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MODERNISMO BRASILEIRO 3ºgeração – 1945… ROTAS Principais autores e obras Clarice Lispector; João Guimarães Rosa; João cabral de Melo Neto. 03 Contexto histórico-social Um mundo pós guerra: é hora de innovar. 01 Características gerais Unidade na multiplicidade. 02 Treinando o ENEM Exercícios do Exame Nacional do Ensino Médio. 04 CONTEXTO HISTÓRICO-SOCIAL (MUNDO) Fim da Segunda Guerra Mundial (1945); Guerra Fria (Estados Unidos e União Soviética); Criação da Organização das Nações Unidas (ONU). CONTEXTO HISTÓRICO-SOCIAL (BRASIL) Fim do Estado Novo de Getúlio Vargas(1945); Getúlio volta ao poder (1951) até o dia em que se suicidou (1954) = Instabilidade política; Juscelino Kubitschek (política desenvolvimentista – construção de Brasília - 1960); Mais instabilidade política (… Jânio Quadros, João Goulart, Castelo Branco – 1964) • Investigação profunda o “eu”; • Valorização do espaço interior (angústias e anseios existenciais); • Retomada do regionalismo (sem obrigação política); • Universalização do regional e do particular; • Valorização do uso das palavras; • Experimentação e pesquisa estética; CARACTERÍSTICAS GERAIS A literatura tem-se mostrado sensível às exigências formalizantes e técnicas que, por assim dizer, estão no ar. Um formalismo pálido, entendido como respeito ao metro exato e fuga à banalidade nos temas e nas palavras, já se delineava com os poetas da chamada “Geração de 45”, onde se têm incluído, entre outros, Péricles Eugênio da Silva Ramos, Domingos Carvalho da Silva, José Paulo Moreira da Fonseca, Geir Campos, Mauro Motta, Lêdo Ivo e João Cabral de Melo Neto. Coube ao último a tarefa e o mérito de ter superado os traços parnasianos-simbolistas que não raro anemizaram a força inventiva dos demais, e ter atingido, pelo rigor semântico e pela tensão participante, o lugar central que ora ocupa na Literatura brasileira. Na ficção, o grande inovador do período foi João Guimarães Rosa, artista de primeira plana no cenário das letras modernas: experimentador radical, não ignorou, porém, as fontes vivas das linguagens não-letradas: ao contrário, soube explorá-las e pô-las a serviço de uma prosa complexa em que o natural, o infantil e o místico assumem uma dimensão ontológica que transfigura os materiais de base. [...] BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. 2. ed. São Paulo: Cultrix, 1977. p. 434-435. TEORIZANDO… RESOURCES Did you like the resources on this template? Get them for free at our other websites. VECTORS ○ Creative process 38 ○ Time plan table PHOTOS ○ Art studio table ○ Close-up of red paintbrush ○ Portrait of female artist with paint hands ○ Hand holding brushes stained with paint ○ Painting concept with copyspace ○ Still life of paint materials ○ Girl painting at home Clarice Lispector https://www.flaticon.com/packs/creative-process-38 https://www.freepik.com/free-vector/time-plan-table_4591109.htm https://www.freepik.com/free-photo/art-studio-table_3552529.htm https://www.freepik.com/free-photo/close-up-red-paintbrush_4513136.htm https://www.freepik.com/free-photo/portrait-female-artist-with-paint-hands_3577622.htm https://www.freepik.com/free-photo/hand-holding-brushes-stained-with-paint_3546909.htm https://www.freepik.com/free-photo/painting-concept-with-copyspace_1977186.htm https://www.freepik.com/free-photo/still-life-paint-materials_3586212.htm https://www.freepik.com/free-photo/girl-painting-home_3578372.htm CARACTERÍSTICAS DA OBRA Despite being red, Mars is a cold place, not hot Fluxo de consciência – análise psicológica das personagens; ComparisonData Study Personagens “sem relevância” social – crítica aos costumes; Escrita filosófica: questionamentos do “eu”; Enredo não linear: Cotidiano → Sublime, → Cotidiano; Epifania – Descobertas interiores. Tudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida. Mas antes da pré-história havia a pré-história da pré-história e havia o nunca e havia o sim. Sempre houve. Não sei o que, mas sei que o universo jamais começou. Que ninguém se engane, só