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Versão On-line ISBN 978-85-8015-075-9 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Produções Didático-Pedagógicas SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DO PARANÁ – SEED PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ – UFPR ODETE GUALBERTO A LEITURA DE CONTOS DE CLARICE LISPECTOR: UMA REFLEXÃO PARA A VIDA CURITIBA 2013 2 ODETE GUALBERTO A LEITURA DE CONTOS DE CLARICE LISPECTOR: UMA REFLEXÃO PARA A VIDA Projeto de Intervenção Pedagógica apresentado ao Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE da Secretaria de Estado da Educação do Paraná – SEED. Área de Conhecimento: Língua Portuguesa Orientador: Prof. Bruno Bohomoletz de Abreu Dallari CURITIBA 2013 3 PRODUÇÃO DIDÁTICA PEDAGÓGICA A leitura de contos de Clarice Lispector: Uma reflexão para a vida A temática proposta tem como finalidade repensar o papel da leitura dos contos de Clarice Lispector, oportunizando melhores condições de interpretação das diferentes práticas do uso da língua – leitura, oralidade e escrita- através dos contos. O público alvo são os alunos do nono ano do Ensino Fundamental do Colégio Estadual Antônio Lacerda Braga, em Colombo. Os objetivos desse material didático são: incentivar a leitura de contos; estimular o gosto pela "contação" recriá-los através de textos orais e escritos. A metodologia utilizada será qualitativa, com base no método recepcional. Motivação para a prática da leitura; compartilhamento de conhecimentos; debates, interpretação dos contos escritos e orais, pesquisas, dramatizações e outras atividades. O método recepcional utilizado em sala de aula: o primeiro passo do professor seria o de efetuar a determinação do horizonte de expectativas 4 da classe, a fim de prever estratégias de ruptura e transformação do mesmo. Esse horizonte de expectativas conterá os valores prezados pelos alunos, em termo de crenças, modismos, estilos de vida, preferências quanto ao trabalho e lazer, preconceitos de ordem moral e social e interesse na área de leitura. As características desses horizontes podem ser constatadas através de técnicas variadas: como observação direta do comportamento, pelas reações espontâneas a leituras realizadas nos contos de Clarice Lispector e através da expressão dos próprios alunos em debates, discussões, respostas às entrevistas e questionários, dramatizações e outras manifestações quanto a sua experiência da obra. A análise comparativa das experiências de leitura, a sala debaterá sobre seu próprio comportamento em relação aos contos lidos levando em conta os desafios enfrentados, os processos de superação dos obstáculos textuais, tais como pesquisas empreendidas para compreensão de composição. Este é o momento dos alunos verificarem que conhecimentos ou vivências pessoais, proporcionaram a eles facilidades de entendimento do texto. O papel do professor neste momento é o de provocar seus alunos e criar condições para que eles avaliem o que foi alcançado e o que resta a fazer. Conscientes das suas possibilidades de conhecimento da literatura, partem 5 para outros contos ou textos o que proporciona uma motivação. O foco da leitura em diferentes funções sociais, buscando sempre o letramento do aluno. Fundamentação Teórica A ideia de explorar o gênero conto dentro da prática desenvolvida no ambiente escolar. A necessidade de trazer o aluno para o mundo imaginário e confrontá -lo com o mundo real e social da leitura e escrita. Alguns requisitos básicos, para que o aluno atinja tal estágio de atuação: a) Refere-se à quantidade e à qualidade de informações que o sujeito recebe, o que exige que o professor esteja preparado para selecionar textos referentes à realidade do aluno, e ao mesmo tempo, capazes de romper com ela; b) Apontar a importância do desenvolvimento da capacidade de refletir sobre a literatura e os fatores estruturais de seu material por parte dos alunos. Dessa forma, com o aprimoramento da leitura numa percepção estética e ideológica mais aguda e com visão crítica sobre sua 6 atuação e a de seu grupo, o