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Caso Clinico 3

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Paulo B. Linhares (nome fictício)
Discussão: Helio Elkis *
Resumo
Relato de caso pelo próprio portador de transtorno mental. Trata-
se de paciente do sexo masculino, ex-seminarista e de nível escolar
universitário. Apresentou sintomatologia psicótica repleta de revela-
ções mediúnicas, chegando a ser aposentado por invalidez. Relata
em detalhes seus primeiros sintomas e situações deles decorrentes,
assim como sua via crucis por atendimentos psiquiátricos. Posterior-
mente cancelou sua aposentadoria e vem trabalhando e vivendo
normalmente. Não considera sua sintomatologia fruto de doença.
Palavras-chave: Transtorno Psicótico; Esquizofrenia Paranóide;
Parafrenia; Transtorno Delirante
A finalidade desse imenso trabalho é contar-lhe o que aconte-
ceu comigo e as minhas experiências com relação a “mediunida-
de”. Mediunidade é uma conquista nossa e é o dom de servirmos
de intermediários entre os dois planos da criação divina: o plano
visível, o nosso, no qual vivemos hoje, com o plano invisível, que
também será nosso no futuro, mas com o qual já sintonizamos
hoje. Aquele que estuda e compreende a profundidade dessa sin-
tonização irá entender também o que é o “inconsciente”.
A mediunidade, que é mesmo “profetismo bíblico”, é, em ge-
ral, considerada como uma doença para a psiquiatria, principal-
mente no início do afloramento dela e também a psicologia a con-
sidera uma doença.
Nós fomos criados simples e ignorantes, mas perfeitos, pois
tudo o que Deus-Pai-Mãe criou é perfeito, e por nossos esforços
vamos evoluindo e nos tornando “sábios e santos”. Essa conquis-
ta da sabedoria é executada através das vidas sucessivas ou das
encarnações em corpos de carne. Nós, atualmente, somos um so-
matório de muitos “eus”, pois tudo o que fomos e aprendemos
em nossas vidas passadas faz parte do nosso inconsciente indivi-
dual. Quando o nosso “inconsciente” vem a tona, temos que se-
parar e entender o que é do “inconsciente individual” e o que é
do “inconsciente coletivo”. Essa separação e esse entendimento
são frutos de muito estudo e é o encontro com a verdade, que li-
berta (Jo 8,32).
Em 1962, estudava interno em um seminário e tinha passado
para o 1º ano do curso clássico (1º ano do 2º grau, hoje) e podia
freqüentar uma sala onde tínhamos permissão de fumar, ler jor-
nais e algumas outras regalias. Por isso comprei três maços de ci-
garros e quando ia fumar o terceiro cigarro, veio um pensamento
a minha mente como uma voz, bem no fundo do meu ser e bem
nítida mesmo, e dizia-me o seguinte: “O seu pai trabalha na roça e
até sob um sol quente para pagar os seus estudos e você ainda vai
queimar o dinheiro dele”.
Essa voz, que falou no fundo da minha mente e que sabia
tudo sobre mim, ajudou-me a não adquirir o vício do cigarro, mas
não me obrigou a nada. Tomei livremente a decisão de não fumar,
pois julguei que realmente não estava agindo corretamente com
relação a gastar o dinheiro do meu pai. Resultado: não fumei o
terceiro cigarro e doei para os colegas todos os cigarros já com-
prados e nunca mais fumei.
Cada pessoa tem a sua história, tem a sua hora certa e a hora
certa só o Pai sabe (Mt 24,36). Nos dias 7 a 10 de janeiro de 1980
vivi momentos interessantes e fantásticos, pois vinha a minha
mente revelações para mim sobre a minha pessoa e minha vida.
Enquanto não escrevia a idéia num bloco de papel, não conseguia
acalmar e trabalhar. Era o início das minhas experiências místicas
ou mediúnicas, assunto este sobre o qual nada conhecia. Foi tam-
bém o início do meu autoconhecimento como um “ser cósmico”
ou um “Eu Sou”. Foi o meu nascimento do alto (Jo 3,7).
Tinha aprendido no seminário que espiritismo era algo con-
trário ao BEM. Mas em 10/01/1980 veio a público a minha me-
diunidade e, após dar muitos escândalos no meu trabalho e em
outros lugares, não dormi nada na noite de 10 para 11/01/1980.
Entre os escândalos que dei, cito alguns.
Após escrever sobre a última revelação, que foi sobre a reen-
carnação com base na Bíblia, escrevi a seguinte frase: “Vai e fala,
senão você morre!”. Saí como um “louco” da minha sala e fui fa-
lando para a secretária: “MF, a Boa Nova chegou”. Como a minha
voz estava alterada, a secretária assustou e teve medo de mim.
Após um rápido diálogo comigo, ela desceu as escadas e falou
com os outros colegas de serviço: “O PBL ficou doido!”. Assustan-
do assim a todos, mas não dei tempo de ninguém pensar e racio-
cinar em nada, pois desci imediatamente as escadas, tremendo
como uma vara verde. Quando fui visto pelos outros colegas, to-
dos espantaram e virou uma confusão tremenda. Pedi a um cor-
retor de valores para me levar ao Provincialado dos Franciscanos
em Carlos Prates, pois queria falar com os freis, já que pensava
que iria morrer imediatamente e tinha que passar para a frente a
notícia da “Boa Nova”. Tentaram me convencer a não ir, mas não
Auto-relato
REVELAÇÕES
REVELATIONS
Casos Clin Psiquiat 1999; 1(1):3-11 3
* Professor Associado Doutor do Departamento de Psiquiatria da
Faculdade de Medicina da USP; Coordenador da Residência em
Psiquiatria do Instituto de Psiquiatria do HC-FMUSP;
Coordenador do Projesq- Projeto Esquizofrenia do Ipq- FMUSP
Endereço para correspondência:
Instituto de Psiquiatria- HC-FMUSP
Rua Ovídio Pires de Campos s/n - sala 4039
05403-010 - São Paulo- SP
E-mail: helkis@usp.br
Revelações
aceitava mesmo. Tentaram me dar água com açúcar, o que rejei-
tei até com indelicadeza, dizendo: “Isso não é para mim, é para os
fracos!”.
Tentei conversar sobre “Deus” e sobre a “Bíblia”, mas desses
assuntos ninguém sabia nada. Falei em voz alta para todos ouvi-
rem: “Essa vai ser uma grande empresa, pois é a primeira vez que
isso ocorre dentro de uma empresa”. Como vi e entendi que nin-
guém compreendia nada, então tentei fazer um milagre para pro-
var o que sentia e falava. Falei assim: “Vocês não acreditam no que
estou falando? Então para provar tudo, vou fazer um milagre aqui
agora!”. Imediatamente peguei uma tabuleta com o nome de um
corretor de valores e disse, em alto e bom som, para todos ouvi-
rem: “Vou fazer isso aqui virar um pássaro!”. Joguei-a para cima e
fiquei esperando a transformação, mas ela caiu no chão conforme
a lei da gravidade, apenas descolando o nome do corretor de va-
lores da madeira. Aí, já com um pouco de tranqüilidade, disse:
“Graças a Deus! Agora sei que não vou morrer. Tenho o tempo todo
para conversarmos, se quiserem podemos ir para a sala de reunião”.