consigo a simplicidade através de muito trabalho. Enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever. Como começar pelo início, se as coisas acontecem antes de acontecer? Se antes da pré-pré-história já havia os monstros apocalípticos? Se esta história não existe, passará a existir. Pensar é um ato. Sentir ó um fato. Os dois juntos - sou eu que escrevo o que estou escrevendo. Deus é o mundo. A verdade é sempre um contato interior e inexplicável. A minha vida a mais verdadeira é irreconhecível, extremamente interior e não tem uma só palavra que a signifique. Meu coração se esvaziou de todo desejo e reduz-sé ao próprio último ou primeiro pulsar. [...] Porque há o direito ao grito. Então eu grito. Grito puro e sem pedir esmola. Sei que há moças que vendem o corpo, única posse real, em, troca de um bom jantar em vez de um sanduíche de mortadela. Mas a pessoa de quem falarei mal tem corpo para vender, ninguém a quer, ela é virgem e inócua, não faz falta a ninguém. Aliás - descubro eu agora - também eu não faço a menor falta, e até o que escrevo um outro escreveria. Um outro escritor, sim, mas teria que ser homem porque escritora mulher pode lacrimejar piegas. A HORA DA ESTRELA, CLARICE LISPECTOR “Perdi alguma coisa que me era essencial, e que já não me é mais. Não me é necessária, assim como se eu tivesse perdido uma terceira perna que até então não me impossibilitava de antar mas que fazia de mim um tripá estável. Essa terceira perna eu perdi. E voltei a ser uma pessoa que nunca fui. Voltei a ter o que nunca tive: duas pernas. Sei que somente com as duas pernas é que posso caminhar. Mas ausência inútil da terceira me faz falta e me assusta, era ela que fazia de mim uma coisa encontrável em mim mesma, e sem sequer precisar me procurar.” “Há um mau-gosto na desordem de viver. E mesmo eu nem saberia, se tivesse desejado, transformar esse passo latente em passo real. Pelo prazer de uma coesão harmoniosa, pelo prazer avaro e permanentemente promissor de ter mas não gastar – eu não precisava do clímax ou da revolução ou de mais do que o pré- amor, que é tão mais feliz que o amor. A promessa me bastava? Uma promessa me bastava.”. A PAIXÃO SEGUNDO GH, CLARICE LISPECTOR João Guimarães Rosa CARACTERÍSTICAS DA OBRA Despite being red, Mars is a cold place, not hot Neologismos (criação, reincorporação lexical); ComparisonData Study Visão existencialista – Dualismo: Deus X Demo; Neorealismo – Realismo fantástico; Linguagem coloquial (modo de falar do sertão – jagunço); Neoregionalismo – Regionalismo Universal: “O sertão é o mundo”. Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja. Alvejei mira em árvore, no quintal, no baixo do córrego. Por meu acerto. Todo dia isso faço, gosto; desde mal em minha mocidade. Daí, vieram me chamar. Causa dum bezerro: um bezerro branco, erroso, os olhos de nem ser se viu; e com máscara de cachorro. Me disseram; eu não quis avistar. Mesmo que, por defeito como nasceu, arrebitado de beiços, essa figurava rindo feito pessoa. Cara de gente, carão de cão: determinaram era o demo. Povo prascóvio. Mataram. Dono dele nem sei quem for. Vieram emprestar minhas armas, cedi. Não tenho abusões. O senhor ri certas risadas... Olhe: quando é tiro de verdade, primeiro a cachorrada pega a latir, instantaneamente depois, então, se vai ver se deu mortos. O senhor tolere, isto é o sertão. Uns querem que não seja: que situado sertão é por os campos-gerais a fora a dentro, eles dizem, fim de rumo, terras altas, demais do Urucaia. Toleima. Para os de Corinto e do Curvelo, então o aqui não é dito sertão? Ah, que tem maior! Lugar sertão se divulga: é onde os pastos carecem de fechos; onde um pode torar dez, quinze léguas, sem topar com casa de morador; e onde criminoso vive seu cristo-jesus, arredado do arrocho de autoridade. O Urucuia vem dos montões oestes. Mas, hoje, que na beira dele, tudo dá fazendõesde fazendas, almargem de vargens de bom render, as vazantes; culturas que vão de mata em mata, madeiras de grossura, até ainda virgens dessas lá há. O gerais corre em volta. Esses