aluno torna-se agente de aprendizagem, determinando ele mesmo a continuidade do processo, num constante enriquecimento cultural e social. Portanto o que constitui um processo de aprendizagem é envolver o estudante em atividades onde ocorra a interação com o objeto de estudo, no caso os contos de Clarice Lispector. Clarice Lispector nasceu numa pequena aldeia Tchetchelnik, na Ucrânia em 1925 e mudou-se com a família para o Brasil em janeiro de 1926. Morou em Alagoas e em Pernambuco e aos 12 anos, passou a viver no Rio de Janeiro, cursou a Faculdade Nacional de Direito. O primeiro livro publicado em 1943 – Perto do coração selvagem ano em que se casa com um diplomata, e o último livro em 1977, A Hora da Estrela – ano em que a escritora falece no Rio de Janeiro. Uma das maiores escritoras brasileira. A literatura produzida por Clarice Lispector não se preocupa com a construção de um enredo tradicionalmente estruturado. Ela busca a compreensão da consciência individual, marcada sempre pela introspecção dos personagens. Trata da condição feminina, da dificuldade de relacionamento humano, da hipocrisia dos papéis socialmente definidos. 7 Portanto a aprendizagem está relacionada com a motivação para contemplar e integrar os contos de Clarice Lispector, no envolvimento de adquirir conhecimento socialmente, que são construídos com o tempo. A necessidade educacional para o leitor conseguir decodificar e relacionar um conto com outras situações vividas, e descobrir um mundo novo dentro de cada conto. Dentro do gênero literário: conto é uma narrativa ficcional curta, condensada, que apresenta poucos personagens, ações, tempo e espaço reduzido. O enredo é geralmente estruturado em introdução, desenvolvimento, clímax e conclusão e as personagens são mais aprofundadas psicologicamente. Emprega geralmente padrão da língua. Para Evely Boruchovitch “Encontrar meios pelos quais a concepção de Inteligência como possível de ser plenamente e adequadamente ampliada pelo contexto educacional é um desafio importante que nos permitirá caminhar ao sentido da promoção de uma motivação adequada à aprendizagem autorregulada em nossos alunos”. (página 112), (Livro a Motivação). A linguagem é vista como um fenômeno social, que nasce da necessidade de interação entre as pessoas. Tendo como base teórica as reflexões do Círculo de 8 Bakhtin: [...] Toda a palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que precede de alguém, como pelo fato de que se dirige a alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro. [...]. Nos conceitos bakhtinianos de gênero primário e secundário, Roxane Rojo propõe uma dissociação entre gênero e texto e associa a nação de gênero à de discurso enquanto produto de um enunciador. Mais elaborados como “instrumentos semióticos complexos” e apropriação dos recursos do letramento não podemos ignorá-la enquanto forma, pois, está voltada para o conhecimento histórico-social. Para Magda Soares: letramento é o resultado da ação de ensinar ou de aprender a ler e escrever: o estado ou a condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como consequência de ter-se apropriado da escrita. O letramento cobre uma vasta gama de conhecimento, habilidades, capacidades, valores, usos e funções sociais. O conceito de letramento envolve, portanto,sutilezas e complexidades difíceis de serem explicadas em uma única definição. Uma definição que é priorizada é a que dá ênfase nas habilidades individuais de ler e escrever, nos usos, funções e propósitos da língua escrita no contexto social. 