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Livro Texto Direito Constitucional Unidade I pós unip ambiental

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Direito Constitucional 
 
Apresentação – Noções do Direito Constitucional e de 
Federação 
 
 
 
Unidade I 
 
 
Prof. Dr. Fábio Bellote Gomes 
 
 
 
 
 
 
APRESENTAÇÃO DO PROFESSOR-AUTOR 
 
Fábio Bellote Gomes é professor-titular na Universidade Paulista – UNIP há 
mais de dezoito anos, nas disciplinas Direito Empresarial e Direito Administrativo. 
É bacharel (1998), mestre (2010) e doutor (2014) pela Faculdade de Direito da 
Universidade de São Paulo – USP, tendo realizado o mestrado e o doutorado na área 
de concentração em Direito Comercial naquela instituição. 
Durante a graduação na Faculdade de Direito da USP, foi aluno-monitor na 
cadeira de Direito Romano e bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado 
de São Paulo (FAPESP), em nível de Iniciação Científica, na área de Direito Público. 
É autor de duas obras didáticas, que atualmente constituem bibliografia 
fundamental de diversos Cursos de Direito: “Manual de Direito Empresarial”, 7ª edição, 
Salvador, Ed. Juspodivm, 2018 e “Elementos de Direito Administrativo”, 2ª edição, São 
Paulo, Ed. Saraiva, 2012. 
É coordenador do curso de pós-graduação em Direito Empresarial Corporativo 
da Universidade Paulista – UNIP. 
Curriculum Lattes: http://lattes.cnpq.br/7100787923660549. 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 4 
1. ÂMBITO DO DIREITO CONSTITUCIONAL – NOÇÕES BÁSICAS ACERCA 
DO DIREITO CONSTITUCIONAL E PRINCÍPIOS ...................................................... 5 
1.1 INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS E REGRAS DE 
HERMENÊUTICA ........................................................................................................ 9 
1.2 A INTERPRETAÇÃO E EFICÁCIA NORMATIVA DO PREÂMBULO 
CONSTITUCIONAL ................................................................................................... 14 
2. FEDERAÇÃO E SUAS CARACTERÍSTICAS REPRESENTADAS NA 
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ....................................................................... 18 
2.1 O ESTADO E A FEDERAÇÃO ..................................................................... 18 
2.2 TIPOS DE CONSTITUIÇÃO ......................................................................... 23 
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 26 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
INTRODUÇÃO 
 
O curso de pós-graduação em Direito Constitucional visa estimular o pós-graduando a 
refletir acerca da robustez das instituições brasileiras e da contemporaneidade do 
ordenamento jurídico, que demanda do operador do direito maior versatilidade 
conforme a democracia e a cidadania plural se tornam cada vez mais complexas. 
Considerando o atual estado da constitucionalidade no país, em que o Poder 
Judiciário, na figura do STF, tenta concretizar os valores e normas contidos na Carta 
Magna, este curso de pós-graduação em Direito Constitucional tem como fulcro a 
análise das noções a serem concretizadas e o entendimento como tais direitos podem 
ser garantidos pela atuação do controle entre os Poderes, especialmente no que tange 
ao ativismo judicial, controle de constitucionalidade e das discussões contemporâneas 
acerca da reserva do possível e do mínimo existencial frente às garantias 
constitucionais. 
O supedâneo do livro-texto de Direito Constitucional terá por base as mais 
recentes decisões judiciais proferidas especialmente pelo Supremo Tribunal Federal, 
considerando, ainda, decisões históricas e marcantes, sempre buscando a ementa 
com conteúdo e definições as mais didáticas possíveis para a compreensão do 
instituto jurídico discutido. 
Assim, a estruturação do curso basear-se-á em três unidades. A primeira 
conterá as noções básicas de Constituição e governo, além da hermenêutica 
constitucional, fora questionamentos de decisões importantes e polêmicas 
condizentes com o ativismo judicial em voga. 
A unidade seguinte conterá os principais julgados e noções acerca das 
Garantias Fundamentais, corolário máximo da relação entre cidadão e Estado. 
Por fim, a unidade final terá como conteúdo o estudo das instituições por meio 
dos Três Poderes constituídos, tendo por análise a Administração Pública 
contemporânea, o equilíbrio entre os Poderes e o controle de constitucionalidade. 
 
 
 
 
5 
1. ÂMBITO DO DIREITO CONSTITUCIONAL – NOÇÕES BÁSICAS 
ACERCA DO DIREITO CONSTITUCIONAL E PRINCÍPIOS 
 
A definição de constituição perpassa por um longo estudo da história da 
humanidade, pela ruptura de impérios e nações, e a criação ou acordo entre novos 
principados, originando novas formas de poder, sempre embasada em bem fundadas 
teorias e movimentos sociopolíticos. 
Sucintamente, uma constituição significa o estabelecimento e hierarquização 
de um regramento que delimita as condutas sociais, necessitando, para tanto, 
constituir um estado – instituição – de onde tais normas serão emanadas e aplicadas 
onde se encontram as pessoas sujeitas a sua soberania e jurisdição. 
Conforme a Teoria Geral do Estado, este pode ser definido pela composição 
de três elementos: o povo, o território e a soberania. A engrenagem que faz essa 
estrutura funcionar precisa estar constituída como uma lei primordial, que fundamenta 
a criação de todas as demais leis, a Lex Mater. A “liga” ou “cola” que vincula e faz 
funcionar e reconhece as interações entre os três elementos aludidos é a “Carta 
Maior”. 
A partir dessa norma, as instituições irão emitir seus comandos aos cidadãos, 
e estes estarão amparados quanto a fruição de direitos e o cumprimento de deveres. 
Não somente as pessoas físicas e pessoas jurídicas de direito privado estarão sujeitas 
à obediência e amparo da Constituição, mas também o próprio poder constituído 
deverá seguir as prescrições da Lei Política. 
Nesse sentido, vemos esse entender posto explanado didaticamente nos 
próprios termos de um julgado proferido pelo Pretório Excelso: 
 
