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Direito Internacional Tributário 1. Introdução Nas primeiras organizações do fenômeno tributário, os estudiosos, as nações e os contribuintes acreditavam que as previsões se limitavam a aspectos internos de cada uma das nações, resultantes de sua soberania e poder de império apenas, com pouca ou quase nenhuma repercussão internacional. Esse aspecto estava limitado à tributação do comércio aduaneiro e que, mesmo assim, remontava aos eventos de entrada ou saída de cada um dos países. Com o passar dos tempos constatou-se que tal verificação era no mínimo incompleta, eis que os fenômenos tributários também repercutiam na esfera das relações internacionais, seja para delimitar as fronteiras do campo de incidência de cada nação, seja em razão da interseção tributária com os eventos decorrente do tratamento dada aos países no comércio internacional. A relativização das fronteiras, o crescimento das consequências da globalização e demais eventos do mundo moderno trouxeram a necessidade de um repensar da tributação nessa seara. Na verdade, esse fenômeno não é restrito ao campo fiscal e pode ser atestado em diversas ramificações do conhecimento jurídico. Dessa constatação houve uma mudança de perspectiva não apenas no estudo e reconhecimento do Direito tributário em si, mas também do próprio Direito internacional, verificando-se a interseção entre os dois campos do conhecimento jurídico, com a absorção recíproca de institutos cada vez mais frequente e necessária. Direito Tributário Internacional e Direito Internacional Tributário Questão preliminar que remonta a tal campo do conhecimento reside na identificação do conteúdo e até mesmo na nomenclatura adotada. No campo doutrinário, embora sem muita unanimidade, tem sido encontrado o emprego das expressões “Direito tributário internacional” e também “Direito internacional tributário”, com alguns procurando estabelecer as distinções. Nesse sentido, existe posição apresentada por alguns que reconhecem que o conceito de “Direito internacional tributário” estaria nas normas referentes às relações entre Estados em matéria tributária, especialmente no tocante ao tratamento coordenado das atividades impositivas, divisão harmônica do poder de tributar entre si e resolução dos problemas oriundos da dupla incidência tributária e dos problemas de fraudes fiscais internacionais. Para essa visão do “Direito internacional tributário” – que reconhece esse campo jurídico como uma decorrência do Direito internacional público – apenas as normas, presentes nas convenções de Direito internacional tributário possuem o condão de resolver esses problemas, pois ofertam critérios de decisão que não pertencem ao Direito interno de certos Estados. Assim, para parte da doutrina, os tratados internacionais a respeito de dupla tributação e evasão fiscal internacional são objeto de estudo do Direito internacional tributário. Podemos ilustrar tal pensar pela referência de Heleno Torres,1 que reconhece que as convenções de Direito internacional tributário, em razão da relação com o direito interno, têm a natureza de leis especiais e se limitam a colocar em vigor um mecanismo para evitar o concurso de pretensões impositivas entre os Estados que celebram o tratado. De outro lado, o “Direito tributário internacional” abrangeria as normas de Direito tributário interno que contivessem elementos de “estraneidade". De forma a ilustrar, seriam reconhecidos estes elementos de estraneidade como aqueles decorrentes ou caracterizadores de fatos relativos à produção de renda ou capital, decorrentes da atuação de residentes de determinado país, mas ocorridos no estrangeiro, ou decorrentes de atuação de estrangeiros, mas ocorrentes no país. 1 TORRES, Heleno. Pluritributação internacional sobre as rendas de empresas. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1997, p.63 e 393. Dessa forma, seriam identificadas pelo “Direito tributário internacional” eventos reveladores de riqueza, comuns aos tipos de incidência normalmente utilizados nas nações, mas que atingiriam a duas ordens jurídicas distintas, sendo isso cada vez mais constante nos tempos de globalização acentuada. Ainda utilizando as remissões de Heleno Torres,2 ao se referir às medidas unilaterais de solução para a dupla tributação internacional que cada país pode adotar, afirma o autor que essas normas são procedimentais de atuação interna, cujas hipóteses de incidência contêm a descrição de fatos com “elementos de estraneidade”. Justo por isso seriam decorrências do Direito interno de cada nação, sendo, portanto, identificados pelas regras de qualificação e de localização como normas de Direito tributário internacional. Como se vê, parte da doutrina estabelece que a distinção entre normas de Direito internacional tributário e normas de Direito tributário internacional reside na origem: as primeiras são oriundas de convenções internacionais, ao passo que as segundas são normas de Direito interno. Essa divisão não é aceita por toda a doutrina. Posicionando-se sobre o tema, Antônio de Moura Borges3 afirma que toda essa divisão tem origem na doutrina dualista, razão pela qual não é plenamente satisfatória. Ao considerar a identidade de natureza das normas internacionais e internas (teoria monista), e que, em caso de conflito, prevalecem as primeiras, parece ser mais adequado, desde logo, a denominação Direito internacional tributário para a disciplina em estudo. Contudo, como a tributação é atividade precipuamente interna, a disciplina que se cogita, pois, abrangendo apenas a atividade tributária que é dominada por considerações internacionais, é mais bem identificada pela denominação Direito tributário internacional, uma vez que dá ênfase ao aspecto tributário do problema com características internacionais. 