9 Segundo a UNESCO – apud SOARES, Magda, 1958, (p. 4) é letrada a pessoa que consegue tanto ler quanto escrever com compreensão uma frase simples e curta sobre sua vida cotidiana. E no sentido social quando participa de atividades nas quais o letramento é necessário para o efetivo funcionamento de seu grupo e comunidade, na vida diária, nas situações que requerem o uso da leitura ou da produção de textos escritos, com o direito de assumir suas responsabilidades cívicas e políticas. Enquanto, Luiz Antônio Marcuschi, sugere uma relação entre letramento e oralidade, evitando a nação de autonomia e supremacia da escrita vinculada ao contexto de produção; com a inserção da fala e da escrita na cultura e vida social. Portanto, os elementos se interpenetram, sejam em termos de função social, potencial cognitivo, práticas comunicativas, nível de organização, estilos, estratégias de formulação, tudo e um texto colaborativo da prática do letramento. A narração, argumentação, exposição, diálogo são tipos textuais, mais do que textos concretos e completos são designações para sequências típicas. Os gêneros são cristalizações linguísticas de práticas sociais. 10 Chegamos à conclusão que o letramento é uma prática social estreitamente relacionada a situações de poder social e etnograficamente situada. A falta de interesse dos alunos com relação à leitura é grande; são diversos os motivos entre eles: a dificuldade de compreender o contexto que as narrativas contemplam. O contato que existe com práticas pedagógicas que valorizem a leitura crítica impedem a construção do saber. Por isso, os diversos campos das atividades humanas estão ligados ao uso da linguagem, e para comunicar – se bem é necessário à leitura como conhecimento e interação social como um todo. A necessidade educacional de motivar e manter essa motivação ressalta a importância do papel do professor e da família nessa empreitada. Para Bakhtin, a valorização da fala, o enunciado, afirma sua natureza social, não individual: a fala está indissoluvelmente ligada às condições da comunicação, que por sua vez, estão sempre ligadas às estruturas sociais. A literatura produzida por Clarice Lispector se preocupa com as condições sociais do individuo e não com a construção de um enredo tradicionalmente estruturado. Ela busca a 11 compreensão da consciência individual, marcada sempre pela introspecção das personagens. Trata da condição feminina, da dificuldade de relacionamento humano, da hipocrisia dos papéis socialmente definidos. Portanto a necessidade educacional para o leitor conseguir decodificar e relacionar um conto com outras situações vividas e descobrir um mundo novo dentro de cada conto, pois, a linguagem é vista como um fenômeno social, que nasce da necessidade de interação entre as pessoas. Tendo como base teórica as reflexões do Círculo de Bakhtin. “ [ Toda a palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige a alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. ] “ Escolhi Clarice Lispector, pois, ela se distingue como iniciadora do romance metafísico no Brasil e as características de uma ficção – aventura, que além de contar sobre o assunto, busca desvendar por meio da palavra, o mistério do mundo e das ideias, domínio pouco explorado. O domínio do enunciado puramente ligado à exploração do vocábulo e se entretém na enunciação, a interioridade é sentida ao mesmo tempo em que se lê o conto, como se imaginasse a cena em si. 12 O estilo de Clarice Lispector é construído pela metafísica, pois, seus contrastes trazem ao texto muita imaginação e a complexidade que os tornam atraentes. Do simbólico a lógica discursiva: a sedução, num corpo aparentemente convencional, numa sequencia linguística, levando em conta o aprendizado como um todo. Roland Barthes tratou das unidades narrativas utilizando, como critério de depreensão das mesmas, a significação. Em contraste com a vida, a arte não possui ruídos, constituindo um sistema que desconhece unidades perdidas. Tudo é significativo, embora os graus de significação sejam variáveis. As produções literárias de Clarice Lispector despertam a tensão semântica do discurso, mantendo o contato com o narrador, como verdadeiros núcleos. Privilegiar a estratégia digressiva evadindo-se da abordagem direta, sem os discursos, tantas vezes inquietantes e estatizados, da logicidade verbal. A prática digressiva é uma tradição de intertextualidade, porque ao deslocar-se, Clarice Lispector cria, estrategicamente, em espaço paródico-diálogo de vozes em que narra, subsidiária e paralelamente, os fatos. Além da consciência de linguagem é o desempenho