Foi um alívio geral: como jogar água num fogo de palha.
Fomos para a sala de reunião, umas oito pessoas. Ali ficamos
conversando até às 16:00 horas, quando senti uma ânsia de vômi-
tos. Fui ao banheiro, mas não cheguei a vomitar e voltei para a sala
de reunião. Com relação as outras pessoas, apenas duas ficaram o
tempo todo, as outras foram fazendo rodízio. Toda hora que che-
gava um novo colega na sala, abraçava-o com muita emoção e, em
alguns casos, até lágrimas saíam dos meus olhos. Sentia-me com
um conhecimento imenso e com poderes totais. Era como se tudo
dependesse de mim e me sentia o dono da situação. Por isso falei,
mais ou menos, assim: “Não posso mais trabalhar com planejamen-
to, pois agora sei tudo e até o futuro”. Ali pelas 16:30 horas, chega-
ram na empresa onde trabalhava o frei TAZ e um outro frei: foi
um alívio geral. Quando ficamos os três sozinhos dentro de uma
sala, fui logo dizendo: “Frei, encontrei o ‘Reino de Deus’!”. Vi e
senti o espanto deles. O frei TAZ apenas perguntou, demonstran-
do muita apreensão e um grande susto: “O que?!”. Repeti o co-
mentário. Ele falou-me que não tinha tempo de conversar comigo
naquela hora. Saímos da sala e do lado de fora haviam muitos co-
legas querendo entender melhor o que acontecia. Quando o frei
TAZ perguntou-me em que hora poderia ir ao Provinciliado Fran-
ciscano no dia seguinte para conversar com ele, respondi de pron-
to: “Frei, para falar do ‘Reino de Deus’ qualquer hora é hora. Até a
meia-noite, se o senhor marcar, estarei lá”.
Ficou marcado que estaria lá às 16:00 horas do dia
11/01/1980. As minhasrespostas e observações assustavam cada
vez mais todo mundo. Às 18:00 horas, um dos diretores da em-
presa me falou assim: “PBL, não foi possível ouvi-lo durante o tra-
balho e quero ouvi-lo um pouco agora. Você, então, aceita que eu o
leve à sua casa e assim poderei ouvi-lo melhor. O assessor leva o seu
carro”. Concordei imediatamente e fomos. Ninguém queria que
eu dirigisse o meu carro, mas nada desconfiei. Chegando em meu
lar, a minha esposa não estava e fui logo mostrando a Bíblia para
eles, comentando o trecho sobre o divórcio e casamento (vide
Mateus 19,1-12). Após um rápido diálogo, pedi licença aos dois
amigos, pois tinha que ir buscar a EML, minha primeira esposa.
Eles não queriam que eu dirigisse, mas nada puderam fazer e ape-
nas me seguiram por alguns quarteirões, depois comentaram o se-
guinte: “Nós não estamos entendendo nada. O PBL está dirigindo
bem. Então vamos embora deixando esse negócio para lá” (isso o
assessor comentou comigo depois). Chegando na casa onde esta-
va a EML, fui logo dizendo: “Agora não haverá mais pobre na ter-
ra. A riqueza será dividida e todos terão meios para terem uma vida
digna dos filhos e filhas de Deus”. Sei que ia assustando cada vez
mais as pessoas. Era como se eu fosse um teleguiado, pois sabia o
que fazia, mas não podia parar de agir e fazer escândalos.
No dia 11/01/1980 iniciou a minha luta contra os psiquiatras,
pois estive no consultório de um deles, que deu o seguinte diag-
nóstico para mim: “Cansaço e esgotamento mental = estafa”. Re-
ceitou-me um descanso de 15 dias na Clínica Pinel (Pinel é uma
clínica de “doentes mentais”, que fica na Pampulha em Belo Ho-
rizonte). Ele mesmo assinou a guia ou o pedido de internação. Fa-
lei para o médico assim, após ter recebido o pedido para a inter-
nação: “Vamos para lá, doutor, que lá é muito bom mesmo (eu re-
feria ao Reino de Deus ou ao céu)”. Este psiquiatra disse para a
EML que eu estava muito perigoso. É interessante observar que
eu mesmo dirigia o carro em todos esses trajetos.
Às 16:00 horas fui conversar com o frei TAZ, que foi meu pro-
fessor e conselheiro espiritual no Seminário. Ele falou-me assim:
“Você precisa é de psiquiatra e não de padre”.
Foi uma grande decepção para mim e ainda é. Quando saí da
sala com o frei TAZ, o meu irmão padre, o frei DBL, estava con-
versando com a EML e falou-me que também queria conversar
comigo. Voltei para a sala com ele. Foi logo perguntando-me o
que estava acontecendo e, com muita coragem e confiança, expli-
quei: “Frei DBL, é bom demais. Não existe mais ódio em mim.
Ódio é apenas uma palavra histórica. Estou pleno de amor e enten-
dendo tudo. Só posso falar sobre o que já escrevi”.
Senti que não fui compreendido e ele me disse que iria dor-
mir em minha casa. Não concordei com ele, dizendo assim: “Hoje
não quero que você vá dormir lá”. Concordou comigo, mas quan-
do saímos da sala o frei TAZ disse: “Frei DBL, você hoje vai dor-
mir na casa do seu irmão, não vai?”. De imediato, respondi: “Hoje
não! Já combinei isso com o DBL”. Tudo o que falava assustava aos
outros. A EML interrompeu-me e disse:
- “O que é isso, PBL! Ele é seu irmão”.
- “Bom, se essa é a sua vontade, então concordo”.
Eu e ela voltamos para a nossa casa. Ali pelas 19:00 horas,
chegou em casa um outro dos meus irmãos, o JBL, e eu não que-
ria que ele dormisse em meu lar. Tentei de todas as maneiras man-
dá-lo para um hotel. Isso escandalizou muito os meus familiares.
Houve acontecimentos, nesse e noutros momentos, que fica-
ram completamente apagados da minha memória. É como se não
tivessem acontecido para mim.
Quando o frei DBL chegou em minha casa, ali pelas 21:00 ho-
ras, levou-me para o quarto para conversar. Fui logo dizendo para
ele: “Frei, é revelação atrás de revelação. É muita coisa boa mesmo.
Não posso mudar nada de momento, nem sei se posso acabar de
construir a minha casa, na rua Ramos de Freitas. Sobre isso vou
pensar depois”.
Não me lembro como fui deitar, mas acordei de noite e saí do
quarto gritando: “A última revelação: a minha mãe está aqui!”.
Coloquei todos em pavorosa confusão. Fui ajoelhar ao lado
da cama duma senhora, que estava dormindo também, naquela
noite, no meu lar. Dizia para essa senhora que ela era a minha
4 Casos Clin Psiquiat 1999; 1(1):3-11
mãe. Era na casa dessa senhora que a EML estava no dia anterior
(10/01/1980).
No dia 12/01/1980, um sábado, fui levado de ambulância à
clínica Pinel e lá cheguei como um louco para “quase” todos. Fi-
quei completamente inconsciente desde que a ambulância parou,
até que fui colocado entre os “enfermos” internados na Pinel.