gerais são sem tamanho. Enfim, cada um o que quer aprova, o senhor sabe: pão ou pães, é questão de opiniães... O sertão está em toda a parte. GRANDE SERTÃO: VEREDAS, GUIMARÃES ROSA MEU TIO O IAUARETÊ, DE JOÃO GUIMARÃES ROSA João Cabral de Melo Neto CARACTERÍSTICAS DA OBRA Despite being red, Mars is a cold place, not hot Disciplina formal (neoparnasianismo); ComparisonData Study Contenção emocional; Objetividade e racionalismo; Importância do Rio (Capibaribe, Beberibe) como metáfora; Preocupação com a realidade social (nordestina). - O meu nome é Severino, como não tenho outro de pia. Como há muitos Severinos, que é santo de romaria, deram então de me chamar Severino de Maria; como há muitos Severinos com mães chamadas Maria, fiquei sendo o da Maria do finado Zacarias. Mais isso ainda diz pouco: há muitos na freguesia, por causa de um coronel que se chamou Zacarias e que foi o mais antigo senhor desta sesmaria. Como então dizer quem falo ora a Vossas Senhorias? Vejamos: é o Severino da Maria do Zacarias, lá da serra da Costela, limites da Paraíba. Mas isso ainda diz pouco: se ao menos mais cinco havia com nome de Severino filhos de tantas Marias mulheres de outros tantos, já finados, Zacarias, vivendo na mesma serra magra e ossuda em que eu vivia. Somos muitos Severinos iguais em tudo na vida: na mesma cabeça grande que a custo é que se equilibra, no mesmo ventre crescido sobre as mesmas pernas finas e iguais também porque o sangue, que usamos tem pouca tinta. E se somos Severinos iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, mesma morte Severina: que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos vinte de fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença é que a morte Severina ataca em qualquer idade, e até gente não nascida). Somos muitos Severinos iguais em tudo e na sina: a de abrandar estas pedras suando-se muito em cima, a de tentar despertar terra sempre mais extinta, a de querer arrancar alguns roçado da cinza. Mas, para que me conheçam melhor Vossas Senhorias e melhor possam seguir a história de minha vida, passo a ser o Severino que em vossa presença emigra. MORTE E VIDA SEVERINA, DE JOÃO CABRAL DE MELO NETO A bailarina feita de borracha e pássaro dança no pavimento anterior do sonho. A três horas de sono, mais além dos sonhos, nas secretas câmaras que a morte revela. Entre monstros feitos a tinta de escrever, a bailarina feita de borracha e pássaro. Da diária e lenta borracha que mastigo. Do inseto ou pássaro que não sei caçar. A BAILARINA, DE JOÃO CABRAL DE MELO NETO Guimarães Rosa TREINANDO O ENEM VAMOS LÁ! ENEM 2017Declaração de amorEsta é uma confissão de amor: amo a língua portuguesa. Ela não é fácil. Não é maleável. […] A língua portuguesa é um verdadeiro desafio para quem escreve. Sobretudo para quem escreve tirando das coisas e das pessoas a primeira capa de superficialismo. Às vezes ela reage diante de um pensamento mais complicado. As vezes se assusta com o imprevisível de uma frase. Eu gosto de manejá-la – Como gostava de estar montada num cavalo e guiá-lo pelas rédeas, às vezes a galope. Eu queria que a língua portuguesa chegasse ao máximo em minhas mãos. E este desejo todos os que escrevem têm. Um Camões e outros iguais não bastaram para nos dar para sempre uma herança de língua já feita. Todos nós que escrevemos estamos fazendo do túmulo do pensamento alguma coisa que lhe dê vida. Essas dificuldades, nós as temos. Mas não fale do encantamento de lidar com uma língua que não foi aprofundada. O que recebi de herança não me chega. Se eu fosse muda e também não pudesse escrever, e me perguntassem a que língua eu queria pertencer, eu diria. inglês, que é preciso e belo. Mas, como não nasci muda e pude escrever, tornou-se absolutamente claro para mim que eu queria mesmo era escrever em português. Eu até queria não ter aprendido outras línguas: só para que a minha abordagem do português fosse virgem e límpida. LISPECTOR, C. A descoberta do mundo Rio de Janeiro Rocco, 1999 (adaptado). O trecho em que Clarice Lispector declara seu amor pela língua