EMENTA: FEDERALISMO E RESPEITO ÀS REGRAS DE DISTRIBUIÇÃO 
DE COMPETÊNCIA. LEI FEDERAL 10.029/2000. COMPETÊNCIA DA 
UNIÃO PARA NORMAS GERAIS NA PREVISÃO DE PRESTAÇÃO 
VOLUNTÁRIA DE SERVIÇOS AUXILIARES NAS POLÍCIAS MILITARES E 
CORPO DE BOMBEIROS MILITAR (CF, ARTS. 22, INCISO XXI E 144, §7º). 
CONSTITUCIONALIDADE. AUSÊNCIA DE RAZOABILIDADE NA FIXAÇÃO 
DE LIMITES DE IDADE. PROCEDÊNCIA PARCIAL. 1. As regras de 
distribuição de competências legislativas são alicerces do federalismo 
e consagram a fórmula de divisão de centros de poder em um Estado de 
Direito. A própria Constituição Federal de 1988, presumindo de forma 
absoluta para algumas matérias a presença do Princípio da Predominância 
do Interesse, estabeleceu, a priori, diversas competências para cada um dos 
entes federativos e, a partir dessas opções, pode ora acentuar maior 
centralização de poder, principalmente na própria União (CF, art. 22), ora 
permitir uma maior descentralização nos Estados-Membros e nos 
Municípios (CF, arts. 24 e 30, I). 2. A Lei Federal 10.029/2000, que 
estabeleceu os parâmetros de organização de serviços voluntários nas 
Polícias Militares e nos Corpos de Bombeiros Militares, possui caráter 
nacional e foi editada dentro dos limites da competência da União (arts. 22, 
XXI, e 144, § 7º, da CF). Precedentes. 3. É incompatível com a Constituição 
a limitação máxima de idade para a prestação de quaisquer serviços 
voluntários na Polícia Militar e no Corpo de Bombeiros Militar. 
Inconstitucionalidade material da expressão “e menores de vinte e três anos”, 
constante do inciso I do art. 3º da Lei Federal 10.029/2000, por ausência de 
razoabilidade. 4. Ao dispor que os voluntários por ela disciplinados terão 
direito ao recebimento de auxílio mensal de natureza indenizatória “destinado 
 
6 
ao custeio das despesas necessárias à execução dos serviços a que se 
refere essa lei” (art. 6º), sem a configuração de “vínculo empregatício” ou de 
“obrigaçãode natureza trabalhista, previdenciária ou afim”, em decorrência 
da relação jurídica constituída (art. 6º, § 2º), a Lei Federal 10.029/2000 não 
viola o artigo 37, I, II e IX, da Constituição Federal, dada a diversidade da 
natureza dos vínculos jurídicos estabelecidos. 5. Ação Direta de 
Inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente.1 (destaque) 
 
Contudo, não podemos olvidar as tradicionais definições, que confluem entre o 
sentido material e o sentido formal de constituição. 
Formalmente, entendemos por constituição toda norma ou dispositivo transcrito 
no corpo da Carta Magna, independentemente do seu conteúdo. Assim, a norma que 
determina Colégio Pedro II, localizado na cidade do Rio de Janeiro, será mantida na 
órbita federal (Art. 242, §2º), tem estatura constitucional e estará hierarquicamente 
superior às disciplinas infraconstitucionais. Já a conceituação material, ou melhor, 
substancial, estabelece como normas constitucionais aquelas denominadoras de 
conteúdo essencialmente político, como a distribuição de competência entre os entes 
federativos, bem como as normas de garantias fundamentais, que alicerçam o 
equilíbrio na relação cidadão-instituição. 
Embora algumas normas genéricas acerca do Direito Eleitoral constem no texto 
constitucional, o Código Eleitoral e a Lei dos Partidos Políticos podem ser definidos 
como normas materialmente constitucionais, mesmo que sejam essencialmente leis 
ordinárias ou complementares, sujeitas a um processo legislativo típico de normas 
infraconstitucionais. 
A complexidade da contemporaneidade e da participação cidadã no cenário do 
Direito, tem requisitado do Poder Judiciário, enquanto intérprete e garantidor da 
Constituição, atuação constante, por meio de proposições proativas às decisões 
prolatadas. Assim, com o advento do ativismo judicial, tem ocorrido a elasticidade da 
significância material de uma constituição. 
Hodiernamente, o Supremo Tribunal Federal (STF) vem adotando posturas 
proativas como guardião e intérprete máximo da Constituição da República Federativa 
do Brasil, por meio do ativismo judicial, ensejando até mesmo debates sobre 
extrapolação do desígnio típico de Poder Judiciário para uma peculiar e constante 
forma de exercer a função legiferante. Ou até mesmo função administrativa. 
A Carta Magna distribui competências para os entes federativos da República 
Federativa do Brasil de modo que as prescrições para atuação por parte daqueles 
permitem haver um saudável e funcional exercício do federalismo. 
Entretanto, caberá ao próprio Poder Judiciário – na figura do STF – pacificar os 
conflitos ou extrapolações do exercício de competência e de poder, de modo a 
compatibilizar com o princípio da separação e a harmonia entre os Poderes, dando a 
palavra final. Nesse sentido, de maneira implícita, ao próprio Poder Judiciário cumpre 
a função de garantidor do pacto federativo, na resolução de conflitos. 
Caberia, no entanto, vislumbrarmos a possibilidade de o Poder Judiciário situar-
se de maneira proeminente diante dos demais Poderes, pois não apenas ele declara 
ser uma lei ou seu dispositivo constitucional ou inconstitucional, mas gera efeitos na 
 
1 STF – ADI nº 4.173/DF. Tribunal Pleno. Min. Relator: Alexandre de Moraes. Julgado em: 19/12/2018. 
Publicação em: 25/02/2019. 
 