2 Idem, p. 285. 3 BORGES, Antônio de Moura. Convenções sobre dupla tributação internacional. Teresina: EDUFPI; São Paulo: IBDT, 1992, pp. 19 e 20. Evidentemente essa procura por uma distinção linguística remonta às necessidades da Ciência do Direito como um produto positivado de normas – seja de princípios e mesmo de regras – de forma a identificar o objeto de estudo, ainda que os objetos e objetivos se confundam. Para muitos, isso seria fundamental sobretudo para reconhecimento de eventual autonomia dessa ramificação. Eventual exagero de linguagem, contudo, pode até mesmo ser revertido em outro sentido, como sugere Heleno Torres:4 Levando às últimas consequências (...) tanto não seria cabível falarmos em “Direito Tributário Internacional”, como tampouco em “Direito Internacional Tributário”, na medida em que ambos setores descritivos prestam-se ao estudo de regras que correspondam, direta ou indiretamente, à arrecadação e fiscalização de tributos. Ou seja, tanto as cláusulas das convenções internacionais destinam-se a isso quanto as normas internas dotadas de elementos de estraneidade, dispostas para alcançar as rendas de residentes produzidas ultraterritorialmente ou as rendas de não- residentes obtidas no território. Diante disso, tem-se que no âmbito da Ciência do Direito, o Direito internacional tributário e o Direito tributário internacional não são autônomos, tendo em vista não possuírem um objeto de estudo, constituído por um subsistema de normas organizado estruturalmente, cuja função e princípios lhes sejam próprios.4 Ib, p. 53. Mais do que isso, verifica-se a dependência do Direito tributário internacional em relação ao Direito tributário, e do Direito internacional tributário em relação ao Direito internacional, ambos em relação ao próprio objeto e método utilizados. O certo é análises e perquirições sobre dupla tributação e casos de elisão ou evasão fiscal internacional demandará um aglomerado de compreensões, com verificação das fontes de Direito internacional e também do Direito interno. Por natural, mostra- se mais apropriado o esboço conjunto das normas internacionais e internas. A verdade é que somente se caracterizam como autônomos o Direito tributário internacional e o Direito internacional tributário quando do ponto de vista de uma didática reclamada pelo Direito tributário, este, sim, um ramo autônomo frente à Ciência do Direito, assim como o Direito internacional. Explica-se mais: se é sabido que a tributação é ato interno por parte de um ato de governo nacional (seja federal, estadual ou municipal nas nações que assim se organizem), mostra-se do mesmo modo correto que as normas internacionais somente terão eficácia (no nosso país) após serem devidamente internalizadas no nosso ordenamento. Nesse passo, carece de sentido prático a divisão entre normas internacionais e normas internas. De qualquer forma, serão normas são tributárias, seja contando com “elementos de estraneidade” ou mesmo com “situações tributárias internacionais”. São, portanto, todas elas normas internas. De outro lado, eventuais normas apenas “internacionais” não são aplicáveis tributariamente no Brasil. Faleceria de validade diante da necessidade de legalidade e, até mesmo, pelos motivos de tipicidade fechada que norteiam o pensamento tributário pátrio. Somente teriam validade interna com a dependência de uma prévia disposição existente no direito nacional. Portanto, a diferença entre Direito internacional tributário e Direito tributário internacional é apenas de nomenclatura, já que o objeto de estudo é o mesmo. Relação entre leis internas e leis internacionais Preliminarmente, é fundamental reconhecer que o estudo das relações entre o Direito internacional e o ordenamento interno se afigura um dos mais difíceis de se compreender, pois consiste em sabermos qual o tipo de relações que mantêm entre si. Isso porque as tradicionais formas de enxergar o fenômeno jurídico buscam uma solução adequada – se possível, com segurança jurídica, especialmente evitando (ou solucionando) o conflito entre as normas. Justamente por esse motivo, as dificuldades de compreensão dessas duas esferas normativas: as normas convencionadas de produção no Direito interno de cada país e aquelas resultadas de ajustes entre as pessoas jurídicas de Direito público externo. O ponto axial da questão recairia em determinar qual das normas deverá prevalecer em havendo conflito entre o produto normativo convencional (norma internacional) e a norma interna. De forma a identificar e solucionar a questão, duas grandes concepções doutrinárias surgiram: a monista e a dualista. O Dualismo Identifica a doutrina nacional5 que foi Alfred von Verdross quem apresentou a expressão “dualismo”, aceita por Triepel, em 1923.6 Por essa visão, o Direito interno de cada Estado e o internacional são dois sistemas independentes e distintos, embora igualmente válidos e aplicáveis. 