e deste para aquele, mas à aprendizagem de uma peculiar e muitas vezes idiossincrática relação fonemas-grafemas, de um outro código, que tem, em relação ao código oral, especificidade morfológica e sintática, autonomia de recursosde articulação do texto e estratégias próprias de expressão/compreensão. (SOARES, 2008, p. 16-18, grifos do original) Lemle (2007), por sua vez, teoriza sobre as capacidades necessárias para a alfabetização, explicitando o que o alfabetizando precisa saber para aprender a ler e a escrever. Segundo ela, são três os componentes da capacidade de fazer uma ligação simbólica entre sons da fala e as letras do alfabeto. De maneira condensada, essas capacidades são as seguintes: “a primeira é a capacidade de compreender a ligação simbólica entre letras e sons da fala. A segunda é a capacidade de enxergar as distinções entre as letras. A terceira é a capacidade de ouvir e ter consciência dos sons da fala, com suas distinções relevantes na língua” (LEMLE, 2007, p. 9-10). Já Morais (2012, p. 51) lista as propriedades do sistema de escrita alfabética (SEA) que o aprendiz precisa reconstruir para Concepções e implicações atuais dos conceitos de alfabetização e letramento 41 compreender o seu funcionamento e, consequentemente, tornar-se alfabetizado. São elas: 1. Escreve-se com letras que não podem ser inventadas, que têm um repertório finito e que são diferentes de números e de outros símbolos; 2. As letras têm formatos fixos e pequenas variações que produzem mudanças em sua identidade (p, q, b, d), embora uma letra assuma formatos variados (P, p, P, p); 3. A ordem das letras no interior da palavra não pode ser mudada; 4. Uma letra pode se repetir no interior de uma palavra e em diferentes palavras, ao mesmo tempo em que distintas palavras compartilham as mesmas letras; 5. Nem todas as letras podem ocupar certas posições no interior das palavras e nem todas as letras podem vir juntas de quaisquer outras; 6. As letras notam ou substituem a pauta sonora das palavras que pronunciamos e nunca levam em conta as características físicas ou funcionais dos referentes que substituem; 7. As letras notam segmentos sonoros menores que as sílabas orais que pronunciamos; 8. As letras têm valores sonoros fixos, apesar de muitas terem mais de um valor sonoro e certos sons poderem ser notados com mais de uma letra; 9. Além das letras, na escrita de palavras usam-se, também, algumas marcas (acentos) que podem modificar a tonicidade ou o som das letras ou sílabas onde aparecem; 10. As sílabas podem variar quanto às combinações entre consoantes e vogais (CV, CCV, CVV, CVC, V, VC, VCC, CCVCC...), mas a estrutura predominante no português é a sílaba CV (consoante-vogal), e todas as sílabas do português contêm, ao menos, uma vogal. Trata-se de uma série de conhecimentos que nós, que já somos alfabetizados, dominamos automaticamente, mas que representam desafios para as crianças em fase de aprendizagem inicial da leitura e da escrita. Cabe ao professor o papel de mostrar os caminhos possíveis para que o aprendiz possa vencer item por item. 42 Alfabetização e letramento: conceitos e processos Nesse aspecto, o professor pode atuar como mediador, valorizando, conforme já mencionado anteriormente, os conhecimentos prévios, as tentativas, as dúvidas e mesmo os erros dos aprendizes, procurando sempre se colocar na perspectiva do aluno. Um exemplo de como isso pode se dar é que, mediante uma pergunta do estudante sobre que letras utilizar para escrever determinada palavra, o professor, em vez de fornecer respostas prontas de imediato, pode fazer questionamentos (aqueles que considerar mais adequados à situação concreta) para levar o aluno a refletir sobre a língua e chegar a algumas conclusões, mesmo que incompletas, mas que representam avanços rumo à apropriação da escrita convencional. Práticas como essa são correlacionadas à psicogênese da língua escrita (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999), que tem base construtivista e se apoia em hipóteses do aprendiz1. Uma