Foi uma total decepção. Como não vi como lá entrei, primei-
ro tentei reconhecer o local, mas não foi possível. Depois falei
em voz alta, quase gritando, palavras sobre o sítio onde passei a
minha infância, pois o meu objetivo era encontrar com os meus
parentes, que tinham desaparecido: “Agropel!” (nome de fanta-
sia de empresa agropecuária da família). Quem compreendesse
as palavras ditas por mim iria me compreender e me levar aos
meus parentes.
Tudo era desconhecido e uma grande incógnita para mim. Aí
pensei que iria enfrentar o “nada absoluto” e me preparei para o
encontro, ajoelhando e colocando a cabeça no chão entre as mi-
nhas mãos. Esperei um pouco e nada aconteceu. Não houve o en-
contro com o “nada absoluto”.
Levantei-me e comecei a perguntar a “torto e a direito” como
tinha chegado e queria saber que lugar era aquele. Ninguém teve
a caridade de me responder. Como não era entendido e não en-
tendia ninguém, comecei a falar sobre “DEUS e o reino de
Deus”: esta era e é a minha loucura, que é viver e falar do infini-
to amor de Deus. Nesta altura vários enfermos se aproximaram
de mim para me ouvir. Senti que ninguém estava entendendo
nada. Tentei dialogar com o grupo e não houve jeito. Quando fiz
uma pergunta para conseguir parâmetros de comparação com o
Reino de Deus, que foi assim: “O que é a melhor coisa da vida?”
Um enfermo, que estava sentado num canto e bem fora do gru-
po, respondeu a minha pergunta em forma de baixaria. Aí falei
para ele assim: “Não é isso não, irmão!” Recebi dele a seguinte res-
posta e ainda girando o dedo indicador da mão direita em torno
do ouvido: “Você endoidou de vez, moço!” Mas esse diálogo fez
com que o “inconsciente coletivo dele” entrasse em sintonia com
o meu “inconsciente coletivo” e passei a pensar coisas estranhas
ao meu hábito com relação a sexo.
Como não houve diálogo com os novos amigos, cheguei a
pensar que tinha feito uma viagem em um disco voador e estava
em outro mundo. Por isso comecei a me preocupar como volta-
ria para a terra se realmente estivesse em outro planeta.
Depois de cansar de falar, entrei por um corredor e não fui se-
guido por ninguém (devo ter entrado em área proibida). Andei
um pouco e quando passava em frente a uma porta, que tinha a
parte de cima aberta, uma moça, que era uma recém-formada em
psiquiatria e que dava plantão lá, chamou-me pelo meu nome e
logo fui falando, bem aliviado: “A você estou compreendendo, mas
aí fora não compreendi ninguém”.
Ela chamou-me para conversar, convidando-me para entrar e
sentar numa cadeira em frente à mesa dela. Logo perguntei a ela:
- “Onde estou?”
- “Você está na Pampulha em Belo Horizonte”.
Ouvindo essa resposta senti um grande alívio, mas queria con-
firmação. Imediatamente perguntei:
- “Onde estão os meus parentes?”
- “Estão lá fora, à sua espera”. Respondeu ela.
- “Leve-me lá”. Pedi em seguida, pois estava ainda em dúvida.
- “Não pode”.
Esta resposta aumentou a minha dúvida e comecei a descon-
fiar que estava sendo ludibriado e enganado.
- “Então traz um deles aqui”. Voltei a pedir, quase suplicando.
- “Não pode”. Voltou a responder a psiquiatra. Nesta altura
conclui que estava sendo realmente ludibriado, enganado e não
acreditei em nada mais. Logo vi três homens (enfermeiros) prepa-
rando uns remédios e aí perguntei:
- “O que eles estão fazendo?”
- “Preparando remédio para você”. Respondeu a psiquiatra.
- “Só tomo remédio se eu ver os meus parentes”. Respondi,pois
não acreditava em nada mais.
Quando os três enfermeiros tentaram aproximar de mim, le-
vantei e encostei na parede, para me defender do ataque dos três.
Eles não se aproximaram mais e após terem voltado para o fundo
da sala a doutora me convidou novamente para sentar na cadeira,
o que fiz. Fiquei de espreita com relação aos três homens. Falei
para ela que parecia com a minha filha CL e conversamos mais
um pouco. Após três tentativas, dei uma bobeada e os três me
agarraram a força e no braço mesmo. Um agarrou-me pelos pés,
outro pela barriga e o terceiro estrangulou-me pelo pescoço, dan-
do-me uma gravata por trás, segurando o meu braço esquerdo e
forçando-o para cima nas minhas costas. Comecei a me defender,
mas mesmo assim pensei racionalmente: “Bom, eles são três e eu
um só, por mais que lute irão me vencer de todo jeito, então a úni-
ca saída é ficar passivo”. Agi, imediatamente, como pensei. Mas
um dos “homens-fera” me deu uma gravata tão apertada e forte
que me enforcava e quando senti que estava morrendo por enfor-
camento, levei a mão esquerda, que não estava mais presa, à mão
do “estrangulador” e puxei um pouco o braço dele e assim pude
respirar bem aliviado. Logo que fui colocado no chão, disse para
os três homens e a psiquiatra: “Vocês fizeram uma covardia comi-
go e não podiam ter agido assim”.
Aí a psiquiatra deu-me permissão para ir aonde estavam os
meus parentes: a EML, o frei DBL e o JBL. Mas nesta altura mi-
nhas pernas já não obedeciam a nenhum comando de minha
mente. Então a doutora pegou num dos meus braços, um dos en-
fermeiros pegou no outro e conduziram-me até onde estavam a
minha primeira esposa e os dois irmãos. Quando vi os três apa-
guei completamente e só acordei no quarto da minha casa (sabia
que tinha falado algo com eles e não recordava nada).
Os acontecimentos na Clínica Pinel poderiam ter sido com-
pletamente diferentes se o meu desejo de ver os meus parentes
fosse aceito, pois o que queria era realmente saber onde estava.
Como só recebi respostas negativas, não acreditei em nada que
me foi dito antes e depois. Tinha sentimentos de dono da situa-
ção, que tudo girava em torno de mim, que os meus desejos ti-
nham que ser realizados e compreendidos. Por causa dos “nãos”
recebidos como respostas senti-me como uma “fera enjaulada e
ferida com vara curta”. Estava sozinho, tinha que sair daquele la-
birinto e só podia contar comigo mesmo.
Logo que reconheci o meu quarto, fiquei tranqüilo e calmo, aí
ouvi uma voz falando-me assim: “Olha, tem padre no meio, que
não está entendendo nada. Então faz um escândalo aqui agora, diz
que você pecou contra Deus e quer confessar”. Acabei de ouvir o
pedido e agi imediatamente. Resultado: tomei mais remédio e
dormi por mais algumas horas.
Casos Clin Psiquiat 1999; 1(1):3-11 5
Revelações
Daí para frente a minha via crucis aos consultórios dos psi-
quiatras e psicólogos foi intensa, até o dia 10/02/1986, quando
consegui o cancelamento da minha aposentadoria por invalidez,
junto ao INSS.
Fora colocado de férias pela empresa onde trabalhava, uma fi-
nanceira e, como fiquei muito bom, voltei ao trabalho no térmi-
no das férias, mas entrei de licença para assuntos particulares do
meu cargo de professor na Faculdade de Ciências Econômicas da
UFMG, onde lecionava desde 1972.
