Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Dermatites eczematosas - Teoricamente, embora existam diferenças conceituais, na prática, os termos “eczema” e “dermatite” podem ser utilizados como sinônimos. - Os eczemas correspondem a um grupo de dermatoses inflamatórias, pruriginosas, com características clínicas e histopatológicas comuns e muito bem definidas. As lesões elementares que definem os eczemas são eritema, edema, vesículas, crostas e descamação. - Apresentam alta prevalência, representando cerca 10-30% das consultas dermatológicas em diferentes populações e grupos étnicos. - Eczema de contato é o tipo mais comum, seguido do eczema atópico e seborreico. - Tipos específicos de dermatite eczematosa são mais comuns em algumas faixas etárias: dermatite das fraldas em lactentes, dermatite atópica em crianças e eczema numular em adultos mais velhos. - A característica básica do processo do eczema é de natureza seroexsudativa, que acomete a epiderme e derme papilar. Na fase aguda, há, na camada de Malpighi, exocitose e edema intercelular, o qual progride em horas, provocando “espongiose” (afastamento entre si das células malpighianas, cujas pontes intercelulares se adelgaçam, de modo que os espaços se enchem de serosidade). O processo continua e assim ocorre marcado edema intracelular, que leva à degeneração reticular. Ocorre também destruição das pontes intercelulares, levando à formação de vesículas intraepidérmicas (vesícula histopatológica), que, a depender da intensidade, podem exteriorizar-se (vesículas clínicas). Com o rompimento das vesículas clínicas, há liberação de exsudato, que, ao secar, forma crostas. Interiormente às vesículas pode- se encontrar linfócitos. Além disso, o edema intracelular altera a ceratinização normal, dando origem à formação de paraceratose (permanência de núcleos achatados nas lâminas ceratínicas mais exteriores), cuja expressão clínica é a escama. No corpo papilar, ocorre vasodilatação e edema, o que justifica o eritema. Na fase crônica, ocorre um espessamento de todas as camadas da epiderme, fazendo com que a lesão se apresente clinicamente como liquenificação. Eczema de contato (dermatite de contato) - Termo utilizado para denominar reações agudas ou crônicas a substâncias que entram em contato com a pele. É subdividida em dermatite de contato por irritante primário (DCIP) e dermatite de contato alérgica (DCA). A mais comum é a DCIP, correspondendo a 80%. Porém, em região de face, essa proporção é invertida, sendo mais comum a alérgica, correspondendo a 80% dos casos. - Pode ser doença de caráter ocupacional, acometendo preferencialmente os grupos expostos a maior número de antígenos sensibilizantes – portanto, indivíduos adultos de sociedades industrializadas e com determinadas profissões. 1. Dermatite de contato por irritante primário (DCIP) Decorre dos efeitos tóxicos e pró-inflamatórios de substâncias capazes de ativar a imunidade da pele ainda que de maneira não específica. É provocada, em geral, por substâncias alcalinas ou ácidas fracas que, não sendo capazes de provocar queimadura e/ou necrose, produzem apenas irritação cutânea. Ao entrar em contato com a pele, essas substâncias causam lesão aos queratinócitos, surgindo, posteriormente, reação inflamatória na derme papilar. Caracteriza-se por eritema, descamação e, por vezes, vesículas e bolhas, que surgem horas depois do contato com agentes irritantes mais fortes, ou depois de semanas de contato continuado com agentes irritantes fracos. O prurido, em geral, é discreto ou ausente, sendo substituído por sensação de dor ou queimação. Não há necessidade de sensibilização prévia e não ocorre a formação de células de memória; portanto, qualquer indivíduo em contato com tais substâncias poderá desenvolver a DCIP, que frequentemente ficará restrita ao local do contato. As 2 principais variáveis são a concentração da substância (até certo limite, pois caso contrário será cáustica e causará queimadura e não uma DCIP) e o tempo de exposição. Existem variações na suscetibilidade dos indivíduos e de regiões do mesmo indivíduo que dependem, principalmente, da espessura da camada córnea. Assim, é mais provável a DCIP ocorrer na pele fina do dorso da mão do que na região palmar, como também é mais fácil nas mãos finas de quem não está acostumado a serviços domésticos, pois o contato crônico e gradativo com tais substâncias é capaz de promover um espessamento epidérmico. A DCIP é frequentemente dermatose de caráter ocupacional (pedreiros, químicos, pintores, donas de casa etc.). Duas condições muito corriqueiras são a dermatite das mãos da dona de casa (detergentes e sabões são alcalinos) e a dermatite das fraldas (ação irritativa de fezes e urina). Dermatite irritativa inicial com ressecamento e espessamento Infecção eczematosa subaguda com ressecamento grave e rachadura das pontas dos dedos Destaque especial merecem as plantas da família anacardiácea, que, no Brasil, é representada pelo gênero Lithraea, produzindo o chamado poison ivy, ou dermatite venenata. Convém atentar para o fato de que essas plantas agem, de início, como agentes etiológicos irritantes. No entanto, elas têm um princípio ativo, que é o urushiol (3-N- pentadecrilcaticol) um potente antígeno e, portanto, capaz de sensibilizar a maioria das pessoas. Nessas condições, o quadro clínico passa a ser o de um verdadeiro eczema de contato, e o aspecto objetivo é basicamente o de uma erupção eritematovesicoescamosa. Fase aguda: identificar e remover o agente etiológico. Curativos úmidos com solução de Burow (solução de acetato de alumínio, que é antisséptica), trocados a cada duas a três horas. As vesículas maiores podem ser drenadas, porém, o teto não deve ser removido. Preparações de glicocorticoides tópicos das classes I e II. Nos casos graves, pode-se indicar o uso de glicocorticoides sistêmicos. Prednisona: ciclo de duas semanas, dose inicial de 60 mg, com redução gradual em 10 mg. Fase subaguda e crônica: remover o agente etiológico/patogênico. Glicocorticoides tópicos potentes (betametasona ou clobetasol) e lubrificação adequada. Com a regressão das lesões, manter a lubrificação. 