7 
execução da função administrativa. Todavia, o Poder Judiciário não vincule matéria 
legiferante impugnada por meio do controle de constitucionalidade, podendo esta ser 
rediscutida no Poder Legislativo. 
Nos dizeres do Ministro Luís Roberto Barroso, a Suprema Corte Brasileira 
decidiu casos singulares nos últimos anos: 
 
De fato, somente no ano de 2008, foram decididas pelo Supremo Tribunal 
Federal, no âmbito de ações diretas – que compreendem a ação direta de 
inconstitucionalidade (ADIn), a ação declaratória de constitucionalidade 
(ADC) e a argüição [sic] de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) 
–questões como: a) o pedido de declaração de inconstitucionalidade, pelo 
Procurador-Geral da República, do art. 5º da Lei de Biossegurança, que 
permitiu e disciplinou as pesquisas com células-tronco embrionárias (ADIn 
3.150); (ii) o pedido de declaração da constitucionalidade da Resolução n.º 7, 
de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, que vedou o nepotismo no âmbito 
do Poder Judiciário(ADC 12); (iii) o pedido de suspensão dos dispositivos da 
Lei de Imprensa incompatíveis com a Constituição de 1988 (ADPF 130). No 
âmbito das ações individuais, a Corte se manifestou sobre temas como 
quebra de sigilo judicial por CPI, demarcação de terras indígenas na região 
conhecida como Raposa/Serra do Sol e uso de algemas, dentre milhares de 
outros2. 
 
Evidente que os exemplos trazidos não devem ficar à mercê da própria 
inconstitucionalidade; no entanto, o que motiva debates é a hipertrofia do Poder 
Judiciário enquanto o Executivo e o Legislativo falham em delinear suas ações e 
cumprir seu papel, o que inclui reformulação de atos ou decisão via controle externo 
do Poder Judiciário. 
Temos, nessa seara, o seguinte julgado, que, embora tenha uma ementa 
prolixa, faz-se necessário para a compreensão do caso: 
 
EMENTA (…) 
1. As reiteradas decisões do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro 
e do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região que resultaram em bloqueio, 
arresto, penhora, sequestro e liberação de valores administrados pelo Poder 
Executivo do Estado do Rio de Janeiro para atender demandas relativas a 
pagamento de salário de servidores ativos e inativos, satisfação imediata de 
créditos de prestadores de serviços e tutelas provisórias definidoras de 
prioridades na aplicação de recursos públicos traduzem, em seu conjunto, ato 
do Poder público passível de controle pela via da arguição de 
descumprimento de preceito fundamental, cabível nos moldes dos arts. 1º, 
caput, e 4º, § 1º, da Lei 9.882/1999. 2. A efetividade do modelo de 
organização da Administração Pública preconizado pela Constituição Federal 
supõe a observância dos princípios e regras do sistema orçamentário (arts. 
167, VI e X, da CF), do regime de repartição de receitas tributárias (arts. 34, 
V, 158, III e IV, e 159, §§ 3º e 4º, e 160, da CF) e da garantia de paramentos 
[sic] devidos pela Fazenda Pública em ordem cronológica de apresentação 
de precatórios (art. 100, da CF). Expropriações de numerário existente nas 
contas do Estado do Rio de Janeiro, para saldar os valores fixados nas 
decisões judiciais, que alcancem recursos de terceiros, escriturados 
 
2 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e democracia. Disponível em: 
http://www.direitofranca.br/direitonovo/FKCEimagens/file/ArtigoBarroso_para_Selecao.pdf. Acesso 
em: 12 ago. 2019. 
 
8 
contabilmente, individualizados ou com vinculação orçamentária 
específica implicam alteração da destinação orçamentária de recursos 
públicos e remanejamento de recursos entre categorias de 
programação sem prévia autorização legislativa, o que não se concilia 
com o art. 167, VI e X, da Constituição da República. A aparente 
usurpação de competências constitucionais reservadas ao Poder Executivo 
– exercer a direção da Administração – e ao Poder Legislativo – autorizar a 
transposição, remanejamento ou transferência de recursos de uma categoria 
de programação para outra ou de um órgão para outro – sugere lesão aos 
arts. 2º, 84, II, e 167, VI e X, da Carta Política. Precedente: ADPF 387/PI, 
Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgamento em 23.3.2017. 
Fumus boni juris evidenciado. 3. Satisfeito o requisito do periculum in 
mora ante o elevado risco de comprometimento do patrimônio e das 
receitas correntes do Estado do Rio de Janeiro. 4. Deferimento apenas 
parcial para suspender os efeitos das decisões judiciais impugnadas 
exclusivamente nos casos em que as medidas constritivas nelas 
determinadas tenham recaído sobre recursosescriturados, com vinculação 
orçamentária específica ou vinculados a convênios e operações de crédito, 
valores de terceiros sob a administração do Poder Executivo e valores 
constitucionalmente destinados aos Municípios, em afronta aos arts. 2º, 84, 
II, e 167, VI e X, da Constituição da República. 5. Medida cautelar deferida 
em parte3. (Destaque) 
 