Logo que voltei ao trabalho completamente bom muita gente
ficou espantada e queria saber o que tinha se passado comigo,
pois no dia 10/01/80, de 14:15 até às 18:00 horas, dei muito es-
cândalo no meu trabalho, falando muito e até milagre tentei fazer
para provar o que dizia sobre Igreja, Bíblia, Religião e Deus. Por
causa da reação dos amigos, procurei um psiquiatra da Unimed.
Fiz isso porque os meus ex-professores e ex-orientadores, os freis
franciscanos, principalmente o frei TAZ, não me compreenderam
e nem puderam me auxiliar ou orientar em nada.
O psiquiatra, que procurei no final de fevereiro de 1980, foi o
Dr. XLV. Logo que lhe expus o quadro, deu-me o seguinte diag-
nóstico: “Eu estava doente, muito perigoso, precisava tomar remé-
dios e fazer análise”. Não aceitei sua orientação e ainda disse a ele:
“Como posso estar doente, se estou trabalhando bem, comendo
bem, dormindo bem e vivendo imensamente bem com minha famí-
lia e com todos. Até parece que fiquei livre duma cadeia invisível e
estou livre na rua”.
Por causa desta última idéia minha é que ele continuou afir-
mando que eu estava doente, desequilibrado e necessitava de re-
médios e análise. Ele só tentou me convencer que estava doente,
o diálogo foi muito longo e maçante para mim. Esse estudioso das
mentes também não entendeu nada da minha mente.
Como ele não me convenceu, disse-me assim: “Sou um profis-
sional e como você não aceita fazer tratamento, preciso conversar
com um parente seu para expor o meu diagnóstico”.
Numa tarde de março de 1980, o Dr. XLV me telefonou con-
vidando para ir ao consultório dele em companhia do frei DBL.
Após muita conversa e já cansado de defender tanto a minha nor-
malidade como a minha saúde, então apelei para tirar do psiquia-
tra o apoio do meu irmão, dizendo: “Só aceito que estou doente se
tudo o que me ensinaram sobre Deus e religião for mentira. Se tudo
o que me ensinaram sobre a bondade de Deus, o Evangelho de Je-
sus e a Igreja for mentira, então aceito que estou doente e preciso
tratar, pois fui enganado e ludibriado durante toda a minha vida; já
que vocês julgam que estou doente”.
Enquanto falava, lágrimas rolaram dos meus olhos e esta mi-
nha observação derrotou o meu irmão DBL, que apoiava o psi-
quiatra e passou para o meu lado. Após sair do consultório, levei
o frei DBL ao Provincialado dos Franciscanos.
Disse a ele que não podia ter mais filhos. Essa foi a razão por-
que na noite de 11 para 12 de janeiro de 1980 não queria que nin-
guém dormisse em meu lar. Pois um “espírito muito forte e pode-
roso” iria reencarnar como meu filho, esperava apenas o meu
“nascimento do alto” (Jo 3,3 ou 7). Como não foi possível, então
passei a participar de um plano muito evoluído e tinha que me
preparar muito bem para cumprir a minha missão nesta encarna-
ção. Agia sobre a influência do “inconsciente coletivo”.
No final de março de 80 voltei a sintonizar com um amigo de-
sencarnado e perdi novamente o sono durante a noite. Esse ami-
go desencarnado, um espírito, é um dos meus grandes protetores
ou auxiliares hoje e o nome dele é padre Luís, que em vida foi o
meu pároco.
Como não dormia à noite, a EML telefonou para o Dr. XLV,
que orientou-a para dar-me uma grande dose de “haldol”, que ela
mesma julgou ser uma dose cavalar e por isso não me deu, voltan-
do a ligar para o doutor, que também achou demasiada a dose de
“haldol” e a reduziu bem mesmo. No domingo cedo a EML to-
mou providências. Levaram, lá em casa, o Dr. CMX, um psiquia-
tra que me deu quatro “haldol” de 5 mg e quatro “akinetons”,
pois, enquanto não apaguei na frente dele, ele não parou de me
dar remédios. Logo que meu primo HLP e a esposa chegaram em
minha casa e ouvi falar que estavam com um psiquiatra, bati a por-
ta na cara deles e ainda falei: “Psiquiatra não entra em minha casa”.
Eles espantaram com a minha reação e disseram: “O que é
isto, PBL. É apenas um amigo”.
Então eu mesmo abri a porta e respondi com muito mais cal-
ma: “Amigo! Pode entrar!”.
Mas quem lá entrou não foi um amigo, mas um digno repre-
sentante da psiquiatria materialista e influenciado por alguns es-
píritos, que não queriam o meu “desenvolvimento mediúnico, o
meu autoconhecimento e o meu equilíbrio, após o meu nascimen-
to do alto”.
Hoje sou um médium desenvolvido e católico, que desmasca-
ra qualquer espírito com pseudo-iluminação ou falsa-evolução.
Como é o caso de muitos monstros sagrados, que dão muitas
mensagens hoje em dia, que passaram a me obsediar e por isso
tive que afastar de muitos “centros espíritas”. Sendo um bom mé-
dium torna-se fácil para os espíritos darem mensagens lindas. O
principal responsável pela “obra” é o médium e não os espíritos,
pois quanto mais evoluído é um “espírito”, maisele respeita a li-
berdade plena do “médium ou do profeta”, que é quem corre to-
dos os riscos e leva todas as conseqüências negativas ou positivas.
A dose de “haldol” (4) e “akineton” (4) do Dr. CMX me co-
locou grogue por vários dias, pois não dou notícias certas de nada
que aconteceu depois. Estive no consultório do Dr. XLV, levado
pelo meu primo HLP e esposa, juntamente com minha primeira
esposa, que desencarnou em 28/01/1984. Lembro-me vagamente
dos diálogos naquelas consultas, nem mesmo sei como eu conse-
guia dirigir o carro.
Falhei vários dias no trabalho, mas não fiquei sabendo quan-
tos. Depois comecei a trabalhar só na parte da tarde.
Comecei a fazer tratamento com o Dr. XLV, que me receitou
litium e neozine. Só suportei este tratamento desumano por uns
15 dias, pois o litium foi terrível para mim. Basta dizer que quan-
do ia ler algo as letras “criavam asas” e rapidamente transforma-
vam-se em um borrão preto em toda a página. Novamente, esse
estudioso das mentes não me entendeu. Fiquei desesperado e
com auxílio de um amigo procurei outro psiquiatra no final de
abril de 1980.
O Dr. LXVI me fez exames de reações psicomotoras e me jul-
gou até com boas reações físicas. Disse-me que não precisava da-
queles remédios do Dr. XLV, mas de outros mais fracos. Nesta al-
tura comecei a analisar que cada psiquiatra agia de uma forma e
receitava remédios diferentes, então eles realmente não sabiam o
6 Casos Clin Psiquiat 1999; 1(1):3-11
que se passava comigo e assim deveria ser com todos. Passei a
confiar mais ainda no meu conhecimento bíblico e na Bíblia Sa-
grada, pois nela existem passagens onde se ouvem vozes e são vis-
tos espíritos.