1.2. Dermatite das fraldas Trata-se de uma reação inflamatória aguda, que acomete as regiões cobertas pelas fraldas, geralmente em crianças < 2 anos de idade. Sua etiopatogenia envolve diversos fatores; o principal fator desencadeante é a oclusão constante da pele pela fralda, com inevitável hidratação e consequente maceração da epiderme. A epiderme úmida é mais suscetível ao dano friccional ocasionado pela fralda, tornando-se mais permeável aos irritantes presentes na urina e nas fezes. A inflamação induzida pela irritação friccional e química promove aumento da permeabilidade, facilitando, assim, infecção secundária por Candida albicans, Proteus, Pseudomonas e B. faecalis. Manifesta-se clinicamente por lesões variadas, sendo mais intensa nas superfícies convexas, enquanto as dobras são tipicamente poupadas. Inicialmente, a pele apresenta eritema de intensidade variável, com brilho e pregueamento característicos; se houver agravamento do quadro, podem surgir edema, pápulas, vesiculação, erosões e ulcerações. Em uma fase mais tardia, o eritema perde o brilho e ocorre descamação, que pode ser intensa. Eventualmente, surgem nódulos e pápulas simulando condiloma sifilítico ou erosões e ulcerações arredondadas, o que se denomina dermatite das fraldas erosiva de Jacquet. Quando ocorre infecção por Candida albicans, a pele fica brilhante, com descamação fina e induto esbranquiçado, acometendo primordialmente as dobras e, frequentemente, com lesões satélites papulosas ou vesicopustulosas características. A dermatite de fraldas é um tipo de DCIPmais prevalente na faixa etária pediátrica. As lesões atingem a área de contato da fralda, ou seja, períneo, nádegas, abdome inferior e coxas. Podem ocorrer pela troca infrequente da fralda (fezes e urina) ou por uso de irritantes químicos como talco, óleos, desodorante. A pomada de hidrocortisona 1% duas vezes ao dia por 5 dias pode ser utilizada como tratamento para dermatite leve. O uso inapropriado de sabonete, antissépticos e loções higienizadoras exacerba o processo inflamatório. O tratamento tem como base o uso de emolientes espessos, que agem como barreira contra urina e fezes, e, principalmente, preparações com óxido de zinco, elemento com ação anti-inflamatória. Quando houver candidíase associada, cremes com nistatina ou cetoconazol devem ser aplicados. Nos casos com infecção bacteriana, antibióticos tópicos devem ser utilizados. Nos casos mais intensos, hidrocortisona a 1% pode ser administrada por curto período. O uso de preparações com corticosteroides potentes não é recomendado, pois a oclusão ocasionada pelas fraldas potencializa a ocorrência de efeitos colaterais locais, bem como eleva a absorção sistêmica. Uma complicação do uso intempestivo de corticosteroides tópicos de alta potência ou de forma prolongada no tratamento da dermatite das fraldas é o granuloma glúteo infantil. Este é caracterizado por nódulos assintomáticos, de coloração acastanhada ou violácea, na região das fraldas; não requer tratamento específico, além da suspensão do corticosteroide. 2. Dermatite de contato alérgica (DCA) A DCA pode se apresentar de 3 maneiras, sempre com muito prurido: aguda (eritema, vesículas, exsudação e crostas); subaguda (eritema, pápulas, escamas e crostas); crônica (liquenificação). Podem ocorrer apresentações intermediárias. A morfotopografia é de grande ajuda no diagnóstico. Assim, uma lesão arredondada (morfologia) no dorso do punho esquerdo (topografia) sugere DCA a algum constituinte da liga metálica do relógio; nos lóbulos auriculares, a componentes dos brincos (níquel); nos seios, a componentes do sutiã; nas tatuagens de Henna (pela substância parafenilenodiamina); em torno de ferimentos, a medicamentos tópicos, etc. Eventualmente, encontramos lesões a distância do local original, ocorrendo por disseminação do alérgeno pelas mãos do paciente ao se coçar. Por vezes observa-se adenopatia satélite não infecciosa, especialmente na região periauricular, devido às suas características anatômicas. Quadros clínicos generalizados e até mesmo eritrodermia, que caracteristicamente tende a ser mais exsudativa, podem ocorrer. Na DCA, existe envolvimento primário do sistema imunológico, sendo exemplo clássico da hipersensibilidade tipo IV da classificação de Gell e Coombs, que é a hipersensibilidade retardada ou mediada por células. Isso ocorre devido a ligação da substância química com proteínas epidérmicas e/ou dérmicas, originando um antígeno completo. As células de Langerhans processam o antígeno, apresenta-o aos linfócitos T, onde ocorre proliferação, em linfonodos regionais, desses linfócitos sensibilizados, que penetram na corrente sanguínea, disseminando-se por toda a pele. Ao segundo contato com o antígeno, os linfócitos de memória já sensibilizados, reconhecem nos pontos de contato, liberando citocinas e culminando em um processo inflamatório. O tempo desse processo será de poucos dias para alergênios com alto poder sensibilizante (7-14 dias), podendo levar anos para outros antígenos. Portanto, é esperado, na anamnese, que o paciente possa questionar, de certo modo, o diagnóstico, visto que sempre usou determinado produto sem nunca ter apresentado anteriormente aquela manifestação. Em geral, a hipersensibilidade adquirida persiste por toda a vida, embora, eventualmente, ocorra o desenvolvimento de tolerância com a exposição continuada, havendo então a cura. Agentes alergênicos: grupo para-amino do radical benzênico (anilinas, procaína, sulfas...), metais (cromo – cimento, tipografia, couros; níquel - objetos de adorno e de utilidades domésticas; mercúrio – remédios), antibióticos (neomicina, penicilina, furacin e cloranfenicol), cosméticos (eosina, hidroquinona, piragalol, azocorantes, resorcina, fenol, formol...), borracha e derivados (tiuram - 72%, mercapto - 25% e carbamato - 3% dos casos) e objetos plásticos (polivinil, polietileno, acrílicos, formaldeídos, nitrocelulose, poliamidos, componentes das epoxirresinas...). Recall dermatites: podem ocorrer em pacientes previamente sensibilizados e que, ao se exporem sistemicamente (VO, IM, IV) a um determinado agente ou relacionado a ele, seria capaz de desencadear a reativação de lesões em locais que já apresentaram previamente o mesmo quadro de eczema. A manutenção do estímulo pode levar à eritrodermia. Síndrome do Babuíno (Erupção Medicamentosa Simétrica Exantemática Intertriginosa e Flexural): decorre da absorção sistêmica (ingestão) de níquel em pacientes previamente sensibilizados. Ocorrência de erupções eczematosas simétricas que acometem axilas, cotovelos, pálpebras e laterais do pescoço, lesões anogenitais muito eritematosas que lembram a região glútea do babuíno. A ingestão de antibióticos, principalmente betalactâmicos (amoxicilina) são as causas mais frequentes. DCA por tatuagem de henna que contém parafenilenodiamina DCA ao couro O diagnóstico é realizado por meio da história clínica e exames clínico e histopatológico. Na história clínica busca-se por: início das lesões, número de surtos, história prévia de DC, atividades ocupacionais, outras atividades/hobbies, contato com substâncias químicas... No exame físico