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Giovanni Fialho RECURSO ESPECIAL Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 2 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Entendendo melhor o STJ Erro 01 - Escrever o REsp como se fosse apelação Erro 02 - Não especificar adequada e expressamente o dispositivo de lei federal violado Erro 03 - Não infirmar todos os fundamentos do acórdão acerca da questão Erro 04 - Apontar afronta à Constituição Federal Erro 05 - Apontar lei local como violada Erro 06 - Não comprovar feriado local, ponto facultativo ou suspensão do expediente Erro 07 - Não esgotar a instância de origem Erro 08 - Matéria de fato Erro 09 - Cláusula contratual Erro 10 - Não infirmar fundamento constitucional autônomo Erro 11 - Apontar afronta a Súmula Erro 12 - Não fazer cotejo analítico Mas, tio Gi, e o prequestionamento? Conclusão 3 2 9 14 22 26 32 37 42 48 51 55 58 63 64 Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Olá, Dr(a). advogado(a)! Parabéns por ter chegado até este e-book! Em primeiro lugar, devo alertar que este não será um conteúdo técnico, formal e frio, como estamos tão acostumados nas academias e corredores forenses. Este é um livro digital com propósitos muito claros, tais como: a) Trocarmos experiências sobre as particularidades e as especificidades do recur- so especial; b) Conversarmos de maneira natural, dando exemplos e fazendo comparações que, assumo, não são comuns no sisudo mundo jurídico, mas acredito que aprenderemos muito mais numa conversa informal, talvez até acompanhados de um drink e um petisco; c) Contribuirmos com a dissolução da barreira que existe entre servidores públicos e advogados; d) Desmistificarmos o “longínquo e inacessível” Tribunal Superior; e e) Democratizarmos o acesso à jurisdição superior (minha grande missão com este trabalho). Sim, é claro que há muita informação técnica com instruções, demonstração de erros, sugestões e exemplos, tendo como premissas os 12 erros mais comuns cometidos nas petições dos recursos especiais, mas, além disso, quero que seja uma experiência agra- dável, construtiva e proveitosa para que, no seu próximo Recurso Especial (REsp), você já perceba significativa diferença na hora de elaborar suas razões. Combinado? E tem mais uma coisa: você terá meu e-mail para contato! Quero saber suas impressões, dificuldades, interesses e também todos os avanços que você vai ter a partir de agora ao elaborar seus recursos especiais. Meu grande objetivo é democratizar o acesso à jurisdição superior e isso só será possível à medida que você colocar em prática as lições deste e-book e dos meus outros materiais e cursos nas suas próximas – e melhores – razões recursais, pois, lembrando-se de uma frase do pensador chinês Confúcio: “A essência do conhecimento consiste em aplicá-lo, uma vez possuído.” Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Giovanni Fialho Para iniciarmos nosso diálogo, é educado apresentar-me! Sou Giovanni Fialho, nasci em São Luís/MA e fui criado em Brasília/DF. Sorridente, brincalhão e descontraído, acredito que seriedade e sisudez sejam coisas diferentes: pode- mos viver a vida de maneira séria e responsável, mas de forma alegre, leve e divertida. Adoro filosofia, psicologia (cheguei a prestar vestibular para ambas as áreas), fi- nanças pessoais e literatura. Gosto de poesias e sempre que possível escrevo alguns versos como forma de acalentar a alma. Tenho alguns hobbies: ler (romances, finanças e psicologia, especialmente), via- jar, explorar novos lugares, conhecer restaurantes, drinks e culturas diferentes, cozinhar, jogar cartas (adoro canastra e buraco). Eventualmente degusto um bom charuto cubano (acompanhado de whisky, fica perfeito). Não curto e não acompanho nada de esportes (nem futebol!). Sou fã de MPB, bossa nova e alguns pops rocks. Um dos meus grandes ído- los (talvez o maior) é o eterno Raul Seixas. Por certa época, dediquei-me ao estudo de várias abordagens do desenvolvimen- to humano, como programação neurolinguística e neurossemântica, coaching, mentoria, hipnose, constelação sistêmica e familiar, psiquiatria para leigos, técnicas avançadas de estudo, leader training etc. Esses estudos e imersões ajudaram-me a desenvolver uma me- lhor versão de mim mesmo, o que não significa que aquilo que é bom para mim seja bom para todos. Cheguei inclusive a integrar uma obra coletiva, na qualidade de coautor1. Na área jurídica, sou graduado em Direito pelo Centro Universitário de Brasília (UniCeub/2008), com pós-graduação em Processo Civil pela mesma instituição (2010). Cur- sei a Escola Superior da Magistratura/DF (2012) e fui professor de cursinhos para concur- sos. Além disso, atuo como instrutor interno do STJ. Servidor efetivo do STJ (Analista Judiciário – Área Judiciária) desde fevereiro de 2009, sempre desempenhei funções na assessoria de Ministros em todas as áreas e órgãos especializados (Turmas e Seções de Direito Público, Privado e Penal, além da Corte Espe- cial e do Conselho de Administração). Também atuei no Ministério Público Federal como assessor de Subprocurador-Geral da República junto ao próprio STJ. Ao todo, examinei aproximadamente 14 mil processos, sendo, em sua grande maioria, Recursos Especiais e seus respectivos agravos. 1 Hipnose terapêutica, coordenação de Inês Marcel. Aurora Vita, São Paulo: 2016. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 2 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Entendendo melhor o STJ No âmbito da Justiça comum, o acesso à jurisdição superior, por determinação consti- tucional, é essencialmente concretizado pelo Recurso Especial. Segundo o relatório de prestação jurisdicional do STJ, a proporção de recursos especiais e agravos em recursos especiais é absurdamente significativa, como se pode ver do seguinte resumo: Ano Total de petições Total de REsp/ AREsp Percentual 2014 314.316 251.138 79,90% 2015 332.905 264.645 79,49% 2016 335.779 266.651 79,41% 2017 327.129 247.841 75,76% 2018 346.337 259.281 74,86% Da leitura desse quadro-resumo, percebe-se o grau de importância do recurso especial e seus respectivos agravos, responsáveis por mais de ¾ da atividade jurisdicional do Superior Tribunal de Justiça. O REsp, todavia, é considerado, por muitos profissionais da advocacia, complexo de ser elaborado, visto que seus requisitos não se encontram todos expressamente arrolados na lei processual, como ocorre com a maioria dos outros recursos. Como sabemos, a interpretação da lei e da própria Constituição resultou na construção jurisprudencial acerca dos inúmeros requisitos de admissibilidade do REsp, o que refle- te, ante a peculiaridade que lhe é intrínseca, a dificuldade de compreensão e o conse- quente alto índice de inadmissibilidade, o qual, somente no ano de 2016, por exemplo, foi de aproximadamente 88,32%. Recentemente, foi implementada a Inteligência Artificial para triar, examinar e já su- gerir o tipo de decisão a ser proferida. A tecnologia, indiscutivelmente, quebra novos paradigmas e faz parte do cotidiano forense. Portanto, é mais do que necessário ter em mente que a própria forma de apresentação do REsp já traz mais chances de sucesso em sua admissibilidade. Assim, o propósito deste e-book, juntamente com os outros trabalhos que tenho rea- lizado na área, é democratizar o acesso à jurisdição superior. Faço isso divulgando informações concretas, práticas e efetivas sobre o Recurso Especial, de modo a aumen- tar as chances de conhecimento dos seus recursos e de possibilitar, de alguma forma, melhorias sociais no acesso ao Tribunal de Sobreposição. Então, vamos ao conteúdo em si? J Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 3Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Erro 01 Escrever o REsp como se fosse apelação A apelação é considerada “o recurso por excelência”, ou seja: possui amplo grau de cognoscibilidade, bastando ficar minimamente clara a intenção de re- forma da sentença para que a devolutividade seja atendida, remetendo a questão ao Tribunal de Justiça ou ao Tribunal Regional Federal. É possível – e aceita na jurisprudência – até mesmo a repetição na íntegra dos termos da petição inicial, contestação ou alegações finais, desde que hábeis a demonstrar a intenção de reforma da sentença e que se insurjam contra o teor da sentença, atendendo ao princípio da dialeticidade (CPC, 1.010 e 1.013). AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DE- CISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO - INSUR- GÊNCIA RECURSAL DA DEMANDADA. [...] 2. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que, embora a mera reprodução da petição inicial nas razões da apelação não enseje, por si só, afronta ao princípio da dialeticidade, se a parte não impugna os fundamentos da sentença, não há como conhecer da apelação, por des- cumprimento do art. 514, II, do CPC/73, atual art. 1010, II, do CPC/15. In- cidência do teor da Súmula 83/STJ. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp 1790742/CE, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 27/05/2019, DJe 03/06/2019.) Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 4 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Na esfera penal, esse efeito permite até mesmo a abordagem de novas temá- ticas e fundamentações, quando houver recurso exclusivamente da defesa e que este não agrave a situação do réu, como se vê do seguinte julgado: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, III, IV e V, DO CP). DOSIMETRIA. FIXAÇÃO DA PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. ALEGAÇÃO DE ALTERAÇÃO DE FUNDAMEN- TAÇÃO EM RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. REFORMATIO IN PEJUS. INOCORRÊNCIA. SITUAÇÃO DO RECORRENTE INALTERADA. 