O Dr. LXVI receitou-me haldol, akineton e neozine. Em maio
de 1980, falei para o Dr. LXVI que não conseguia trabalhar to-
mando aquelas drogas, pois não conseguia raciocinar e nem pen-
sar. Se fosse necessário tomá-las, então era para ele conseguir uma
licença no INSS para mim. Ele não quis, dizendo-me que não de-
via ou podia (?) me arrumar licença e que então era para que eu
ficasse sem remédios, mas logo que a “crise” (hoje a chamo de fe-
nômeno mediúnico ou místico) iniciasse era para que eu tomasse
uma dose de “haldol”, pois não iria agüentar o desenrolar da cri-
se. Logo que terminou o efeito do remédio e comecei a sentir a
presença dos “invisíveis ou espíritos”, tive um acesso muito forte
de vômitos, mas nada vomitei e não aceitei tomar remédios.
Em junho de 1980, voltei ao consultório do Dr. LXVI, que
tentou forçar-me a aceitar a tomar remédios e, perante a minha
negativa, disse-me mais ou menos assim: “Se você fosse um auxi-
liar de pedreiro, mandava uma radiopatrulha prendê-lo e interná-
lo no ‘Galba Veloso’ (outro hospital para doentes mentais) para
você tomar remédio”. O que respondi imediatamente: “A minha
sorte é que não sou, não é doutor? Também tenho curso superior,
posso lhe pagar esta consulta e também o senhor precisa dela para
o seu sustento”.
É lógico que não gostou da minha resposta e disse para a
EML que não iria tratar mais de mim porque eu era teimoso e ca-
beçudo demais.
No último trimestre de 1980 freqüentei a clínica A. Santa do
frei NK e lá me orientaram a parar de tomar remédio. Nessa clí-
nica tomei soro, fiz sessões de regressão de vida até ao útero e de
relaxamento. Numa dessas sessões vi mentalmente pela primeira
e única vez o “Velho Jó”, o espírito, que hoje é o meu mentor
principal.
Pelo meu conhecimento atual, sei que a pessoa que dirigia a
“sessão de relaxamento” não agiu corretamente. Ela mesma fez
com que o “Velho Jó” saísse da minha tela mental, pois não o co-
nhecia, mas como houve o aparecimento dele era necessário des-
cobrir a causa ou razão daquela visão. A imagem do “Velho Jó”
continua nítida em minha mente.
Levou um bom tempo para a limpeza química do meu físico.
No início de 1981, após o término dos efeitos dos remédios, vol-
tei a sentir os efeitos da mediunidade. Tive que retornar ao Dr.
LXVI, pois o meu orientador da clínica A. Santa, o psicólogo ir-
mão MPN estava de férias e os meus familiares não aceitavam que
eu ficasse sem remédios. Nesta consulta com o Dr. LXVI conver-
samos sobre “ETs” e discos voadores: “OVNIS”. Ele fez-me mui-
tas perguntas, às quais ia respondendo. Disse-me também que o
tratamento na clínica A. Santa era puro charlatanismo. Fiz o pa-
gamento à secretária, mas esqueci de assinar o cheque. O Dr.
LXVI repetiu os mesmos remédios receitados em abril/1980. Na
consulta seguinte, após a orientação sobre os remédios, apresen-
tou-me o cheque sem assinatura e falou-me, mais ou menos assim:
“Assine aqui para mim. Você estava tão ruim na vez passada que
nem assinou o cheque”. Respondi imediatamente, sem pensar:
“Pois é, doutor, e quem recebeu o cheque estava pior do que eu, pois
recebeu um papel sem nenhum valor”.
Em março/81, através de uma velha e muito amiga, a mesma
que chamei de mãe na noite de 11 para 12 de janeiro de 1980, fo-
mos avisados que, no bairro Jardim América, um médium aten-
dia e curava muitos doentes, inclusive de câncer, e como a EML
tinha câncer, o que ficamos sabendo em novembro de 1980, pe-
diu-me para levá-la lá. Foi assim que tomei conhecimento prático
da vida evangélica e caridosa dos espíritas. O atendimento era fei-
to aos domingos à tarde e de 14 em 14 dias. Na primeira vez não
aceitei fazer uma consulta para mim, mas na segunda vez consul-
tei também. Logo que entrei na sala do médium e expus o que
acontecia comigo, o médium mediunizado respondeu-me: “Você
não tem doença nenhuma, o problema é que os amigos invisíveis es-
tão querendo manter contato. Você conhece alguma coisa?”
Perante minha ignorância completa do assunto aconselhou-
me a ler as obras do André Luiz, psicografadas por Chico Xavier.
Também foi marcada uma reunião de captação para mim, após 28
dias. Religiosamente compareci no dia marcado com antecedên-
cia e nada foi feito. Quando cobrei a razão de não ter sido aten-
dido, indicaram-me um outro médium para conversar. Este era
um advogado, que recebia um caboclo e deu-me a seguinte expli-
cação, após um bom diálogo: “Nós não fizemos a reunião de cap-
tação com você porque estamos com medo. Os que estão com você
são espíritos de extremos: são muito bons ou muito maus. Por isso
aconselho-o a ler as obras da codificação do espiritismo, escritas por
Allan Kardec”.
Não é necessário dizer que as li e reli todas, ainda continuo
lendo e estudando-as.
Uma conversa premonitória com colegas da empresa (sobre
medida que evitaria sua falência, o que se concretizou posterior-
mente), também em início de 81, causou-me muita emoção e,
logo que cheguei em casa, senti uma forte manifestação mediúni-
ca. Quando cheguei na janela da sala vi um carro parado em fren-
te, na rua Ramos de Freitas. Ouvi o passageiro falar com o moto-
rista assim: “Toca, que nós não podemos entrar nessa casa, é luz de-
mais”. O carro foi embora, como também o provável auxílio.
Em setembro de 1981 tirei férias e senti uma razoável melho-
ra. Viajei sozinho para visitar o papai e outros familiares. Em Di-
vinópolis, fiquei sabendo do lado espiritual de tudo aquilo que
aconteceu comigo. Participei também de uma reunião mediúnica,
na linha de umbanda, na casa do meu irmão, com um médium
que esteve em minha casa no final de março de 1980. Tive ótima
melhora durante as férias. Alguns dias depois fiquei sabendo que
meus familiares davam-me remédio sem o meu conhecimento e,
como viajei sozinho, esta atitude desleal não pôde continuar. Com
isso, o meu físico começou a ficar livre da contaminação e da pri-
são química. Aqui estava a explicação da minha melhora.
Procurei então o psiquiatra espírita e médium Dr. MMM.
Pois raciocinei assim: “Já que estou pagando a um psiquiatra, é
melhor que vá a um psiquiatra espírita, pois assim posso apren-
der mais sobre mediunidade e espiritismo kardecista”. O Dr.
MMM me falou algo, que muito me decepcionou: “Como você
veio aqui, é porque a ‘espiritualidade’ julga que você precisa de re-
médios e por isso vou ter que receitar para você. Aqui sou psiquia-tra e não médium”.
Por orientação médica do Dr. MMM tomei “stelazine”, “to-
franil”, “semap”, “haldol” e “akineton”. Aceitei ficar com o Dr.
MMM até julho de 1983, pois este psiquiatra também era mé-
Casos Clin Psiquiat 1999; 1(1):3-11 7
Revelações
dium e, para mim, um grande conhecedor do assunto e podia me
ajudar muito. Como me enganei... e muito mesmo.