deve ser observado se há presença de lesões eczematosas em qualquer fase evolutiva, localização da lesão e características da lesão. O mapeamento topográfico é de grande valia no diagnóstico de DCA: Procura-se correlacionar o local do eczema com várias exposições; assim, no eczema de pescoço, devemos investigar joias e adereços de metais e plásticos, perfumes, casacos, gravatas, corantes de tecidos, goma de colarinho... Os testes de contato (patch-test) são úteis na identificação de substâncias as quais o paciente é alérgico. No entanto, deve ser interpretado com critério, pois substâncias testadas, ainda que positivas, podem não estar relacionadas com o problema atual, e a substância envolvida pode não ter sido testada. Em 1996, o Grupo Brasileiro de Estudos em Dermatite de Contato (GBEDC) determinou as substâncias da bateria padrão de alergênios. São 22 elementos presentes em testes internacionais, acrescidos de mais 8 substâncias relacionadas com medicamentos tópicos e de uso frequente no nosso meio, totalizando 30 substâncias. Esta bateria padrão é aplicada em todo paciente com suspeita de DCA. Por vezes, dependendo da ocupação profissional ou de lazer do indivíduo, é possível adicionar elementos ao teste. O teste é realizado aplicando-se a substância suspeita sobre uma região do corpo, e verificando se há indução de lesão clínica do tipo eczematoso naquele local. O paciente, para ser submetido aos testes de contato, deve, no momento da aplicação, apresentar sua dermatose em fase inativa. Os testes, em geral, são aplicados no dorso dos pacientes, por se tratar de área que, pela sua extensão, possibilita colocação de número adequado de substâncias. Após 48 h da aplicação, os testes são retirados e a primeira leitura é feita. A segunda leitura é feita em 96 h. Os critérios adotados para leitura são os preconizados pelo International Contact Dermatitis Research Group de 1981, dentre os resultados temos: ✓ (-) negativo; ✓ (+) discreto eritema com algumas pápulas; ✓ (++) eritema, pápulas e vesículas; ✓ (+++) intenso eritema, pápulas e vesículas confluentes;Bateria padrão brasileira de testes de contato Substância [ ] % Substância [ ] % Antraquinona 2% Neomicina 20% Bálsamo do Peru 25% Nitrofurazona 1% Benzocaína 5% Parabenos 15% Bicromato de K 0,5% Parafenilenodiamina 1% Butilfenol-p-3o 1% Perfume-mix 7% Carba-mix 3% PPD-mix 0,4% Cloreto de Co 1% Prometazina 1% Colofônia 20% Propilenoglicol 10% Etilenodiamina 1% Quatemium 2% Formaldeído 1% Quinolina-mix 6% Hidroquinona 1% Resina epóxi 1% Irgasan 1% Sulfato de níquel 5% Kathon CG 0,5% Terebintina 10% Lanolina 30% Timerosal 0,05% Quando existe múltipla positividade a diferentes grupos das baterias testadas, pode-se estar diante de um caso de angry back skin syndrome (síndrome da pele excitada), reproduzindo inúmeros falso-positivos. Em caso negativo, recomenda-se a exposição à luz, pois esta pode potencializar algumas das reações da DCA. O paciente não pode estar em uso de corticosteroide tópico no local do teste e de corticosteroide sistêmico, especialmente em doses imunossupressoras por 2 semanas. Mesmo que o paciente esteja em vigência do uso de anti-histamínicos, não é necessário suspendê-los para a realização do teste de contato, pois não há correlação com o mecanismo fisiopatogênico do eczema de contato. Não deve molhar as fitas ou se expor ao sol. A prática de atividade física é desaconselhada para não descolar as fitas ou molhá-las com suor. O diagnóstico diferencial é feito principalmente com os outros eczemas, dermatofitoses, dermatofítides, psoríase, parapsoríase e farmacodermias. Imunoglobulina intravenosa pode causar quadro de eczema assim como eczema disidrótico. Em relação ao tratamento, inicialmente deve-se interromper a exposição ao se identificar o agente etiológico. A conduta dependerá da fase e da extensão do quadro: ✓ Fase aguda Inicia-se o tratamento com banho ou compressas, preferencialmente com soluções antissépticas como solução de permanganato de potássio 1:40.000 durante as primeiras 24 h. A solução de ácido bórico 1 a 2% pode ser usada, devendo ser evitada no tratamento de grandes áreas em crianças por seu potencial nefro e neurotóxico. ✓ Fase subaguda (menos exsudativa) Utilizamos pasta d’água ou creme de corticosteroide tópico. ✓ Fase crônica Está indicado o uso de corticosteroide em pomada, fita oclusiva ou, mesmo, injeção intralesional. Em casos generalizados ou de eritrodermia, indicam-se corticosteroides sistêmicos (prednisona 0,5 mg/kg de peso). Os imunomoduladores tópicos, inibidores da calcineurina (tacrolimo e pimecrolimo), mostraram-se bastante efetivos no tratamento da dermatite de contato das mãos. Embora não haja atuação sobre o mecanismo fisiopatogênico, o uso de anti-histamínicos de primeira geração pode ser útil na redução do prurido, graças à sedação. Tratamento tópico: pomadas/ géis de glicocorticoides tópicos (classes I a III). As vesículas maiores podem ser drenadas, porém o teto não deve ser removido. Curativos úmidos com compressas embebidas em solução de Burow, que devem ser trocadas a cada duas a três horas. A DCA propagada pelo ar pode necessitar de tratamento sistêmico. O pimecrolimo e o tacrolimo são efetivos na DCA, porém em menor grau do que os glicocorticoides. Tratamento sistêmico: os glicocorticoides estão indicados nos casos graves e na DCA propagada pelo ar. Prednisona em dose inicial de 70 mg (adultos), com redução gradual em 5 a 10 mg/dia, no decorrer de um período de uma a duas semanas. Nos casos em que pode não ser possível evitar totalmente o alérgeno responsável pela DCA propagada pelo ar, a imunossupressão com ciclosporina oral pode se tornar necessária.. Dermatite atópica (DA) - A dermatite atópica (DA) é a principal manifestação cutânea da atopia. Esta foi definida por Cocca, em 1925, como a tendência hereditária a desenvolver alergia a antígenos alimentares ou inalantes, manifestando-se por eczema, asma ou rinite alérgica. Sinonímia: eczema atópico, prurigo disseminado e prurigo diatésico. Trata-se de doença genética, de herança poligênica, com evidentes alterações imunológicas, fortemente influenciada por fatores ambientais e, eventualmente, emocionais. - Nas últimas décadas, a frequência da doença atópica (rinite alérgica, asma e eczema atópico) tem aumentado em todo o mundo. Sua prevalência varia em função da localização geográfica, das condições climáticas, do nível socioeconômico e da poluição. Os dados obtidos no ISAAC (International Study of Asthma and Allergies in Childhood) demonstram que, no Brasil, a prevalência da dermatite atópica é similar à de outras partes do mundo, estando em torno de 10 a 15%. - A