portuguesa, acentuando seu caráter patrimonial e Sua capacidade de renovação, é a) “A língua portuguesa é um verdadeiro desafio para quem escreve.” b) “Um Camões e outros iguais não bastaram para nos dar para sempre uma herança de língua já feita.” c) “Todos nós que escrevemos estamos fazendo do túmulo do pensamento alguma coisa que lhe dê Vida.” d) “Mas não falei do encantamento de lidar com uma língua que não foi aprofundada.” e) “Eu até queria não ter aprendido outras línguas: só para que a minha abordagem do português fosse Virgem e límpida.” Comentário da questão Para Clarice, a própria língua portuguesa é um patrimônio que se renova com a justificativa de que “um Camões e outros iguais não bastaram”, já que “todos nós que escrevemos estamos fazendo do túmulo do pensamento alguma coisa que lhe dê vida”. Essa passagem demonstra a renovação constante da língua portuguesa. ENEM 2014 O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem. ROSA, J. G. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. A leitura do trecho permite identificar que o desabafo de Riobaldo se aproxima de um(a): a) diário, por trazer lembranças pessoais. b) fábula, por apresentar uma lição de moral. c) notícia, por informar sobre um acontecimento. d) aforismo, por expor uma máxima em poucas palavras. e) crônica, por tratar de fatos do cotidiano. Comentário da questão O desabafo de Riobaldo se aproxima de um aforismo, que é uma máxima que enuncia através de poucas palavras uma regra, por expor e sintetizar sua vida em oposições como “esquenta e esfria”. ENEM 2019 Uma ouriça Se o de longe esboça lhe chegar perto, se fecha (convexo integral de esfera), se eriça (bélica e multiespinhenta): e, esfera e espinho, se ouriça à espera. Mas não passiva (como ouriço na loca); nem só defensiva (como se eriça o gato); sim agressiva (como jamais o ouriço), do agressivo capaz de bote, de salto (não do salto para trás, como o gato): daquele capaz de salto para o assalto. Se o de longe lhe chega em (de longe), de esfera aos espinhos, ela se desouriça. Reconverte: o metal hermético e armado na carne de antes (côncava e propícia), e as molas felinas (para o assalto), nas molas em espiral (para o abraço). MELO NETO, J. C. A educação pela pedra. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. Com apuro formal, o poema tece um conjunto semântico que metaforiza a atitude feminina de a) tenacidade transformada em brandura. b) obstinação traduzida em isolamento. c) inércia provocada pelo desejo platônico. d) irreverência cultivada de forma cautelosa. e) desconfiança consumada pela intolerância. Comentário da questão O título atribui à palavra “ouriço” o gênero feminino e fala, então, de uma “ouriça” que de longe assume uma postura retraída e resiste (tenaz), mas que se reconverte em uma atitude de abertura ao elemento que se aproximando (brandura). ENEM 2016Tudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida. Mas antes da pré-história havia a pré-história da pré-história e havia o nunca e havia o sim. Sempre houve. Não sei o quê, mas sei que o universo jamais começou. [...] Enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever. Como começar pelo início, se as coisas acontecem antes de acontecer? Se antes da pré-pré- história já havia os monstros apocalípticos? Se esta história não existe, passará a existir. Pensar é um ato. Sentir é um fato. Os dois juntos – sou eu que escrevo o que estou escrevendo. [...] Felicidade? Nunca vi palavra mais doida, inventada pelas nordestinas que andampor aí aos montes. Como eu irei dizer agora, esta história será o resultado de uma visão gradual – há dois anos e meio venho aos poucos descobrindo os porquês. É visão da iminência de. De quê? Quem sabe se mais tarde saberei. Como que estou escrevendo na hora mesma em que sou lido. Só não inicio pelo fim que justificaria o começo – como a morte parece dizer sobre a vida – porque preciso registrar os fatos antecedentes. LISPECTOR, C. A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1998 (fragmento). A elaboração de uma voz narrativa