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Artigo Cientifico TCC - Canaã - corrigido

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CANAÃ: Universo ficcional como testemunho histórico de uma época
Chrislayne Karla Sobral de Carvalho Abreu[footnoteRef:1] [1: Aluna concluinte do curso de Letras Português da Universidade Estácio de Sá. ] 
Luiz Carlos de Sá Campos[footnoteRef:2] [2: Professor Orientador do artigo da Universidade Estácio de Sá.] 
RESUMO
Este artigo visa analisar a obra Canaã, do autor José Pereira da Graça Aranha, especificamente o modo como o texto literário representa o processo imigratório no Espírito Santo e do seu impacto sobre os destinos da civilização brasileira. Pretende-se ainda discutir e compreender como os dados históricos, de natureza social, contribuem na abordagem da questão racial, da mestiçagem e a política de branqueamento com base no romance, por considerar o autor testemunha dos fatos ocorridos no século XIX e início do XX, e o cenário ter sido palco dos acontecimentos e ao mesmo tempo inspiração para o escritor. 
Palavras-Chave: Canaã. Imigração no Espírito Santo. Política de Branqueamento. 
 1. INTRODUÇÃO 
A obra Canaã, de Graça Aranha, foi considerada o primeiro romance sobre o tema imigração escrito no país. Aborda o problema da imigração estrangeira e do seu impacto sobre os destinos da civilização brasileira e as ideias expressas pelos principais personagens do livro, que são em torno dos vínculos entre raça e cultura, do processo de mestiçagem e do futuro embranquecimento da população brasileira, através da chegada dos povos europeus, especificamente nessa região: os alemães.
A vinda dos imigrantes para o Brasil, especificamente para o Espírito Santo, deu-se como resultado de um projeto da Coroa Brasileira, que visava povoar algumas regiões do país ainda não desbravadas e substituir a mão de obra escrava, abolida no período. Política esta, que estava sintonizada com os argumentos e debates da época, preocupados em buscar um suposto branqueamento da população nativa. 
Trata-se do retrato da vida de uma comunidade de imigrantes alemães que viviam no Espírito Santo e os desafios enfrentados numa nova terra, a sua Canaã, terra prometida.
O presente artigo visa realizar uma análise detalhada do romance, de uma obra que aproxima a literatura da história, abordando aspectos importantes da sociedade da época numa visão crítica da realidade brasileira.
O que motivou a pesquisa foi o fato de que no livro pode-se encontrar uma realidade por dentro de uma ficção. Uma obra que ao ler, aprende-se com ela. Não é apenas um romance com final feliz, e sim um estudo detalhado de uma época no Brasil, uma literatura de testemunho, que traz grande aprendizado e a compreensão de um povo, de uma determinada época. 
Os objetivos principais são de analisar o processo imigratório no Espírito Santo e compreender a contribuição histórica do romance tese - que tem como característica apresentar um ponto de vista e tentar demonstrar através dos fatos narrados - ao discutir assuntos tão polêmicos, tais como: as questões raciais, preconceitos, superioridade de raças, motivações políticas, amor, dentro outros. 
Quanto a Metodologia utilizada a pesquisa foi exploratória e descritiva. Exploratória, pois buscou-se uma maior familiarização com o tema ao esclarecimento de hipóteses; Descritiva, porque constitui etapa indispensável para que se possa evidenciar pensamentos e percepções de autores e estabelecer relações no texto.
 Em relação aos meios usados para buscar as informações necessárias à obtenção de um conteúdo desejável foi a pesquisa bibliográfica para fundamentação teórica do trabalho que analisa e discute trabalhos já publicados, revisões bibliográficas, com o intuito, de sintetizar ou sistematizar informações, afim de que estas fiquem mais precisas e compactas na transmissão do conhecimento. 
Pretende-se com este estudo resgatar uma obra tão importante no cenário brasileiro, de um escritor tão brilhante, e ainda contribuir para a difusão da pesquisa na comunidade acadêmica e futuras gerações, por se tratar de um livro regionalista e documental. 
2. EXPRESSÃO LITERÁRIA DE UMA ÉPOCA
O livro Canaã reflete a maneira de pensar de Graça Aranha e torna-se um instrumento para exprimir o seu modo pessoal de ver o mundo e a vida. E mistura elementos reais e ficcionais para compor sua obra, considerando a literatura como a arte de pintar a realidade,  recriá-las e produzir de maneira artística, ou seja, que possua um valor estético, donde o autor utiliza das palavras em seu sentido conotativo (figurado) para oferecer maior expressividade, subjetividade e sentimentos ao texto.
