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Resenha Crítica - Direito empresarial

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TELLES, Fábio; MOREIRA, Hugo; MOREIRA, Maria; SILVA, Wellem. Instituto da desconsideração da personalidade jurídica na Lei 13.874/2019: Reflexões sobre a intenção do fraudador e do legislador.
BRENDA MIZAEL LIMA
DANIELLE VICTOR DE PAULA
LAILA LUIZA RIBEIRO SOUSA
MARCELLA CORRÊA OLIVEIRA
Resenha Crítica 
 	O artigo, que é objeto de análise da presente resenha, tem como objetivo elucidar as alterações que a Lei 13.874 de 2019 (Lei da Liberdade Econômica) trouxe ao artigo 50 do código civil de 2002, discutindo a amplitude da repercussão da mesma no instituto da desconsideração da personalidade jurídica e se esta foi suficiente para atingir o objetivo idealizado pelo legislador. 
	Para tanto, explica, inicialmente, o surgimento da pessoa jurídica, que se dá a partir da inscrição do contrato social no registro público. A partir de então, a sociedade adquire personalidade jurídica, contraindo obrigações e direitos em nome próprio. De acordo com Maria Helena Diniz (2018), a pessoa jurídica possui direitos de personalidade, como direito ao nome, à marca, à imagem, liberdade, privacidade, à própria existência, entre outros. Uma das consequências é a autonomia patrimonial, negocial e jurídica que separa a personalidade e o patrimônio da empresa de seus sócios. 
 	Essa autonomia é título do próximo capítulo do artigo, correlacionando-a com o instituto da desconsideração da personalidade jurídica. Os atores citam os princípios da separação, independência e autonomia patrimonial que fundamentam o fato de a pessoa jurídica responder com seu próprio patrimônio, em regra, de forma que os sócios não respondem patrimonialmente pelas obrigações da empresa. 	
	Essa divisão patrimonial atrai aqueles que tem objetivo de fraudar seus credores, ficando impune de suas manobras fraudulentas. E, de acordo com o autor Fábio Ulhoa, foi a partir desta motivação que a doutrina criou o instituto da desconsideração da personalidade jurídica, que ignora a autonomia da pessoa jurídica, permitindo que o fraudador pague com seu patrimônio por aquilo que fraudou. 
 	O artigo trata ainda dos preceitos anteriores à Lei nº 13.874/19, com relação a desconsideração da personalidade jurídica. O artigo 49-A do Código Civil de 2002 informava que a pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios. De acordo com Flavio Tartuce (2017), a responsabilidade dos sócios é subsidiaria, de forma que primeiro exaure-se o patrimônio da pessoa jurídica.
 	De acordo com Pablo Stolze, o Código de 2002, adotou a teoria maior da desconsideração em seu artigo 50, ao exigir além da insuficiência patrimonial, a demonstração do abuso caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial. A redação do artigo 50, trazida pelo artigo 7º da Lei da Liberdade Econômica ficou da seguinte forma: 
“Art. 7º  A Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), passa a vigorar com as seguintes alterações: 	
(...)
“Art. 50.  Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.
§ 1º  Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza.	
§ 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por:	
I - cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa;	
II - transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e	
III - outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.
§ 3º  O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica.
§ 4º  A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica.	
§ 5º  Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica.” (NR)
 	Os cinco parágrafos foram adicionados pela MP 881/2019, que já havia alterado o artigo 50. A Lei de Liberdade Econômica retirou a expressão “dolosa” trazida pela MP. A expressão era utilizada para ensejar a declaração da desconsideração da personalidade pelo juiz. Segundo os autores, a alteração deixou uma brecha interpretativa que pode prejudicar a garantia do direito pretendido. 
 	O artigo explicita ainda a falta de clareza ao explicitar o objetivo do primeiro parágrafo, deixando novamente brechas que podem mudar os rumos da aplicação do instituto. 	
 	Em seu 7º capítulo, o artigo traz uma análise de algumas das (301) emendas ao texto original da MP 881, citando e comentando algumas delas. Seu objetivo é demonstrar que não há consonância entre os legisladores da redação final, deixando ainda mais vago o objetivo que buscavam. E deixando pairar a questão: houve avanço real do instituto considerando a MP e o texto final? Para os autores, “se a redação final do parágrafo primeiro fosse acertada, clara e inequívoca, ignorando-se também a expressão “como o proposito de”, não haveria controvérsia e nem mesmo necessidade hermenêutica de interpretação do dispositivo legal”.	
 	Para os autores a maior dúvida quanto a redação final é se o objetivo do legislador é que deve haver a comprovação do dolo ou não, já que apesar de retirar a expressão, manteve o sentido interpretativo de que se deve provar a existência de propósito para fraudar. A dúvida influi diretamente no andamento processual, pois não se sabe ao certo se é necessário produzir prova da intenção de fraudar. 	
 	Diante da exposição resumida das ideias centrais do artigo e da análise do mesmo, conclui-se que é nítida a confusão que traz a leitura do parágrafo primeiro, deixando dúvidas e brechas para diferentes aplicações. 
 	Apesar da hermenêutica constituir ponto extremamente importante neste impasse, é de suma importância que haja uma modificação para correção do erro legislativo, se é que assim se pode denominá-lo. A aplicação do direito se dá pautada na ideia de que nós previamente o conhecemos. A confusão não permite que os credores tenham conhecimento claro do direito que lhes é aplicado, dependendo da interpretação jurídica do aplicador da norma, abrindo brecha para a discricionariedade e levando a injustiça.

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