5 Accioly, Hildebrando, Nascimento e Silva, Geraldo Eulálio do. Manual de direito internacional público. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. 6 TRIEPEL, Heinrich. Les rapports entre le droit interne et le droit international. Recueil des Cours de l’Académie de Droit International. Paris, Hachette, tome 1, p. 77- 118, 1923. Justificado pelo fato de que, conceitualmente, tratariam de sistemas materiais distintos, entre eles não poderia haver conflito. Ou seja, um tratado internacional não poderia, em nenhuma hipótese, regular uma questão interna sem antes ter sido incorporado a este ordenamento por um procedimento receptivo que o transforme em lei nacional. E isso para ocorrer deveria ser operado pelos mecanismos de produção do Direito especificados na norma fundamental constitucional. Por esses motivos, para os adeptos da tese dualista, os tratados internacionais representam apenas compromissos exteriores do Estado, sem que isso possa influir no ordenamento interno desse Estado. No primeiro caso, tratar-se-ia de relações entre Estados, enquanto no segundo, as normas cuidariam, precipuamente, da regulamentação das relações entre indivíduos. Dessa forma, aqueles compromissos exteriores, para os dualistas, não teriam o condão de gerar efeitos automáticos na ordem jurídica interna do país, se todo o pactuado não se materializar na forma de diploma normativo típico do direito interno: uma lei, um decreto, uma lei complementar, uma norma constitucional etc. De forma sintética, afirma Triepel,7 Direito internacional público e Direito interno “são dois círculos em contato íntimo, mas que não se sobrepõem jamais”. Ilustra bem essa posição a figura trazida por Bobbio,8 em sua teoria do ordenamento, de dois conjuntos intocáveis, incomunicáveis, caracterizando uma situação de exclusão total. O Monismo Já os autores monistas partem da compreensão oposta. Para essa visão do relacionamento das normas, na medida em que determinado país celebra e ratifica um tratado internacional, se compromete juridicamente a assumir aquele conjunto de disposição; se tal compromisso envolve direitos e obrigações que podem ser 7 Ib. p, 83. 8 BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 10. ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1999, p. 166. exigidos no âmbito interno do Estado, não se faz necessária, só por isso, a edição de um novo diploma, materializando internamente aquele compromisso exterior. Portanto, não existiriam duas ordens jurídicas distintas. Ao contrário, um só ordenamento que se completa e harmoniza, adotando tanto as normas produzidas internamente, como aquelas alienígenas, na medida em que as duas são resultantes de sua soberania. A posição monista divide-se em duas correntes: Monismo internacionalista, que sustenta a unicidade da ordem jurídica sob o primado do Direito internacional, a que se ajustariam todas as ordens internas. Monismo nacionalista, que expressa o primado do Direito nacional de cada Estado soberano, sob cuja ótica a adoção dos preceitos do Direito internacional reponta como uma faculdade discricionária. Aceitam a integração do produto convencional ao Direito interno, mas não em grau hierárquico superior. O Brasil, segundo o Supremo Tribunal Federal, enquadra-se nesse segundo sistema (monismo nacionalista). Há muito vigora na jurisprudência brasileira o sistema paritário, em que o tratado, uma vez formalizado, passa a ter força de lei ordinária, podendo, por isso, revogar as disposições em contrário, ou ser revogado (rectius: perder eficácia) diante de norma posterior. Assim ficou assentado no famoso julgamento acerca da Lei Uniforme de Genebra, debatido no STF por intermediário do Recurso Extraordinário 80.004, j. em 01.06.1977 e relatado pelo Min. Xavier de Albuquerque, com a seguinte ementa publicada: CONVENÇÃO DE GENEBRA, LEI UNIFORME SOBRE LETRAS DE CÂMBIO E NOTAS PROMISSÓRIAS – AVAL APOSTO A NOTA PROMISSÓRIA NÃO REGISTRADA NO PRAZO LEGAL – IMPOSSIBILIDADE DE SER O AVALISTAACIONADO, MESMO PELAS VIAS ORDINÁRIAS. VALIDADE DO DECRETO-LEI Nº 427, DE 22.01.1969. EMBORA A CONVENÇÃO DE GENEBRA QUE PREVIU UMA LEI UNIFORME SOBRE LETRAS DE CÂMBIO E NOTAS PROMISSÓRIAS TENHA APLICABILIDADE NO DIREITO INTERNO BRASILEIRO, NÃO SE SOBREPÕE ELA ÀS LEIS DO PAÍS, DISSO DECORRENDO A CONSTITUCIONALIDADE E CONSEQUENTE VALIDADE DO DEC-LEI Nº 427/69, QUE INSTITUI O REGISTRO OBRIGATÓRIO DA NOTA PROMISSÓRIA EM REPARTIÇÃO FAZENDÁRIA, SOB PENA DE NULIDADE DO TÍTULO. SENDO O AVAL UM INSTITUTO DO DIREITO CAMBIÁRIO, INEXISTENTE SERÁ ELE SE RECONHECIDA A NULIDADE DO TÍTULO CAMBIAL A QUE FOI APOSTO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO. Desde então firmou-se no Direito brasileiro a adoção do modelo monista, incorporando os tratados internacionais ao ordenamento pátrio com esse enquadramento. Por outro lado, ainda que dentro da teoria monista, deve sempre se resguardar a posição dos tratados internacionais de direitos