Encontramos nessa obra literária uma forte dose de naturalismo que surge como desdobramento da estética realista, voltada para a valorização da ciência como instrumento de análise e compreensão da sociedade. A literatura, portanto, estava a serviço da ciência. Deixando também o autor um toque do impressionismo, dando ênfase aos temas da natureza, principalmente de paisagens, muito bem retratada na obra:
Aumentavam as sombras. No céu, nuvens colossais e túmidas rolavam para o abismo do horizonte... Na várzea, ao clarão indeciso do crepúsculo, os seres tomavam ares de monstros... As montanhas, subindo ameaçadoras da terra, perfilavam-se tenebrosas... Os caminhos, espreguiçando-se sobre os campos, animavam-se quais serpentes infinitas... As árvores soltas choravam ao vento, como carpideiras fantásticas da natureza morta... Os aflitivos pássaros noturnos gemiam agouros com pios fúnebres. Maria quis fugir, mas os membros cansados não acudiam aos ímpetos do medo e deixavam-na prostrada em uma angústia desesperada. Os primeiros vaga-lumes começavam no bojo da mata a correr as suas lâmpadas divinas... No alto, as estrelas miúdas e sucessivas principiavam também a iluminar... Os pirilampos iam-se multiplicando dentro da floresta, e insensivelmente brotavam silenciosos e inumeráveis nos troncos das árvores, como se as raízes se abrissem em pontos luminosos... A desgraçada, abatida por um grande torpor, pouco a pouco foi vencida pelo sono; e deitada às plantas da árvore, começou a dormir... Serenavam aquelas primeiras ânsias da Natureza, ao penetrar no mistério da noite. O que havia de vago, de indistinto, no desenho das coisas transformava-se em límpida nitidez. As montanhas acalmavam-se na imobilidade perpétua; as árvores esparsas na várzea perdiam o aspecto de fantasmas desvairados... No ar luminoso tudo retomava a fisionomia impassível. Os pirilampos já não voavam, e miríades e miríades deles cobriam os troncos das árvores, que faiscavam cravados de diamantes e topázios. Era uma iluminação deslumbrante e gloriosa dentro da mata tropical, e os fogos dos vaga-lumes espalhavam aí uma claridade verde, sobre a qual passavam camadas de ondas amarelas, alaranjadas e brandamente azuis. As figuras das árvores desenhavam-se envoltas numa fosforescência zodiacal. E os pirilampos se incrustavam nas folhas, e aqui, ali e além, mesclados com os pontos escuros, cintilavam esmeraldas, safiras, rubis, ametistas e as mais pedras que guardam parcelas das cores divinas e eternas. Ao poder dessa luz o mundo era de um silêncio religioso, não se ouvia mais o agouro dos pássaros da morte; o vento que agita e perturba calara-se... Por toda parte a benfazeja tranquilidade da luz... (ARANHA, 2013, p. 174, 175)
A análise psicológica marcou a literatura realista. E a literatura tese se desenvolve numa estrutura pensada para demonstrar ao leitor a visão determinista da sociedade, proveniente do Darwinismo Social[footnoteRef:3] muito difundido na época. [3: Darwinismo social é a teoria da evolução da sociedade. Recebe esse nome uma vez que se baseia no Darwinismo, que é a teoria da evolução desenvolvida por Charles Darwin (1808-1882), no século XIX.] 
2.1. GRAÇA ARANHA: SUA VIDA
José Pereira da Graça Aranha nasceu em São Luís do Maranhão, em 21 de junho de 1868. Filho de família abastada e culta, o que favoreceu e seu desenvolvimento cultural. Estudou na Faculdade de Direito do Recife, numa época agitada. Foi aluno e discípulo Tobias Barreto Escritor, que exerceu sobreele grande influência. 
Pertencente ao movimento chamado Pré-modernismo, apresentou traços regionalistas e um evidente interesse e preocupação com a realidade brasileira. Sendo essa, uma fase de transição literária entre as escolas anteriores e a ruptura dos novos escritores com as mesmas.
Membro fundador da Academia Brasileira de Letras, porém não conseguindo realizar as reformas que desejava na Academia, abandonou-a. Sua revolta era devido à pouca aceitação das suas ideias, e por ter sido recusado o projeto de renovação que elaborara. Ele declarou, numa conferência, que a fundação da Academia foi um equívoco, um erro. Graça Aranha foi o único dos fundadores da Academia Brasileira de Letras a nela entrar sem nenhum livro publicado, contrariando o estatuto.
Aliou-se aos jovens do movimento modernista, porém mais como doutrinador, devido à sua experiência. Não teve, portanto, participação prática significativa na preparação do movimento de 1922, mas pronunciou duas conferências que provocaram escândalo, e que depois foram reunidas em Espírito Moderno em 1925. 
Antes de seguir carreira diplomática na Europa (Inglaterra, Itália, Suíça, Noruega, Dinamarca, França e Holanda) exerceu a função de juiz de direito em Porto Cachoeiro, no Espírito Santo. Recorrendo aos seus diários e à historiografia do local, dando um fundo verídico à maioria dos acontecimentos entretecidos no romance. E assim buscou inspiração e elementos para criação da sua obra mais importante, Canaã, que o projetou no início do século XX:
Acasos da fortuna levaram-no, jovem juiz municipal, a fixar-se por alguns meses em Porto Cachoeiro, pequena comunidade do Espírito Santo, onde predominavam imigrantes alemães. A observação da vida local, com seus patentes contrastes entre selva e cultura, trópico e mente germânica, era bem de molde a tentar um espírito propenso ao jogo de ideias e, ao mesmo tempo, sensível às formas e às cores da paisagem. Assim nasceu Canaã, retrato de algumas teses em choque e deleitação romântico-naturalista das realidades vitais. (BOSI, p. 368-369).