peculiar acompanha a trajetória literária de Clarice Lispector, culminada com a obra A hora da estrela, de 1977, ano da morte da escritora. Nesse fragmento, nota-se essa peculiaridade porque o narrador a) observa os acontecimentos que narra sob uma ótica distante, sendo indiferente aos fatos e às personagens. b) relata a história sem ter tido a preocupação de investigar os motivos que levaram aos eventos que a compõem. c) revela-se um sujeito que reflete sobre questões existenciais e sobre a construção do discurso. d) admite a dificuldade de escrever uma história em razão da complexidade para escolher as palavras exatas. e) propõe-se a discutir questões de natureza filosófica e metafísica, incomuns na narrativa de ficção. Comentário da questão A peculiaridade da voz narrativa de Clarice Lispector aparece neste fragmento de “A hora da estrela” em um sujeito que, com a visão crítica da linguagem, ao invés de narrar, tece reflexões sobre questões existenciais (como se estivesse em crise), quando diz “Enquanto eu tiver perguntas e não houver respostas, continuarei a escrever.” e sobre a própria construção do discurso, como texto, quando diz “como eu irei dizer agora, esta história...”. ENEM 2017A partida do trem Marcava seis horas da manhã, Angela Prain pagou o táxi e pegou sua pequena valise, Dona Maria Rita de Alvarenga Chagas Souza Melo desceu do Opala da filha e encaminharam-se para os trilhos. A velha bem vestida e com joias. Das rugas que a disfarçavam saía a forma pura de um nariz perdido na idade, e de uma boca que outrora devia ter sido cheia e sensível. Mas que importa? Chega-se a um certo ponto — e o que foi não importa. Começa uma nova raça. Uma velha não pode comunicar-se. Recebeu o beijo gelado de sua filha que foi embora antes do trem partir. Ajudara-a antes a subir no vagão. Sem que neste houvesse um centro, ela se colocara do lado. Quando a locomotiva se pôs em movimento, surpreendeu-se um pouco: não esperava que o trem seguisse nessa direção e sentara-se de costas para o caminho. Angela Pralini percebeu-lhe o movimento e perguntou: — A senhora deseja trocar de lugar comigo? Dona Maria Rita se espantou com a delicadeza, disse que não, obrigada, para ela dava no mesmo, Mas parecia ter-se perturbado. Passou a mão sobre o camafeu filligranado de ouro espetado no peito, passou a mão pelo broche. Seca. Ofendida? Perguntou afinal a Angela Pralini: — É por causa de mim que a senhorita deseja trocar de lugar? LISPECTOR, C. Onde estiveste de noite. Rio de Janeiro. Nova Fronteira. A descoberta de experiências emocionais com base no Cotidiano é recorrente na obra de Clarice Lispector. No fragmento, o narrador enfatiza o(a) a) comportamento vaidoso de mulheres de condição social privilegiada. b) anulação das diferenças sociais no espaço público de uma estação. c) incompatibilidade psicológica entre mulheres de gerações diferentes. d) constrangimento da aproximação formal de pessoas desconhecidas. e) sentimento de solidão alimentado pelo processo de envelhecimento. Comentário da questão No texto, a frase “uma velha não pode comunicar-se” evidencia o sentimento de solidão alimentado pelo processo de envelhecimento. ENEM 2018 ROSA, R. Grande sertão: veredas: adaptação da obra de João Guimarães Rosa. São Paulo: Globo, 2014 (adaptado). A imagem integra uma adaptação em quadrinhos da obra Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa. Na representação gráfica, a inter-relação de diferentes linguagens caracteriza- se por a) romper com a linearidade das ações da narrativa literária. b) ilustrar de modo fidedigno passagens representativas da história. c) articular a tensão do romance à desproporcionalidade das formas. d) potencializar a dramaticidade do episódio com recursos das artes visuais. e) desconstruir a diagramação do texto literário pelo desequilíbrio da composição. Comentário da questão A imagem ilustra de maneira expressiva a fala, potencializando o caráter dramático do episódio. Isso fica claro pelos tamanhos diferentes das figuras em função da narrativa. CLARICE LISPECTOR