DA está frequentemente associada ao nível sérico elevado de imunoglobulina e a história pessoal ou familiar de atopia. A ocorrência de história familial de atopia em até 70% dos casos de DA assegura o caráter hereditário, sendo provavelmente de herança poligênica. Os níveis de AMP-cíclico (AMPc) intracelulares estão diminuídos nos macrófagos, basófilos e linfócitos. Os baixos níveis de AMPc podem ser responsáveis pelo aumento da liberação de histamina, diminuição dos linfócitos T supressores e aumento da produção de IgE. A inflamação aguda na DA está associada a um predomínio na expressão de IL-4 e IL-13, enquanto a inflamação crônica na DA está associada a níveis aumentados de IL-5, do fator de estimulação de colônias granulocíticas e macrofágicas, da IL- 12 e do IFN- gama. Por conseguinte, a inflamação cutânea na DA exige um padrão bifásico de ativação das células T. - Histopatologicamente, a dermatite atópica é caracterizada por alterações epidérmicas, incluindo espongiose (edema epidérmico), com graus variados de acantose e hiperqueratose, acompanhadas de um infiltrado linfohistocítico na derme. Na fase aguda, a espongiose leva a um alongamento e eventual ruptura dos anexos intercelulares, com a formação de vesículas. - Clinicamente, trata-se de dermatose crônica de evolução flutuante, podendo ocorrer em qualquer idade a partir do 3o mês de vida. O prurido é intenso e está sempre presente. A constante escarificação (arranhões) leva a um ciclo vicioso de prurido → escarificação → erupção → prurido → escarificação. A morfologia e a distribuição das lesões variam com a idade: ✓ Bebês e crianças < 2 anos (DA infantil) Lesão pruriginosa, eritematosa, escamosa e com crostas na superfície extensora dos membros, no tronco, face e couro cabeludo. Inicia-se em regiões malares e dissemina-se para regiões como couro cabeludo, pescoço, fronte, punhos, face de extensão de membros e área das fraldas. Dentição, infecções, distúrbios emocionais, alterações ambientais (temperatura e umidade), imunizações e outros fatores podem agravá-la ou desencadeá-la. Acredita-se que antígenos alimentares como ovo, castanha, leite, soja, peixe, galinha e aditivos alimentares têm papel importante até o final dessa fase. Observa-se que ao final do segundo ano de vida algumas crianças têm resolução espontânea (< ½ casos ), enquanto o restante evolui para lesões menos exsudativas, mais papulosas, que possuem tendência a liquenificação, acometendo dobras antecubitais e poplíteas, punhos, pálpebras, face e pescoço. Ocorre ainda o aumento a hipersensibilidade a inalantes (pelo de animais, pólen, penas e poeira domiciliar – ácaros). Pode haver ainda incidência aumentada, nos atópicos, de hipersensibilidade a níquel, neomicina, oleorresinas e lanolina. O surgimento de vesiculação aguda, localizada ou generalizada, sugere infecção secundária bacteriana ou viral. ✓ Crianças > 2 anos e adolescentes (DA pré-puberal) As lesões tornam-se papulodescamtivas e liquenificadas em uma distribuição flexural, principalmente na fossa anticubital e poplítea, com aspecto volar dos pulsos, tornozelos e pescoço. Tais lesões são sujeitas a agudização. ✓ Adultos Lesão geralmentemais localizada, com liquenificação predominante, mas também pode ser vista em formas exsudativas, eczema crônico nas mãos, dermatite facial e eczema palpebral também são frequentemente observados. - Outras manifestações de atopia (asma, rinite) ocorrem em 50% dos casos de DA, podendo haver alternância ou concomitância entre elas ao longo da vida. Urticária e reações anafiláticas são mais frequentes. A ictiose vulgar é encontrada em 30 a 40% dos doentes e alopecia areata é mais frequente nos atópicos. Alguns pacientes podem evoluir para eritrodermia esfoliativa. - São considerados estigmas atópicos a dupla prega de Dennie-Morgan (presente em outras condições eczematosas das pálpebras), sinal de Hertoghe (rarefação do terço distal dos supercílios, devido à coçadura), tubérculo de Kaminsky, protuberância centrolabial superior, hiperlinearidade palmar, ceratose pilar (face lateral dos braços e coxas - praticamente, 100% dos casos), dermatite das mãos, e ceratose punctata palmoplantar (mais frequente em negros). - O acometimento ocular na DA ocorre entre 25 e 40%, sendo a dermatite palpebral a mais comum. A ceratoconjuntivite (conjuntivite alérgica) pose se manifestar como prurido ocular bilateral, cansaço, irritação ou sensação de corpo estranho, chegando, eventualmente, à ulceração ou perfuração da córnea. O prurido intenso e mantido leva ao ceratocone - conificação da córnea (1% dos casos). - Ocorre aumento de suscetibilidade a infecções fúngicas (dermatofitose), virais (molusco contagioso, verrugas vulgares e herpes simples) e bacterianas, principalmente estafilocócica. A erupção variceliforme de Kaposi compreende o eczema herpeticum e o eczema vaccinatum, quando ocorre infecção aguda, localizada ou generalizada, respectivamente pelo herpes-vírus simples e vaccínia. Clinicamente, se traduz pelo aparecimento de vesículas generalizadas, umbilicadas e de início súbito; em geral, tem bom prognóstico se tratada adequadamente. A ocorrência de colonização maciça por S. aureus nas lesões, sobretudo agudizadas de DA, mesmo na ausência de evidências de infecção bacteriana, faz com que consideremos a DA virtualmente sempre infectada, o que eventualmente ocorre. - O diagnóstico é basicamente clínico, corroborado muitas vezes por uma história pessoal ou familial de atopia; eosinofilia e aumento da IgE circulante podem reforçá-lo. A confirmação diagnóstica é feita por meio dos critérios apresentados na tradicional classificação de Hanifin e Rajka. É necessária a associação de um mínimo de 3 critérios maiores a 3 menores. - A gravidade da DA é avaliada tanto pelo EASI (eczema area severity index) quanto pelo SCORAD (scoring atopic dermatitis), que tem sido empregado na validação de estudos clínicos para determinação de eficácia terapêutica. Ambos avaliam a área da pele acometida e a gravidade de uma lesão em especial, destacando-se: eritema, edema, presença de crostas, sinais de escoriação e liquenificação. No SCORAD, considera-se ainda a avaliação do paciente ou cuidador incluindo perguntas sobre a qualidade do sono e intensidade do prurido nos últimos três dias que antecederam a avaliação. As notas podiam variar de zero a um máximo possível de 103 pontos. Critérios para o diagnóstico de DA CRITÉRIOS MAIORES (3 ou mais) Prurido Envolvimento facial e extensor em lactentes e crianças Morfologia e distribuições típicas Dermatite – crônica ou cronicamente recorrente Liquenificação flexural em adultos História pessoal ou familiar de