Durante sua estada em Porto Cachoeiro, hoje, Santa Leopoldina–ES, apelidou-a, carinhosamente, de “Filha do Sol e das águas” - título que até os dias de hoje permanece pela cidade, inclusive mencionada em seu romance:
Então, de uma pequena elevação que ia galgando, Milkau, o olhar espraiado na paisagem, dominava a povoação apertada entre a montanha e o Santa Maria. Cheia de luz, com sua casaria toda branca, em plena glória da cor, da claridade e da música feita dos sons da cachoeira, represa do férvido rio que se liberta em franjas de prata, a cidadezinha era naquele delicioso e rápido instante a filha do sol e das águas” (Aranha, 2014, p. 14).
Desde então, Graça Aranha tornou-se um escritor brilhante, viajou por diversos países, adquirindo muitos conhecimentos e influências, os quais foram aplicados em suas obras, na literatura brasileira.
Em síntese, Graça Aranha, romancista, ensaísta, diplomado, escritor, fundador da Academia Brasileira de Letras, morreu no Rio de Janeiro em 1931, aos sessenta e dois anos de idade. E hoje é lembrado pelo empenho na área intelectual e preocupação com a cultura e desenvolvimento do país.
Algumas de suas principais obras são: Canaã (1902; romance); Malazarte (1911: drama): A estética da vida (1920; filosofia e crítica); Correspondência de Machado de Assis e Joaquim Nabuco (1923); O espírito moderno (1925; ensaios e conferências); Manifesto de Marinetti e seus companheiros (1926); A viagem maravilhosa (1929; romance) e O meu próprio romance (1931).
2.2. CANAÃ: FICÇÃO IDEOLÓGICA
Graça Aranha foi considerado um escritor situado na fronteira entre a ficção realista-naturalista e a aventura da modernidade, voltada para a construção da independência da identidade do povo brasileiro:
O romance Canaã foi inspirado no naturalismo filosófico alemão e inaugurou uma nova fase do romance brasileiro, com a fusão entre realismo e simbolismo. Dentro desse espírito, reflete sobre uma situação histórica nova ou até então não considerada: a imigração alemã no Espírito Santo. Além disso, apresentou ao Brasil um novo gênero literário: o romance-tese, em que o debate de ideias filosóficas se integra à narrativa e muitas vezes até a supera em importância. (BRASILEIRO & FÁVERO, 2016, p. 18)
O autor imortalizou, nas páginas de Canaã, romance psicológico, de evidentes preocupações sociológicas, cenários e costumes da referida região, tão bem retratadas pelo autor. Lançado em 1902 e marcado por seu cunho social foi considerada uma tese sociológica por estar ligada ao problema da imigração europeia no Brasil. Esse trabalho projetou Graça Aranha nacionalmente. 
O autor empenhou-se em compreender e refletir a atualidade brasileira. Como testemunha ocular dos fatos por eles narrados, enriquecendo ficcionalmente a sua prosa com o sopro criativo da imaginação:
Universo ficcional do período também trouxe, nas entrelinhas do imaginário, a sociedade que o motivou, servindo de testemunho histórico. Na literatura, as tensões nacionais e o discurso da ciência estão presentes em metáforas, anedotas e personagens que representam um ‘verdadeiro’ retrato do país. (TAMANO, p. 771)
O romance surgiu no período marcado pelo Pré-Modernismo, que tinha como principais características: O realismo nos episódios e ambientes; naturalismo ao retratar com riqueza de detalhes a beleza da região; O interesse em expor e denunciar uma realidade brasileira; Uma inclinação regionalista; Uma acentuada ligação com os fatos políticos; Um interesse especial pelos tipos marginalizados; Os assuntos do dia a dia dos brasileiros e a presença de traços de ruptura com o passado estético:
Caberia ao romance de Lima Barreto e de Graça Aranha, ao largo ensaísmo social de Euclides, Alberto Torres, Oliveira Viana e Manuel Bonfim, e à vivencia brasileira de Monteiro Lobato o papel histórico de remover as águas estagnadas da belle époque, revelando, antes dos modernistas, as tensões que sofria a vida nacional. (BOSI, p.306)
Canaã apresenta memoráveis descrições da natureza brasileira ainda em estado quase selvagem. O leitor, ao acompanhar as tomadas panorâmicas que ressaltam a beleza das inexploradas terras brasileiras, pode bem visualizar o esplendor da nossa natureza: 
A estrada se alargava, outras vinham aparecendo, desconhecidas, infinitas e incertas, como são os caminhos do homem sobre a terra. A brisa fresca encanava-se pelas duas ordens fronteiras de colinas paralelas ao rio e trazia ao encontro do viajante um mugido sonoro de cascata. O rolar do Santa Maria batendo sobre as pedras amontoadas, despedaçando-se como um louco nas lajes, aumentava; e as suas águas revoltas, espumantes, recolhiam e reverberavam a luz do sol, como um vacilante espelho. Milkau ao longe, na mata ainda fumegante de névoas, uma larga mancha branca. (ARANHA, 2013, p. 13)
Estruturado em torno dos fatos decorrentes da imigração alemã no Brasil, Graça Aranha construiu em Canaã um romance de ideias, ou de tese. Ele conheceu in loco a região que serviria de cenário e possibilitaria transformar-se em inspiração para a concepção e a realização do seu romance.