fundamentais. Como cediço, os atos internacionais podem ser incorporados ao direito interno equiparados às emendas constitucionais, como dado no festejado art. 5º §3º da Constituição (introduzido pela Emenda nº 45, de 2004), desde que, obviamente, observadas as exigências de aprovação ali estampadas e típicas do poder constituinte reformador (dois turnos de votação, quórum de três quintos, em casas separadas). Assim já ocorreu com Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007,9 e Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Yorque, em 30 de março de 2007.10 Distinto a isso ocorreu na apreciação feita pelo Supremo Tribunal Federal para os demais tratados que versam sobre Direitos Humanos, anteriores à promulgação da Emenda nº 45/2004, que não foram, portanto, sujeitos àquele procedimento especial que os equipara ao poder constituinte reformador. No julgamento do Recurso Extraordinário nº 466.343-SP, apreciando a situação do Direito interno que previa a prisão civil do depositário infiel diante das normas do Pacto de São José da Costa Rica, prevaleceu a tese da supralegalidade dos tratados, posicionando-os abaixo da Constituição, mas acima das leis internas do país. E neste campo tem se mantido o STF: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PROVIMENTO CONJUNTO 03/2015 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA. 1. A Convenção Americana sobre Direitos do Homem, que dispõe, em seu artigo 7º, item 5, que “toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz”, posto ostentar o status jurídico supralegal que os tratados internacionais sobre direitos humanos têm no ordenamento jurídico brasileiro, legitima a denominada “audiência de custódia”, cuja denominação sugere-se “audiência de apresentação”. (...) 9 Decreto Legislativo nº 186, de 9.7.2008. 10 Decreto nº 6.949, de 25.8.2009. (STF – ADI 5240, Pleno, rel. Min. Luiz Fux, j. em 20.8.2015, DJe 29.1.206 Validade, Vigência e Eficácia dos Tratados Internacionais Genericamente, os tratados e convenções internacionais são determinados atos acordados entre dois ou mais países com a intenção de administrar interesses sociais, econômicos ou políticos, evitando conflitos entre esses mesmos interesses. Das referências do Direito como um todo, o art. 84, VIII, da CRFB/1988 determina que compete privativamente ao Presidente da República celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional. Ainda da carta constitucional, o art. 49, I, decide que cabe ao colegiado do legislativo resolver definitivamente sobre esses atos internacionais. Pela relevância do procedimento, importante recordar as formas e o procedimento de elaboração dos tratados, não apenas de conteúdo tributário. São várias as etapas. 1º) Em primeiro lugar, a competência para a celebração de tratados internacionais é do Poder Executivo. Ainda que negociados por agentes diplomáticos ou representantes do Ministério das Relações Exteriores, só o Presidente da República tem competência para a sua conclusão. Segundo a Constituição Federal – art. 84, VIII –, compete privativamente ao presidente da República celebrar tratados, convenções e atos internacionais. 2º) Em seguida, o Presidente remete os tratados para apreciação do Congresso Nacional, a quem cabe resolver definitivamente sobre a sua aprovação – art. 49, I, da Constituição. É de se observar que a própria designação de competência ao Presidente da República (art. 84, VIII, CRFB/1988) afirma que aquela sua manifestação de adesão ou celebração depende de ratificação pelo Congresso Nacional. Para exteriorizar tal ato será expedido um Decreto Legislativo. 3º) Na sequência, os atos internacionais voltam ao Executivo para a ratificação. Essa é manifestação do Poder Executivo, que é dada no sentido de que o propósito de pactuar o tratado continua, atendendo aos interesses superiores do Estado. Essa providência de ratificação do que fora combinado anteriormente serve para confirmar a negociação, agora já com o aval do legislativo interno de cada país. Essa ação é transmitida às contrapartes estrangeiras, pelo depósito do instrumento de ratificação. Representa uma providência no intuito de formalizar o compromisso do país. 4º) Por derradeiro, para aperfeiçoar-se o ato e ter vigência no território nacional, o Presidente da República expede um decreto de promulgação. Naturalmente, esse Decreto Presidencial é publicado. A partir dessa divulgação, no âmbito interno (seguindo o padrão do Diário Oficial), inicia a sua vigência no território nacional. Então, de acordo com esse procedimento, para que sejam aplicados no país, os tratados e convenções internacionais precisam ser aprovados pelo Congresso Nacional, pois sem essa aprovação não se aderem às fontes do Direito do país. Apesar de prevalecer no Brasil a teoria monista, o que se percebe é que o tratado tem um momento de validade na ordem internacional e outra validade na ordem interna. O tratado tem validade na ordem internacional no momento em que o governo brasileiro, depois desses procedimentos, acredita o tratado, deposita o tratado no consulado do outro país contratante. Na ordem interna, o tratado tem validade como lei interna no momento em que o decreto do Presidente é publicado no Diário