atopia – asma, rinite alérgica, dermatite atópica CRITÉRIOS MENORES (3 ou mais) Catarata (anterior subcapsular) Infecções (cutâneas) – S. Aureus, HSV Ceratocone IgE elevada Ceratose pilar Intolerância à lã Conjuntivite – recorrente Intolerância alimentar Dermatite das mãos – não alérgica irritativa Palidez facial/eritema facial Dermatite dos mamilos Pitiríase alba Dermografismo branco Prega infraorbital (linhas de Dennie-Morgan) Eczema – acentuação perifolicular Prurido quando transpira Escurecimento periorbital Queilite Hiperlinearidade palmar Reatividade cutânea imediata (tipo 1) Ictiose Xerose ✓ 0 a 14: dermatite atópica leve; ✓ 15 a 40: dermatite atópica moderada; ✓ >41: dermatite atópica grave. Neste contexto, a soma total seria 83 e nos casos de dermatite grave e desfigurante na face acrescentam-se 10 pontos; nesse caso, a pontuação máxima será 93; - Como diagnóstico diferencial devem ser consideradas a dermatite seborreica, dermatite de contato, eczema numular, escabiose, psoríase (principalmente palmoplantar), dermatite herpetiforme e doença de Darier. Em crianças, por apresentarem erupção cutânea semelhante à DA, devem sempre ser consideradas algumas síndromes associadas a imunodeficiências (de hiper-IgE, Wiskott-Aldrich, agamaglobulinemia, ataxia-telangiectasia, síndrome de Hurler, síndrome de Jung, síndrome de Netherton), distúrbios metabólicos (fibrose cística, fenilcetonúria, doença celíaca, acrodermatite enteropática), infiltrativas (langerhoses) e genodermatoses (displasia ectodérmica anidrótica). - Os principais objetivos do tratamento são evitar a coçadura, a xerodermia e afastar os agravantes. É importante recomendar o corte das unhas semanalmente, visando assim diminuir as escoriações. A terapêutica tópica para hidratação da pele é feita com emolientes, especialmente óleo de amêndoas doces, vaselina ou alfa-hidroxiácidos, associados ou não a cremes de corticosteroide de potência variável segundo a área, o tipo de lesão a ser tratada e a idade do paciente. Antibióticos tópicos com atividade antiestafilocócica têm suas indicações. Como alternativa aos corticosteroides tópicos, pode-se usar pastas e cremes com coaltar 2-4%. O uso de emolientes deve ser incentivado, apesar de maior probabilidade do desenvolvimento de eczema de contato à lanolina. Recentemente, foram introduzidos, com grande sucesso, preparados contendo diversos lipídios, acompanhados de palmidrol a 0,3%, que é uma substância com propriedades anti- inflamatórias. A ureia – um hidratante clássico – deve ser evitada pelo fato de, por vezes, produzir ardor e irritação. - Sistematicamente, indica-se antibioticoterapia antiestafilocócica, mesmo na ausência de evidência franca de infecção secundária, com ótimos resultados, sobretudo em casos de piora súbita. Algumas vezes, são necessários cursos prolongados, pois recidivas são frequentes. Os anti- histamínicos anti-H1 são úteis por sua ação periférica e ação sedativa central, especialmente à noite. Temos utilizado o cetotifeno por meses, com bons resultados, nos casos associados à bronquite asmática. Casos extensos podem ser indicação de corticoterapia sistêmica, e, eventualmente, indica- se PUVA-terapia, com bons resultados. A ciclosporina, por via oral, tem sido empregada nos casos mais rebeldes com boa resposta; no entanto, com todos os eventuais efeitos colaterais conhecidos e recidivas frequentes. IFN-gama é bastante efetivo, sobretudo em crianças. Recentemente, novos imunomoduladores macrolídeos de uso tópico (tacrolimo e pimecrolimo) têm sido utilizados no tratamento da dermatite atópica. Ambas as substâncias atuam de maneira semelhante aos corticosteroides, tendo ação anti-inflamatória e inibindo a liberação de interleucinas, embora de maneira bem mais seletiva, sem causar os efeitos colaterais indesejáveis tão conhecidos. Em casos de DA grave e recalcitrante, tem sido empregado com resultados insatisfatórios o omalizumabe, que é um anticorpo monoclonal humanizado proveniente de recombinação de DNA do tipo IgG anti-IgE. 1. Erupção atópica da gestação Foi descrita por Ambros-Rudolph et al. em 2006, a partir dos achados de um estudo retrospectivo de 505 pacientes gestantes. As principais características desta entidade são o surgimento de dermatose pruriginosa antes do3o trimestre gestacional, história pessoal ou familiar de atopia e o caráter recorrente nas gestações subsequentes. Durante a gestação existe uma alteração imunológica que parece participar da etiopatogênese da erupção atópica da gestação (EAG). Verifica-se uma alteração do padrão de linfócitos T helper (TH), com redução das citocinas do perfil Th1 e aumento da produção e secreção de citocinas para o eixo Th2, principalmente ILs 4 e 10. Clinicamente chama atenção o prurido intenso, difuso, que parece se intensificar no período noturno. A maioria das pacientes apresenta eczema em superfícies flexoras dos membros superiores e inferiores, além de face, região cervical e torácica. Em uma pequena parcela de gestantes não predomina o padrão de eczema. Nessas, o quadro se caracteriza por lesões tipo prurigo, acometendo predominantemente o tronco e as extremidades. Laboratorialmente a maioria dos estudos cita um aumento da IgE sérica total. O tratamento se baseia em emolientes, corticoterapia tópica e anti-histamínicos sistêmicos para controle sintomático (dexclorfeniramina – categoria B da FDA; loratadina – categoria B da FDA). Corticoterapia sistêmica e fototerapia com UVB-NB são opções de segunda linha para casos refratários. O prognóstico é excelente. Não há qualquer prejuízo ao feto em desenvolvimento. Dermatofitoses - Embora o termo dermatofitose não corresponda à classificação taxonômica, ficou consagrado para designar doenças causadas por um grupo de fungos que, geralmente, em vida parasitária, vivem à custa da queratina da pele, dos pelos e das unhas. Agrupam-se sob essa denominação fungos dos gêneros Trichophyton, Microsporum e Epidermophyton, cujas características morfológicas, fisiológicas e antigênicas os relacionam entre si. Como sinonímia, há tinea. - Atualmente, são descritas mais de 40 espécies de dermatófitos. Destas, 30 são patogênicas para o homem. Têm distribuição universal, mas com certas peculiaridades (T. soudanense, na África; T. concentricum, na Ásia, na América Central e no Brasil); essas variações de frequência dependem de migrações. A prevalência é maior nas zonas tropical e subtropical, em regiões de clima quente e úmido. A mesma espécie pode produzir quadros clínicos bem diferentes e, inclusive, com seletividade de grupos etários (T. tonsurans pode produzir tinea do couro cabeludo na infância e dermatofitose corporis