O processo de estilização apresenta “a história dando raiz à ficção e a ficção ilustrando e lustrando a história” (FOGAL, p. 127). O texto artístico e a realidade estabelecem entre si influências recíprocas.
Em termos da narrativa ficcional, a história de Canaã pode ser resumida como um romance trata da vinda de um imigrante a uma terra idealizada e da sua progressiva desilusão à medida que se envolve mais concretamente com a realidade local. 
A personagem Milkau é um alemão que chega à cidade Porto de Cachoeiro onde vivem outros estrangeiros europeus. Ele conhece um comerciante chamado Roberto Schultz, que o apresenta a outro jovem alemão, o Lentz, filho de um general, e ambos desenvolvem uma grande amizade. 
Eles discutem durante a história as suas visões antagônicas, comparando, e até mesmo confrontando as duas civilizações: a brasileira e a germânica, que segundo Alfredo: 
Asteses em conflito são defendidas por dois amigos imigrantes: Milkau e Lentz: este a profetizar a vitória dos arianos, enérgicos e dominadores, sobre o mestiço, fraco e indolente; aquele a pregar a integração harmoniosa de todos os povos na natureza maternal. É o contraste entre racismo e o universalismo, entre a ‘lei da força’ e a ‘lei do amor’ que polariza ideologicamente, em Canaã, as atitudes do imigrante europeu diante da sua nova morada. (BOSI, p. 369)
Milkau representa a esperança de encontrar no Brasil uma sociedade mais justa e mais solidária do que a europeia. Utopia nascida de seu encantamento com as maravilhas da natureza e com a afabilidade e o caráter dos habitantes desse “Novo Mundo”. Lentz, ao contrário, representa a nostalgia da pátria distante, pois ainda se encontra preso às fortes raízes germânicas, muito presentes em seu exílio americano.
Shultz os apresenta ao agrimensor Sr. Felicíssimo, que estava prestes a ir medir terras em Rio Doce. Milkau então resolve acompanhá-lo, e convida Lentz para ir junto. 
Milkau termina sua casa e Lentz fica com ele e passa ser responsável, então, pelas compras e viagens da casa. Os dois tinham visões e ambições diferentes, enquanto Lentz queria sempre prosperar e ter poder, Milkau, por sua vez, queria apenas de viver na sua terra com paz e justiça. Tendo uma vida simples ao lado de pessoas boas. 
Um dia acontece uma festa no sobrado de Jacob Müller, e lá Milkau conhece Maria Perultz, uma colona que possuía uma triste e solitária história que o comove.
Maria e sua mãe moravam junto com um velho, Augusto Kraus, o filho dele, Franz Kraus, a nora Ema e o neto Moritz. Ela tinha um relacionamento amoroso com Moritz, mas a família desaprovava, pois almejava que ele se casasse com uma mulher rica chamada Emília. Quando o velho Augusto morre, tudo se complica para Maria. Ema envia Moritz a Jequitibá para ficar com Emília, ele parte contente, isso deixa Maria muito triste e desanimada.
Maria descobre que está grávida de Moritz, e anseia sua volta para contar-lhe, o que não acontece. A família começa a desconfiar, e planeja uma maneira de livrar-se dela. Começam a maltratá-la, sobrecarregam-na de serviços e eles quase não a alimentam. Um dia, trêmula e exausta Maria acaba deixando cair um prato no chão. Ema com raiva a expulsa da casa. Ela pede auxílio a um pastor da cidade, que acaba não ajudando-a por medo da família.
Ela parte para buscar abrigo e encontra uma estalagem, onde precisa empenhar suas roupas em troca de comida e lugar para dormir. Milkau a vê e com sentimento de piedade, a leva para a casa de uns colonos, onde Maria começa a trabalhar num cafezal, que também é maltratada. 
Um dia Maria acaba dando à luz ao bebê sozinha no meio do cafezal e desmaia. Uns porcos selvagens se aproximam para lamber o bebê ensanguentado e ele então acaba morrendo. A filha dos colonos presencia a cena e sem perguntar nada deduz que Maria matou seu filho e o deu de comida aos porcos. 