Mostrei para o Dr. MMM os meus primeiros escritos psico-
grafados. Logo que os leu, disse-me: “Esse espírito é um engana-
dor e depois que ele conquistar a sua confiança irá pedir para você
agir errado. Ele não sabe nada”.
Com essa observação dele, notei claramente que também no
plano invisível existe muita discórdia, confusão, inveja e despeito.
Em fins de abril de 1982 o meu chefe no trabalho falou em
uma reunião que iria me despedir do serviço, pois não conseguia
trabalhar e a empresa não era de assistência social. Conversei com
o chefe e pedi a ele uns dias de prazo, pois iria tentar uma licen-
ça médica junto ao INSS, já que não conseguia mesmo cumprir as
minhas responsabilidades no trabalho, devido aos efeitos colate-
rais dos remédios. No dia 25/05/1982 entrei de licença no INSS.
Em maio/82 fiz uma “sessão de sacudimento” com um mé-
dium, que trabalha com a linha de candomblé. O preto-velho Be-
nedito (um espírito) me aconselhou a continuar freqüentando
reuniões no Centro Oriente e como me orientou a reduzir as do-
ses dos remédios, tomei a decisão de parar de tomar stelazine e
tofranil em junho de 1982. Pois vi e compreendi que também a
“espiritualidade” não tinha a mesma orientação com relação aos
remédios. Tenho também comigo uma receita mediúnica, do iní-
cio de 1982, do espírito Joseph Gleber, por intermédio do mé-
dium Dr. MMM, onde foi orientado para que eu continuasse to-
mando remédio.
Logo que o efeito dos remédios terminou, voltei a sentir a li-
gação mental com a espiritualidade. Em agosto/82, dentro da
Igreja de Santa Tereza, na hora da missa, aconteceu um belo e
fantástico fenômeno mediúnico ou místico comigo e não existem
palavras para descrever o que senti. Passei por experiências in-
descritíveis. Vivi emoções tão intensas que escandalizariam qual-
quer profeta bíblico. Uma voz me contou uma vida passada do
meu espírito no início da Era Cristã. Essa revelação ou autoco-
nhecimento me deu confiança plena e certeza que tinha uma mis-
são importante a cumprir aqui na terra. Perdi completamente a
vontade de morrer, passando a ter uma imensa vontade de viver.
Em junho/83 estava tomando semap, receitado no início de
1983, um comprimido por semana, e novamente parei de tomar
remédio “no peito”, contra a orientação do psiquiatra-médium.
Em julho/83 voltei a sentir a presença dos invisíveis, uns eram
amigos e bons, outros inimigos ou despeitados. Durante uma mis-
sa, na Igreja de Santa Luzia na Cidade Nova, sintonizou comigo
uma entidade com péssima vibração. Quando conversava com ela
a minha boca ficava toda torta e, após dois dias, a EML viu o fe-
nômeno e tive que voltar ao consultório do Dr. MMM, pois meus
familiares não aceitavam que eu ficasse sem remédios.
Primeiro falei em particular com o Dr. MMM e disse para ele
mais ou menos assim: “Doutor, o senhor também é médium, sabe
muito bem que existem espíritos em todos os lugares e também que
sentimos a presença deles onde quer que estivermos, por isso, para
que eu consiga o meu equilíbrio, não posso tomar droga alguma.
Quero o seu auxílio para ajudar os meus familiares a me entende-
rem e a aceitarem que eu fique sem tomar remédios”.
Enquanto estava sozinho com o Dr. MMM ele nada falou co-
migo e confiei nele, mas ele me traiu. Para mim, ele agiu com mui-
ta desonestidade, muita falsidade e até com antiética médica, pois
apenas a EML entrou na sala, disse, dirigindo-se a ela: “O PBL pa-
rou de tomar semap, agora terá que tomar remédio mais forte: hal-
dol”. E virando-se para mim, perguntou-me: “Você toma?”.
Raciocinei rápido, tomei a decisão de nunca mais voltar ali e
que não podia dizer ao doutor psiquiatra o que ele precisava ou-
vir, pois assim pareceria mesmo “louco” para minha primeira es-
posa. Minha primeira vontade era sair do consultório e ofender
ao Dr. MMM com palavras, chamando-o de incompetente e que
nem de amigo poderia chamá-lo. Mas reprimi o primeiro ímpeto
e respondi para ele de pronto: “Tomo sim, doutor, pois Jesus disse
que o que faz mal ao homem é o que sai da boca e não o que entra
pela boca”.
Ele olhou para mim com os olhos arregalados e depois fez
uma receita, que nunca foi usada, pois quando estava na rua, fa-
lei: “Nunca mais voltarei aqui no consultório do Dr. MMM, pois
perdi toda a confiança nele”.
Quando comentei com outro psiquiatra os fenômenos acon-
tecidos em agosto de 1982, dentro da Igreja de Santa Tereza,
oportunidade em que fiquei sabendo de uma vida passada do
meu espírito, houve esse diálogo:
- “Quem você foi?”
- “Bom, doutor, isso é uma coisa muito íntima. Não dá para fi-
car contando assim”. Tentei sair da armadilha, pois cai numa ara-
puca.
- “Aqui é como um confessionário. O que você contar aqui, fica
aqui mesmo”.
Comentou o psiquiatra, fechando o cerco em cima de mim.
Mesmo assim não contei o nome, mas disse apenas o grupo, ao
qual pertenci num longínquo passado. Imediatamente senti a pre-
sença de um amigo invisível, que fez efeitos físicos perto do meu
cotovelo direito, pois os meus cabelos num círculo com raio de 3
cm ficaram eriçados. Mostrando o braço para o psiquiatra, disse:
- “É isso que falo com o senhor, doutor, veja aqui no meu braço!”
- “O que é isso?” Perguntou espantado o Dr.
- “Isso aqui, é porque tem um amigo invisível aqui, que não vejo
e nem o senhor, mas para ele dizer que está aqui faz isso comigo. Ele
quer saber quem fui há 2.000 anos atrás, pois disse para o senhor
apenas o grupo e ocultei o nome”. Falei apontando com o dedo
para o meu lado direito.
- “Porque isso acontece com você e não comigo?” Perguntou o
psiquiatra.
- “O senhor, doutor, é que deveria me explicar e não eu. O se-
nhor é que é o psiquiatra”.
- “Você daria um analista muito bom mesmo”. Arrematou o
psiquiatra.
- “Realmente, neste campo, quero ajudar sim, doutor. Mas tem
uma condição, pois vou ajudar de graça, já que para o meu sustento
vou usar do meu conhecimento de matemática”.
- “Aí você tira o meu ganha-pão!” Disse-me ele.
- “Isso já não é problema meu, mas seu. Se o senhor quer real-
mente ajudar, então estuda muito mesmo, pois existe muita gente
necessitada, que não vai aceitar de graça”.
Freqüentei também reuniões no Centro Espírita Irmão Ma-
teus, de março de 1984 a junho de 1988. Tive que parar porque
o dirigente da reunião não me compreendeu e nem aceitou a paz,
o amor e o sentimento de unificação do “Velho Jó”. O mesmo
aconteceu no Centro Espírita Bezerra de Menezes, em que estive
8 Casos Clin Psiquiat 1999; 1(1):3-11
de 1996 a 1998, onde também não foram compreendidas as
orientações de PAZ PLENA e liberdade total do “Velho Jó”.