guiado pelo senso de pesquisa e de 13 descoberta do mundo: ponto de encontro de uma proliferação de vozes. O universo textual de Clarice Lispector deixa-se flagrar – espelho invertido e revertido – no estranhamento e na revolução paródica. O diálogo entre dois eus funda-se na utopia de uma práxis inaugural, digressão da subjetividade pretensamente única, rompendo a completude estabilizadora dos discursos lógicos. Uma estrutura recorrente Nos romances e contos, Clarice Lispector trata da condição feminina, das dificuldades de relacionamento humano, da hipocrisia dos papéis socialmente definidos, da busca pelo eu. As narrativas apresentam uma estrutura semelhante, que o crítico Affonso Romano de Sant’Anna definiu em quatro passos: A personagem é disposta numa determinada situação cotidiana. Prepara-se um evento que é pressentido discretamente pela personagem (algo como uma inquietação). Ocorre o evento que ilumina sua vida (epifania). 14 Apresenta-se o desfecho, no qual a situação da vida da personagem, após a epifania, é reexaminada. O trabalho com a linguagem é fundamental para que esse processo de autodescoberta adquira a dimensão intimista que permite, ao leitor, acompanhar os efeitos, na personagem, do momento de iluminação. A autora promove, na forma do texto, uma desconstrução equivalente àquela vivida pelas personagens, fazendo com que a própria linguagem assuma uma função libertadora. Outra característica recorrente, na ficção de Clarice, é a presença constante de animais (cavalo, galinha, barata, aranha, búfalo, gato, etc.) que representam o “coração selvagem” da vida, que pulsa descontrolada, sem se submeter às regras e expectativas sociais. Essa é uma forma também revolucionária de simbolizar a busca incessante das personagens pela libertação das amarras sociais e o mergulho no irreversível processo de individuação. 3° Geração do Modernismo ou pós-modernismo – (Geração 45 até os dias atuais). Contexto histórico: Criação do ONU; Publica-se a Declaração dos Direitos Humanos; Fim da ditadura Vargas (redemocratização); 15 Inicio da guerra-fria (norte-americanos e soviéticos). Os contos de Clarice Lispector respeitam as características fundamentais do gênero. Seguem o mesmo eixo mimético dos romances, assente na consciência individual como limiar originário do relacionamento entre o sujeito narrador e a realidade, o que resultam do ponto de vista assumido pelo sujeito narrador em relação ao personagem. O episódio único que serve de núcleo é um momento de tensão conflito – é um momento de crise interior condicionado e qualificado em função do desenvolvimento. Essa tensão conflitiva estabelece uma ruptura do personagem com o mundo. Porém a crisedeclarada que raramente se resolve através de um ato, mantem-se do principio ao fim, seja como devaneio ou aspiração, de embate de sentimentos. O confronto pelo olhar, troca de olhares entre as personagens. O poder mágico do olhar e do descortino contemplativo silencioso. A existência e liberdade, contemplação e ação, linguagem e realidade, o eu e o mundo, conhecimento das coisas e relações intersubjetivas, são os pontos de referência do horizonte de pensamento que se descortina na ficção de Clarice Lispector. O que importa é a inquietação, o desejo de ser, o predomínio da consciência reflexiva, a violência interiorizada nas relações humanas o impulso ao 16 dizer expressivo e o descortinar silencioso das coisas. A temática marcadamente existencial com tópicos de filosofia da existência e mais ao existencialismo de Sartre. A perspectiva mística suplantada a existencial inerente à temática da obra, a subjetividade, e, portanto a experiência interior, o existencialismo do próprio individuo, que mesmo quando ama, precisa de cólera. O dizer modifica o sentir sujeito a estados imutáveis. A acuidade reflexiva e a inquietação formam os elos inseparáveis da consciência de si. A coisificação pelo olhar, perigo que espreita os personagens de Clarice Lispector um aspecto do regime conflitivo de suas relações mútuas. O silêncio é a origem e o destino que sustenta a