Uns dias depois ela vai presa na cadeia de Porto Cachoeiro. Milkau fica sabendo da história e acredita que Maria é inocente, acompanhando seu julgamento. Mas quando ela é condenada, ele a tira da prisão e ambos fogem pelas matas em busca da “terra prometida”, a bíblica Canaã, uma visão metafórica do Brasil:
Fujamos para sempre de tudo o que te persegue; vamos além, aos outros homens, em outra parte, onde a bondade corra espontânea e abundante, como a água sobre a terra. Vem... Subamos àquelas montanhas de esperança. Repousemos depois na perpétua alegria... Vamos... corre... É a felicidade que te prometo. Ela é da Terra, e havemos de achá-la... Quando vier a luz, encontraremos outros homens, outro mundo, e aí... É a felicidade... Vem, vem... -“Canaã! Canaã!...” suplicava ele em pensamento, pedindo à noite que lhe revelasse a estrada da Promissão. (ARANHA, p. 250)
2.3. IMIGRAÇÃO ALEMÃ NO ESPÍRITO SANTO 
Segundo Folgal, Graça Aranha foi destacado como o precursor do romance social no Brasil. Em sua obra, Canaã foi aclamado pela maneira com que abordou o tema sobre o processo imigratório no Espírito Santo, sobretudo como recriou o choque das ideias, o debate ideológico entre colonos e brasileiros. Essa obra tem como tema os contrastes culturais entre os imigrantes alemães no Espírito Santo e a população local.
Para melhor compreensão dos fatos, se faz necessário entender o contexto histórico vivido na época. Por que o incentivo para vindas dos estrangeiros para o Espírito Santo? Primeiro porque, segundo Rölke, a colônia passou a integrar o polo cafeeiro, segundo por causa da região portuária e por último a falta de mão de obra. Por muito tempo os governantes foram resistentes e não pareciam muito interessados em viabilizar o progresso da capitania do Espírito Santo, havia uma preocupação com a proteção das jazidas de ouro, principalmente devido à proximidade com Minas Gerais, porém o progresso era necessário:
Na sua fase colonial, foram descobertas enormes jazidas de ouro no Brasil. Estas descobertas, nos séculos XVII e XVIII, em nada contribuíram para o desenvolvimento e crescimento da capitania, mesmo se supondo que nela também se encontrariam ricas jazidas. Ao invés de exploração e desbravamento das terras capixabas, o Governo Imperial apenas adotou medidas para fortificar Vitória. Os canhões do forte São João e São Francisco Xavier comprovam esta fase. (RÖLKE, 2016, p. 152)
Historiadores especulam que, àquela época, o Espírito Santo ainda conservava a Mata Atlântica quase intocada. Ela ocupava em torno de 90% do seu território. E a população se concentrava principalmente na faixa litorânea. 
As terras que o governo colocou à disposição da imigração europeia, devido a sua topografia, matas densas e rios caudalosos, geralmente não atraíam mão de obra nacional. 
Nesse cenário as terras capixabas receberam milhares desses sonhadores europeus, de origem germânica fugindo da secular exploração e da miséria. Mas, na desconhecida terra prometida, o recomeço e a reinvenção do cotidiano não foram fáceis. O escritor expressa esse respeito na fala de Lentz: “calado, suspirava bocejando. Tudo aqui será uma grande dificuldade, pensava ele; não há estradas, não há a menor sombra de conforto, tudo é agreste e selvagem” (ARANHA, 2013, p.86).
Os imigrantes germânicos, em sua maioria originários da extinta região da Pomerânia, vieram com a missão de ocupação de extensas porções das terras ao longo do século XIX, o que representou importante marco histórico para o Espírito Santo. 
Os alemães foram os desbravadores da primeira colônia imperial no Estado, conforme Helmar:
A partir de 1846 o governo brasileiro decide criar na Província do Espírito Santo, colônias para receber imigrantes europeus. Uma se estabelece em Santa Isabel. A outra é a colônia de Santa Maria (...) conhecida como Santa Leopoldina. Para cada colono são designadas 62.500 braças quadradas, o que significa 30,25 ha. Os engenheiros responsáveis pela medição, nem sempre cumprem o estabelecido. Em muitos casos a medição é feita no olho, fazendo com que alguns lotes de terra só cheguem a medir de 3 a 5 hectares. Isto fez com que alguns colonos imigrantes se recusassem a assumir os lotes que lhes eram designados. (ROLKE, 1996, P. 90-91)
A respeito desse assunto, o autor relata, com detalhes, o total despreparo do governo nas medições e divisões de terras destinadas aos imigrantes, provocando muita insatisfação e perdas:
O agrimensor calou-se ainda mais solene e entregou-se todo ao instrumento; mirava na objetiva, abaixava-se, erguia-se para espiar por cima, voltava a retificar as lentes, torcendo-as ora de mais, ora de menos, sempre com insucesso. Já o tomava a angústia de não acertar, mas ora teimava em seus movimentos, ora abandonava o aparelho e ia mirá-lo de longe. Voltava ao instrumento, tornava a ajeitá-lo, espiava outra vez e sempre o mesmo resultado negativo. (ARANHA, p. 92)
Nesse movimento, os germânicos ajudaram a colonizar grande parte do território capixaba, com seu espírito trabalhador, senso de comunidade e disposiçãopara construir vida renovada e próspera, mesmo que na simplicidade. Porém muitos foram os desafios: língua, o clima, a falta de infraestrutura entres outros. E muitas foram as promessas não cumpridas pelo governo:
A propaganda das vantagens que receberiam na nova terra prometia tudo aquilo que procuravam: terra fértil para trabalhar e o direito a possuir essa terra e a de vivenciar sua identidade cultural ilimitadamente, o que parecia ser muito melhor que o tipo de vida que levavam no próprio país. Porém a promessa mostrou-se outra, o que se apresentou foi uma dura realidade. Não encontraram uma estrutura para o desenvolvimento e estabelecimento, mas sim uma floresta inóspita que tiveram que desbravar com ausência de recursos e apoio do governo. (SCHWARCZ, 1993, p. 11)
A Colônia Imperial de Santa Leopoldina (antiga Porto de Cachoeiro) foi considerada uma das mais prósperas do Brasil Imperial. A primeira fase da colônia vai até 1860 quando se verifica a entrada de camponeses da Província da Pomerânia (então sob o domínio do Império Prussiano), da Saxônia, Baden, Bavária, Hesse, Renânia, da Holanda, de Luxemburgo, da França e da Áustria. 