no adulto). O T. rubrum é o agente etiológico mais frequente. Etiopatogenia - Os dermatófitos, na fase assexuada (parasitismo), são constituídos por três gêneros: Microsporum, Trichophyton e Epidermophyton. - Na fase sexuada (saprofitismo no meio ambiente) foram identificados dois gêneros: Nannizzia (Microsporum) e Arthroderma (Trichophyton). - No gênero Microsporum: M. audouinii, com localização preferencial no couro cabeludo; M. canis, acometendo couro cabeludo e pele glabra; M. ferrugineum e o M. gypseum, acometendo couro cabeludo e tronco. Podem, raramente, acometer a unha, ocorrendo com maior frequência em pacientes imunodeprimidos. Há casos de onicomicoses em pacientes imunocompetentes por meio do contágio de gatos domésticos doentes. - No gênero Trichophyton: T. rubrum, podendo produzir praticamente quase todos os quadros clínicos de dermatofitose e tendo como característica principal certa resistência aos tratamentos; T. schoenleinii, poupando apenas as dobras naturais, os pés e as mãos; T. tonsurans, poupando a área da barba e das pregas dos pés e das mãos; T. yaounedi, comprometendo exclusivamente o couro cabeludo. - O gênero Epidermophyton só tem uma espécie patogênica para o homem: E. floccosum, com preferência pelas dobras e pelos pés, podendo atingir também tronco e unhas, porém não acomete o couro cabeludo e a barba. - O grau de exuberância das manifestações depende do grau de hipersensibilidade celular (linfócito T). - Com relação ao habitat, os dermatófitos podem ser divididos em três grupos: antropofílicos, zoofílicos e geofílicos. Os antropofílicos produzem pouca ou nenhuma reação de hipersensibilidade – mais resistentes ao tratamento. Zoofílicos e geofílicos provocam no ser-humano quadros mais inflamatórios e exuberantes, inclusive com tendência à cura espontânea. As fontes de infecção podem ser, consequentemente, o homem, determinados animais e o solo. - Hipersensibilidade celular específica é dada pelo teste intradérmico à tricofitina (extrato de várias culturas de dermatófitos), com resposta papuloeritematosa em 24-48h. CLÍNICA - Diversos quadros clínicos bem individualizados podem ser descritos: 1. Dermatofitose do corpo (tinea corporis) O quadro clássico é representado por lesões eritematoescamosas, circinadas, isoladas ou confluentes, uma ou várias com crescimento centrífugo, de modo que a parte externa é mais ativa; por vezes pode ter aspecto concêntrico. Para se obter um resultado fidedigno em um exame micológico da lesão de dermatofitose, deve-se procurar obter a amostra na periferia da lesão circinada. Há casos com predominância de vesícula e, até mesmo, pústula; outras vezes, a lesão é em placa eritematoescamosa e de evolução lenta; o prurido está sempre presente. São localizações usuais os braços, a face e o pescoço. 2. Dermatofitose marginada (tinea cruris) Caracteriza-se por lesão eritematoescamosa, a partir da prega inguinal. Avançando sobre a coxa, com nitidez de borda (daí o nome marginada), a lesão pode invadir o períneo e propagar-se para as nádegas, a região pubiana e, até mesmo, o baixo-ventre. O não acometimento da pele da bolsa escrotal demonstra a especificidade da ceratinofilia dos dermatófitos e ajuda no diagnóstico diferencial com a candidíase. É muito pruriginosa e, por isso, a liquenificação é frequente. 3. Dermatofitose dos pés (tinea pedis) Três formas são descritas: ✓ Aguda Eczematoide, representada por vesículas em geral plantares e digitais, é causada pelo T. mentagrophytes var. mentagrophytes e manifesta-se com vesículas, sendo bastante pruriginosa. ✓ Intertriginosa Causada pelo T. mentagrophytes var. interdigitale, de localização nas pregas interpododáctilas (predominantemente), caracterizada por fissuras e maceração; ✓ Crônica Caracterizada por lesões descamativas pouco pruriginosas, acometendo praticamente toda a região plantar. 4. Dermatofitose imbricada (tinea imbricata) Apresenta lesões escamosas em círculos concêntricos ou que formam arabescos, atingindo grandes áreas do corpo e muito pruriginosas. O agente etiológico é o T. concentricum. É típica de determinadas regiões, como a Polinésia (“tokelau”); no Brasil (Mato Grosso e Amazônia) tem o nome de “chimberê”. Parece ter um caráter genético. 5. Dermatofitose ungueal (tinea unguium) ou onicomicose Caracteriza-se por lesões destrutivas e esfarinhentas das unhas, iniciando-se pela borda livre, de cor branco-amarelada, como o marfim velho; geralmente, há ceratose do leito ungueal. É doença eminentemente crônica, comprometendo uma ou várias unhas dos pés (preferentemente as do hálux) ou, com frequência bem menor, das mãos. O acometimento ungueal é, em geral, secundário ao plantar. 6. Dermatofitose da face Tem um aspecto peculiar e, às vezes, de difícil diagnóstico. São lesões eritematoescamosas de crescimento centrífugo, às vezes com disposição em asa de borboleta, lembrando o lúpus e a dermatite seborreica; em geral, o prurido é discreto. 7. Dermatofitose do couro cabeludo (tinea capitis) Caracteriza-se pelo comprometimento dos cabelos, que são invadidos e lesados; há também lesões eritematoescamosas do couro cabeludo. Os cabelos são fraturados próximo à pele, produzindo as típicas áreas de tonsura, caracterizadas por pequenos cotos de cabelos ainda implantados. Na tinea tricofítica, as áreas de deglabração são pequenas,ao contrário das microspóricas, cuja área em geral é única e grande. Nessas duas, os cabelos voltam ao normal com o tratamento ou com a involução espontânea, na época da puberdade. A explicação para essa regressão seria o início da produção de ácidos graxos com propriedades fungistáticas. Na variedade favosa, entretanto, ocorre atrofia com alopecia definitiva ou cicatricial. Essa variedade apresenta um aspecto morfológico muito característico: as escútulas fávicas (godet) – crosta constituída por micélio, esporos, células, sebo e exsudato. A alopecia definitiva é mais frequentemente causada pelo T. schoenleinii, porém agentes de origem zoofílica e geofílica, como T. violaceum e M. gypseum, também são capazes de causá-la por reação inflamatória intensa com posterior fibrose e atrofia folicular. A tinea capitis pode ser classificada, também, em função do local de comprometimento do pelo, em parasitismo ectothrix e endothrix. No primeiro tipo, a produção de artrosporos se dá na superfície externa da bainha do pelo. Quando a matriz do pelo encontra-se recheada de esporos grandes é provavelmente causado por fungos do gênero Trichophyton, e quando forem pequenos, por Microsporum sp. que pode evoluir para endothrix. No entanto, no segundo, as hifas fragmentam-se em artrosporos confinados no interior da bainha do pelo (T. tonsurans, T. violaceum, T. schoenleinii etc.). Os pelos afetados tornam-se frágeis e quebradiços e, portanto, sofrem fratura. Os denominados black-dots correspondem aos pontos enegrecidos que surgem no local de fratura dos pelos (sinal do ponto de exclamação) e são tipicamente desencadeados pelos agentes causadores do parasitismo endothrix. Os principais agentes de tinea capitis no Brasil são M. canis (parasitismo ectothrix) e T. tonsurans (parasitismo endothrix). Há uma variante seborreica “não tonsurante” de tinea capitis, produzida pelo T. tonsurans, que deve ser diferenciada em crianças da dermatite seborreica no couro cabeludo e da pseudotinea amiantácea. A dermatoscopia possibilita o achado de cabelos em “vírgula” e, descritos nos melanodérmicos, pelos em “saca-rolha”; há diferenças dermatoscópicas que podem diferenciar infecções pelo T. tonsuras do M. canis. 