diferença do sentido assinalada pelo paradoxo e a própria linguagem mostra uma realidade indeterminada. A escritura assombrada pelo silêncio, porque pela presença mística da coisa, é uma escritura conflitiva, que problematiza as relações entre linguagem e realidade. Escrever é dilatar o tempo decompondo em instantes sucessivos. A ficcionista expôs-se a si mesma, o dilaceramento de sua escritura equívoca que só possui e cria uma realidade negativa. A obra de 17 Clarice Lispector se reveste de uma importância exemplar, de um valor indiscutível. Como a crônica o conto é um texto curto que pertence ao grupo dos gêneros narrativos ficcionais. Caracteriza – se por ser condensado, isto é, por apresentar poucas personagens, ações e tempo e espaço reduzidos. A estrutura do enredo Introdução ou apresentação – geralmente coincide com o começo da história; é o momento em que o narrador apresenta os fatos iniciais, as personagens e, às vezes, o tempo e o espaço. Desenvolvimento ou complicação – é a parte do enredo em que é desenvolvido o conflito. Clímax – é o momento culminante da história, ou seja, aquele de maior tensão, no qual o conflito atinge o seu ponto máximo. Conclusão ou desfecho – é a solução do conflito, que pode ser surpreendente, trágica, cômica, etc., e corresponde ao final da história. FELICIDADE CLANDESTINA Felicidade => qualidade ou estado de feliz; ventura; contentamento. 18 Bom êxito; sucesso. Clandestina => ilegítimo; ilegal; feito em segredo; quem entra ilegalmente num país ou mesmo num meio de transporte. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria. Mas que talento tinha para a crueldade (prazer em fazer o mal; maltratar os outros). Ela todo era pura vingança. Comigo exerceu com calma ferocidade (caráter cruel) o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia. Até que um dia, quando eu estava à porta da sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa, apareceu sua mãe; disse firme e calma para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo. E para mim: “E você fica com o livro por quanto tempo quiser”. Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, (deslumbrada, tonta, maravilhar-se) e assim recebi o livro na mão. Acho que não disse nada. Peguei o livro, comprimia-o contra o peito. Meu peito estava quente, meu coração pensativo. A felicidade sempre iria ser clandestina para mim, (fluxo de consciência). Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar. Havia orgulho e poder em mim. Eu era uma rainha delicada. Às vezes 19 sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo. Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante. 1 – Leitura do conto Felicidade Clandestina de Clarice Lispector. 2 – No conto Felicidade Clandestina, vamos pesquisar no dicionário palavras cujo sentido você desconheça, para esclarecer o significado no contexto. 3 – Qual o conflito apresentado? 4 – Quem são os personagens? 5 – Onde a história acontece? 6 – Quando a história poderia ter acontecido? Por que não há indicações precisas de tempo? 7 – Qual o clímax do conto? 8 – É possível deduzir qual a condição socioeconômica das duas meninas que conversam? A partir de que indicativos? 9 – Comentários sobre a situação em si do conto. 10 – Em círculo, debate sobre Felicidade Clandestina. 20 11 – Pode – se afirmar que o conto está expondo, de forma figurada, um pensamento sobre a sociedade. Que pensamento é esse? 12 – Os requintes de crueldades constituem tema de vários contos de Clarice Lispector. Nesse conto, o que pode estar gerando o sentimento desumano, o gosto em fazer o mal ou a insensibilidade? 13 – Comentários sobre o conto em questão, em círculo, colocaram suas ideias. Contos próximos e distantes do mundo real. O conto é um texto ficcional, narra uma história inventada ou recriada por um autor. Entretanto, segundo o grau de aproximação entre o mundo real e o da ficção, podem – se reconhecer diferentes tipos de contos. 