No caso em tela, foram impugnadas decisões judiciais demandando restrição 
patrimonial contra o Estado do Rio de Janeiro para atender à demanda judicial de 
servidores públicos, ativos e inativos, vitimados com atraso no pagamento da 
remuneração. Porém, como reflexo da medida de controle externo realizada, o Poder 
Executivo estadual estava na emergência de sofrer comprometimento de seus 
recursos orçamentários. 
Foi necessário haver parâmetros para aplicação de tal contingenciamento de 
gastos para destinar recursos aos agentes públicos querelantes. 
Os fundamentos nucleares da Arguição de Descumprimento de Preceito 
Fundamental (ADPF) diziam respeito à segurança orçamentária e à competência do 
chefe do Poder Executivo quanto à condução da gestão para qual foi eleito, admitindo-
se que as decisões judiciais favoráveis aos agentes públicos poderiam comprometer 
a harmonia e equilíbrio dos Poderes, porquanto o Judiciário estaria alocando ou 
priorizando verba orçamentária atinente ao âmbito da Administração Pública, pela 
execução orçamentária. 
Poder-se-ia fundamentar a interferência do Poder Judiciário com fulcro no 
princípio da inafastabilidade da jurisdição, consagrado no Inciso XXXV, do Art 5º, da 
Carta Política, uma vez que no ordenamento jurídico brasileiro a Administração 
Pública stricto sensu não exerce jurisdição própria, como preceituado pelo modelo 
francês; assim, até mesmo as querelas entre Administração Pública contratante e 
agentes públicos ocupantes de cargo de efetivo exercício ou empregados públicos 
deverão provocar o Judiciário para solucionar conflitos que possam repercutir em 
ameaças ou concretas lesões a direito. 
 
3 ADPF 405 MC / RJ. Tribunal Pleno. Min. Relatora: Rosa Weber. Julgado em: 14/06/2017. Publicado 
em: 05/02/2018. 
 
9 
Diante disso, os operadores do Direito necessitam conhecer as metodologias 
de interpretação constitucional, principalmente quando as querelas judiciais acabam 
por extrapolar as hipóteses contidas na lei. 
Buscar o equilíbrio entre a aplicação de princípios ou garantias salutares a um 
Estado Democrático de Direito e o harmonioso exercício dos Poderes torna-se o dever 
do intérprete do Direito Constitucional. 
É possível constatar rotineiramente o quão complexa a democracia e o 
saudável exercício da cidadania têm se tornado, demandando das instituições 
atuação para sanar as mais variadas formas de litígio; vemos então as formas de 
equiparação de direitos trabalhistas; o reconhecimento de parentesco socioafetivo 
para fins de registro, pensão alimentícia e herança; a união homoafetiva. Na mesma 
esteira, surgem novos conflitos e temores, como o contrato de namoro, desinformação 
quanto à união estável presumida. 
O Direito Constitucional contemporâneo necessita passar por esse conflito, já 
que vivenciamos um percurso entre o já estabelecido civil law e chegando a um 
incipiente e atuante commow law. Para este desiderato, utilizaremos das técnicas de 
hermenêutica constitucional. 
 
1.1 Interpretação das normas constitucionais e regras de hermenêutica 
 
Na didática de Uadi Lammêgo Bulos (2015; p. 446), interpretar é: “[…] descobrir 
o significado, o conteúdo e o alcance dos símbolos linguísticos escritos em seus 
artigos, parágrafos, incisos e alíneas”. 
Hermenêutica é como se denomina a ciência da interpretação. Assim, 
concebemos que esta ciência é constituída de métodos e regras próprios capazes de 
investigar e alcançar o conteúdo e significado do texto jurídico. 
Partimos, portanto, do conteúdo semântico e alcançamos até mesmo o 
propósito de determinada norma, aplicando critérios racionais ou teleológicos. 
Alguns doutrinadores traçam a distinção entre a hermenêutica jurídica e a 
hermenêutica constitucional no sentido de estar esta última além daquela, mas não 
sendo opositora, somente complementar4. 
Todos os agentes públicos e operadores do Direito são intérpretes das normas 
jurídicas; mas, no âmbito constitucional, principalmente em sede de controle de 
constitucionalidade, será o STF quem determinará o significado das normas 
submetidas a seu julgo, valendo-se sempre das regras de hermenêutica. 
A exegese mais moderna e adequada ao atual contexto constitucionalista é a 
que se dá pela mutação constitucional ou interpretação conforme a constituição. 
Isso não significa estabelecer que os métodos clássicos e principiológicos 
estejam necessariamente superados, mas sim que se tornam cada vez mais 
acessórios ou secundários frente ao dinamismo e eficácia oriundos dos novos 
métodos. 
 