8. Dermatofitose inflamatória Existem 3 tipos principais: ✓ Kerion Localizado no couro cabeludo ou na barba, representado por placa de foliculite aguda ou subaguda, eminentemente hiperégica, com intensa supuração e cura espontânea, às vezes com alopecia cicatricial; ✓ Sicose tricofítica Representada por pústulas centralizadas por pelos na região da barba e do bigode. Às vezes são isoladas e, outras vezes, formam conglomerados, evolução geralmente crônica; ✓ Foliculitis capitis abscedens et suffodiens Lesões de foliculite com túneis intercomunicando abscessos, no couro cabeludo – geralmente estafilocócica, quando micótica, T. tonsurans (perifoliculite abscedante de Hoffmann). 9. Dermatofitoses granulomatosas Manifestações clínicas variadas, mas com características comuns – dermatófito na derme e com reação granulomatosa, com ou sem hipersensibilidade à tricofitina. Podem ser localizadas ou generalizadas. Localizadas: ✓ Tipo Majocchi Ocorrem naturalmente em situações de oclusão ou por uso indiscriminado de corticosteroides, levando à quebra da barreira cutânea. Apresentam-se como nódulos com tendência à fistulização – face (queixo) ou nos punhos e frequentemente diagnosticadas por histopatológico (hifas no interior de folículos distendidos e infiltrado inflamatório granulomatoso. ✓ Tipo Wilson-Cremer Nódulos eritematosos, com tendência à ulceração nos membros inferiores, em geral de mulheres, provavelmente por trauma decorrente da raspagem de pelos. Generalizadas: ✓ Tipo Azulay Erupção generalizada, eritematoescamosa, com pápulas, tubérculos e comprometimento ungueal. ✓ Tipo Artorn Quadro eritrodérmico com lesões tumorais e adenopatia generalizada. ✓ Tipo Pelevine-Tchermogouboff Placas de infiltrações, nódulos, alguns dos quais ulcerados, adenopatia e comprometimento ósseo. 10. Tinea incógnita Uso de corticoide tópico, ou mesmo sistêmico, pode mascarar quadro clínico em função da falta de características clínicas da lesão, porém, por ser pruriginosa e pela história de recidivas quando da suspensão do corticoide, suspeita-se do diagnóstico – confirmado pelo exame micológico. 11. IDES ou dermatofítides Quadros hiperalérgicos, agudos ou subagudos, de morfologia variada, com tendência a simetria e decorrentes de disseminação hematogênica de produtos antigênicos de dermatófito, com propensão a recidivas no portador de dermatofitose. Aspecto disidrosiforme é o mais comum, porém já foram descritas erupções liquenoides, psoriasiformes, morbiliformes, eritemas multiforme e nodoso, púrpura, eritema anular e outros. Três são os fundamentos para diagnóstico – lesões serem desabitadas, fungo ser demonstrado em foco à distância e quadro desaparecer com cura da dermatofitose. Diagnóstico diferencial - Medalhão da pitiríase rósea, psoríase plantar ou vulgar, eczema de contato, eczema numular, alopecia areata, onicodistrofia de várias naturezas, síndrome vesicular das mãos e/ou pés, dermatite seborreica. Tratamento - Tópico: terbinafina tópica 1%; derivados imidazólicos (miconazol 2%, oxiconazol 1%, tioconazol 1%, isoconazol 1%, flutrimazol 1%) em 1 a 2 aplicações diárias – apresentações em creme, loção, spray e pó. Tolciclato 1%, ciclopiroxolamina 1% e amorolfina 0,025% são outras opções. Vaselina salicilada ou ureia 20% na tinea pedis com descamação é de grande valia. - Sistêmico: Mandatório fazer nos casos de tinea capitis, tinea corporis extensa e onicomicoses com grau de acometimento maior que 50% da superfície ungueal e/ou acometimento de matriz ungueal, bem como tinea pedis crônica. Todos os novos antifúngicos podem ser usados, em termos de custo – compensaria a griseofulvina (menos eficiente). Dose pediátrica – 10-20mg/kg/dia, dose adultos – 1g/dia dividida em 2 tomadas, logo após as refeições. Tempo de tratamento para tinea capitis é de cerca de 30-45 dias; tinea corporis de 20 dias; tinea pedis de 45 dias. Várias cepas de T. rubrum são resistentes à griseofulvina. Itraconazol 100mg/dia, fluconazol 150mg/semana e terbinafina 250mg/dia são superiores em eficácia. Tinea corporis – 2 até 4 semanas; tinea capitis – 4 a 6 semanas. Pitiríase versicolor (pano branco) - Doença de distribuição universal – todas as raças, sem predileção de sexo, idade adulta (maior atividade hormonal – maior oleosidade cutânea). - Mais prevalente em climas quentes e úmidos. Etiologia - Fungos do gênero Malassezia – dermatis, equi, furfur, globosa, obtusa, pachydermatis, restricta, sloofiae e sympodialis. - Pachydermatis - única que não requer lipídio para crescimento em meio de cultura. - Diferenciação entre espécies pode ser feita por morfologia e requerimentos nutricionais na cultura, aspectos ultraestruturais e PCR. - Maior frequência das espécies globosa e sympodialis em relação a furfur – comunidade médica considera a furfur como agente etiológico. - M. furfur – levedura saprófita e lipofílica, encontrada com frequência no couro cabeludo e regiões de pele glabra ricas em glândulas sebáceas – comporta-se como oportunista e fator agravante em casos de dermatite seborreica. - Predisposição individual e recorrências frequentes. Clínica - Lesões arredondadas – surgem de estrutura pilosebácea – podem confluir. - Lesões hipocrômicas descamativas, mas podem ser hipercrômicas ou eritematosas – versicolor. - Alguns referem prurido, sobretudo com exposição solar (quando eritematosas). - Localização mais frequente – áreas de maior concentração de glândulas sebáceas – metade superior do tronco e dos braços. - Pode ocorrer em face, abdome, nádegase até mesmo em membros inferiores. - Esticando distalmente a pele (sinal de Zireli) ou atritando-a com a cureta, ou mesmo com a unha (sinal de Besnier), aparecem escamas furfuráceas. - Paciente com a pele oleosa ou tenha tomado banho – maior dificuldade de perceber descamação. - Lesões hipercrômicas – aumento de tamanho, alterações da distribuição e incremento na multiplicação dos melanossomos na epiderme. - Lesões hipocrômicas – levedura produz ácidos dicarboxílicos que inibem reação dopa-tirosinase – diminui produção de melanina. - Recidivas – pacientes com peles oleosas ou que fazem uso contínuo de produtos oleosos e em pacientes que apresentam lesões predominantemente infundibulares ou foliculares – fungo mais profundo, dificultando ação medicamentosa. 