1 – Realista – os elementos ( fatos, personagens, tempo, lugar ) representam uma realidade possível; – Fantásticos – baseiam–se em elementos da realidade, mas apresentam os fatos de uma maneira diferente do modo habitual, muitas vezes de maneira assombrosa. UMA AMIZADE SINCERA Conhecemo-nos no último ano da escola. Chegamos a um ponto de amizade que não 21 podíamos mais guardar um pensamento: um telefonava logo ao outro, marcando um encontro imediato. Esse estado de comunicação continua chegou a tal exaltação que, no dia em que nada tínhamos a nos confiar, procurávamos com alguma aflição um assunto. Às vezes um telefonava encontrávamo-nos, e nada tínhamos a nos dizer. Éramos muito jovens e não sabíamos ficar calados. Experimentávamos ficar calados, mas tornávamo- nos inquietos logo depois de nos separarmos. Quando minha família mudou para São Paulo e ele morava sozinho, pois sua família era do Piauí, foi quando o convidei para morar em meu apartamento. Que rebuliço de alma. Radiantes, arrumávamos nossos livros e discos, preparávamos um ambiente perfeito para a amizade. Queríamos tanto salvar o outro. Amizade é matéria de salvação (fluxo de consciência). Mas como se nos revelava sintética a amizade. Não havia paz. Só muito depois eu ia compreender que estar é também dar. Um aperto de mão comovido foi o nosso adeus no aeroporto. Sabíamos que não nos veríamos mais. Mais que isso: que não queríamos nos rever. E sabíamos também que éramos amigos. Amigos sinceros. 22 1 – Leitura do conto Uma amizade sincera de Clarice Lispector. 2 – Comentários sobre amizade. 3 - O que é uma amizade sincera? Exemplos. 4 - Qual o tipo de comunicação eles mantinham? 5 – Quais os primeiros sinais de perturbação entre eles? 6 – Qual o significado: “Queríamos tanto salvar o outro. Amizade é matéria de salvação.” Dentro do contexto. 7 – Por que eles consideravam a amizade insolúvel? 8 – A solidão e a falta de paz entre eles eram constante. Justifique. 9 – Por que as pessoas se presenteiam? Justifique. 10 – Você daria outro final ao conto? Qual? Por quê? 11 – Como se classifica o conto Amizade sincera?12 – Que fatos podem ser considerados possíveis no mundo real? 13 – Um grupo de três integrantes e comecem a planificar um conto sobre amizade, utilizando os passos propostos a seguir. O planejamento é provisório, servirá para produzir as primeiras ideias. Mais adiante, poderão modificá-lo. 23 Tipo de conto: Título: Lugar: Tempo: Personagens: Enredo: Clímax: Expansão dos fatos: Como você já viu, a estrutura do conto pode apresentar uma situação inicial, um conflito e uma estrutura tão simples. É preciso despertar o interesse do leitor e, para isso é importante o modo como se desenvolve ou se expande cada uma dessas partes. Expansões são ações que ampliam ou desenvolvem uma ação fundamental. 1 – Em que parte do conto – início, conflito, resolução – o relato se deteve? 2 – Que tipo de expansão – descrição, comentário ou explicação – predomina no conto? Por quê? 3 – Fazer um grande círculo para comentários e debates sobre o conto. 24 O PRIMEIRO BEIJO Os dois mais murmuravam que conversavam: era o amor. Amor com o que vem junto: ciúme. - Vá nunca beijou uma mulher antes de me beijar? - Sim, já beijei antes uma mulher. - Quem era ela? Não sabia como dizer. O ônibus da excursão subia lentamente a serra. E nem sombra de água. O jeito era juntar saliva, e foi o que fez. O ônibus parou, todos estavam com sede, mas ele conseguiu ser o primeiro a chegar ao chafariz de pedra, antes de todos. De olhos fechados entreabriu os lábios e colou- os ferozmente ao orifício de onde jorrava a água. Era a vida voltando e com esta encharcou todo o seu interior arenoso até se saciar (fluxo de consciência). A vida havia jorrado dessa boca de uma boca para outra. Intuitivamente, confuso na sua inocência, sentia intrigado: mas não é de uma mulher que sai o líquido vivificador, o liquido germinador de vida... Olhou a estátua nua. Ele a havia beijado. Perplexo, num equilíbrio frágil. Até que, vinda da profundeza de seu ser, jorrou de uma fonte oculta nele à verdade. Que logo o encheu de susto e logo também de um orgulho antes jamais sentido. Ele... (fluxo de consciência). 25 Ele se tornara homem. 