Entre 1868 e 1869 observa-se uma nova leva de pomeranos que também são dominantes nos anos entre 1872 a 1874, juntamente com centenas de poloneses (provenientes da então Prússia Ocidental, também sob o domínio do Império Prussiano). O acesso à colônia se dava pela navegação do rio Santa Maria da Victória, cuja foz se dava na baía da capital do Espírito Santo. 
Esses verdadeiros desbravadores não só ocuparam a parte que lhes fora destinada inicialmente nas montanhas capixabas, subindo cada vez mais o vale do Santa Maria e seus afluentes à procura de terras mais férteis, bem como também avançando rumo ao norte do nosso território, ampliando a fronteira produtiva para além do Rio Doce, conforme registrado pelo romancista: “Chegou em boa hora para arranjar um excelente prazo nas novas terras do Rio Doce, que se vão abrir aos imigrantes. O juiz comissário mandou pregar o edital para as medições e arrendamentos” (Aranha, p. 17).
O autor relata em sua obra a chega do imigrante alemão Milkau em busca da terra prometida: 
... cavalgava molemente o cansado cavalo que alugara para ir do Queimado à cidade do Porto do Cachoeiro, no Espírito Santo. Os seus olhos de imigrante pasciam na doce redondeza do panorama. Nessa região a terra exprime uma harmonia perfeita no conjunto das coisas: nem o rio é largo e monstruoso precipitando-se como espantosa torrente, nem a serra se compõe de grandes montanhas, dessas que enterram a cabeça nas nuvens e fascinam e atraem como inspiradoras de cultos tenebrosos, convidando à morte como um tentador abrigo... (ARANHA, 2013, p. 13)
O Espírito Santo foi, portanto, o grande personagem de Canaã, criado com o fascínio e o deslumbramento da natureza, que integra a terra no livro, mostrando um Brasil que fundiam formas diferentes de um povo que se miscigenava, aculturava e reinterpretava. Foi o quadro de uma sociedade em formação na variedade de figuras e aspectos, foi, em suma, a ecologia natural, social e humana que fez do Espírito Santo o personagem central do livro, e lhe polarizou a ação, o lirismo e a dinâmica.
2.4. IDEOLOGIA DE RAÇAS: POLÍTICA DE BRANQUEAMENTO
Em Canaã vemos a síntese racial, impulsionada pelo branqueamento, dar origem a um novo mestiço, capaz de gerar o desenvolvimento do país:
A teoria do branqueamento trazia consigo uma ambiguidade curiosa: ao mesmo tempo que considerava a mestiçagem um mal a ser impedido, via-a como possibilidade de salvação. Os mestiços eram uma realidade. Como resolver um problema posto? Branqueando as gerações subsequentes desses indivíduos. Nesse sentido, a imigração europeia, com preferência por alemães e italianos, favoreceria a aceleração desse processo. Vale ressaltar que, na política do branqueamento, a mestiçagem incentivada era uma mestiçagem controlada e direcionada, ou seja, os indivíduos deveriam procurar, sempre, pessoas de cor mais clara, se não brancas, para se relacionarem. (TAMANO, p.767)
Segundo Rölke (2016), na época da independência, a população brasileira era de 3,5 milhões de habitantes. Destes, em torno de 68% eram escravos e, sendo a esmagadora maioria, negros. Tudo isto trazia preocupações há alguns segmentos do governo. Já que não era possível eliminar a mistura indesejada, propunham-se meios de amenizá-la, a exemplo do processo de “branqueamento”:
O branqueamento está presente também em Canaã, porém apresentado como horizonte futuro para o projeto civilizatório brasileiro. O estado do Espírito Santo, mais precisamente a cidade de Porto do Cachoeiro, é o cenário narrativo. A obra abarca temas complexos como a situação dos libertos da escravidão, a ideia de inferioridade do mestiço e, sobretudo, a imigração e a política racial. (TAMANO, p.768)
Ainda dentre desse assunto Rölke (2016, p.141) os vários fatores que motivaram o Governo Brasileiro a incentivar a imigração. De forma resumida, estes eram os seguintes: havia a necessidade de preencher o espaço geográfico de enormes áreas desabitadas e também de regiões de litígio em fronteiras com outros países. Tinha que ser feito algo por causa da forte pressão internacional para a abolição da escravidão e ainda havia a preocupação de “branquear” a população brasileira. 