4 FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. SALVADOR: Juspodivm. 2017. 
p. 182. 
 
10 
Assim, por mais que seja realizada uma interpretação conforme a Constituição, 
pode ser aplicada uma leitura teleológica do dispositivo discutido e coadunado com 
os atuais valores cívicos da sociedade brasileira, especialmente dando guarida a 
princípios construídos doutrinariamente, especialmente em face de vieses garantistas. 
Nos anos recentes, tivemos, então, históricas decisões como a da prisão civil 
do depositário infiel (HC n.º 90.450 - MG e HC n.º 94.695 - RS) e do reconhecimento 
da união estável homoafetiva (ADI n.º 4.277 – DF e ADPF n.º 132 - RJ). 
Embora algumas decisões proferidas pelos Ministros do STF pareçam 
unicamente caprichos narcísicos para o senso comum, vemos uma finalidade 
premente de adequação a tratados e convenções anteriormente acatados pela 
República Federativa do Brasil. 
Nesse sentido, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos traz em seu 
bojo que “ninguém deve ser detido por dívidas” (Art.º 7; n. 7), com a clara exceção 
para o inadimplemento de obrigações alimentícias. O advento da Emenda 
Constitucional n.º 45/2004, acrescentando o § 3º ao Art. 5º da Constituição, trouxe 
uma nova hierarquização dos tratados internacionais aprovados pelo rito de emendas 
constitucionais. 
Para tanto, no magno e didático entendimento do Pretório Excelso: 
 
EMENTA: “HABEAS CORPUS” - DENEGAÇÃO DE MEDIDA LIMINAR - 
SÚMULA 691/STF - SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS QUE AFASTAM A 
RESTRIÇÃO SUMULAR - PRISÃO CIVIL - DEPOSITÁRIO JUDICIAL - A 
QUESTÃO DA INFIDELIDADE DEPOSITÁRIA - CONVENÇÃO AMERICANA 
DE DIREITOS HUMANOS (ARTIGO 7º, n. 7) - HIERARQUIA 
CONSTITUCIONAL DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS 
HUMANOS - “HABEAS CORPUS” CONCEDIDO “EX OFFICIO”. 
DENEGAÇÃO DE MEDIDA LIMINAR - SÚMULA 691/STF - SITUAÇÕES 
EXCEPCIONAIS QUE AFASTAM A RESTRIÇÃO SUMULAR. 
(…) 
A INTERPRETAÇÃO JUDICIAL COMO INSTRUMENTO DE MUTAÇÃO 
INFORMAL DA CONSTITUIÇÃO. - A questão dos processos informais de 
mutação constitucional e o papel do Poder Judiciário: a interpretação 
judicial como instrumento juridicamente idôneo de mudança informal 
da Constituição. A legitimidade da adequação, mediante interpretação do 
Poder Judiciário, da própria Constituição da República, se e quando 
imperioso compatibilizá-la, mediante exegese atualizadora, com as novas 
exigências, necessidades e transformações resultantes dos processos 
sociais, econômicos e políticos que caracterizam, em seus múltiplos e 
complexos aspectos, a sociedade contemporânea. HERMENÊUTICA E 
DIREITOS HUMANOS: A NORMA MAIS FAVORÁVEL COMO CRITÉRIO 
QUE DEVE REGER A INTERPRETAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. - Os 
magistrados e Tribunais, no exercício de sua atividade interpretativa, 
especialmente no âmbito dos tratados internacionais de direitos humanos, 
devem observar um princípio hermenêutico básico (tal como aquele 
proclamado no Artigo 29 da Convenção Americana de Direitos Humanos), 
consistenteem atribuir primazia à norma que se revele mais favorável à 
pessoa humana, em ordem a dispensar-lhe a mais ampla proteção jurídica. - 
O Poder Judiciário, nesse processo hermenêutico que prestigia o 
critério da norma mais favorável (que tanto pode ser aquela prevista no 
tratado internacional como a que se acha positivada no próprio direito 
interno do Estado), deverá extrair a máxima eficácia das declarações 
internacionais e das proclamações constitucionais de direitos, como 
 
11 
forma de viabilizar o acesso dos indivíduos e dos grupos sociais, 
notadamente os mais vulneráveis, a sistemas institucionalizados de 
proteção aos direitos fundamentais da pessoa humana, sob pena de a 
liberdade, a tolerância e o respeito à alteridade humana tornarem-se 
palavras vãs. - Aplicação, ao caso, do Artigo 7º, n. 7, c/c o Artigo 29, ambos 
da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa 
Rica): um caso típico de primazia da regra mais favorável à proteção efetiva 
do ser humano5. (destaque) 
 
Pelo caso em comento, poder-se-ia conjecturar uma reforma constitucional 
informal, realizada pela hermenêutica, restringindo o alcance gramatical da parte final 
do Inciso LXVII do Art. 5º (“não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável 
pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do 
depositário infiel”). 
Ponderou-se pelo viés garantista em prol da amplitude da proteção aos direitos 
fundamentais dos cidadãos. 
Nesse sentido, vemos o seguinte julgado acerca da interpretação realizada pela 
Corte Suprema sem realizar alteração textual, apenas da sua amplitude semântica: 
 