1 – Leitura do Conto O primeiro beijo. 2 – Como se inicia o conto? 3 – Quais os personagens? 4 – Qual o conflito surgido? Por quê? 5 – “Ficar quieto, sem quase pensar e apenas sentir, era tão bom”. Justifique. 6 – A sede começa com o brincar com a turma, falar bem alto, mais alto que o barulho do motor do ônibus da excursão, rir, gritar, pensar, sentir, puxa vida. Como deixava a garganta seca. Que atitude o personagem tomou? Explique. 7 – No texto: “E soube então que havia colado sua boca na boca da estátua de pedra. A vida havia jorrado dessa boca, de uma boca para outra”. Que associação o personagem faz? Justifique. 8 – Releia o texto, em que também se verifica ambiguidade: “Estava em pé, docemente agressivo, sozinho no meio dos outros, de coração batendo fundo espaçado, sentindo o mundo se transformar. A vida era inteiramente nova, era outra, descoberta com sobressalto. Perplexo, num equilíbrio frágil”. a) Que sentidos podem depreender desse trecho? 26 b) Levante hipóteses: Por que o personagem se sentia assim? c) O que representa a estátua da mulher de pedra? 9 – Nos gêneros narrativos, a sequência de fatos que mantêm entre si uma relação de causa e efeito constitui o enredo. Um dos mais importantes elementos que compõem o enredo é o conflito. Identifique o conflito do conto. 10 – No desfecho do conto geralmente ocorre à solução do conflito ou uma revelação para o personagem. A revelação acontece quando um fato ou uma situação muda o modo de agir do personagem, levando - o a romper com determinados valores a questionar seu modo de vida, etc. No desfecho do conto ocorre a solução do conflito, uma revelação ou ambos? Justifique. 11 – O discurso indireto livre – consiste na fusão da fala ou do pensamento do personagem com o discurso do narrador. Destaque do conto, os trechos que correspondem ao discurso indireto livre. 12 – Reúna – se com seus colegas (máximo de três) e juntos concluam: - Quais as características do conto? 27 - Seu grupo irá pesquisar, escolher, produzir e expor um conto com uma temática livre. 13 – Cada grupo lerá e debaterá os contos criados. Os diálogos e as vozes entre os contos: 1) Felicidade Clandestina, 2) Uma Amizade Sincera e 3) O Primeiro Beijo, são uma constante da escritora Clarice Lispector em suas obras; há a tomada de consciência, quando ela conversa com seu interior, há uma mudança de comportamento, uma transformação em suas atitudes, uma maturidade. 1) “Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com seu amante”. 2) “Queríamos tanto salvar o outro. Amizade é matéria de salvação”. 3) “A vida havia jorrado dessa boca, de uma boca para a outra. Ele se tornara homem”. As narrativas de Clarice Lispector sublinham a precariedade e o nomadismo da consciência e da existência, entre as aleluias e as agonias de ser. Para Bakhtin, todas as vivências interiores do outro individuo – sua alegria, seu sofrimento e finalmente, propósito semântico, ainda que nada disso se manifeste em nada exterior, se enuncie, se reflita em seu rosto, na expressão do seu olhar... A vivência moral do outro têm uma exterioridade interior voltada para mim, e vou contemplar como olhos interiores. Os três eixos básicos do pensamento: 28 1. Unicidade do ser e do evento; Base da concepção dialógica da linguagem. 2. Relação eu/outro; 3. Dimensão axiológica Toda interpretação é a correlação de dado texto com outros textos. O comentário é a índole dialógica dessa relação. O lugar da filosofia começa onde termina a cientificidade exata e começa a heterocientificidade; é a metalinguagem de todas as ciências. Segundo DALLARI, a literatura não era apenas uma referência formal. Seus conteúdos também eram considerados como referência: ali se discutia política, filosofia, ciência, sociedade, a psicologia e as emoções humanas, se fazia reflexões sobre a natureza humana, suas expectativas, desejos, fantasias, etc. As abordagens educacionais e de letramento produzem a capacitação de comunicação do aluno, realçando os aspectos práticos e profissionais. Os jovens querem ou são livres, fazendo o que bem entendem, se fecham em seu mundo