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Cancer de mama Definição: Neoplasia maligna que se origina no parênquima mamário. Fisiopatologia: Proliferação descontrolada de células do parênquima mamário. Tipos Histológicos • Carcinoma ductal invasivo (CDI - 70-80%); • Carcinoma lobular invasivo (CLI - 8%); • Carcinoma misto ductal/lobular (7%); • Outros (metaplásico, mucinoso, medular, papilífero, tubular < 5%). Apresentação Clínica Anamnese Epidemiologia: É o tipo de câncer feminino mais comumente diagnosticado no mundo (após câncer de pele), com mais de 1 milhão de casos novos a cada ano. É também a principal causa de morte por câncer em mulheres. Por ano, no Brasil, são diagnosticados quase 60 mil novos casos e o número de mortes pela doença se aproxima a 15 mil. A incidência vem diminuindo nos últimos anos, principalmente por causa da diminuição no número de mulheres pós- menopausa que fazem terapia de reposição hormonal. A mortalidade também vem diminuindo por dois motivos: implementação do rastreio e avanços na terapia adjuvante. Quadro clínico: O paciente pode ser assintomático (rastreio positivo), ter sintomas de doença localizada ou já demonstrar sintomas de doença metastática ao diagnóstico. O principal sintoma relatado é a presença de um nódulo palpável, indolor e de crescimento progressivo em uma das mamas. Retração de mamilo, descarga papilar, ulceração ou infiltração da pele podem estar presentes. Questionar sobre linfonodomegalias, principalmente em cadeias axilar e supraclavicular. Sintomas de doença avançada, como dores ósseas, dispneia, cefaleia, déficits focais, hepatomegalia, icterícia ou ascite. Marcadores de gravidade: Em geral, sinais/sintomas de doença metastática são marcadores de gravidade. Emergências oncológicas, como síndrome de compressão medular ou alteração neurológica por metástases cerebrais ou carcinomatose meníngea, não são eventos raros e devem ser prontamente detectados para se evitar sequelas graves ou até mesmo óbito do paciente. A chamada crise visceral é também sinal de gravidade e se manifesta quando há grande volume de doença causando dano a órgãos-alvo, como fígado (insuficiência hepática) e pulmão (insuficiência respiratória) principalmente. Fatores de risco: Idade avançada, sexo feminino, etnia branca, obesidade (em mulheres no pós-menopausa), maior exposição ao estrogênio (menarca precoce, menopausa tardia, primeira gravidez em idade avançada, nuliparidade), consumo de bebidas alcoólicas (dose relacionada), e tabagismo (fator não claramente relacionado). Fatores de proteção: Prática de atividade física e dieta rica em frutas e vegetais. Exame Físico Exame cuidadoso das mamas, utilizar paquímetro para medir o tamanho do nódulo (útil, principalmente, no contexto de neoadjuvância). Sempre palpar cadeias linfonodais axilares e supraclaviculares bilateralmente. Abordagem Diagnóstica Os exames de imagem comumente solicitados são mamografia, ultrassonografia e ressonância magnética. A mamografia costuma ser o primeiro exame a ser solicitado quando a paciente apresenta nódulo mamário palpável. Muitas vezes, a ultrassonografia é solicitada em conjunto, pois consegue auxiliar no diagnóstico diferencial entre lesões malignas e benignas. Esses dois exames radiológicos conseguem classificar a imagem como suspeita para neoplasia (classificação Bi-Rads). Classificação Bi-Rads: • 0: exame limitado - não é possível estimar risco de ser neoplasia, necessita exames adicionais; • 1: exame normal - risco muito baixo de neoplasia, seguir com controle anual; • 2: alterações benignas - risco muito baixo de neoplasia, seguir com controle anual; • 3: alterações provavelmente benignas - risco baixo (2%) de neoplasia, seguir com controle semestral; • 4: alteração suspeita - risco alto (20%) de neoplasia, seguir com biópsia; • 5: alteração fortemente suspeita - risco muito alto (95%) de neoplasia, seguir com biópsia; • 6: alteração já comprovadamente maligna por biópsia prévia, seguir com tratamento oncológico. A ressonância das mamas é usada como rastreio de mulheres com alto risco para desenvolver câncer e pode