Em maio de 1994 aconteceu um fato mundial: a morte do ído-
lo Airton Senna, que causou muita emoção no mundo inteiro e
principalmente no Brasil. Vivi um fenômeno paranormal muito
intenso mesmo e com a participação de outros, mas todos pude-
ram extravasar suas emoções, menos eu, pois fiquei como o úni-
co culpado por tudo que aconteceu no meu trabalho. Disseram
que tentei dar dois socos num colega, que tentei agarrar outra
pessoa pelos pés ao subir uma escada. Disseram ter visto isso, mas
foi um fenômeno paranormal por parte deles, pois nada daquilo
tinha acontecido no plano físico, só tiveram ilusões. Ainda recebi
um castigo para ficar alguns dias em casa e meus familiares foram
obrigados a me dar algumas doses de remédio sem o meu conhe-
cimento. Tudo isso por ordem de pessoas que não queriam a vi-
tória plena do bem, nem a PLENA PAZ na terra e a divulgação
da verdade, que liberta.
Bom, o que quero mostrar com esse trabalho e essas revela-
ções é que mediunidade nunca se trata com remédios, que só po-
dem ser usados como um paliativo por pouco tempo, mas princi-palmente com amor, compreensão, conhecimento, muita carida-
de, muito estudo teórico e prático.
Que a luz, o amor, a sabedoria e a compreensão do mestre Je-
sus possam envolver a todos os seres humanos na terra. Com esse
sentimento geral torna-se possível a construção do “Reino de
Deus na terra”, como pedimos na oração do “Pai-Nosso”, ensina-
da por Jesus de Nazaré.
Informações Complementares
Maurício Viotti Daker *
Idade: 54. Naturalidade: região das Vertentes, interior de Mi-
nas Gerais. Residência: Belo Horizonte. Cor: branco. Estado ci-
vil: casado, sendo que já foi viúvo. Profissão: ciências contábeis e
administração de empresas. Nível de educação: superior. Reli-
gião: católica (seminarista por nove anos); hoje estuda outras re-
ligiões, conhece o espiritismo, mas não se considera espírita.
Início do quadro mental em janeiro de 1980, com uma inter-
nação psiquiátrica de curta duração, conforme descrito no auto-
relato. Possui documentos médicos com os seguintes diagnósti-
cos: 296.3 (13/5/82) e 295.6 (16/5/82 e 24/11/82).
Possui três filhos do primeiro casamento e dois do segundo.
Relacionamento familiar muito bom.
Principal entretenimento: estudar religião. Teria relaciona-
mento social adequado, amigos.
Trabalhou de 1969 a 1978 e de 1986 até hoje numa mesma fir-
ma. Entre 1978 e 82 numa financeira, retirando-se com a licença
médica. De 1972 a 80 foi professor auxiliar na Faculdade de
Ciências Econômicas da UFMG.
Sempre foi auto-suficiente financeiramente, mesmo quando
afastado pelo INSS (embora com mais dificuldades).
Relato de primos, filhos de pais consangüíneos, com história
de internação psiquiátrica.
Atualmente, relata que não mais se sente “teleguiado” e sem
controle, pois entende os fenômenos que vivencia, discute e os
explica, é mais consciente. “Desenvolvi uma visão diferente com
base na prática”, ou seja, com base nos fenômenos que lhe ocor-
rem e que não dependem dele. Por exemplo, teria “interpreta-
ções” adequadas para acontecimentos como a quebra de uma
ponta de lápis, ou para a mudança repentina de sua letra enquan-
to escreve. Para suas interpretações e explicações, utiliza-se de es-
tudos religiosos/mediunidade, metafísica, parapsicologia/para-
normalidade, física, matemática e uma numerologia própria. Re-
lata apresentar alterações motoras e dores, além de alucinações
auditivas e cenestésicas/táteis. As “vozes” agora seriam mais su-
tis, “tenho uma defesa muito forte, entendo melhor”. Há muito
não estaria apresentando alucinações visuais, mas ainda poderá
“ver tudo,” pois “o futuro pertence a Deus”. Lembra que visões
ou ouvir vozes são fenômenos freqüentemente descritos na Bí-
blia. Por vezes, escreve para autoridades eclesiásticas em busca de
diálogo na compreensão de suas vivências.
Discussão do caso
Este é sem dúvida um caso extraordinário na medida em que
se trata de um auto-relato de caso, algo muito raro em nossos
dias. A comparação com o célebre caso Schreber é inevitável, tal-
vez a mais famosa e detalhada auto-descrição de um quadro deli-
rante até hoje escrita.1 Daniel Paul Schreber era um juiz da corte
de apelação da Saxônia que foi internado algumas vezes em hos-
pitais psiquiátricos entre 1884 e 1902. Em 1900, começou a escre-
ver suas “Memórias de um Doente dos Nervos”, terminadas em
1902 e publicadas no ano seguinte. As “Memórias” de Schreber
foram objeto de análise de vários autores: Baumeyer, Niederland2
e, sobretudo, Freud.3 Foi diagnosticado por seu médico Fleshig e
por Freud (que não o conheceu, somente analisou sua autobio-
grafia) como portador de dementia paranoides, antigo termo krae-
pelineano que corresponde ao que hoje denominamos esquizofre-
nia paranóide. No entanto, o início tardio do quadro psicótico, a
estrutura delirante complexa e o fato de não ter evoluído de for-
ma deteriorante, são argumentos que permitem afirmar que o
quadro clínico de Schreber esteve mais próximo de uma parafre-
nia, termo hoje englobado dentro dos transtornos delirantes. Na
realidade Kraepelin considerava a esquizofrenia e a parafrenia
como processos que não produziam uma demência completa (de-
menz em alemão) mas sim uma espécie de “enfraquecimento
mental” (verblödung).4
A idade de início é ainda uma das variáveis mais estudadas na
esquizofrenia. Já está bem estabelecido que seu pico de incidên-
cia nos homens é de 15 a 25 anos e nas mulheres 25 a 35 anos.5
Embora se saiba que a esquizofrenia pode ter seu início fora das
faixas etárias antes mencionadas, no caso em questão, o paciente
PBL apresentou as primeiras manifestações psicóticas aos 34
anos, isto é, fora da faixa esperada de idade de início da esquizo-
frenia. Por outro lado esquizofrenia não significa necessariamen-
te evolução deteriorante e a história de PBL fornece-nos evidên-
cias contrárias a esta hipótese: voltou a trabalhar em 1986, seis
anos após sua internação psiquiátrica, manteve um segundo casa-
Casos Clin Psiquiat 1999; 1(1):3-11 9
* Prof. Adjunto Doutor do Departmento de Psiquiatria e Neurologia da
Faculdade de Medicina da UFMG.
Revelações
mento, amigos, algo difícil de ocorrer em pacientes deteriorados
cognitivamente.