Oficial. O tratado em matéria tributária Sem prejuízo de todo o narrado, os tratados em matéria tributária ganham uma qualidade ainda maior no debate jurídico por conta do próprio tratamento reconhecido pelas normas do Código Tributário Nacional. Isto porque assim dispõe o art. 98 do CTN: Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha. O que dispõe esse artigo é que a legislação que se refere àquele país que realizou o tratado ou convenção é que terá tratamento diferenciado, sendo muito comum para disciplinar e evitar situações de bitributação na esfera internacional, ou questões aduaneiras, entre outras medidas. Justamente em razão dessa aplicabilidade, restou sedimentada a concepção de que os tratados tanto podem ser elaborados para funcionar como uma norma geral e abstrata, como um pacto celebrado entre duas naçõespara regulamentar questões específicas de seus interesses. O art. 98 do CTN permite, dessa forma, a distinção entre os chamados tratados-contratos e os tratados-leis. Toda a construção a respeito da prevalência da norma interna com o poder de revogar os tratados, equiparando-os à legislação ordinária, foi feita tendo em vista os designados tratados, contratos, e não os tratados-leis. Salienta-se que esse dispositivo gera debates com muita frequência, e que o mesmo consolida a ideia de que, em Direito tributário, o tratado modifica a lei, e esta, superveniente, não modifica o tratado. O que se conclui é que a disciplina do específico (no tratado internacional) prevalece sobre o genérico (leis internas do país). Assim afirmam os tribunais: A antinomia supostamente existente entre a norma da convenção e o direito tributário interno resolve-se pela regra da especialidade, ainda que a normatização interna seja posterior à internacional. (STJ – 2ª turma, Resp nº 1161147, rel. Min. Castro Meira, j. em 17.5.2012, DJe 1º.6.2012.) Tecnicamente, não há a revogação das normas internas, pois elas continuarão vigentes e aplicáveis às demais relações jurídicas não afetadas pelas disposições específicas da convenção internacional. A decisão transcrita acima ainda complementa essa particularidade: O art. 98 do CTN deve ser interpretado à luz do princípio Lex specialis derrogat generalis, não havendo, propriamente, revogação ou derrogação da norma interna pelo regramento internacional, mas apenas suspensão de eficácia que atinge, tão só, as situações envolvendo os sujeitos e os elementos de estraneidade descritos na norma da convenção. A norma interna perde a sua aplicabilidade naquele caso específico, mas não perde a sua existência ou validade em relação ao sistema normativo interno. Com essa determinação, é possível reconhecer que o nosso sistema, em matéria tributária, adotou a posição supralegal para os atos internacionais. Diante disso, depreende-se do art. 98 do CTN, tem de ser interpretado de maneira que os tratados internacionais devam conviver com a lei interna. Depois de devidamente incorporado ao direito interno segundo aquele procedimento retratado, o tratado internacional deve ser respeitado pela legislação interna como tal.11 Nesse aspecto do posicionamento dos tratados diante das demais normas, dificilmente será aplicada no Direito tributário a disposição constitucional (art. 5º, § 3º) que lhes confere equiparação às emendas constitucionais. Vale sempre lembrar que tal capacidade está adstrita aos pactos internacionais que versem sobre Direitos Humanos, não sendo fácil a aproximação desse tema com a tributação. Por outro lado, diversas manifestações dos próprios Ministros do Supremo Tribunal Federal têm destacado a importância dos tratados em matéria tributária. Para reforçar a autoridade desses atos internacionais, vejamos as transcrições do STF, em processo ainda pendente de julgamento definitivo pelos demais integrantes da Corte: O relator frisou, no entanto, que, pelas peculiaridades, os tratados internacionais em matéria tributária tocariam em pontos sensíveis da soberania dos Estados. Demandariam extenso e cuidadoso processo de negociação, com a participação de diplomatas e de funcionários das respectivas administrações tributárias, de modo a conciliar interesses e a permitir que esse instrumento atinja os objetivos de cada nação, com o menor custo possível para a receita tributária de cada qual. Pontuou que essa complexa cooperação internacional seria garantida essencialmente pelo pacta sunt servanda. Nesse contexto, registrou que, tanto quanto possível, o Estado Constitucional 11 Em se tratando de matéria tributária, a superveniência de legislação nacional não revoga disposição contida em tratado internacional contratual, consoante dispõe o art. 98 do CTN (STJ – 2ª Turma, REsp 228.324, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. em 12.5.2005, DJ 1º.7.2005). Cooperativo reinvindicaria a manutenção da boa-fé e da segurança dos compromissos internacionais, ainda que diante da legislação infraconstitucional, notadamente no que se refere ao direito tributário, que envolve garantias fundamentais dos contribuintes e cujo descumprimento colocaria em risco os benefícios de cooperação cuidadosamente articulada no cenário internacional. Reputou que a tese da legalidade ordinária, na medida em que