maneira citada por diversos autores como sendo eficaz para conduzir o educando a reflexões sobre a escrita é a construção (com e para os aprendizes) de um ambiente alfabetizador. Nele, além de disponibilizar aos alunos uma diversidade de portadores textuais (livros, revistas, jornais, gibis etc.), o professor pode deixar visíveis alguns textos ou mesmo palavras que, com o decorrer do tempo, vão se tornando estáveis para aquele grupo. Por exemplo, a lista de chamada, exposta no mural da sala, pode ser constantemente consultada pelos alunos, no sentido de estabelecer comparações com outras palavras que desejam escrever ou cuja grafia pretendem confirmar. O mesmo pode ocorrer com uma cantiga ou uma parlenda conhecida pela turma, que foi explorada em uma brincadeira: os alunos podem ajudar o professor a registrar o respectivo texto em um cartaz. Previamente memorizado, por ter sido explorado ludicamente, o texto pode servir de consulta para a identificação de letras, sílabas, rimas, aliterações etc. 1 Essas hipóteses, que são etapas de apropriação da escrita, serão detalhadas no Capítulo 4. Concepções e implicações atuais dos conceitos de alfabetização e letramento 43 A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento normativo que estabelece as diretrizes para a elaboração dos currículos das escolas públicas e particulares brasileiras, trata a alfabetização com especial cuidado. Já no texto introdutório do componente Língua Portuguesa para os anos iniciais do ensino fundamental, a BNCC trata do assunto de modo sistemático e explícito, sob o item “O processo de alfabetização”: embora, desde que nasce e na Educação Infantil, a criança esteja cercada e participe de diferentes práticas letradas, é nos anos iniciais (1º e 2º anos) do Ensino Fundamental que se espera que ela se alfabetize. Isso significa que a alfabetização deve ser o foco da ação pedagógica. Nesse processo, é preciso que os estudantes conheçam o alfabeto e a mecânica da escrita/leitura – processos que visam a que alguém (se) torne alfabetizado, ou seja, consiga “codificar e decodificar” os sons da língua (fonemas) em material gráfico (grafemas ou letras), o que envolve o desenvolvimento de uma consciência fonológica (dos fonemas do português do Brasil e de sua organização em segmentos sonoros maiores como sílabas e palavras) e o conhecimento do alfabeto do português do Brasil em seus vários formatos (letras imprensa e cursiva, maiúsculas e minúsculas), além do estabelecimento de relações grafofônicas entre esses dois sistemas de materialização da língua. (BRASIL, 2017, p. 89-90) A alfabetização, na BNCC, é sistematizada no 1º e no 2º ano, no eixo análise linguística/semiótica, apresentando habilidades que exploram as complexas relações que se estabelecem entre os sons da fala (fonemas) e as letras da escrita (grafemas), envolvendo também a consciência fonológica da linguagem. Mais recentemente, preocupado em elevar a qualidade da alfabetização no Brasil, o Ministério da Educação (MEC), por meio da Secretaria de Alfabetização (Sealf), lançou a Política Nacional de Alfabetização (PNA), instituída pelo Decreto n. 9.765, de 11 de abril de 2019 (BRASIL, 2019a), com diretrizes de adesão voluntária pelos sistemas de ensino públicos e privados do país. Em agosto do mesmo ano, foi lançado um caderno explicativo com 54 páginas 44 Alfabetização e letramento: conceitos e processos que abordam o cenário atual da alfabetização no Brasil, os marcos históricos e normativos, além de apresentar relatórios sobre o tema e apresentar conceitos de alfabetização e literacia. Fundamentando-se na ciência cognitiva da leitura, a PNA define alfabetização como “o ensino das habilidades de leitura e de escrita em um sistema alfabético”, priorizando-a no 1º ano como uma de suas diretrizes (BRASIL, 2019b, p. 18; 32). O referido caderno também explicita outros conceitos adotados, como a compreensão do princípio alfabético (percepção de que os caracteres alfabéticos não são meros sinais gráficos, mas que, individualmente