Um início precoce é um fator de mal prognóstico em várias
doenças mentais. No caso da esquizofrenia a idade de início pre-
coce demonstrou ser um fator preditivo para o desenvolvimento
de resistência ao tratamento neuroléptico.6 No caso de PBL po-
der-se-ia contra-argumentar que se trata de uma “esquizofrenia
de bom prognóstico”, na medida em que o paciente apresenta al-
guns dos fatores preditivos associados a uma evolução mais favo-
rável (menos deteriorante): ser casado, ausência de história psi-
quiátrica prévia, ausência de alterações prévias de personalidade,
bom relacionamento social, antecedentes de bom desempenho
escolar e no trabalho, idade de início tardio.5
O relato de PBL apresenta trechos que sugerem um quadro
de excitação (p.ex. “Sentia-me com um poder imenso e com co-
nhecimentos totais”; “Sei que ia assustando cada vez mais as pes-
soas. Era como se fosse um teleguiado, pois sabia o que fazia, mas
não podia parar de agir e fazer escândalos”). Por outro lado, o pa-
ciente recebeu o diagnóstico de 296.3 (depressão). Estaríamos na
realidade diante de um transtorno bipolar com sintomas psicóti-
cos? O pouco que sabemos de sua evolução não aponta para tal
direção e, na descrição de sua situação atual, há a informação da
presença de um quadro delirante alucinatório persistente, sem re-
missões, o que não seria esperado nos transtornos bipolares.
Penso que numa discussão de caso devemos adotar sempre a
estratégia do Advogado do Diabo: procurar refutar a hipótese do
diagnóstico principal até o limite máximo, para que as evidências
a seu favor tenham peso maior que o das evidências contrárias.
Assim temos evidências neste caso de que se trata de um transtor-
no delirante, e não de uma esquizofrenia, com relativa conserva-
ção da personalidade. No entanto, há algumas evidências de sin-
tomas maniformes e um diagnóstico anterior de depressão. O pa-
ciente poderia ter recebido tratamento correspondente (antide-
pressivos, estabilizadores do humor), mas só há a descrição de
uso de antipsicóticos (Haldol®, Neozine®, Semap®‚) que, diga-se
de passagem, quando interrompidos, levaram a um retorno da
sintomatologia (“ ...em junho/83 parei de tomar remédio ‘no pei-
to’.... em julho/83 voltei a sentir a presença dos invisíveis…”).
No caso dos transtornos delirantes a ocorrência concomitante
de sintomas do humor não é novidade. Por exemplo, comentando
a história dos transtornos delirantes, Kendler chama atenção que
Esquirol denominava “monomanias” quadros delirantes associa-
dos a humor elevado e aumento das capacidades física e mental.7
Mesmo o caso Schreber já foi interpretado como um transtorno
do humor8 uma vez que o próprio Freud descreveu sintomas de-
pressivos nas manifestações iniciais do caso.3 A própria CID-10
admite que nos transtornos delirantes persistentes “sintomas de-
pressivos ou mesmo um episódio depressivo bem marcado (F32.)
podemestar presentes de forma intermitente...” (p. 96).9
No entanto, uma questão maior na discussão deste caso: a es-
trutura do delírio do paciente PBL. Como já fora observado por
vários autores, apesar de comprometidos, os pacientes delirantes
apresentam-se relativamente preservados em outras áreas, o que
também se evidencia no paciente objeto de nossa discussão. Para
explicar tal fenômeno Esquirol cunhou o termo delírio parcial
para estes casos.7 Do ponto de vista da evolução, autores que ti-
veram a oportunidade de dar seguimento aos pacientes descritos
por Kraepelin puderam observar que os que apresentavam a cha-
mada paranóia, um transtorno delirante puro sem alucinações, ti-
veram melhor prognóstico que os parafrênicos, que tendiam para
uma evolução deteriorante em muitos dos casos.4
A estrutura delirante de PBL, descrita através do seu relato,
não parece sistematizada, mas isto pode estar limitado pelos do-
tes literários do paciente, que variam da mesma forma que o das
pessoas sãs. A maioria de seus delírios são de caráter místico-reli-
gioso, eivados por idéias de grandeza. Seu linguajar é facilmente
encontrado em pessoas que professam a religião espírita e que
nada têm de delirante.
Há, portanto, uma grande influência cultural no delírio deste
paciente e aqui surge uma questão, se quisermos classificá-lo de
acordo com a nosologia ou a nosografia atuais: para CID-10, nos
transtornos delirantes persistentes (F22) os delírios devem ser
“claramente pessoais e não subculturais” (p. 96).9 Entendemos
que o verdadeiro quadro delirante se caracteriza pela presença de
um construto pessoal tão idiossincrático que não permite ser
compartilhado com os outros. Para se ter uma idéia de um delí-
rio cuja construção é pessoal citamos o que Schreber escreveu a
um determinado ponto de sua obra:
“A capacidade de interferir deste modo sobre os nervos
de uma pessoa é, antes de mais nada, própria dos raios divinos...
Só posso encontrar a explicação para isso no fato de que o profes-
sor Fleschig de algum modo se permitiu fazer uso dos raios divi-
nos; mais tarde além do professor Fleschig, raios divinos também
se puseram em contato com meus nervos... Assim, relativamente
cedo, esta interferência teve lugar na forma de uma coação a pen-
sar...” (pp. 68-69)2
O delírio de PBL está longe de ser algo tão elaborado, cons-
truído à partir de uma teoria pessoal, como fizera Schreber. Por
outro lado surge também uma contradição se quisermos classifi-
car este paciente dentro dos critérios dos “transtornos delirantes”
da DSM IV, pois nestes casos os delírios devem ser “não bizarros”
como ocorre na esquizofrenia. A idéia de “bizarria” na DSM IV
é derivada do conceito de plausibilidade: assim é considerado bi-
zarro um delírio onde uma pessoa afirma que “...uma pessoa re-
moveu meus órgão internos e colocou os órgãos de outra pessoa
sem deixar qualquer cicatriz” e como não bizarros aquelas situa-
ções plausíveis de ocorrência na vida real, tais como “ser seguido,
envenenado, infectado, amado à distância, enganado pela esposa
ou amante” (pp. 296-297).10
Por estes critérios os delírios de Schreber são francamente bi-
zarros e os de PBL nem tanto: um dos médiums que o atendeu
chegou a afirmar que ele não tinha doença alguma, fornecendo
uma explicação apropriada dentro de uma certa cultura, compar-
tilhando de suas idéias.
Summary
Presentation of a case by the own patient, a man that once was se-
minarian and that has a high educational level. He presented psycho-
tic symptomatology full of mediumistic revelations and was retired
for some years. He describes in details his first symptoms and its
consequences, as well as his via crucis through psychiatric treatments.
Today he works and lives normally. He does not consider his sympto-
matology as originated from disease.
10 Casos Clin Psiquiat 1999; 1(1):3-11
Key-words: Psychotic Disorder; Paranoid Schizophrenia; 
Paraphrenia; Delusional Disorder
Referências Bibliográficas
1. Schreber DP. Memórias de um doente dos nervos. Rio de Ja-
neiro: Graal, 1984.
2. Carone M. Da loucura de prestígio ao prestígio da loucura
(prefácio). In: Schreber DP. Memórias de um doente dos
nervos. Rio de Janeiro: Graal, 1984:7-23.
3. Freud S. Psycho-analytic notes on the autobiographical ac-
count of a case of Paranoia (Dementia Paranoides). London:
The Hogarth Press and the Institute of Psychoanalysis, 1958.
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