1. Foliculite pitiroscópica – foliculite por malassezia Mulheres entre 25 e 35 anos, pode desencadear prurido moderado a intenso. Mais prevalente em países de clima quente e úmido. Caráter crônico, ocorre em maior frequência em pacientes com DM e após tratamentos prolongados com antibióticos ou corticoides. Pápulas foliculares e pústulas no pescoço, no tronco e membros inferiores. Poucas vezes a face. Preferencialmente doentes acamados – áreas de maior atrito. Paciente com AIDS – lesões disseminadas e acompanhadas de febre alta. Tratamento – antifúngicos sistêmicos. 2. Malasseziose Doença sistêmica causada pelas leveduras do gênero Malassezia. Raramente geram fungemia e septicemia – imunodeprimidos quanto crianças de baixo peso. Cateteres empregados em alimentação lipídica parenteral. Febre – sintoma mais comum. Afeta mais coração e pulmões. Diagnóstico - Exame direto – fita gomada ou por raspagem. - Hifas curtas, curvas e largas, além de elementos leveduriformes arredondados agrupados em forma de cacho de uva ou aspecto de espaguete com almôndegas (MO). Tratamento - Formas localizadas – sulfeto de selênio a 2,5%, propilenoglicol a 50%, cetoconazol a 2% ou outros derivados imidazólicos – soluções hidroalcóolicas ou xampus por 10 a 20 dias – aplicadas generosamente, além das áreas acometidas. - Recomenda-se novo tratamento 2 meses depois – evitar recidivas. - Aplicar sulfeto de selênio por cerca de 30 minutos e remover no banho. Uso da bucha no banho é bastante eficaz. - Formas extensas ou recidivantes – via oral: cetoconazol 200mg/dia (10-15 dias), itraconazol 100mg (2x por 5 a 7 dias), fluconazol 300mg por semana em 2 semanas. - Recorrências frequentes – profilaxia por 6 meses, iniciando- se 30 dias após finalizado o tratamento. Candidíase cutânea - Micose produzida essencialmente pela Candida albicans (70- 80%) e, poucas vezes, por outras espécies, comprometendo, isolada ou conjuntamente, mucosas, pele e unhas, raramente outros órgãos. Epidemiologia - Distribuição universal, atingindo muitas vezes neonatos. - Pode ser mais frequente em determinadas profissões: empregados domésticos, lavadores de pratos, cozinheiros, enfermeiros. - Candidíase esofágica e das vias respiratórias – doenças definidoras de AIDS. Etiopatogenia - Candida albicans atua normalmente como saprófita no TGI, orofaringe (50%) e mucosa vaginal (20-25%, grávidas 30%). - Fungos oportunistas que agridem o homem em determinadas condições: ✓ Modificações fisiológicas (gravidez), quando os glicídios existem em maior quantidade na vagina; doenças como DM ✓ Deficiências imunológicas e endocrinopatias ✓ Tratamento prolongado por antibióticos ou corticoides e imunossupressores ✓ Estados de umidade prolongada Clínica 1. Candidíase oral Mais comum em RN, idosos, debilitados e pacientes com AIDS. Lesões erosivas e esbranquiçadas. 2. Candidíase intertriginosa Atinge dobras naturais (interdigitais, inframamárias, inguinais, axilares). Lesões erosivas, fissurais, úmidas, com induto esbranquiçado, pruriginoso e pequenas lesões satélites arredondadas, eritematoescamosas e até mesmo pústulas bacterianas. 3. Candidíase ungueal e periungueal Intensa lesão eritematoedematosa periungueal – dolorosa e pode levar à onicólise. Caracteristicamente acomete borda proximal da unha – principalmente mãos. Principal causa de paroníquia. 4. Queilite angular Relacionada com lesões fissuradas no canto da boca, muito comuns nas modificações da arquitetura da boca por prótese – idosos. Neonatos – contato vaginal. Geralmente há associação bacteriana. 5. Vaginites e balanites Lesões erosivas esbranquiçadas, úmidas e pruriginosas, na vagina e no sulco balanoprepucial. Corrimento esbranquiçado vaginal é característico – não ocorre em circundados. Podem ser adquiridas por contato sexual. Balanite recorrente – postectomia. 6. Candidíase mucocutânea crônica Grupo heterogêneo de síndromes clínicas, muitas vezes genéticas, caracterizadas por infecção crônica e recorrente da pele, unha e orofaringe. Não existe tendência à disseminação ou ao envolvimento visceral. Geralmente, inicia- se antes dos 3 anos e caracteriza-se clinicamente por lesões orais, perlèche (queilite angular), envolvimento ungueal e paroníquia com importante distrofia, vulvovaginite e acometimento cutâneo. Alguns casos, observam-se lesões ceratósicas com tendência à formação de verdadeiros cornos cutâneos ou de granulomas que predominam no couro cabeludo, face, sobrancelhas e extremidades. Defeitos imunológicos que determinam o quadro clínico variam de efeitos específicos a quadros de falência generalizada. Associação a síndromes de endocrinopatias múltiplas é frequente. Diagnóstico - Exame direto – hifas finas, ou, mais caracteristicamente, pseudo-hifas para confirmação diagnóstica, já que a simples presença de blastosporos (esporos arredondados) sugere apenas colonização. - Cultura em meios adequados – ágar Sabouraud com antibiótico – crescem colônias cremosas e brancacentas em 2 a 5 dias. Tratamento - Considerar fatores predisponentes locais e gerais (diabetes), peculiaridades topográficas e forma clínica (superficial ou sistêmica). - Paroníquia e intertriga: fluconazol ou itraconazol VO complementados com terapia tópica antifúngica com derivados azólicos – nistatina 100.000UI creme, timol a 4% em clorofórmio por 2 a 3 meses para prevenir recidivas. - Balanite: creme com nistatina 100.000UI e ácido bórico a 2%; balanites recidivantes: postectomia. - Dermatite das fraldas: higiene local e troca de fraldas, hidrocortisona a 1% associada a nistatina creme 25.000 a 100.000 UI, para alívio do quadro inflamatório em caso de maceração, ou imidazólicos nas trocas de fraldas. Protetores de barreira são úteis, assim como exposição diária ao sol. - Vaginite: comprimidos vaginais ou óvulos (nistatina 100.000 UI, clotrimazol 500mg, miconazol 1200mg), tioconazol creme a 6,5%, itraconazol e fluconazol. - Candidíase oral, estomatite, perlèche: violeta de genciana a 2% (3-4x/dia); solução de 400.000 a 500.000UI nistatina (3-4x/dia) ou associação das duas; fluconazol oral ou itraconazol oral. - Mucocutânea crônica: itraconazol e fluconazol contínuos.
Compartilhar