1. Sabe-se que em razão do efeito amplamente devolutivo da apelação, pode o Tribunal, ao julgar recurso exclusivo da defesa, apresentar novas fundamentações, desde que não agrave a situação do recorrente. [...] 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC 320.398/MT, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, jul- gado em 28/06/2016, DJe 01/08/2016.) Em contraposição, o REsp é recurso de fundamentação vinculada, isto é, só tem cabimento dentro das específicas hipóteses previstas no art. 105, III, da Constituição Federal. Nesse sentido: O recurso especial é recurso de fundamentação vinculada, limitado em ex- tensão pela matéria recursal devolvida e adstrito às questões jurídicas deci- didas em única ou última instância. (AgInt no AgRg no REsp 1371046/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLI- ZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/05/2019, DJe 16/05/2019.) Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 5 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Mas o que significa isso, na prática? Então, é o seguinte: Não adianta alegar no REsp matérias de “justiça”, “liberdade” ou qualquer outra tese ou abordagem jurídica, mesmo que em essência tenha-se esse mister na defesa que se faz em juízo. Não adianta declamar bravatas de injustiças e desacertos, de violações e garantias. Não adianta nada fazer discursos (às vezes acalorados) falando da necessária tutela estatal para os mais variados temas e realidades da vida. Não, não estou dizendo que isso não é importante. Estou dizendo que o “palco” para esse tipo de postura não é o recurso especial. É aquela história: adianta ser um piloto habilidoso, com domínio do carro e suas funcionali- dades, querer que o veículo alcance 320 km/h, mas o veículo ter um motor 1.0 com 80 cava- los? Pois é, não adianta, porque não tem como alcançar o resultado pretendido! Portanto, é preciso entender cada tipo de ferramenta para que a funcionalidade seja devida- mente aplicada, de acordo com a necessidade. Isso me faz lembrar uma frase: “Quem só conhece martelo, vê prego em tudo!” É uma ótima reflexão mesmo, pois, se a única ferramenta que eu sei usar é o martelo, em qualquer situação vou querer usá-lo para bater, mesmo que não sejam as marteladas as melhores alternativas. Por outro lado, no momento em que eu conhecer e aprender a utilizar uma chave de fenda, por exemplo, ao invés de querer martelar um parafuso, saberei parafusá-lo, dando-lhe me- lhor destino em suas funcionalidades. Uau, isso pareceu até livro de autoajuda! Bem, mas vamos voltar ao REsp, neném! O que temos é o seguinte: Tenha em mente que o recurso especial possui fundamentação vinculada, o que significa dizer: o STJ deve analisar somente aquilo que lhe foi devolvido, nos estritos limites em que o foi, nos termos do princípio da devolutividade estrita. Não é atribuição do STJ (lembrando que esse estudo é amparado no enten- dimento da própria Corte Superior e não em reflexões doutrinárias ou acadê- micas) adentrar em questões que não lhe tenham sido especifica e restritamente colocadas a julgamento. É por essa razão que geralmente as decisões em sede de REsp são pontuais e objeti- vas. Observe que um acórdão proferido em apelação, por exemplo, tem fundamentação mais genérica, discorrendo de forma usualmente ampla e reflexiva sobre possibilidades atinentes à causa posta em julgamento. Por sua vez, o julgamento do REsp é diferente, segmentando as teses em pon- tos independentes (embora às vezes haja interdependência ou prejuízo, já que se trata de unidade decisória). É esse o motivo pelo qual você já deve ter observado decisões de REsp serem mais ou menos assim: Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 6 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Quanto à tese de afronta ao art. x, não prospera porque (...) Referente à violação dos arts. x e y, a pretensão esbarra na Súmula (...) Por fim, o dissídio pretoriano não realizou o devido cotejo analítico, pois deixou (...) No que concerne à tese de serem irrisórios os honorários advocatícios, em afronta ao art. 85 do CPC (...) Não dá a impressão de serem questões bem estanques, diversas entre si? Pois é exatamente desse jeito! A maioria das petições e recursos existentes no ordenamento jurídico brasi- leiro possui espaço para livre argumentação, e, consequentemente, livre decisão motivada, o que não acontece com as razões e decisões do recurso especial, haja vista a tecla na qual estamos dando ênfase: o recurso especial possui funda- mentação vinculada. Por isso, cada tese (ou afronta) veiculada no recurso especial em regra é ana- lisada de maneira pontual e aparentemente independente na decisão proferida, muito embora às vezes outras questões sejam analisadas conjuntamente e sem- pre deva ser observada eventual prejudicialidade. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 7 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los # Na prática Como meu objetivo é sairmos do plano teórico e conhecer- mos ideias mais concretas e úteis para a elaboração das suas petições, então é mais do que necessário pensar na questão prática, que é a feitura da sua peça recursal, buscando maiores chances de admissibilidade – e de sucesso da sua causa. Ao elaborar a petição, tenha em mente que só será decidido estritamente aquilo que for devolvido ao STJ. Portanto, desen- volva raciocínios e argumentações de maneira pontual para só depois desenvolver suas argumentações jurídicas. É óbvio que cada um tem a sua característica literária e reda- cional e isso é uma individualidade muito importante, tanto que a literatura estuda os estilos e diferenças entre os autores de va- riados gêneros e épocas com proficuidade. Longe de mim querer “homogeneizar” o jeito de cada um es- crever suas peças e defesas jurídicas! A ideia aqui é somente demonstrar o que seriam excessos de acordocom o propósito que você mesmo quer alcançar. Exces- sos esses que, pela própria ideia do termo, só atrapalham. Então vamos lá. Cuidado com aquelas petições que citam muitas doutrinas, clássicos, referências históricas e construções jurídicas. Não que isso seja ruim ou proibido. O problema é sempre o excesso. Por- tanto, elabore um texto objetivo, claro e direto. Estritamente no REsp, para fazer valer a fundamentação vin- culada, sugiro até mesmo elaborar previamente, seja no bloco de notas do computador, celular ou em um papel qualquer, um índice resumido dos pontos que serão alegados, mais ou menos assim (teses meramente exemplificativas): Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 8 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Violação a ser alegada Tese central Referências no caso Art. 1022 do CPC Omissão, porque o TJ não falou da questão x. - Aleguei no agravo de instrumento (fls...) - Aleguei nos embargos (fls...) Art. 298 e art. 489, § 1º, III, ambos do CPC Ao revogar a tutela provisória, o juiz não fundamentou seu convencimento de modo claro e preciso, de acordo com as necessidades e características do caso concreto, o que foi ratificado pelo Tribunal de origem, mantida a decisão não fundamentada. - Decisão de 1ª instância (fls...) - Constou no agravo de instrumento (fls...) - O TJ afirmou que (fls...) Arts. 186, 624 e 927 do Código Civil A empresa fulana de tal, contratada como empreiteira, injustificadamente, suspendeu a obra, causando prejuízos diversos ao recorrente e a seus clientes, devendo, por isso, arcar com as perdas e danos frutos da sua conduta. - No acórdão constou que não há responsabili- dade civil, por não ficar configurado o contrato de empreitada (fls....) Art. 85, § 2º, do CPC Honorários fixados em valor excessivo (20% sobre a causa), o que equivale a R$ 350 mil reais. - Pouco tempo de tramitação (só 1 ano e meio); - Julgamento antecipado - só prova documental; - Causa tramitou em comarca da capital. - Sem maiores problemas ou diligên- cias para o advogado. A partir desse “mapa”, você terá a orientação de como desenvolver suas razões recursais de maneira objetiva e orientada ao propósito de fundamentação vincu- lada, facilitando – e muito – o trabalho de construção textual, que partirá desse índice. #Para saber mais AgInt no AREsp 1325685/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA; AgInt no AgRg no REsp 1371046/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA; AgInt no AREsp 1307819/SC, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 9 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Erro 02 Não especificar adequada e expressamente o dispositivo de lei federal violado Pode parecer curioso, mas este ponto, muitas vezes decorrente do Erro 1, só é definido como “erro” devido à especificidade técnica do recurso especial, em cujas razões não é cabível a mera irresignação jurídica ou o simples pedido de novo julgamento da causa. Embora seja sempre necessário explicar adequadamente qual a tese jurídica en- volvida e sua aplicação ao caso concreto, é comum nos textos e razões jurídicas que as referências aos dispositivos de lei envolvidos sejam indiretas, como por exemplo: • (...) razão pela qual deve incidir ao caso o art. 166 do Código Tributário; ou • (...) levando-se em consideração o inadimplemento da obrigação, po- sitiva e líquida, conforme previsão do art. 397 do Código Civil; ou • (...) sendo inequívoco que tal conduta não configura o tipo penal do art. 21 da Lei n. 7.492/86. Sim, são formatos comuns de conclusões e raciocínios jurídicos que fazem referências a textos de lei. Entretanto, quase sempre não se aplicam ao recurso especial, cuja tecnicidade própria exige, via de regra, maiores cuidados e espe- cífica indicação do(s) dispositivo(s) tido(s) por violado(s). Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 10 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Desse modo, ao elaborar o REsp, sugiro sempre que coloque em primeiro plano nas suas alegações a afronta à lei federal, que é, afinal, a causa de pedir, a razão de ser do próprio recurso especial, demonstrando, na sequên- cia, qual o motivo dessa violação legal. Por isso, busque ter uma redação mais direta, como nos exemplos a seguir: · Nesse cenário, tem-se que o art. 166 do Código Tributário foi violado pelo Tri- bunal de origem, na medida em que (...); ou · O art. 397 do Código Civil foi afrontado, porquanto, mesmo em se tratando de obrigação positiva e líquida (...); ou · Inequívoca a negativa de vigência ao art. 21 da Lei n. 7.492/86, pois a conduta descrita na denúncia e apurada na instrução não configura o tipo penal em foco, pelos seguintes motivos (...) Observe que, em todos esses exemplos, o foco da redação foi afronta (ou vio- lação ou negativa de vigência) ao dispositivo legal, sendo explicitado o motivo com as respectivas razões, diferentemente dos primeiros exemplos (mais comu- mente utilizados), em que o ponto essencial da argumentação figura no raciocí- nio jurídico, complementado com a referência ao texto da lei. Vamos aprofundar um pouco mais esse assunto, neném? Um exemplo comparativo (caso meramente hipotético): Argumentação livre em Apelação: Explicitação do dispositivo violado: Vigora no direito brasileiro, como viga mestra de sustentação das relações jurídicas, o princí- pio da liberdade de contratar e do efeito vincu- lante dos contratos, razão pela qual não podem os juros de mora serem calculados pela taxa que esteja em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional, nos ter- mos do art. 406 do Código Civil, tendo em vista que há na cláusula 4.2 do contrato de prestação de serviços expressa previsão de juros de mora de 1% ao mês. O art. 406 do Código Civil foi violado, haja vista haver previsão contratual expressa de serem os juros de mora de 1% ao mês, não podendo ser utilizada a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impos- tos devidos à Fazenda Nacional. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 11 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 12 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Perceba a diferença: na apelação (coluna da esquerda), é possível desenvolver livremente a argumentação jurídica, o que torna o próprio texto mais solto, mais livre de ser trabalhado. Por outro lado, no REsp, a argumentação é mais objetiva, partindo da de- monstração de qual (ou quais) dispositivo foi violado. Presta atenção, neném: não estou dizendo que a única forma de expor suas razões é essa que eu trouxe no exemplo, até porque é claro que o estilo redacional de cada indivíduo deve ser respeitado, como já falei. Pode-se até mesmo utilizar o mesmo texto que expus como apelação, mas desde que especifique melhor qual o dispositivo violado, porque, da forma como está elaborado, não reúne condições de admissibilidade, já que incide a Súmula n. 284/STF. Esse enunciado, existente desde dezembro de 1963 e plenamente válido e aplicável, diz o seguinte: É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamenta- ção não permitir a exata compreensão da controvérsia (SÚMULA n. 284/STF). Deficiência na sua fundamentação e exata compreensão da controvérsia são ex- pressões que podem gerar dúvidas e ampla aplicação, especialmente pelo fato de que “compreensão” enseja juízo absolutamente subjetivo. Por essa razão, existem algumas hipóteses de aplicação desse enunciado (ao menos 10), e, no exemplo dado no quadro acima, nos depararíamos com somen- te uma dessas formas, ou seja: não foi indicado precisamente o dispositivo de lei federal violado. Assim, você precisa dizer especificamente que “o artigo x foi violado” para não correresse enorme risco. Por isso eu enfatizei anteriormente que o foco do seu texto argumentativo deve ser o(s) dispositivo(s) violado(s) para então ser demonstrada a malversação, e não, como sói acontece, o inverso (se precisar, olha lá atrás o que o tio Gi disse). Olhe só este exemplo de acórdão sobre isso: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE INDICA- ÇÃO DOS DISPOSITIVOS LEGAIS VIOLADOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 284 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF. CONEXÃO ENTRE CRIMES DE COMPETÊNCIA FEDERAL E ESTADUAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 122 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. COMPETÊNCIA DA JUSTI- ÇA FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Quanto à aplicação do princípio da insignificância, o agravante deixou Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 13 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los de indicar, expressamente, qual dispositivo de lei foi violado pelo acórdão recorrido, incidindo, na espécie, a Súmula n. 284/STF. 2. Conforme dispõe a Súmula n. 122/STJ, compete à Justiça Federal o pro- cesso e julgamento unificado dos crimes conexos de competência Federal e Estadual, não se aplicando a regra do art. 78, II, ‘a’, do Código de Processo Penal - CPP. Assim, a conexão entre os delitos previstos no art. 55 da Lei Federal n. 9.605/98 e art. 2º, caput, da Lei Federal n. 8.176/91 impõe o proces- samento perante a Justiça Federal. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 1790545/RS, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 27/08/2019, DJe 04/09/2019.) #Na prática Você já deve ter entendido, mas, para deixar bem claro: desenvolva suas razões recursais a partir da violação da lei, de modo que o leitor compreenda, logo no primeiro passar de olhos, qual o dispositivo afrontado, buscando, se possível, discurso direto. Assim, fica muito mais seguro e certo ter o seu recurso admitido quanto a esse ponto. #Para saber mais AgRg no REsp 1817683/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA; AgInt no REsp 1508703/RN, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA; AgInt no AREsp 1049022/RJ, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA; AgInt no AREsp 1465252/GO, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA; AgRg no AREsp 1477652/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA; REsp 1755958/MG, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA; REsp 1822666/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA; AgInt no AREsp 1407932/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA; AgInt no AREsp 1374956/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 14 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Erro 03 Não infirmar todos os fundamentos do acórdão acerca da questão Este é um ponto que exige um pouco mais de raciocínio jurídico. Então vamos partir de uma situação corriqueira na qual todo mundo, de alguma forma, já esteve presente. Estão num carro duas pessoas: Ana, dentista, 42 anos, que está dirigindo, e sua filha, Eduarda, estudante, 16 anos, no banco do passageiro. Ana saiu do seu consultório, pegou a filha na escola e está indo para casa almoçar antes de enfrentar o turno da tarde, em que terá reuniões para tentar se credenciar a novos planos de saúde. Eduarda geralmente aproveita esse momento no carro, quando está a sós com a mãe, para falar das descobertas da adolescência e “sondar o terreno” nas suas pretensões juvenis, principalmente porque o pai não está junto. Elas travam o seguinte diálogo, que eu mesmo inventei aqui para nosso estudo: - Oi, filha! - Oi. - Tudo bem? - Uhum! (idioma monossilábico típico de adolescentes) - Como foi na escola? - Normal. (Se você é pai/mãe de adolescente, sabe muito bem o que esse “normal” quer dizer, quase um “não me enche o saco”! kkkkkkk) - Alguma novidade? - Não... Ah, tem sim! Amanhã é aniversário da Gabrielle e ela convidou a galera pra ir à noite naquela pizzaria da praça. Posso ir? - Não! - Por que não?! Vai todo mundo! - Primeiro porque você não é todo mundo (não podia faltar a resposta típica de mãe, né?). Além do mais, você não arrumou seu quarto, como eu mandei, não fez o trabalho de geografia e também porque eu estou sem dinheiro. - Eu arrumei meu quarto, sim, você que não viu! Até troquei o lençol e coloquei aquele rosa que Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 15 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los você comprou! O professor cancelou o trabalho de geografia, porque ele disse que só precisa fazer quem não tiver tirado 7 na prova, eu tirei 8,5, então já passei de ano e não preciso fazer. E você não precisa me dar dinheiro, porque eu guardei o dinheiro que minha vó me deu de natal e eu uso ele. - Mas você não vai mesmo assim! - Mas mãe, por quê? - Porque eu não gosto da Gabrielle e acho que ela não é uma boa companhia para você. - Você que sempre implicou com ela. Ela tira boas notas, você sabe onde ela mora, é amiga dos pais dela, como pode não gostar dela? - Vou pensar no seu caso, Eduarda! Tirando o fato de que estou me sentindo quase um roteirista de novela infantil, algumas conclusões iniciais sobre esse diálogo: 1. Grande chance de Eduarda tornar-se advogada! 2. Ana deu 3 motivos para Eduarda não ir à pizzaria: não arrumou o quarto; não fez o trabalho de geografia; falta de dinheiro. 3. Pela autoridade ínsita à condição de mãe (poder familiar), qualquer dos moti- vos seria suficiente, por si só, para impedir que Eduarda fosse ao aniversário. 