e vivem em outra realidade, nunca participam da realidade onde estão inseridos. Assim como Clarice Lispector está em seu mundo interior, mas ao mesmo tempo querendo ficar só. Criando situações, diálogos que mais parece um monólogo, pois, ela conversa com o seu interior e imagina uma resposta para os seus questionamentos. Assim são os jovens que criam diálogos para uma situação também imaginária, que 29 ele supõe que pode ocorrer por causa do seu envolvimento com determinadas situações. Clarice Lispector dá importância às vozes dos contos e participa como narrador personagem. Essa é a relação que existe entre os jovens que querem e vivem o seu mundo interior, agindo como se fosse o único e que o mundo girasse ao seu redor. Para Clarice Lispector o mundo interior é o mais importante, pois, ela se completa e vive feliz dessa maneira. Os personagens são interiorizados, ela se coloca em seu lugar, algumas vezes não faz distinção entre as personagens e si mesma. Essa forma de ser de Clarice Lispector que chama atenção dos seus leitores jovens, que se identificam com a mesma. Clarice Lispector “Mas o Deus é hoje: seu reino já começou”. I. Valorização das experiências de leitura trazidas pelo aluno: Perguntar aos alunos quais foram os contatos que tiveram com uma leitura durante a escolarização e se estes contatos foram prazerosos. II. A leitura na formação do cidadão: Mostrar que a leitura, apesar de ser uma prática individual se socializada podefazer a diferença na vida das pessoas, uma vez que as tornam detentoras de novos conhecimentos e de novas possibilidades. 30 III. Apresentação do gênero literário conto: Expor aos alunos quais são as características do gênero literário conto. IV. Leitura dos contos: Apresentar o título dos contos Felicidade Clandestina, Uma Amizade Sincera e o Primeiro Beijo que serão lidos e solicitar que pensem sobre o enredo e verbalizem suas impressões. V. Representação da leitura por imagens e desenhos: Solicitar que os alunos façam desenhos ou recortes de imagens de revistas ou jornais que tenham relação com a história lida e produzem um quadro. VI. Exibição de filmes relacionados com os temas trabalhados nos contos: Selecionar filmes relacionados à temática dos contos lidos. VII. A música e a leitura: Propor que os alunos relacionem alguma música que tenham ouvido à temática dos contos lidos. 31 VIII. Leitura coletiva dos contos escolhidos: Fazer uma roda de leitura para que os contos sejam lidos coletivamente. IX. Roda de conversa: Conversar com os alunos para saber se foi significativa a experiência que tiveram com a leitura dos contos. X. Produção de conto: Propor aos alunos que produzam o seu próprio conto com tema escolhido por eles. REFERÊNCIAS BARTHES, R. (1993) Mitologias, Bertrand Brasil, São Paulo. BARTHES, R (2002) O Prazer do Texto, Ed. Elos, São Paulo. BAKHTIN, M. (2003) Estética da Criação Verbal. Martins Fontes, São Paulo. BAKHTIN, M. (1988) Marxismo e Filosofia da Linguagem. Hucitec, São Paulo. GNERRE, M. (1985) Linguagem, Escrita e Poder. Martins Fontes, São Paulo. 32 SCOTOLO, I. (2008) O Discurso Midiático: articulação entre representações e produção dos sentidos. In A Leitura como Ofício, Scotolo, I. (org.). Ed. Porto de Idéias, São Paulo. VIGOSTKY, I. (1987) A Formação Social da Mente. São Paulo, Martins Fontes. DALLARI, Bruno B. A. (2010), Mídia, cidadania e as novas práticas de letramento. NUNES, Benedito de (1973), Leitura de Clarice Lispector. FARACO, Carlos Alberto (2010), Linguagem e Diálogo. As ideias Linguísticas do Circulo de Bakhtin. FIORIN, José Luiz (2008), Introdução ao Pensamento de Bakhtin. SOARES, Magda (2012), Letramento, um tema em três gêneros. GOMES, André Luís (2008), Seminário Internacional, Clarice em cena: 30 anos depois. Parâmetros Curriculares Nacionais – Língua Portuguesa. Secretaria de Educação Fundamental, MEC, 1997. Parâmetros Curriculares Nacionais – Língua Portuguesa. Terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental. Secretaria de Educação Fundamental, MEC, 1998.
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