Havia no país uma discussão sobre o racismo como um dos responsáveis pelo atraso social brasileiro em relação às “nações mais civilizadas”. Nesse período, pensadores brasileiros defenderam a possibilidade de promover o aprimoramento racial da população através da teoria do branqueamento racial. 
A raça se tornou um fator determinante para a evolução da sociedade e o aprimoramento racial era percebido como a melhor possibilidade de promover o crescimento de uma nação.
Nessa época, a visão corrente no exterior sobre o Brasil era a de país racialmente miscigenado e degenerado.
Na virada do século XIX para o XX a população brasileira era caracterizada pela miscigenação, o que colocava o país como supostamente atrasado em relação aos países civilizados europeus. O Brasil era considerado mestiço e nessa época o “cruzamento de raças era entendido, com efeito, como uma questão central para a compreensão dos destinos dessa nação” (SCHWARCZ, 1993, p. 14).
A teoria do branqueamento assumiu caracteristicas próprias, com a existência de um discurso de possível solução para os problemas existentes no país. Ou seja, contrariamente a versão europeia que pressupunha o cruzamento como um problema, alguns pensadores brasileiros viam nesta prática a possibilidade de aperfeiçoamento racial através da eliminação gradual do elemento mestiço (SCHWARCZ, 1993, p. 231-232). 
Essa teoria de um embranquecimento através da reprodução entre as diferentes raças tomava corpo na sociedade brasileira, sendo defendido a mistura das raças, que daria origem a uma raça tipicamente brasileira.
A teoria do branqueamento que surge entre os pensadores brasileiros defendia o caldeamento da raça e pressupunha que as características da raça superior superariam a inferior e que com a miscigenação a raça negra seria suplantada e desapareceria (SEYFERTH, 1996).
O conflito entre alemães e brasileiros, imigrantes e ex-escravos é constantemente evidenciado na narrativa. A supremacia do colono europeu é fortemente percebida na fala de personagens, como, por exemplo, Felicíssimo que elogia a facilidade de assimilação, energia no trabalho dos alemães em contraste com as qualidades inferiores do brasileiro:
Esses alemães têm olho (...) se fossem brasileiros, estava tudo arrebentado. E o agrimensor continuava, nesse tom, a fazer o elogio das virtudes germânicas para o negócio, a economia, a facilidade de assimilação, a energia no trabalho, dando, como contraste a ela, as qualidades inferiores dos brasileiros”. (ARANHA, 2014, p. 22)
Em um determinado momento da viagem ao Rio Doce Milkau e Lentz discutem as suas visões sobre dominação alemã em cima das demais nacionalidades. Lentz, acredita na superioridade alemã. Elecomenta que a mistura de etnias acaba gerando uma cultura inferior. Já Milkau discorda do amigo que acredita mais na humanidade, e enxergava que a fusão de etnias causaria um rejuvenescimento da civilização:
As raças civilizam-se pela fusão; é no encontro das raças adiantadas com as raças virgens, selvagens, que está o repouso conservador, o milagre do rejuvenescimento da civilização. O papel dos povos superiores é o instintivo impulso do desdobramento da cultura, transfundindo de corpo a corpo o produto dessa fusão que, passada a treva da gestação, leva mais longe o capital acumulado nas infinitas gerações. (ARANHA, 2013, p. 36-37)
Em vários momentos no romance, são tratadas e desenvolvidas as questões principais do debate sobre a formação da “Nação” brasileira e fusão de raças como proposta para solucionar o problema:
História é um processo de fusão: só as raças estacionadas, isto é, as que se não fundem com outras, sejam brancas ou negras, se mantêm no estado selvagem. Se não tivesse havido a fatal mistura de povos mais adiantados com populações atrasadas, a civilização não teria caminhado no mundo. E no Brasil, fique certo, a cultura se fará regularmente sobre esse mesmo fundo de população mestiça, porque já houve o toque divino da fusão criadora (...) E no futuro remoto, a época dos mulatos passará, para voltar a idade dos novos brancos vindos da recente invasão, aceitando com reconhecimento o patrimônio dos seus predecessores mestiços, que terão edificado alguma coisa, porque nada passa inutilmente na terra. O País será branco em breve – suspirou Maciel. (ARANHA, 2013, p. 234)
O debate, no Brasil, enfocava o significado de uma suposta herança “racial inferior”, as possibilidades de “melhorar” essa condição, a influência das premissas geográficas sobre a população. Existia uma crença, de um dos personagens, em que o futuro do Brasil estaria diretamente ligado a imigração, especialmente europeia: 
Mas isto é a lei da vida e o destino fatal deste País. Nós renovaremos a Nação, nos espalharemos sobre ela, a cobriremos com os nossos corpos brancos e a engrandeceremos para a eternidade (...) Falando-lhe com a maior franqueza, a civilização desta terra está na imigração de europeus. (ARANHA, 2013, p. 31, 32)
O viés étnico costuma estar sempre ligado, direta ou indiretamente, às tentativas de definição de um caráter nacional brasileiro.