permite às entidades federativas internas do Estado brasileiro o descumprimento unilateral de acordo internacional, conflitaria com princípios internacionais fixados pela Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados (art. 27). Dessa forma, reiterou que a possibilidade de afastamento da incidência de normas internacionais tributárias por meio de legislação ordinária (treaty override), inclusive em sede estadual e municipal, estaria defasada com relação às exigências de cooperação, boa-fé e estabilidade do atual panorama internacional. Concluiu, então, que o entendimento de predomínio dos tratados internacionais não vulneraria os dispositivos tidos por violados. Enfatizou que a República Federativa do Brasil, como sujeito de direito público externo, não poderia assumir obrigações nem criar normas jurídicas internacionais à revelia da Constituição. Observou, ainda, que a recepção do art. 98 do CTN pela ordem constitucional independeria da desatualizada classificação em tratados- contratos e tratados-leis. (RE 460320/PR, manifestação do rel. Min. Gilmar Mendes, 31.8.2011., Informativo 638 STF) Tratados e isenções internas Como de sabença clara, o sistema constitucional federativo repartiu o exercício das competências tributárias entre os entes políticos. Decorrente disso, cada unidade federativa perceberá parcela de competência tributária, com autorização constitucional para o exercício do poder tributário determinado. Até em razão das compreensões do campo da legalidade, essa autorização constitucional de competência será para que sejam criados e modificados posteriormente os tributos. Igualmente, terão os entes poder para que sua alíquota seja reduzida ou se criem isenções. Por isso é natural que se afirme que o poder de conceder isenções nada mais é que o exercício da competência constitucional tributária. A norma constitucional ainda deixou clara a vedação de tratamento distinto, proibindo que isenções fossem concedidas por pessoas distintas daquelas que têm a competência definida constitucionalmente. É a vedação às isenções heterônomas. Art. 151. É vedado à União: [...] III – instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios. A questão é como compatibilizar esse comando com a possibilidade de celebração de tratados internacionais pelo Presidente da República, especialmente se esses atos internacionais repercutirem na esfera dos tributos estaduais e municipais. A doutrina diverge sobre a matéria, entretanto, vozes importantes se posicionam favoravelmente à prevalência do tratado internacional, sobre a lei interna. Assim coloca o problema Ricardo Lobo Torres: É particularidade do Direito tributário brasileiro reconhecer a prevalência do tratado internacional sobre a legislação nacional. [...] Observe-se que não se trata, a rigor, de revogação da legislação interna, mas de suspensão da eficácia da norma tributária nacional,que readquirirá a sua aptidão para produzir efeitos se e quando o tratado for denunciado.12 Assumindo a posição da supralegalidade e dispondo sobre eventual afastamento de tributos, essa disposição terá, sim, a capacidade de conceder benefícios no campo da incidência dos estados e dos municípios. Vale transcrever decisão do STF a respeito: Recurso extraordinário. ICM. Emenda Constitucional nº 23; 1983 e lei nº 3.991/1983, do Estado de São Paulo. Constituição art. 23, II, e par. 11. Importação de país signatário do GATT de mercadoria cujo similar nacional goza de isenção do ICM. Subsistência da Súmula 575, após o advento da Emenda Constitucional nº 23/1983. Precedente da Primeira Turma, no RE 109.817-SP. Recurso extraordinário não conhecido (STF – RE nº 113.759-2-SP, Rel. Min. Néri da Silveira). 12 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 45. No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça tem posição semelhante àquela adotada pela Suprema Corte, como retrata a Súmula nº 20 da Corte: Súmula 20 STJ. A mercadoria importada de país signatário do GATT é isenta do ICM, quando contemplado com esse favor o similar nacional. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal voltou a tratar do tema, mantendo a posição quanto à possibilidade de prevalência do art. 98, CTN, pela dispensa de tributos estaduais e municipais. Nesse momento, foi ainda mais claro reconhecendo que não se trata de um ato da União Federal como unidade federativa interna, mas, sim, um ato celebrado pelo Chefe do Estado nacional. DIREITO TRIBUTÁRIO. RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988 DO ACORDO GERAL DE TARIFAS E COMÉRCIO. ISENÇÃO DE TRIBUTO ESTADUAL PREVISTA EM TRATADO INTERNACIONAL FIRMADO PELA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. ARTIGO 151, INCISO III, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ARTIGO 98 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE ISENÇÃO HETERÔNOMA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO. 1. A isenção de tributos estaduais prevista no Acordo Geral de Tarifas e Comércio para as mercadorias importadas dos países signatários quando o similar nacional tiver o mesmo benefício foi recepcionada pela Constituição da República de 1988. 