ou em grupo, representam os sons da fala/fonemas da língua), a consciência fonêmica (conhecimentoconsciente das menores unidades fonológicas da fala, os fonemas, e a capacidade manipulá-las intencionalmente) e instrução fônica sistemática (o aprendizado das relações entre as letras, ou seja, grafemas, e os menores sons da fala, isto é, os fonemas) (BRASIL, 2019b, p. 18; 33). Ainda de acordo com o PNA, literacia consiste “no ensino e na aprendizagem das habilidades de leitura e de escrita, independentemente do sistema de escrita utilizado” (BRASIL, 2019b, p. 18). Ao ampliar a explanação do termo, o documento explica que: Literacia é o conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes relacionados à leitura e à escrita, bem como sua prática produtiva. Pode compreender vários níveis: desde o mais básico, como o da literacia emergente, até o mais avançado, em que a pessoa que já é capaz de ler e escrever faz uso produtivo, eficiente e frequente dessas capacidades, empregando-as na aquisição, na transmissão e, por vezes, na produção do conhecimento. (MORAIS, 2014 apud BRASIL, 2019b, p. 21) Ao mencionar “prática produtiva” e práticas e experiências relacionadas à linguagem, inclusive no ambiente familiar (exemplificado no PNA como a leitura partilhada de histórias ou Concepções e implicações atuais dos conceitos de alfabetização e letramento 45 leitura em voz alta feita pelo adulto para a criança), o conceito de literacia aproxima-se da concepção de letramento. Considerações finais Diante do exposto, é inegável a importância tanto da alfabetização (aprendizagem do sistema alfabético e de suas convenções) quanto do letramento (valorização dos usos e as funções sociais da língua escrita). É imprescindível que a escola, desde os primeiros anos, contemple gêneros discursivos que circulam em diferentes esferas/ campos sociais de atividade/comunicação/uso da linguagem e, ao mesmo tempo, dê enfoque à aquisição da leitura e da escrita e à reflexão sobre a língua. Podemos fazer uma analogia com um barco movido a remos, um de cada lado: um deles é a alfabetização, e o outro, o letramento. Se o navegante remar com apenas um deles, corre o risco de se mover em círculos, sem sair do lugar. De pouco servirá ao aprendiz saber decodificar palavras isoladas se for incapaz de compreender um texto e sua função, por mais simples que seja. Da mesma forma, terá pouca serventia conhecer vários gêneros textuais e seus usos sociais se não souber efetivamente decodificá-los. Assim, a prática pedagógica precisa considerar a aprendizagem inicial da língua escrita na sua totalidade, buscando a articulação entre o desenvolvimento das habilidades de uso do sistema alfabético e a apropriação dos usos sociais da língua. A não observância da relação intrínseca entre alfabetizar e letrar pode privar o aprendiz de ter a noção ampla da natureza, da dimensão sociocultural e das funções da língua escrita. 46 Alfabetização e letramento: conceitos e processos Ampliando seus conhecimentos • ALFABETIZAÇÃO e letramento. 1 vídeo (9 min). Publicado pelo canal Alfaletrar Cenpec. Disponível em: https://youtu. be/k5NFXwghLQ8. Acesso em: 20 ago. 2019. Nesse vídeo, a professora doutora Magda Soares esclarece as relações entre alfabetização e letramento, as quais vêm sendo muito debatidas nos últimos anos, e comenta os conhecimentos necessários ao professor que deseja ensinar sob essa perspectiva. • SANTOS, C. F.; MENDONÇA, M. Alfabetização e letramento: conceitos e relações. Belo Horizonte: Autêntica, 2005. Disponível em: http://www.serdigital.com.br/gerenciador/ clientes/ceel/arquivos/22.pdf. Acesso em: 20 ago. 2019. O livro traz textos de diversos especialistas que abordam os conceitos de alfabetização e letramento, bem como suas relações com a escolarização e com o trabalho com os gêneros textuais na escola. Além disso, a obra contempla a organização do trabalho pedagógico, a abordagem da alfabetização e do letramento nos livros didáticos e o letramento digital no contexto do ensino. • CEALE. Termos de alfabetização, leitura e escrita para educadores. Belo Horizonte: UFMG, 2019. Disponível em: http://www.ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/glossarioceale/. Acesso em: 20 ago. 2019. Esse glossário on-line permite ao professor um acesso rápido e confiável aos principais verbetes de alguma forma relacionados à aprendizagem inicial e continuada da língua escrita. Os verbetes são assinados por especialistas da área. Concepções e implicações atuais dos conceitos de alfabetização e letramento 47 Atividades 1. De acordo com o que foi estudado neste capítulo, qual é a relação existente entre alfabetizar e letrar? 2. Como podem ser conceituados, basicamente, a alfabetização e o letramento? 3. Por que não procede o pensamento de que alfabetizar sob a perspectiva do letramento é superficial e espontaneísta? Referências BATISTA, A. A. G. et al. Práticas escolares de alfabetização e letramento. Belo Horizonte: Ceale, 2006. (Coleção Instrumentos da Alfabetização; 7). Disponível em: http://ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/files/uploads/ i n s t r u m e nt o s % 2 0 d a % 2 0 a l f a b e t i z a % C 3 % A 7 % C 3 % A 3 o / C o l - Instrumentos-07_%20Praticas_escolares.pdf. Acesso em: 16 ago. 2019. BRASIL. Ministério da Educação. Base nacional comum curricular: versão definitiva de 20 dez. 2017. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_ versaofinal_site.pdf. Acesso em: 20 ago. 2019. BRASIL. Decreto n. 9.765, de 11 de abril de 2019. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 11 abr. 2019a. Disponível em: http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/decreto/D9765.htm. Acesso em: 21 ago. 2019. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Alfabetização. PNA: Política Nacional de Alfabetização/Secretaria de Alfabetização. Brasília: MEC/ SEALF, 2019b. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/images/banners/ caderno_pna.pdf. Acesso em: 16 ago. 2019. FERREIRO, E.; TEBEROSKY, A. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre: Artmed, 1999. KLEIMAN, A. Modelos de letramento e as práticas de alfabetização na escola. In: KLEIMAN, A. (org.). Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita. Campinas: Mercado das Letras, 2008. 48 Alfabetização e letramento: conceitos e processos LEMLE, M. Guia teórico do alfabetizador. 17. ed. São Paulo: Ática, 2007. MORAIS, A. G. Sistema de escrita alfabética. São Paulo: Melhoramentos, 2012. ROJO, R. Pedagogia dos multiletramentos [entrevista – partes 1 e 2]. São Paulo: Escrevendo o Futuro/Cenpec, 2016. Disponível em: https:// www.escrevendoofuturo.org.br/conteudo/videos/formacao/palestras/ artigo/2239/pedagogia-dos-multiletramentos. Acesso em: 17 ago. 2019. SANTOS, C. F.; ALBUQUERQUE, E. B. C. Alfabetizar letrando. In: SANTOS, C. F.; MENDONÇA, M. (orgs.). Alfabetização e letramento: conceitos e relações. Belo Horizonte: Autêntica, 2005. SOARES, M. Alfabetização e letramento. 5. ed. São Paulo: Contexto, 2008. SOARES, M. Alfabetização: a questão dos métodos. São Paulo: Contexto, 2017. STREET, B. V.; CASTANHEIRA, M. L. Práticas e eventos de letramento. In: CEALE: termos de alfabetização, leitura e escrita para educadores. Belo Horizonte: UFMG, 2019. Disponível em: http://www.ceale.fae.ufmg.br/app/ webroot/glossarioceale/verbetes/praticas-e-eventos-de-letramento. Acesso em: 15 ago. 2018. 3 Ressignificando os processos de ensinar e aprender Inglyde Vieira Você já parou para pensar que a linguagem faz parte de todas as etapas da vida do ser humano? E, ainda, que poucas vezes nos dedicamos a refletir sobre suas funções e os papéis que ela exerce em nossa sociedade? A relação da linguagem com a representação e a comunicação parece ser a mais explícita, mas, ao pensar que comunicamos ideias, pensamentos, saberes e conhecimentos, é inevitável refletir sobre como se constituem esses aspectos. Nesse sentido, entendemos a linguagem como prática social, como uma atividade que constitui os sujeitos e as relações
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