ser usado para rastreio em mulheres com prótese mamária. Achados sugestivos devem ser conduzidos com biópsia (preferencialmente core biópsia). O tecido obtido deve ser submetido à análise histopatológica (diferencia os diversos tipos histológicos) e imuno-histoquímica (determina subtipo molecular através da presença de receptores hormonais e expressão HER2). Rastreio Mulheres de não alto risco (risco < 15% de desenvolver câncer de mama): • < 40 anos: não recomendado; • 40-49 anos: individualizar; • 50-74 anos: mamografia a cada 2 anos; • > 75 anos: mamografia a cada 2 anos, se expectativa de vida for maior que 10 anos. Mulheres com moderado risco (mulheres sem síndrome genética conhecida, mas com familiar de primeiro grau com câncer de mama): • Rastreio semelhante ao das mulheres de não alto risco. Mulheres com alto risco (história prévia de câncer de mama, ovário, peritôneo ou tuba uterina; predisposição genética; radioterapia torácica prévia): • Considerar encaminhamento a centros de referência para discutir intensificação de rastreio, realização de testes genéticos e estratégias de redução de risco. Como Estadiar Os exames a serem solicitados para completar o estadiamento dependem do tamanho da lesão/presença de linfonodos acometidos e presença de sintomas. Exames complementares: • Pacientes com tumores menores de 2 cm não necessitam de exames complementares; • Pacientes com tumores de até 5 cm ou tumores de até 2 cm com linfonodos axilares móveis podem ser estadiadas apenas com cintilografia óssea, radiografia de tórax e ultrassonografia de abdome; • Pacientes com tumores maiores de 5 cm devem ser estadiados com tomografias de tórax, abdome e pelve e cintilografia óssea. Considerar PET-CT nesse cenário. Quando há expressão de HER2 ou se o tumor for triplo negativo, solicitar ressonância magnética de crânio; • Pacientes com suspeita de linfonodo axilar comprometido devem ser submetidas à ultrassonografia + punção aspirativa por agulha fina (PAAF) para confirmação de metástase linfonodal; • Em pacientes com doença metastática, solicitar marcador tumoral CA 15,3. Estadiamento Existem três tipos de estadiamentos: anatômico, prognóstico clínico e prognóstico patológico. O estadiamento anatômico se baseia em características como tamanho da lesão, presença de metástases linfonodais ou à distância. O estadiamento prognóstico, além dessas características, leva em consideração o grau histológico do tumor, status de receptores hormonais e HER2, e testes genômicos. O estadiamento anatômico é mundialmente reconhecido e fácil de se aplicar. Os estadiamentos prognósticos dependem de testes mais sofisticados e, no cenário atual, podem auxiliar em decisões mais difíceis de tratamento (fazer ou não adjuvância, por exemplo). Estadiamento Clínico T → Tumor • Tx: tumor não avaliável; • T0: sem evidência de tumor; • Tis (CDIS): Carcinoma ductal in situ; • T1 ≤ 20 mm (T1a > 1 e ≤ 5 mm; T1b > 5 e ≤ 10 mm; T1c > 10 e ≤ 20 mm); • T2: > 20 e ≤ 50 mm; • T3 > 50 mm; • T4: extensão para parede torácica e/ou pele; • T4a: extensão para parede torácica; • T4b: ulcerações, nódulos satélites ou edema de pele; • T4c: T4a+T4b; • T4d: carcinoma inflamatório. N → Linfonodo • Nx: não avaliável; • N0: sem metástase linfonodal; • N1: linfonodos axilares ipsilaterais móveis; • N2: linfonodos axilares ipsilaterais fixos ou linfonodos em mamária interna sem acometimento axilar; • N3: linfonodos infraclaviculares ipsilateral (com ou sem linfonodo axilar), linfonodo na mamária interna ipsilateral (com linfonodo axilar) ou linfonodo supraclavicular. M → Metástase • M0: sem metástase à distância; • M1: metástase à distância. Estadiamento Anatômico • IA: T1N0M0; • IB: T0N1miM0 ou T1N1miM0; • IIA: T0N1M0 ou T1N1M0 ou T2N0M0; • IIB:T2N1M0 ou T3N0M0; • IIIA: T0N2M0 ou T1N2M0 ou T2N2M0ou T3N1M0 ou T3N2M0; • IIIB: T4N0M0 ou T4N1M0 ou T4N2M0; • IIIC: qqTN3M0; • IV: qqTqqNM1. Acompanhamento O seguimento de pacientes tratados com intensão curativa normalmente é feito com visitas a cada 3-6 meses para anamnese e exame físico. A realização de exames de imagem de rotina não é recomendada, sendo