Canaã, portanto, tematizou, como primeiro romance, aprofundamento da questão da imigração, motivo de muitas polêmicas na época, polarizando entre duas visões: Da imigração como fator indispensável ao processo de “branqueamento” da população e da imigração como ameaça à soberania brasileira e como expressão de relativo desprivilégio da população “brasileira”. 
Graça Aranha, consciente das contradições e dos problemas não resolvidos do Brasil republicano, empregou no seu romance a tentativa de transpor para a ficção um panorama dos problemas discutidos no País, fazendo dos assuntos sociais o tema de suas ficções, criando uma literatura para cuja caraterização o termo “ficção ideológica”.	
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho demonstrou como a imigração é estilizada na obra Canaã, ou seja, como a obra representa a implementação da mão de obra imigrante, no Brasil, que havia libertado seus escravos, havendo, portanto, nesse período uma ruptura com o regime escravocrata. 
Pode-se observar que a narrativa do romance traz um registro de diferentes vozes – o imigrante, o brasileiro, o escravo – a debaterem a cultura brasileira e a formação do nacional.
Segundo o artigo de Tamano, o livro abordado não é apenas uma invenção da mente do autor, mas também uma criação historicizada, cuja matéria-prima são as atitudes e representações sociais e culturais de um tempo.
Procurou-se mostrar, com este estudo, que a literatura pode ser fonte legítima e enriquecedora para a investigação histórica, uma vez que o imaginário aprofunda e toca a vida íntima de uma sociedade, ora recriando e reforçando certos tipos de práticas e símbolos sociais, ora contestando e debatendo as estruturas do poder. 
Quanto a defesa do branqueamento, ou do “embranquecimento”, tinha como ponto de partida o fato de que, dada a realidade do processo de miscigenação na história brasileira, os descendentes de negros passariam a ficar mais brancos a cada nova prole gerada. O país via a miscigenação como algo positivo, por conta da sobreposição dos traços da raça branca sobre as outras, a negra e a indígena, que serviram de argumento para justificar a fase do Neocolonialismo. 
A maioria dos intelectuais da época foi inábil em perceber que os problemas brasileiros eram consequências da estrutura econômica e política vivida pela nação e não por causa mestiçagem.
Apesar do preconceito racial e a forma como tudo ocorreu, depois de mais de 100 anos da chegada dos imigrantes alemães à nova pátria, estes deixaram um legado cultural do período colonial que foi, sem dúvida, para as terras capixabas, o mais precioso patrimônio herdado do continente europeu. 
Deram os traços principais da cultura capixaba. As Igrejas, casarios, calçamentos guardam ainda marcas das influências destes e de outros povos que também vieram no período. 
O Espírito Santo, hoje, é o resultado de uma mistura, um encontro de raças que faz a sua história rica de tradição e costumes, e de grande riqueza cultural e econômica para o Estado.
O romance trata de vários temas que era realidade na época, como Racismo, Preconceito, Imigração, Política de branqueamento, sendo, portanto, um livro considerado regionalista e documental. 
Podemos então concluir, que tanto o testemunho quanto a ficção se misturam, mas não se anulam, cabendo ao leitor lidar com essa fronteira.
4. REFERÊNCIAS
ARANHA, Graça. Canaã. 1 ed. Rio de Janeiro: Fundação Darcy Ribeiro, 2013. 280 p.
BRASILEIRO, C.; FÁVERO, A. Literatura Brasileira III. 1ª Ed. Rio de Janeiro: SESES, 2016.
BOSI, Alfredo. História concisa da Literatura Brasileira. 3ª ed. São Paulo: Cultrix, ano 90-95. 
FOGAL, Alex A. A Estilização da Imigração em Canaã. Disponível em: <http://revistas.fw.uri.br/index.php/literaturaemdebate/article/view/628> Acesso em: 09 out.2019.
RÖLKE, Helmar Reinhard. Descobrindo Raízes. 1ª ed. Vitória: UFES, 1996.
RÖLKE, Helmar Reinhard. Raízes da Imigração Alemã: História e Cultura Alemã no Estado do Espírito Santo. Vitória: Arquivo Público do Estado do Espírito Santo, 2016.
SCHWARCZ, Lília Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil. 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
SEYFERTH, Giralda. Construindo a nação: hierarquias raciais e o papel do racismo na política de imigração e colonização. In: MAIO, M. C. e Santos, R. V. (orgs.). Raça, Ciência e Sociedade. Rio de Janeiro, Ed. Fiocruz/CCBB, 1996.
TAMANO, Luana T.O. O Cientificismo das Teorias Raciais mm O Cortiço e Canaã. Disponível em: <www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702011000300009>. Acesso em: 09 out.2019.
TUFANO, Douglas. Estudos de Literatura Brasileira. 4 ed. rev. e ampl. São Paulo: Moderna, 1988.
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