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTS. 20 E 21 
DA LEI N. 10.406/2002 (CÓDIGO CIVIL). PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE 
ATIVA REJEITADA. REQUISITOS LEGAIS OBSERVADOS. MÉRITO: 
APARENTE CONFLITO ENTRE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS: 
LIBERDADE DE EXPRESSÃO, DE INFORMAÇÃO, ARTÍSTICA E 
CULTURAL, INDEPENDENTE DE CENSURA OU AUTORIZAÇÃO PRÉVIA 
(ART. 5º INCS. IV, IX, XIV; 220, §§ 1º E 2º) E INVIOLABILIDADE DA 
INTIMIDADE, VIDA PRIVADA, HONRA E IMAGEM DAS PESSOAS (ART. 5º, 
INC. X). ADOÇÃO DE CRITÉRIO DA PONDERAÇÃO PARA 
INTERPRETAÇÃO DE PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL. PROIBIÇÃO DE 
CENSURA (ESTATAL OU PARTICULAR). GARANTIA CONSTITUCIONAL 
DE INDENIZAÇÃO E DE DIREITO DE RESPOSTA. AÇÃO DIRETA 
JULGADA PROCEDENTE PARA DAR INTERPRETAÇÃO CONFORME A 
CONSTITUIÇÃO AOS ARTS. 20 E 21 DO CÓDIGO CIVIL, SEM REDUÇÃO 
DE TEXTO. 
(…) 
privacidade, à honra e à imagem. 8. Para a coexistência das normas 
constitucionais dos incs. IV, IX e X do art. 5º, há de se acolher o 
balanceamento de direitos, conjugando-se o direito às liberdades com a 
inviolabilidade da intimidade, da privacidade, da honra e da imagem da 
pessoa biografada e daqueles que pretendem elaborar as biografias. 9. Ação 
direta julgada procedente para dar interpretação conforme a Constituição 
aos arts. 20 e 21 do Código Civil, sem redução de texto, para, em 
consonância com os direitos fundamentais à liberdade de pensamento 
e de sua expressão, de criação artística, produção científica, declarar 
inexigível autorização de pessoa biografada relativamente a obras 
biográficas literárias ou audiovisuais, sendo também desnecessária 
autorização de pessoas retratadas como coadjuvantes (ou de seus 
familiares, em caso de pessoas falecidas ou ausentes).6 (destaque) 
 
5 HC nº 94.965 / RS. 2ª Turma. Min. Relator: Celso de Mello. Julgamento em: 23/09/2008. Publicação 
em: 06/02/2009. 
6 ADI 4815/DF. Tribunal Pleno. Min. Relatora: Carmen Lúcia. Julgamento em: 10/06/2015. Publicação 
em: 01/02/2016. 
 
12 
 
 A alteração da interpretação sem realizar uma efetiva alteração do texto 
constitucional é conhecida como “mutação constitucional”, fenômeno abundante no 
ordenamento jurídico brasileiro atual. 
 Possui alicerce na “interpretação conforme a Constituição”, que, embora pareça 
carregar redundância, traduz o significado e o fim da sua investida por parte do STF. 
 A primeira vez que este princípio – ou método – foi adotado pelo Supremo 
Tribunal Federal se deu na Representação n.º 1.417-7, do ano de 1987: 
 
REPRESENTAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO PARÁGRAFO 3 
DO ARTIGO 65 DA LEI ORGÂNICA DA MAGISTRATURA NACIONAL, 
INTRODUZIDO PELA LEI COMPLEMENTAR N. 54/86. - O PRINCÍPIO DA 
INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO 
(VERFASSUNGSKONFORME AUSLEGUNG) E PRINCÍPIO QUE SE 
SITUA NO ÂMBITO DO CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE, E NÃO 
APENAS SIMPLES REGRA DE INTERPRETAÇÃO. A APLICAÇÃO DESSE 
PRINCÍPIO SOFRE, PORÉM, RESTRIÇÕES, UMA VEZ QUE, AO 
DECLARAR A INCONSTITUCIONALIDADE DE UMA LEI EM TESE, O STF 
- EM SUA FUNÇÃO DE CORTE CONSTITUCIONAL - ATUA COMO 
LEGISLADOR NEGATIVO, MAS NÃO TEM O PODER DE AGIR COMO 
LEGISLADOR POSITIVO, PARA CRIAR NORMA JURÍDICA DIVERSA DA 
INSTITUÍDA PELO PODER LEGISLATIVO. POR ISSO, SE A ÚNICA 
INTERPRETAÇÃO POSSÍVEL PARA COMPATIBILIZAR A NORMA COM A 
CONSTITUIÇÃO CONTRARIAR O SENTIDO INEQUÍVOCO QUE O PODER 
LEGISLATIVO LHE PRETENDEU DAR, NÃO SE PODE APLICAR O 
PRINCÍPIO DA INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO, QUE 
IMPLICARIA, EM VERDADE, CRIAÇÃO DE NORMA JURÍDICA, O QUE É 
PRIVATIVO DO LEGISLADOR POSITIVO. - EM FACE DA NATUREZA E 
DAS RESTRIÇÕES DA INTERPRETAÇÃO CONFORME A 
CONSTITUIÇÃO, TEM-SE QUE, AINDA QUANDO ELA SEJA APLICÁVEL, 
O É DENTRO DO ÂMBITO DA REPRESENTAÇÃO DE 
INCONSTITUCIONALIDADE, NÃO HAVENDO QUE CONVERTER-SE, 
PARA ISSO, ESSA REPRESENTAÇÃO EM REPRESENTAÇÃO DE 
INTERPRETAÇÃO, POR SEREM INSTRUMENTOS QUE TÊM FINALIDADE 
DIVERSA, PROCEDIMENTO DIFERENTE E EFICÁCIA DISTINTA. - NO 
CASO, NÃO SE PODE APLICAR A INTERPRETAÇÃO CONFORME A 
CONSTITUIÇÃO POR NÃO SE COADUNAR ESSA COM A FINALIDADE 
INEQUIVOCAMENTE COLIMADA PELO LEGISLADOR, EXPRESSA 
LITERALMENTE NO DISPOSITIVO EM CAUSA, E QUE DELE RESSALTA 
PELOS ELEMENTOS DA INTERPRETAÇÃO LÓGICA. - O PARÁGRAFO 3 
DO ARTIGO 65 DA LEI COMPLEMENTAR N. 35/79, ACRESCENTADO 
PELA LEI COMPLEMENTAR N. 54, DE 22.12.86, É INCONSTITUCIONAL, 
QUER NA ESFERA FEDERAL, QUER NA ESTADUAL. VIOLAÇÃO DOS 
ARTIGOS 57, II, 65 E 13, III E IV, BEM COMO SEU PARÁGRAFO 1, DA 
CARTA MAGNA. REPRESENTAÇÃO QUE SE JULGA PROCEDENTE, 
PARA SE DECLARAR A INCONSTITUCIONALIDADE DO PARÁGRAFO 3 
DO ARTIGO 65 DA LEI COMPLEMENTAR N. 35/79, INTRODUZIDO PELA 
LEI COMPLEMENTAR N. 54, DE 22.12.86. (destaque)7 
 