2. O artigo 98 do Código Tributário Nacional “possui caráter nacional, com eficácia para a União, os Estados e os Municípios” (voto do eminente Ministro Ilmar Galvão). 3. No direito internacional apenas a República Federativa do Brasil tem competência para firmar tratados (art. 52, § 2º, da Constituição da República), dela não dispondo a União, os Estados-membros ou os Municípios. O Presidente da República não subscreve tratados como Chefe de Governo, mas como Chefe de Estado, o que descaracteriza a existência de uma isenção heterônoma, vedada pelo art. 151, inc. III, da Constituição (STF – Pleno, RE nº 229.096- RS Rel. p/Acórdão Min. Cármen Lúcia, j. em 16.8.2007, DJe 10.4.2008). Como se extrai, não existe a figura da União na ordem internacional. A União é pessoa jurídica de Direito público interno, assim como os Estados e Municípios. A República Federativa do Brasil é que existe na ordem internacional, e ela é composta pela União, pelos Estados e Municípios. Não se pode dizer que um país que adote o sistema federativo não pode acordar com outros países matérias que dentro do âmbito interno sejam matérias dos Estados e Municípios. Isso seria isolar os regimes federativos dentro da ordem internacional, pois para fazer o Mercosul, por exemplo, teríamos de chamar todos os prefeitos, governadores e Presidente do Brasil, e isso seria um absurdo. Os Estados e Municípios não aparecem na ordem internacional. No regime presidencialista, o Presidente da República não atua apenas como chefe do Poder Executivo da União. É também o chefe de Estado, do Estado Republicano Federal. A celebração de um tratado internacional decorre dessa qualidade funcional. Daí, a decisão do Supremo está no sentido da possibilidade do tratado internacional conceder isenção de tributo estadual e municipal, não incidindo na proibição do art. 151, III CRFB/1988. Medidas destinadas a evitar ou a eliminar a dupla tributação internacional A partir das recomendações conceituais sobre os fenômenos de incidência tributária persiste a recomendação de que as ordens jurídicas devem evitar uma dupla imputação. Tal consignação é dada tanto para o Direito interno, como em decorrência de realidades internacionais. No que nos interessa, a prevenção ou a eliminação da dupla tributação internacional pode ser realizada não somente pelos Estados, mas também pelos próprios contribuintes, por meio de planejamento tributário internacional. Os Estados previnem ou eliminam a dupla tributação internacional tanto unilateralmente, por meio de normas internas, quanto internacionalmente, com o uso de convenções internacionais. Medidas unilaterais Relativamente às medidas unilaterais tendentes a evitar ou a eliminar a dupla tributação internacional, embora os Estados que adotam o critério da fonte possam estabelecê-las, normalmente são os que adotam o critério da residência que o fazem. Isso se explica porque o critério da residência, fazendo com que a tributação incida inclusive sobre as rendas que provêm do exterior, apresenta a potencialidade de gerar a dupla tributação internacional. Assim, para mitigar ou eliminar a dupla tributação internacional, os Estados da residência geralmente adotam, unilateralmente, ou o método da isenção ou o método da imputação, podendo ainda estabelecer outros métodos, como o da redução da alíquota e o da dedução de impostos pagos no exterior, da base de cálculo. Tudo isso será dado nas normas internas de cada nação, dependendo, naturalmente, das características de cada uma das incidência que possam repercutir nos atos de estraneidade. Medidas internacionais As convenções contra a dupla tributação internacional são normalmente bilaterais. As convenções multilaterais existentes são ainda em número bastante reduzido e só disciplinam a tributação de alguns objetos, como veículos automotores, dada a grande dificuldade de obter soluções harmonizadas com base nos diversos sistemas tributários e nos interesses particulares de cada um dos Estados. Todavia, as convenções bilaterais nem sempre eliminam completamente a dupla tributação. Frequentemente, apenas atenuam os seus efeitos, sendo que, em determinadas circunstâncias, implícita ou explicitamente, deixam que ela subsista, principalmente em se tratando de matérias não consideradas básicas, sobre as quais os Estados não entram em acordo. Com efeito, as convenções bilaterais podem resolver grande parte dos problemas de dupla tributação internacional, pois, por meio delas, os Estados concedem alívios tributários, limitando os respectivos poderes tributários, de forma bem mais abrangente do que estariam dispostos a fazê-lo indiscriminadamente. De qualquer forma, em nossas aulas, iremos analisar algumas dessas situações que possam ser utilizadas, indicando também suas características marcantes. Planejamento tributário internacional Considerando que os tributos representam importante fatia do resultado de atividades humanas com repercussão econômica, principalmente com o advento da globalização, o planejamento tributário internacional passou a ser objeto de especial atenção. Com efeito,se, por um lado, os Estados devem estabelecer sistema tributário justo e socialmente aceitável, por outro, cabe aos contribuintes organizar as suas atividades de modo a não terem de pagar a título de tributos mais