os exames solicitados apenas se houver queixas ou achados ao exame físico que possam indicar presença de doença metastática. Abordagem Terapêutica O pilar do tratamento da doença localizada é a cirurgia. Em muitos casos, é necessário complementar o tratamento com RDT, QT ou hormonoterapia. O tipo de cirurgia depende da relação tamanho da mama x tamanho do tumor e da presença de outros focos tumorais (doença multifocal). As opções normalmente são mastectomia ou cirurgias mais conservadoras (ex.: setorectomia, quadrantectomia). Sempre que é oferecida cirurgia conservadora, deve-se oferecer tratamento local complementar com RDT adjuvante. Nos casos de mastectomia, a indicação de RDT adjuvante depende de outros fatores. A abordagem da axila, seja com esvaziamento linfonodal, seja com pesquisa de linfonodo sentinela também deve ser individualizada. O tratamento da doença avançada se baseia em controle sistêmico com quimioterapia ou hormonoterapia (quando há presença de receptores hormonais). A RDT pode ser usada como estratégia de controle local (estratégia antiálgica, por exemplo). Doença Localizada (Estágio I, IIA e IIB - T2N1) Cirurgia é o tratamento preferencial (com ou sem RDT adjuvante). Pacientes com linfonodos comprovadamente acometidos devem ser submetidas à esvaziamento axilar. Em pacientes sem suspeita clínica de acometimento linfonodal axilar ou quando há suspeita clínica mas a PAAF pré-cirurgia for negativa, a indicação é proceder com pesquisa de linfonodo sentinela. Normalmente, quando há mais de três linfonodos sentinelas metastáticos, indica-se esvaziamento axilar. Após a cirurgia, deve-se levar em consideração uma série de características para indicar ou não adjuvância (QT ou HT). Pacientes com receptores hormonais positivos devem receber adjuvância pelo menos com hormonoterapia, já que nesses casos a indicação de quimioterapia deve ser individualizada. O tempo de hormonoterapia adjuvante normalmente é de 5 anos, mas pode se estender à 10 anos em alguns casos de maior risco. Quando o tumor não expressa receptores hormonais nem HER2, costuma-se oferecer QT adjuvante quando o tamanho do tumor é maior que 0,5 cm. Nos casos de câncer HER2 positivo, tumores maiores de 1 cm devem ser tratados com QT adjuvante e terapia anti-HER2 associados. Doença Localmente Avançada (Estágio IIB - T3N0, III) A maioria dessas pacientes pode receber tratamento neoadjuvante com objetivo de reduzir o tumor a ponto de ser possível a realização de cirurgia conservadora. É preferível realizar neoadjuvância com QT ao invés de HT. Quando o tumor é HER2 positivo, terapia anti-HER2 deve ser associada. Após a cirurgia, pacientes com doença receptor hormonal positiva devem ser tratadas com HT adjuvante, e aquelas com doença HER2 devem seguir terapia anti-HER2 até completar 1 ano do tratamento inicial. Em casos de tumores triplo negativos que não atingiram resposta patológica com o tratamento neoadjuvante pode-se considerar QT adjuvante. Doença Avançada (Estágio IV) Nesses casos, a melhor opção é o controle sistêmico seja com QT ou HT. A escolha depende do tipo de tumor, perfil molecular, performance da paciente, presença de comorbidades, volume de doença, local de metástase, entre outros. Autoria Autor(a) principal: Maria Fernanda Vicentini (Oncologia). Revisor(a): João Marcelo Coluna (Ginecologia e Obstetrícia, com mestrado em Fisiopatologia). Equipe adjunta: • Camilla Luna (Ginecologia e Obstetrícia, com especialização em Reprodução Humana); • Zolder Marinho Silva (Ginecologia e Obstetrícia, com mestrado em HIV/AIDS e Hepatites Virais). Referências Bibliográficas Abeloff MD, et al. Clinical Oncology. 4ª ed. Churchill Livingstone; 2008. DeVita V, et al. Cancer: Principles and Practice of Oncology. 10ª ed. Wolters Kluwer Health; 2011. Harbeck N, Gnant M. Breast cancer. The Lancet 2017; 389(10074): 1134-1150. Waks AG, Winer EP. Breast Cancer Treatment: A Review. JAMA 2019; 321(3):288-300. Witten M, Parker CC. Screening Mammography: Recommendations and Controversies. Surg Clin North Am. 2018; 98(4):667-675
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