 A ementa em questão traduz que a interpretação conforme a Constituição não 
pode ser usada no sentido de legislação positiva, estipular uma disposição normativa 
 
7 RP. 1417 – DF. Tribunal Pleno. Min. Relator: Moreira Alves. Julgamento em: 09/12/1987. Publicação 
em: 15/04/1988. 
 
13 
pela interpretação distinta daquela pretendida pelo Poder Legislativo, pois, nesse 
caso, configuraria usurpação de Poderes. 
O disposto é ainda didático no sentido de expor que a interpretação não é 
ilimitada e ampla, devendo buscar sua própria finalidade em primor da própria norma 
constitucional. 
 O instituto em voga serve para sanar a polissemia dos dispositivos 
constitucionais, excluindo a interpretação de natureza inconstitucional, v.g., a que 
propuser a diminuição ou limitação de direitos e garantias fundamentais. 
 Assim, quando da publicação da Lei Maria da Penha, Lei n.º 11.340/2006, 
nasceram duas posições distintas acerca do núcleo desta norma: ao se estabelecer 
um tratamento diferenciado a homens e mulheres no tocante à política penal, haveria 
sido criada uma discriminação que privilegia determinado grupo em ofensa à 
igualdade, de que todos seriam iguais perante a lei, ou a distinção em questão estaria 
alicerçada em peculiaridades culturais e físicas entre homens e mulheres?8 
 Frente às duas posições, pode-se dizer que a discriminação ao arrepio do 
princípio da igualdade é flagrantemente inconstitucional ou que a mesma distinção 
com base em dados e em aspectos culturais e físicos aproxima homens e mulheres 
frente à dignidade, tornando-se uma medidaclaramente constitucional. 
 Desta feita, a Corte Suprema entendeu pela intepretação que atribuía distinção 
constitucionalmente condizente com o propósito de coibir violência nas relações 
familiares (ADC n.º 19 – DF. Tribunal Pleno. Min. Relator: Marco Aurélio. Julgamento 
em: 09/02/2012. Publicação em: 29/04/2014). 
 De maneira similar, quando do julgamento da ADI n.º 4.274, acerca da 
denominada Marcha da Maconha ser exercício da liberdade de expressão ou apologia 
a crime previsto na Lei de Drogas, foi dada a intepretação que tornasse o conteúdo 
constitucional (ADI n.º 4274 – DF. Tribunal Pleno. Min. Relator: Ayres Britto. 
Julgamento em: 23/11/2011. Publicação em: 02/05/2012). 
O princípio da interpretação conforme a Constituição se sobressai pelo 
ferramental de controle de constitucionalidade perante os demais princípios, os quais 
são alicerces da própria interpretação constitucional. 
 No entanto, pode ser questionado se tal metodologia – ou forma de controle de 
constitucionalidade – conflita com princípios interpretativos, em especial o da unidade 
da constituição. Esse baluarte hermenêutico preconiza uma equidade hierárquica 
entre as próprias normas contidas no texto constitucional, coibindo contradições, 
especialmente no que tange às cláusulas pétreas de encontro às demais normas 
constitucionais. Mas não seria toda exegese realizada uma tentativa de equalizar as 
próprias normas constitucionais, priorizando uma em detrimento de outra? 
Por exemplo, o reconhecimento da união estável homoafetiva, com base nas 
garantias de direito de família, dignidade da pessoa humana e liberdade de foro íntimo, 
não estaria em confronto com o texto do §3º, Art. 226, que menciona precisamente a 
união estável entre homem e mulher? 
A unidade da constituição como bastião exegeta estabelece não o perecimento 
da norma em face de uma subsunção, mas fornece amplitude para o instituto da “união 
 
8 NUNES JÚNIOR, Flávio Martins. Curso de Direito Constitucional. Revista dos Tribunais: São Paulo. 
2017. 
 
14 
estável” de modo a abarcar outras formas afetivas para cumprimento das garantias e 
direitos do Art. 5º. Harmonizaram-se duas dinâmicas de direito dentro do sistema 
constitucional de normas: admitindo-se a união estável entre homem e mulher, e a 
união homoafetiva. 
Com base no princípio da correção funcional, temos que a hermenêutica irá 
priorizar a estabilidade entre os Poderes. Deu-se no caso da constrição de dotações 
orçamentárias para atender à demanda de agentes públicos com salários em atrasos, 
no Estado do Rio de Janeiro (ADPF 405 MC / RJ. Tribunal Pleno. Min. Relatora: Rosa 
Weber. Julgado em: 14/06/2017. Publicado em: 05/02/2018). 
Esses, entre outros, são uníssonos em estabelecer uma interpretação ou 
alteração semântica do conteúdo positivado constitucionalmente sem acarretar 
distorções jurídicas da norma em análise, justamente em homenagem à tripartição 
dos Poderes. Em sentido diverso, ampliando ou distorcendo desarrazoadamente, 
estaríamos falando em uma usurpação do poder legiferante. 
Assemelha-se ao princípio da concordância prática, que estatui pelo não 
esgotamento da norma constitucional posta em discussão pelo Judiciário: no conflito, 
deve valorar os efeitos da norma, equilibrá-los, mas sem esgotá-los de valor ou 
aplicação. 
Todos estes celebram o princípio da máxima eficácia e efetividade da 
Constituição, relacionado com a concretização da Constituição. Assim, o intérprete 
deverá aplicar o significado que atribuir maior eficácia às normas constitucionais. 
Todos esses princípios sobressaem na aplicação do método hermenêutico-
concretizador, corroborado por Konrad Hesse, que consiste na exegese a partir do 
problema trazido aos olhos do Poder Judiciário. Busca homenagear a norma sem, 
contudo, menosprezar o caso em tela. Não se deve perder o texto constitucional de 
vista, para poder estar face ao problema, primando a norma sobre o conflito. 
No sentido contrário, no método tópico-problemático, prioriza-se a resolução 
de conflitos, estando a norma constitucional questionada aberta a interpretações 
subjetivas, para adaptar parcela de sua interpretação – uma entre muitas – ao 
problema. 
 