do que o esperado e rigorosamente devido. É no mínimo sensato, portanto, que, dentro da lei, os contribuintes organizem as suas atividades empresariais e pessoais de modo a atraírem a menor incidência de tributos possível. Agir de modo diferente, especialmente em se tratando de atividades que envolvem somas vultuosas, pode afetar desnecessária e consideravelmente o poder de compra e a acumulação de riquezas por parte das pessoas físicas e, relativamente às empresas, pode reduzir-lhes os lucros para distribuição ou reinvestimento, ou até mesmo comprometer-lhe a competitividade. Assim é que, para a concretização de atividades com objetivos empresariais, pessoais ou outros, além dos fatores não tributários, o aspecto tributário deve ser examinado com cautela, a fim de se decidir sobre se a atividade é realmente viável, devendo ser realizada e, em o sendo, quando, como e com quem deve ser conduzida. Heleno Tôrres afirma, acertadamente, que: Como “produto”, o planejamento tributário corresponde à orientação que é dada à conduta humana na constituição dos atos jurídicos, a partir do plano elaborado para otimizar os custos com as obrigações tributárias, pela identificação e organização das melhores e mais econômicas alternativas de formação dos negócios jurídicos permitidos pela legislação, reduzindo as possibilidades de conflitos com o Fisco.13 13 TÔRRES, Heleno. Direito tributário internacional: planejamento tributário e operações transnacionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 43-44. Realmente, a finalidade do plano tributário é especificar os meios e os atos jurídicos adequados para o atendimento dos objetivos empresariais e pessoais com o menor custo possível em termos de obrigações tributárias principais e acessórias, e com o menor risco possível. Plano tributário ousado, que promova ganho tributário de curto prazo, mas que sujeita o contribuinte a penoso e dispendioso litígio, não é recomendável. Na essência, o planejamento tributário internacional não difere do planejamento tributário interno, embora o primeiro seja considerado bem mais complexo, por envolver as especificidades dos sistemas tributários de mais de um Estado. Ao se engajarem em transações internacionais, contribuintes têm aumentado o risco de se sujeitarem a níveis de tributação mais elevados, podendo ser excessivos, dada a grande possibilidade de determinados rendimentos serem abrangidos pelo âmbito da incidência tributária em dois ou mais Estados. Das práticas mais conhecidas, o planejamento tributário entre países geralmente assume uma das seguintes formas organizacionais: Uso de países com tributação favorecida: é a utilização dos benefícios fiscais (e também de órbita penal, traduzindo-se na inexistência de tipos delituosos para condutas relacionadas à evasão de impostos) concedidos por alguns países, comumente chamados de paraísos fiscais (tax havens). À luz da legislação brasileira, são considerados países com tributação favorecida aqueles que tributam a renda à alíquota máxima de 20% (art. 24 da lei nº 9.430/1996). Uso abusivo de acordos internacionais mais benéficos (treaty shopping): trata-se da utilização de interpostas pessoas para beneficiar indevidamente determinada pessoa jurídica, que não seria abrangida por acordo internacional para evitar a bitributação (cria-se uma residência fiscal fictícia em um dos países signatários do acordo, de modo a estender seus efeitos a empresas situadas em países diversos dos signatários). Sub-capitalização de empresas (thin-capitalization): situação que ocorre quando o capital da empresa é pequeno em relação ao seu passivo. A companhia realiza empréstimos com empresas vinculadas para capitalizar seus negócios em vez de utilizar capital próprio. Com essa prática, obtém vantagem tributária, uma vez que a remuneração do empréstimo – sendo despesa – irá reduzir seu lucro tributável. Preços de transferência (transfer pricing): operação de empréstimo financeiro ou de compra e venda realizada entre empresas vinculadas, localizadas em jurisdições diferentes, utilizando-se preços artificiais de modo a reduzir o lucro da empresa situada em país de maior pressão fiscal, em benefício da companhia situada em país onde a tributação é menor. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACCIOLY, Hildebrando, Nascimento e Silva, Geraldo Eulálio do. Manual de direito internacional público. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 10. ed. Universidade de Brasília, 1999. BORGES, Antônio de Moura. Convenções sobre dupla tributação internacional. Teresina: EDUFPI; São Paulo: IBDT, 1992. TORRES, Heleno. Pluritributação internacional sobre as rendas de empresas. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1997. _________. Direito tributário internacional: planejamento tributário e operações transnacionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. TRIEPEL, Heinrich. Les rapports entre le droit interne et le droit international. Recueil des Cours de l’Académie de Droit International. Paris, Hachette, tome 1, 1923. XAVIER, Alberto Pinheiro. Direito Internacional Tributário do brasil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.
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