4. Eduarda insurgiu-se impugnando os 3 motivos utilizados por Ana. 5. Em acréscimo, um 4º motivo surgiu (não gosto da Gabrielle), que também foi questionado por Eduarda (você que sempre implicou). Agora vamos trazer esse diálogo para o universo jurídico do recurso especial, porque ele tem muito a nos ensinar! Creio que você já deva ter entendido a analogia entre a mãe decidir (acórdão) e a filha recorrer (REsp). Até aí é simples, não é mesmo? O essencial vem agora: vamos identificar os trechos do diálogo como se fossem situa- ções jurídicas: - Amanhã é aniversário da Gabrielle e ela convidou a galera pra ir à noite naquela pizza- ria da praça. Posso ir? (Pedido dirigido ao TJ/TRF, seja em ação autônoma ou fase recursal.) - Não! (Negado provimento ou improcedência.) - Por que não?! Vai todo mundo! Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 16 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los - Primeiro porque você não é todo mundo (não podia faltar a resposta típica de mãe, né?). Além do mais, você não arrumou seu quarto, como eu mandei, não fez o trabalho de geografia e também porque eu estou sem dinheiro. (Fundamentos da negativa, no total de 3 motivos.) - Eu arrumei meu quarto, sim, você que não viu! Até troquei o lençol e coloquei aquele rosa que você comprou! O professor cancelou o trabalho de geografia, porque ele disse que só precisa fazer quem não tiver tirado 7 na prova, eu tirei 8,5, então já passei de ano e não preciso fazer. E você não precisa me dar dinheiro, porque eu guardei o dinheiro que minha vó me deu de natal e eu uso ele. (Impugnação aos 3 fundamentos utilizados.) - Mas você não vai mesmo assim! - Mas mãe, por que? - Porque eu não gosto da Gabrielle e acho que ela não é uma boa companhia para você. (Novo fundamento surgiu.) - Você que sempre implicou com ela. Ela tira boas notas, você sabe onde ela mora, é amiga dos pais dela, como pode não gostar dela? (Impugnação ao 4º fundamento utilizado.) - Vou pensar no seu caso, Eduarda! (Retirado de pauta.) Agora vamos pensar que os motivos de Ana são os fundamentos de um acórdão e as insurgências de Eduarda são os argumentos de um recurso especial. De maneira siste- matizada, temos o seguinte esquema: Não arrumou o quarto Arrumei, sim. Você que não foi conferir. Até troquei o lençol. Não fez o trabalho de geografia Não preciso mais fazer, porque o professor cance- lou Estousem dinheiro Eu tenho a grana que minha vó me deu no natal Não gosto dela, é uma companhia ruim Você que sempre implicou com ela Sabemos que, pela autoridade que Ana possui como mãe, ela nem precisaria dar moti- vos, mas isso é psicologicamente inconsistente. Então, mesmo que ela quisesse dar só um motivo, seria suficiente para subsidiar sua decisão. A questão é que Eduarda impug- nou cada um dos fundamentos. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 17 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Imaginemos que Eduarda tivesse falado que tinha arrumado o quarto e que não precisa- va mais fazer o trabalho de geografia. Mesmo assim, o motivo de Ana “estar sem dinhei- ro” seria suficiente, por si só, para manter a autoridade da sua decisão. Por isso, para que Eduarda conseguisse derrubar a decisão, seria preciso, para começar, questionar todos os motivos que ela elencou. E ela fez isso. Mas, depois, Ana trouxe mais um motivo, que é o fato de não gostar da amiga Gabrielle (preocupações legítimas de mãe). E esse motivo também foi impugnado pela Eduarda. Se ela não tivesse impugnado esse motivo, a decisão de Ana restaria soberana, porque somente ele é, por si só, suficiente para manutenção da decisão tomada. Em outras palavras, é um jogo argumentativo: tese – antítese - síntese. Você deve estar se perguntando: mas tio Gi, qual o motivo de analisarmos esse diálogo com tantas abordagens? É porque ele representa a ideia central, traduzida em uma situ- ação cotidiana, de um dos erros mais comuns do recurso especial e que gera sua inad- missibilidade, materializada pela Súmula n. 283/STF. Então, mudando a linguagem para o juridiquês, vejamos o que diz o texto dessa Súmula: É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles (Súmula n. 283/STF). Esse enunciado, editado pelo STF em dezembro de 1963, consolida a ideia de que no REsp não é possível, mesmo quando conhecido, decidir além de seu objeto e de suas ra- zões. Por isso, é imprescindível analisar o acórdão recorrido de forma a mapear adequadamente os fundamentos utilizados para cada ponto e, assim, im- pugná-los um a um no recurso especial. Do contrário, permanecerá hígido o decisum proferido. Trocando em miúdos, o Enunciado n. 283/STF diz que não adianta julgar o recurso, pois, mesmo que eventualmente provido, não terá essa decisão força suficiente para descons- tituir o acórdão recorrido, tendo em vista que alguns fundamentos não foram devida- mente infirmados. É usual ocorrer esse tipo de circunstância quando o acórdão fundamenta e em seguida traz acréscimos do tipo “ainda que assim não fosse (...)” ou “mesmo que superado/afas- tado esse entendimento (...)” Preste atenção: mais de um motivo (leia-se: fundamento) foi utilizado para justificar aquela conclusão jurídica. Portanto, todos esses motivos devem ser infirmados no re- curso especial, da mesma forma que na história entre Ana e sua filha Eduarda. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 18 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los A questão possui tamanha relevância que foi incorporada ao texto da lei, as- sim constando no Código de Processo Civil vigente: Art. 932. Incumbe ao relator: III – não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida. Nota-se que a redação desse dispositivo não é a mesma da Súmula n. 283/STF (em verdade, é praticamente o mesmo texto da Súmula n. 182/STJ), mas possui a igualdade da ideia: impugnação de todos os fundamentos da decisão recorrida. Agora fale a verdade para o tio Gi: está ficando mais claro, não está? É óbvio que não podemos esquecer os capítulos da decisão judicial, de modo que a impugnação específica disposta nesse art. 932, III, refere-se a fundamentos dentro do mesmo capítulo decisório. Vamos olhar um acórdão para entender um pouco mais essa questão: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIO- NAL DE ALUGUEL. VALOR DO ALUGUEL FIXADO EM QUANTIA SUPERIOR À PLEITEADA NA INICIAL. JULGAMENTO ULTRA PETITA. NÃO OCORRÊN- CIA. NULIDADE DA PROVA PERICIAL. FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RE- CORRIDO NÃO IMPUGNADOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 283/STF. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Não configura ofensa ao art. 1.022 do CPC/2015 o fato de o col. Tribunal de origem, embora sem examinar individualmente cada um dos argumentos suscitados pelo recorrente, adotar fundamentação contrária à pretensão da parte, suficiente para decidir integralmente a controvérsia. 2. Segundo o entendimento do STJ, não configura julgamento ultra petita a fixação de aluguel em valor superior ao pleiteado pela parte na ação revisio- nal, pois a quantia requerida é meramente estimativa, a depender de laudo pericial e da fixação pelo juiz. Precedentes. 3. A ausência de impugnação, nas razões do recurso especial, de funda- mentos suficientes à manutenção do acórdão estadual, quanto ao desin- teresse na produção da prova pericial e à preclusão para impugnar seu conteúdo, atrai a incidência da Súmula 283 do STF. 4. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1449843/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TUR- MA, julgado em 03/09/2019, DJe 19/09/2019.) Nesse caso, interessante refletir sobre as ponderações do Ministro Raul Araú- jo em sua decisão monocrática, a qual consignou expressamente que o recurso Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 19 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los especial apontou o art. 473, § 3º, do CPC como violado, visto que “a perícia é nula, pois ‘lastreada exclusivamente na avaliação de outros imóveis do condomí- nio industrial do próprio recorrido”. E decidiu o titio Raul Araújo: Ainda, no tocante à alegação de nulidade da prova pericial, foi disposto que ‘a apelante se manifestou pelo desinteresse na produção da prova e não im- pugnou seu conteúdo, tornando preclusa a faculdade processual de impug- nação da decisão e inviável a rediscussão a respeito da finalização da perícia’. Ocorre que a parte recorrente não impugnou a fundamentação acima, autô- noma e suficiente à manutenção do aresto hostilizado, a qual permaneceu incólume. Vamos entender: 1º - O acórdão de origem solucionou a controvérsia com dois fundamentos: a) teria a apelante se manifestado no sentido de não ter interesse em produção da prova pericial; e b) não ter impugnado o seu conteúdo, caracterizando-se a preclusão para questionar o ato de realização da perícia. 2º - No recurso especial, apesar de indicar violação do art. 473, § 3º, do CPC diante da nulidade da perícia, não teria sido infirmado o fundamento de preclu- são, que é autônomo e suficiente por si só, dentro do próprio capítulo da senten- ça, para manter o acórdão recorrido. Por isso, a incidência da Súmula n. 283/STF. Será que agora está clareando a mente? #Na prática Uma dica prática para evitar esse equívoco é: faça uma espécie de mapa dos fundamentos utilizados no acórdão recorrido, igual fizemos acima no exemplo da Ana e da Eduarda, mãe e filha. Você pode fazer isso de forma simples: usando um papel, celular ou computador. Escreva quais os fun- damentos utilizados pelo acórdão recorrido. Após, elabore a petição do REsp, confira se todos os itens anotados estão correta e claramente impugnados no texto da sua petição. Ah, outra ideia interessante é utilizar pequenos títu- los para separar as questões, os chamados intertítu- los, o que facilita a leitura e a agilidade de localiza- ção de tópicos. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 20 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los #Para saber mais AgInt no REsp 1673329/DF, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TUR- MA; REsp 1812097/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA; AgInt no REsp 1619661/MG, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA;AgInt no AREsp 1364933/MS, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA; AgInt no AREsp 1159241/PR, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA; AgInt no AREsp 1360924/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUAR- TA TURMA. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 21 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 22 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Erro 04 Apontar afronta à Constituição Federal Para adentrarmos nesse próximo erro, é imprescindível lembrarmos uma lição introdu- tória do Direito. Pois bem. Lembra o que é competência? Podemos dizer que seria o conjunto de limites dentro dos quais cada órgão do Judiciário exerce sua função jurisdicional de maneira legítima. Vamos ver o que diz alguém mais importante do que eu (por enquanto, hehehe): A competência é a quantidade de jurisdição, de ‘poder jurisdicional’, cujo exercício é atribuído a cada órgão. É, por isto mesmo, a concretização da jurisdição, como verdadeira repartição ideal dela, identificando qual órgão jurisdicional deve atuar perante qual situação e em qual território. (Cássio Scarpinella Bueno, Curso Sistematizado de Direito Processual Civil – vol. 1, 7ª ed., São Paulo: Saraiva, 2013, p. 262). Competência é a demarcação dos limites em que cada juízo pode atuar. Em- bora comumente se diga que competência é a medida da jurisdição, isto é, a jurisdição para o caso específico, deve-se frisar que a questão não é, exa- tamente, de quantidade, mas dos limites em que cada órgão pode exercer legitimamente a função jurisdicional. Trata-se de fixação de limites, não de mensuração de quantidade. (Elpídio Donizetti, Curso Didático de Direito Processual Civil, 17ª, São Paulo: Atlas, 2013, p. 256). Agora que já refrescamos a memória, sabemos que essas regras de competência não servem somente para a 1ª instância, não é mesmo? Elas servem para todos os tribunais e instâncias, ainda mais quando decorrem expressamente da Constituição Federal! Agora que já refrescamos a memória, sabemos que essas regras de competência não servem somente para a 1ª instância, não é mesmo? Elas servem para todos os tribunais e instâncias, ainda mais quando decorrem expressamente da Constituição Federal! Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 23 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los É exatamente aí que a porca torce o rabo. A Constituição é categórica ao estabelecer que compete ao STJ julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos TJs ou TRFs, quando a decisão contrariar tratado ou lei federal ou ne- gar-lhes vigência – art. 105, III, a. O texto da norma constitucional é claro ao se referir às espécies normativas contraria- das que podem ser questionadas em especial: lei federal e tratado. Na maioria das vezes, diante da estrutura da nossa organização juspolítica, o recurso versa sobre lei federal. Agora eu te pergunto uma coisa: onde se situa a lei federal naquela nossa velha conhe- cida “hierarquia das leis”, na inesquecível pirâmide de Hans Kelsen? Pronto, para não correr o risco de você dizer que não lembra, eu a trouxe para sua con- sulta: a ideia central da hierarquia das leis é essa do desenho. Lei federal, independente da sua categorização em lei complementar, lei ordinária, medida provisória etc., é uma norma hierarquicamente inferior à Constituição e superior aos atos normativos concretos (resoluções, decretos com efeitos concretos, portarias etc.). Então, eu te pergunto uma coisa: é possível alegar no REsp que um dispositivo da Cons- tituição foi violado? Não, neném, não é possível, por dois motivos: Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 24 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Primeiro, porque qualquer dispositivo da Constituição não é lei federal. Segundo, porque compete ao STF analisar suposta afronta a dispositivos da Constitui- ção, e isso está categoricamente disposto no art. 102, III, da CF/88, que diz: Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição. Pergunto novamente: a qual órgão compete analisar eventual afronta a norma consti- tucional? Ao STF, claro! É isso que está no art. 102, III, a, da CF. E a análise de eventual afronta a lei federal? Isso também já vimos: cabe ao STJ, conforme art. 105, III, a, da CF. Então, já que a regra é “cada um no seu quadrado”, como diria o axé da Dança do Qua- drado, o quadrado do STF é julgar afronta à Constituição Federal (recurso extraordinário) e o quadrado do STJ é julgar ofensa à lei federal (recurso especial). Então por que tantas petições de REsp apontam afronta a dispositivos da Constituição? Acredito que a resposta, em sua maioria, seja desconheci- mento da sistemática dos recursos destinados aos tribunais superiores, cujas características permitem a interposição simultânea de recurso espe- cial para o STJ e extraordinário para o STF, em exceção ao princípio da unir- recorribilidade recursal. Essa metodologia, como você deve se lembrar, não é nova, já estando prevista no art. 541 do CPC/73, sendo mantida na atual sistemática processual, art. 1.029 do CPC vigen- te, sendo tão importante que, muitas vezes, a depender da circunstância em julgamento e dos fundamentos utilizados pelo Tribunal de origem, é imprescindível a interposição simultânea dos dois recursos (veremos isso adiante). O fato é que: jamais, nunca, never alegue no REsp que um artigo da Constituição Federal teria sido violado, pois esse é um erro GRITANTE e como diria um colega que também é assessor, em tom de brincadeira: “Que bobinhx! X advogadx nem sabe pra que serve o STJ!” Para essa lição ficar bem marcada, vamos ver a jurisprudência? ADMINISTRATIVO. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 3/STJ. SERVIDOR PÚBLICO. FGTS. ACÓRDÃO BASEADO EM FUNDAMENTO EMINENTEMEN- TE CONSTITUCIONAL. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 25 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los 1. A hipótese permitida constitucionalmente para interposição de recurso especial pela alínea ‘a’ do inciso III do artigo 105 da CF, em suma, restringe- -se à violação de Tratado ou dispositivo de Lei Federal, excluída, portanto, da competência atribuída a esta Corte Superior, a apreciação e julgamen- to de suposta afronta à norma da Constituição Federal. Precedentes. 2. Agravo interno não provido. (AgInt nos EDcl no REsp 1761945/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/02/2019, DJe 26/02/2019.) # Na prática Muito fácil: só aponte afronta à lei federal. Somente utilize a Constituição, se necessário, para fundamentação de teses jurídicas, mas não aponte um dispositivo da CF como se tivesse sido violado. Se houver ofensa à Constituição, interponha o com- petente Recurso Extraordinário para o STF, nos ter- mos do art. 102, III, a. #Para saber mais REsp 1816307/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA; AgInt no AREsp 1370746/SC, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA; AgInt no AREsp 805.749/DF, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA; REsp 1672894/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA; AgRg no REsp 1075022/SC, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 26 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Erro 05 Apontar lei local como violada Como vimos no erro anterior, agora você já sabe que não pode alegar afronta a disposi- tivos da Constituição Federal, pois o meio correto para isso é o recurso extraordinário, dirigido ao Supremo Tribunal Federal. Mas o art. 105, III, a, da CF/88 traz maisinformações necessárias ao estudo do REsp e que – pasmem – causam grandes e absurdos erros na interposição. Esse dispositivo é expresso ao dizer que caberá recurso especial por afronta a tratado ou lei federal. Não é qualquer lei: é somente lei federal, federal, federal, fe-de-ral, F-E- -D-E-R-A-L! Então, neném, o que é lei federal? 1º - Lei é todo ato normativo abstrato e genérico emanado do Poder Legislativo por de- corrência direta da Constituição. 2º - Federal é a lei produzida para regular relações na ordem federal ou nacional, em regra, produzidas pelo Congresso Nacional. Importante colocar, em regra, porque existem algumas hipóteses legislativas que se en- quadram no conceito de lei federal para fins de interposição do REsp mas não são pro- duzidas pelo Congresso Nacional, como Medidas Provisórias e Decretos. Também existem algumas leis que são federais mas cujo conteúdo não é federal (devido à peculiaridade do Distrito Federal, por exemplo, a lei de organização judiciária do DF). Esse erro é comum, uma vez que causas são levadas ao Judiciário – legitimamente –, cujas relações jurídicas são estabelecidas de acordo com o previsto na legislação dos Estados e Municípios, que detêm, como sabemos, Poder Executivo e Legislativo e, por isso, produzem leis e atos próprios. Então, vamos entender a questão da melhor forma possível, ou seja, fazendo você ter mais clientes, claro! Um exemplo: chega a você um novo e potencial cliente e narra seu problema, que tem a ver com matéria tributária, quanto ao pagamento do IPTU. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 27 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Onde está previsto esse tributo? a) Constituição Federal: art. 156, I; b) Código Tributário Nacional (Lei n. 5.172/66): arts. 32 a 34; c) Leis e decretos do Município onde está situado o imóvel do seu cliente (ou do Distrito Federal, que não tem Município, por previsão constitucional). Quem advoga na área tributária, sabe que é um emaranhado de normas, referências e alterações que dá nó na cabeça de qualquer mortal (e talvez até dos deuses do Olimpo). Em 1ª e 2ª instância, é plenamente possível – e deveras necessário, muitas vezes – fundamen- tar suas pretensões e argumentar a questão nas leis regentes da matéria, sejam elas federais, estaduais ou municipais (ou até espaciais, se houvesse)! Mas, não é sempre assim, neném! Chegando ao STJ via REsp, você não pode simplesmen- te alegar que a lei federal (Código Tributário) e as leis municipais foram violadas, porque essas leis municipais NÃO são federais, portanto não se encaixam no conceito de lei federal previsto no art. 105, III, a, da Constituição Federal. Você até pode vir a mostrar que a lei federal, que no nosso exemplo é o Código Tribu- tário, foi violada, sendo por isso cabível o REsp. Mas não pode dizer que houve afronta à lei municipal (ou distrital ou estadual), porque o STJ, em outras palavras, vai dizer o seguinte: “não tenho nada a ver com isso, já que compete ao Tribunal de Justiça de cada Estado dar a última palavra sobre as leis locais”. É esse o sentido do Enunciado n. 280/STF: Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário. (Súmula n. 280/STF). Então, chega de passar a vergonha de dizer no REsp que lei local (estadual, municipal ou distrital) foi violada, porque agora você já sabe que isso não pode, certo? Veja um exemplo de julgado do STJ: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TOMBAMENTO. INVIABI- LIDADE DE ANÁLISE DE LEI MUNICIPAL EM RECURSO ESPECIAL. SÚMU- LA 280/STF. ENUNCIADOS SUMULARES DE TRIBUNAIS NÃO SE EQUIPA- RAM A LEIS FEDERAIS, PARA FINS DE INTERPOSIÇÃO DO APELO NOBRE. INVIABILIDADE DE EXAME DE NORMAS CONSTITUCIONAIS, SOB PENA DE USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO STF. INOCORRÊNCIA DE VÍCIOS NA FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. JULGAMENTO CITRA E EXTRA PETITA. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284/STF. SUSCITADO CERCEAMENTO DE DEFESA NO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE E NA JUNTADA DE DOCUMENTOS. INVERSÃO DO JULGADO. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. PEDIDO DEMOLITÓ- RIO. FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO RECORRIDO NÃO ATACADO. SÚMULA 283 DO STF. INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS, PRESTAÇÃO DE CAU- ÇÃO E CONFIGURAÇÃO DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ NA PROPOSITURA DA Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 28 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los AÇÃO. NOVA ANÁLISE DOS FATOS E PROVAS DA CAUSA. DESCABIMENTO. CONDENAÇÃO DO AUTOR DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM HONORÁRIOS. MÁ-FÉ AFASTADA. IMPOSSIBILIDADE. ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTO- NIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. FALTA DE COTEJO ANALÍTICO. FINALMENTE, AUSÊN- CIA DE INTERESSE RECURSAL. PEDIDOS MINISTERIAIS JULGADOS TO- TALMENTE IMPROCEDENTES - A FAVOR DAS PARTES ORA AGRAVANTES, PORTANTO. AGRAVO INTERNO DOS PARTICULARES A QUE SE NEGA PRO- VIMENTO. 1. Nos termos do que decidido pelo Plenário do STJ, aos recursos interpos- tos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na for- ma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (Enunciado Administrativo 2). 2. Inexiste a alegada violação dos arts. 2º, 126, 128, 458, 459, 460 e 535 do CPC/1973, pois a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, conforme se depreende da análise do acórdão recorrido. O Tribu- nal de origem apreciou fundamentadamente a controvérsia, não padecendo o acórdão recorrido de qualquer omissão, contradição ou obscuridade. Ob- serve-se, ademais, que julgamento diverso do pretendido, como na espécie, não implica ofensa à norma ora invocada. 3. O Recurso Especial se fundamenta, em diversos momentos, em suposta violação da Lei Municipal 3.781/2013 (fls. 2.724, 2.786, 2.787, 2.813, 2.819); o acórdão recorrido, por sua vez, baseou-se na necessidade de atendimento dos requisitos da Lei Municipal 428/1979 - o Código de Obras do MUNICÍPIO DE SANTO ÂNGELO/RS - para negar o pedido de demolição do imóvel (fls. 2.599/2.600). Inviável, assim, a modificação das conclusões do acórdão re- corrido no ponto, pois tal providência exigiria a análise de Legislação local, vedada à luz da Súmula 280/STF. [...] 18. Agravo Interno dos Particulares a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 842.731/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/06/2019, DJe 27/06/2019.) Mas tem outra coisa: mesmo que você aponte somente lei federal como violada, é tam- bém possível que essa eventual afronta só possa ser verificada pelo STJ se também for apreciada a legislação local. Para exemplificar, vamos usar o mesmo caso do IPTU. Nessa hipótese, você alega afronta aos correspondentes dispositivos do Código Tributá- rio, alegando que a alíquota incidente deve ser de natureza residencial e não comercial, como entendeu a Corte de origem. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 29 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Até aqui estaria tudo certo, mas tem um “probleminha” essencial: o Tribunal de Justiça estadual entendeu que a alíquota seria comercial porque a legislação urbanística do mu- nicípio prevê que a região onde situada o imóvel tem destinação comercial. Nesse caso, você já percebeu que a decisão judicial teve que analisar a legislação mu- nicipal para concluir qual o destino dado ao imóvel e, por conseguinte, definir qual a alíquota tributária incidente. Assim, da mesma forma, não pode o STJ examinar a legislação local para verificar se o entendimento proferido pela Corte estadual está ou não alinhado com os termos da lei municipal e o sentido dado quanto ao destino do imóvel no plano urbanístico e conse- quente legislação. Por isso, mesmo que você indique no seu REsp somente dispositivos de lei federal como violados, oSuperior Tribunal não poderá verificar se ocorre- ram as alegadas afrontas, visto que a análise demandaria, obrigatoriamen- te, exame da lei local, o que também atrai o mesmo Enunciado n. 280/STF. É um pouco mais elaborado esse raciocínio do que na primeira hipótese, não é mesmo? Mas veja o seguinte julgado: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 1º DO DECRETO 20.910/1932 E DOS ARTS. 186 E 927 DO CÓDIGO CIVIL/2002. DEFICIÊNCIA NA FUNDA- MENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. PRESTAÇÕES DE TRATO SUCESSIVO. SÚ- MULA 85/STJ. DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF, APLICADA POR ANALOGIA. ANÁLISE DE LEGISLAÇÃO LOCAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 280/STF. 1. Cuida-se, na origem, de ação objetivando o pagamento/implantação de quinquênio no percentual de 5% (cinco por cento) sobre o salário-base. 2. Não se conhece de Recurso Especial no que se refere à violação ao art. 1º do Decreto 20.910/1932 e aos arts. 186 e 927 do Código Civil/2002, quando a parte não aponta, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Aplicação, por analogia, da Súmula 284/STF. 3. Em se tratando de relação de trato sucessivo, o indeferimento do pedido pela Administração é o termo a quo para o cômputo do prazo quinquenal. Em não havendo negativa expressa, o entendimento jurisprudencial é de que nas hipóteses em que a Administração, por omissão, não paga benefí- cios aos servidores, a prescrição não atinge o próprio fundo de direito, mas tão somente as parcelas vencidas a mais de cinco anos da propositura da ação, nos termos da Súmula 85/STJ. 4. A demanda foi dirimida no acórdão recorrido com base em Direito lo- cal (Lei Orgânica do Município de Juazeirinho e Lei Municipal 246/1997). Logo, é inviável sua apreciação em Recurso Especial, em face da incidên- Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 30 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los cia, por analogia, da Súmula 280 do STF: “por ofensa a direito local não cabe Recurso Extraordinário”. 5. Recurso Especial não conhecido. (REsp 1814166/PB, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/08/2019, DJe 05/09/2019.) # Na prática Em primeiro lugar, jamais diga que uma lei local foi violada, porque você não merece mais passar por essa vergonha, não é mesmo? Em segundo lugar, busque isolar as teses jurídicas entre lei federal e lei local, extraindo da controvérsia somente a tese jurídica com referência à legislação federal. É possível que em alguns casos seja quase indissociável e, por isso, talvez impossível fugir do Enunciado n. 280/STF. Nesse caso, sugiro que você use toda sua capacidade estratégica na construção de teses jurídicas e desen- volva esse potencial argumentativo ínsito à advoca- cia. Não, eu não estou sendo irônico, estou sendo sincero e te explico o por quê. Você terá mais trabalho, é óbvio, mas não adianta dar “murro em ponta de faca”. Será necessário de- duzir teses jurídicas tangenciais à questão principal para ter mais chance de admissibilidade. É necessário pensar com outras regras do jogo. Isso te dá absoluta chance de admissibilidade? É cla- ro que não! Mas aumenta – e muito – as chances, a depender da forma e do conteúdo que você aborde no seu recurso especial, lembrando, claro, da neces- sidade do famoso prequestionamento. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 31 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los # Para saber mais AgInt no AREsp 1419534/DF, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA; AgInt nos EDcl no AREsp 1160270/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, Rel. p/ Acórdão Ministro NAPO- LEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA; AgInt no AgInt no AREsp 1070584/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA; AgInt no AREsp 1206646/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA; AgInt no AREsp 1266937/SP, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA; AgInt no REsp 1583923/RR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA; AgInt no AREsp 792.500/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA; AgInt no AREsp 1124027/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA; REsp 1701865/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA; AgRg no AREsp 892.699/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 32 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Erro 06 Não comprovar feriado local ou sus- pensão do expediente Esse ponto já gerou algumas boas e várias controvérsias, principalmente devido à apa- rente quebra de paradigma com a sistemática do atual CPC de 2015 e também com a mudança de procedimento adotado na vigência do CPC de 1973. No CPC anterior, 0após entendimento do STF dizendo que era possível comprovar feria- do local (ou encerramento antecipado do expediente) em sede de agravo interno, o que passou a ser aplicado também pelo STJ, a mudança legal introduzida pelo CPC de 2015 causou novo debate. A essência da controvérsia é porque o art. 932, parágrafo único, da Lei Adjetiva assevera: Art. 932, parágrafo único. Antes de considerar inadmissível o recurso, o re- lator concederá o prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível. Essa norma alinha-se ao sistema de princípios do Código, que se lastreia na primazia do mérito, razão pela qual prevista a intimação do(a) recorrente para sanar vicio ou complementar a documentação antes de o recurso ser simplesmente “não conhecido”. Por outro lado, existem dois outros artigos no CPC que causaram confusão. São eles: Art. 1.003, § 6º. O recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso. Art. 1.029, § 3º. O Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justi- ça poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar sua correção, desde que não o repute grave. Vemos que o art. 1.003, § 6º, é categórico ao dizer que o feriado local deve ser compro- vado no ato da interposição do recurso, sem qualquer ressalva. Além do mais, a desconsideração do vício formal permitida pelo art. 1.029, § 3º, só pode ocorrer se o recurso for tempestivo. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 33 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 34 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Então, a matéria foi solucionada pelo órgão jurisdicional máximo do STJ, que é a Corte Especial, entendendo que o próprio Código estabelece que a tempestividade deve ser comprovada no ato da interposição do REsp, não sendo aplicável o parágrafo único do art. 932, tendo em vista que na pró- pria legislação consta que a desconsideração de vício formal exige, em pri- meiro lugar, que o recurso seja tempestivo. Vamos estudar o julgado: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FERIADO LOCAL. COMPROVAÇÃO. ATO DE INTERPOSIÇÃO DO RECURSO. 1. O propósito recursal é dizer, à luz do CPC/15, sobre a possibilidade de a parte comprovar, em agravo interno, a ocorrência de feriado local, que en- sejou a prorrogação do prazo processual para a interposição do agravo em recurso especial. 2. O art. 1.003, § 6º, do CPC/15, diferentemente do CPC/73, é expresso no sentido de que ‘o recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso’. 3. Conquanto se reconheça que o novo Código prioriza a decisão de mérito, autorizando, inclusive, o STF e o STJ a desconsiderarem vício formal, o § 3º do seu art. 1.029 impõe, para tanto, que se trate de ‘recurso tempestivo’. 4. A intempestividade é tida pelo Código atual como vício grave e, portanto, insanável. Daí porque não se aplica à espécie o disposto no parágrafo único do art. 932 do CPC/15, reservado às hipóteses de vícios sanáveis. 5. Seja em função de previsão expressa doatual Código de Processo Civil, seja em atenção à nova orientação do STF, a jurisprudência construída pelo STJ à luz do CPC/73 não subsiste ao CPC/15: ou se comprova o feriado local no ato da interposição do respectivo recurso, ou se considera intempestivo o recurso, operando-se, em consequência, a coisa julgada. 6. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 957.821/MS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 20/11/2017, DJe 19/12/2017.) Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 35 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los #Era uma vez a segunda-feira de carnaval... Tem gente que gosta de festejar, tem gente que aproveita mesmo é para descan- sar, outros ainda para fazer retiros espirituais ou religiosos. Tanto faz. O que importa é que o famoso feriado de carnaval é tradicionalíssimo – e desejado pela maioria. Mas entre o descanso e a cerveja, enquanto alguns cantam “Oh, abre alas que eu quero passar”, outros são arrastados e pisoteados pelos intermináveis trios elé- tricos e outros mais esquecem que depois de nove meses você tem o resultado, uma questão jurídica com grande repercussão surgiu no STJ. Preste atenção, neném! No julgamento do REsp 1.813.684/SP, após idas e vindas, pedidos de vista, votos divergentes, convergentes e novas divergências, formação de ao menos 3 corren- tes dentro do STJ, problemas de modulação de efeitos e outras complicações, a Corte Especial (órgão máximo jurisdicional do STJ) definiu os seguintes pontos: A controvérsia inicial limitava-se à segunda-feira de carnaval, mas a decisão foi ampliada para todos os feriados locais; A segunda-feira de carnaval e corpus christis não são feriados nacionais, por não estarem previstos na Lei n. 6.802/80 c/c a Lei n. 9.093/95; Mesmo sendo praxe não ter expediente forense nessas datas, não pode ser pre- sumido o ponto facultativo nesses dias, ante o expresso impedimento do CPC; É obrigatório comprovar que a segunda-feira de carnaval e o dia de corpus christis é ponto facultativo ou feriado, juntando o respectivo ato normativo no momento da interposição do REsp, conforme exigido pelo CPC 1.003, § 6º do CPC; A ausência de expediente não pode ser comprovada posteriormente. Logo, se você não demonstrar esse fato na interposição do REsp, seu recurso não vai ser conhecido e já era, você não terá outra chance. Ante as inúmeras controvérsias surgidas entre os titios e titias da capa preta na Corte Especial, buscaram uma posição conciliatória, sugerida pelo titio Luis Felipe Salomão, prevista no art. 927, § 3º, do CPC. Conclusão do julgamento: todo e qualquer feriado local, ponto facultativo ou suspensão do expediente (incluindo segunda-feira de carnaval e corpus christi) deve ser comprovado no ato da interposição do REsp, sob pena de não conheci- mento. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 36 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Modulação dos efeitos: fica permitida a comprovação posterior à interposição do REsp para aqueles recursos interpostos até a data de publicação do acórdão, que ocorreu em 18 de novembro de 2019, salvo se já tiver transitado em julgado. Para seu límpido estudo, veja a ementa desse julgado: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. FERIADO LOCAL. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO NO ATO DE INTERPOSIÇÃO DO RECURSO. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO. NECESSIDADE. SEGURANÇA JURÍDICA. PROTE- ÇÃO DA CONFIANÇA. 1. O novo Código de Processo Civil inovou ao estabelecer, de forma expressa, no § 6º do art. 1.003 que “o recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso”. A interpretação sistemática do CPC/2015, notadamente do § 3º do art. 1.029 e do § 2º do art. 1.036, conduz à conclusão de que o novo diploma atribuiu à intempestividade o epíteto de vício grave, não havendo se falar, portanto, em possibilidade de saná-lo por meio da incidência do disposto no parágrafo único do art. 932 do mesmo Código. 2. Assim, sob a vigência do CPC/2015, é necessária a comprovação nos autos de feriado local por meio de documento idôneo no ato de interposição do recurso. 3. Não se pode ignorar, todavia, o elastecido período em que vigorou, no âmbito do Supremo Tribunal Federal e desta Corte Superior, o entendimento de que seria possível a comprovação posterior do feriado local, de modo que não pare- ce razoável alterar-se a jurisprudência já consolidada deste Superior Tribunal, sem se atentar para a necessidade de garantir a segurança das relações jurídi- cas e as expectativas legítimas dos jurisdicionados. 4. É bem de ver que há a possibilidade de modulação dos efeitos das decisões em casos excepcionais, como instrumento vocacionado, eminentemente, a ga- rantir a segurança indispensável das relações jurídicas, sejam materiais, sejam processuais. 5. Destarte, é necessário e razoável, ante o amplo debate sobre o tema instala- do nesta Corte Especial e considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança, da isonomia e da primazia da decisão de mérito, que sejam modulados os efeitos da presente decisão, de modo que seja aplicada, tão somente, aos recursos interpostos após a publicação do acórdão respectivo, a teor do § 3º do art. 927 do CPC/2015. 6. No caso concreto, compulsando os autos, observa-se que, conforme docu- mentação colacionada à fl. 918, os recorrentes, no âmbito do agravo interno, comprovaram a ocorrência de feriado local no dia 27/2/2017, segunda-feira de carnaval, motivo pelo qual, tendo o prazo recursal se iniciado em 15/2/2017 (quarta-feira), o recurso especial interposto em 9/3/2017 (quinta-feira) deve ser considerado tempestivo. 7. Recurso especial conhecido. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 37 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los (REsp 1813684/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 02/10/2019, DJe 18/11/2019) Esse julgamento foi um importante marco devido à modulação dos efeitos re- alizada, tanto que a AASP – Associação dos Advogados de São Paulo, amicus curiae na causa, publicou uma nota celebrando o fato: “A decisão proferida hoje pela Corte Especial representa uma significativa vitória dos jurisdiciona- dos e da advocacia”. # Na prática Atentar-se ao prazo é algo essencial, tanto que muito conhece- mos a velha brincadeira: “advogado não tem vida, tem prazo”. Mas, além disso, você deve comprovar no próprio REsp (e isso também vale para o recurso extraordinário) que houve feriado local, seja municipal, estadual ou distrital, ponto facultativo ou que o expediente foi encerrado mais cedo, juntando inclusive cópia da lei ou do ato normativo respectivo. Essa exigência tam- bém é válida para a segunda-feira de carnaval e dia de corpus christi. Desse modo, sempre confira corretamente o prazo recursal e, caso haja um feriado local ou a suspensão do expediente, lem- bre-se de alegar isso em preliminar no REsp e juntar o respecti- vo ato! Você já percebeu, neném, que aqui é onde “a porca torce o rabo” e, se você não tomar cuidado, vai acabar se lascando por não po- der comprovar o prazo depois de interposto o recurso especial. Então, pelo amor de seja-lá-quem-você-acredite, tome cuidado com isso, porque, depois, não adianta chorar o leite derramado, ok? #Para saber mais AgInt no REsp 1805589/MT, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA; AgInt no AREsp 1434220/MA, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA; AgInt no AREsp 1447974/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA; AgInt no AREsp 1405602/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA; AgInt no AREsp 1443953/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA; AgRg no AREsp 1502325/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 38 Recurso Especial:Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Erro 07 Não esgotar a instância de origem Para tratar desse erro, vamos novamente lembrar o que está na Constituição: Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Esta- dos, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida (...) (gri- fos nossos). Dessa expressão em destaque, “causas decididas”, surgem algumas conclusões, entre elas: a causa só é considerada realmente decidida se não tiver mais possibilidade de alterações no julgado pelo Tribunal de origem, o que, em outras palavras, significa: quando não couber mais recurso perante o TJ ou TRF. Você deve lembrar-se de que os recursos podem ser divididos em duas categorias: ordinários e extraordinários. Nestes, estão o recurso especial (nosso queridinho) e o recurso extraordinário para o STF. Também deve lembrar-se de que o REsp e o RE possuem fundamentação vinculada, so- mente sendo cabíveis em hipóteses muito, muito específicas, previstas expressamente na própria Constituição. Ok! Recordamos isso para que toda a informação esteja fresca em sua memória e para que possamos avançar. Então, a pergunta da vez é: Como pode o STJ – por meio de um recurso extraordinário (lato sensu) – analisar uma questão que ainda poderia ter sido decidida pelo Tribunal de origem – de maneira ordinária? E a resposta é: não pode! Esse é o sentido do Enunciado n. 281 do STF: Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 39 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los É inadmissível o recurso extraordinário, quando couber na justiça de ori- gem, recurso ordinário da decisão impugnada. (Súmula n. 281/STF). Ou seja, você só pode interpor o recurso especial quando não puder mais apresentar recurso ordinário junto ao TJ ou TRF (isso não significa embargos de declaração prote- latórios, ok?). Vamos lembrar a ideia geral do trâmite processual: Por esse quadro, você já se lembrou de que, se tiver sido proferida decisão monocrática, pode apresentar o agravo interno para que o órgão colegiado possa se manifestar. Você PODE, mas se quiser ter a oportunidade de utilizar o REsp, você DEVE interpor o agravo interno! Isso porque não cabe recurso especial contra decisão monocrática. Assim, se não for apresentado o agravo interno, seu REsp não vai ser conhecido – e fim. Petição apresentada ao TJ ou TRF, em grau recursal ou originário Decisão monocrática Agravo interno Acórdão Embargos de declaração Acórdão dos embargos de declaração Recurso Especial Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 40 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Por mais incrível e esdrúxulo que possa parecer, sempre aparecem recursos que foram interpostos contra decisão monocrática (caberia agravo interno), contra sentença (ca- beria apelação ou recurso em sentido estrito), contra decisão interlocutória de 1º grau (caberia agravo de instrumento ou recurso em sentido estrito) etc. Espie este julgado aqui: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDE- NATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE QUE NÃO CONHECEU DO RECLAMO ANTE A AUSÊNCIA DO ESGOTAMENTO DAS VIAS ORDINÁRIAS. INSURGÊNCIA RECURSAL DA DEMANDADA. 1. Consoante a jurisprudência desta Corte Superior, a legislação processual vigente (artigo 932 do CPC) permite ao relator julgar monocraticamente re- curso inadmissível. Ademais, a possibilidade de interposição de insurgência para apreciação do órgão colegiado (artigo 1.021 do CPC) afasta qualquer alegação de ofensa ao princípio da colegialidade. Precedentes. 2. Não se conhece do recurso especial interposto contra decisão monocrá- tica ante o não esgotamento das instâncias ordinárias, sendo aplicável o óbice da Súmula 281 do STF. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1480690/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 26/08/2019, DJe 30/08/2019.) Um ponto interessante tem a ver com os embargos infringentes. Sim, sabemos que eles existiam no CPC de 1973, art. 530, e que foram abolidos no atual Código. No regime anterior, era obrigatória a oposição dos infringentes, quando cabíveis, sob pena de não conhecimento do REsp, nos termos do Enunciado n. 207/STJ: É inadmissível recurso especial quando cabíveis embargos infringentes contra o acórdão proferido no tribunal de origem. (Súmula n. 207/STJ). E você deve estar pensando: essa Súmula perdeu objeto, já que os infringentes deixaram de existir, certo? Errado! Ela continua aplicável, por uma singela razão, conhecida para quem atua no cri- me: os embargos infringentes continuam a existir e serem obrigatórios – nas hipóteses legais – no âmbito do processo penal. Tá duvidando? Aposto um chocolate. Olha o que diz o CPP: Art. 609, parágrafo único. Quando não for unânime a decisão de segunda instância, desfavorável ao réu, admitem-se embargos infringentes e de nu- lidade, que poderão ser opostos dentro de 10 (dez) dias, a contar da publica- ção de acórdão, na forma do art. 613. Se o desacordo for parcial, os embar- gos serão restritos à matéria objeto da divergência. Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 41 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los Viu, eu disse! Você me deve um chocolate (eu prefiro amargo)! J Se nós pensarmos bem, esse Enunciado n. 207/STJ, por tratar de um tipo específico de re- curso, é mera especificidade da própria Súmula n. 281/STF, que aborda genericamente todo e qualquer tipo de recurso objetivando o exaurimento da instância de origem. De qualquer forma, as peculiaridades que havia nos embargos infringentes, principal- mente as divergências, controvérsias e alterações legislativas existentes no âmbito do CPC/73, fizeram com que o Superior Tribunal editasse essa súmula, cuja aplicabilidade ainda subsiste, embora limitada à ordem processual penal. Vejamos. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. USO DE DOCUMENTO FALSO E ESTELIONATO. RECURSO ES- PECIAL NÃO CONHECIDO NOS TERMOS DA SÚMULA 207 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. INOVAÇÃO RECURSAL. INCABÍVEL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Caracterizada a votação não unânime prejudicial à defesa, imprescin- dível a oposição dos infringentes para fim de esgotamento da instância. Inteligência da Súmula 207/STJ. 2. In casu, no julgamento da apelação criminal houve um voto favorável, ain- da que parcialmente, ao recurso do réu e que restou vencido pelo chamado ‘voto médio’ (2 votos pelo desprovimento do apelo defensivo e 1 voto por seu parcial provimento). 3. ‘Os embargos infringentes, recurso exclusivo da defesa, previsto no art. 609 do Código de Processo Penal - CPP, não exige, para sua interposição que o acórdão tenha reformado a sentença de mérito, consoante o art. 530 do Código de Processo Civil - CPC. No processo penal, basta que o acórdão te- nha sido não unânime e seja desfavorável ao Réu.’ (AgRg no AREsp 334.087/ SP, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, QUINTA TURMA, DJe 12/11/2013) 4. A tese de ‘fungibilidade recursal’, não foi alegada em sede de recurso es- pecial e representa, portanto, indevida inovação recursal, motivo pelo qual não pode ser analisada. Precedentes. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp 751.566/RJ, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 09/08/2016, DJe 19/08/2016.) Licensed to Carla - carlacbonini@gmail.com Giovanni Fialho - 42 Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los # Na prática Então, neném, antes mesmo de você apresentar seu REsp, verifique se ainda cabe algum recurso ordiná- rio na origem. Mas, para isso, é necessário entender a sistemática processual e os recursos cabíveis. Não adianta interpor um monte de recurso sem pé nem cabeça, como recurso em sentido estrito numa causa cível, porque
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