1.2 A interpretação e eficácia normativa do preâmbulo constitucional 
 
Peculiar questão que possa surgir acerca da exegese aplicada à Constituição 
diz respeito a que valor ou eficácia pode-se atribuir ao preâmbulo. 
O preâmbulo disposto na Carta Magna de 05 de outubro e 1988 está disposto 
nos seguintes termos: 
 
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia [sic] 
Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a 
assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a 
segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como 
valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, 
fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e 
internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a 
 
15 
proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA 
FEDERATIVA DO BRASIL. 
 
Pelo conteúdo preceituado, tratou-se de uma fotografia do momento da 
promulgação do documento político. 
Inaugurou-se uma nova ordem constitucional com base naqueles valores ali 
declarados. Contudo, estaria tal formalidade caracterizada como norma 
constitucional? Aliás, poderia ser denominada norma constitucional programática? 
Diante disso, buscou-se algumas teorias acerca de seu peso jurídico, sendo 
três delas de especial valoração para sanar a dúvida: a da irrelevância jurídica, a da 
valoração jurídica direta (eficácia direta) e a da valoração jurídica reflexa (eficácia 
indireta). 
A que demanda maiores esclarecimentos é essa última: pela teoria da eficácia 
indireta, os prolegômenos constitucionais estariam consagrados como elemento 
norteador da interpretação e aplicação das normas constitucionais positivadas. Seria, 
portanto, um critério ou base exegética para o entendimento das normas 
constitucionais. 
Para além de um mero expediente ou formalidade, seria uma diretriz para as 
normas constitucionais. 
Pondo fim a essa questão, o STF vaticinou que não fosse norma central 
constitucional, conforme vemos a seguir: 
 
EMENTA: CONSTITUCIONAL. CONSTITUIÇÃO: PREÂMBULO. NORMAS 
CENTRAIS. Constituição do Acre. 
I. – Normas centrais da Constituição Federal: essas normas são de 
reprodução obrigatória na Constituição do Estado-membro, mesmo porque, 
reproduzidas, ou não, incidirão sobre a ordem local. Reclamações 370-MT e 
383-SP (RTJ 147/404). 
II. – Preâmbulo da Constituição: não constitui norma central. Invocação da 
proteção de Deus: não se trata de norma de reprodução obrigatória na 
Constituição estadual, não tendo força normativa. 
III. – Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente9. 
 
Nesse sentido, entende-se não ser uma norma de matriz política; assim, não 
necessita ser reproduzida nas constituições estaduais, alinhada ao que conhecemos 
como princípio da simetria, que estabelece haver consonância das normas 
constitucionais dos Estados-membro com a da Constituição Federal. 
Após esse entender, a Min. Carmén Lúcia elucidou a querela novamente: 
 
(…) E, referindo-se, expressamente, ao Preâmbulo da Constituição brasileira 
de 1988, escolia José Afonso da Silva que “O Estado Democrático de Direito 
destina-se a assegurar o exercício de determinados valores supremos. 
‘Assegurar’, tem, no contexto, função de garantia dogmático-constitucional; 
não, porém, de garantia dos valores abstratamente considerados, mas do seu 
‘exercício’. Este signo desempenha, aí, função pragmática, porque, com o 
 
9 ADI 2.076, Min. Relator: Carlos Velloso, Julgamento em: 15/08/2002. Publicado em: 08/08/2003. 
 
16 
objetivo de ‘assegurar’, tem o efeito imediato de prescrever ao Estado uma 
ação em favor da efetiva realizaçãodos ditos valores em direção (função 
diretiva) de destinatários das normas constitucionais que dão a esses valores 
conteúdo específico” (…). Na esteira destes valores supremos explicitados 
no Preâmbulo da Constituição brasileira de 1988 é que se afirma, nas normas 
constitucionais vigentes, o princípio jurídico da solidariedade.10 
 
Também é compreendido que não há necessidade da reprodução da 
expressão ou signo acerca de Deus, ou de matriz religiosa propriamente. Como 
mencionado, foi o reflexo histórico de 1988 e, sendo norma de estatura constitucional, 
estaria sujeito à emenda constitucional para acrescer ou mudar signos de valores 
(filosóficos, ideológicos ou religiosos). 
Coube também o devido questionamento acerca da laicidade do Estado: 
mencionando a proteção de Deus, estaria o ordenamento jurídico sujeito a um valor 
predominantemente cristão em detrimento de outras crenças e filosofias? O 
entendimento é que não há essa valoração jurídica de cunho cristão, não sendo 
obrigatória também a reprodução dos termos específicos na promulgação das 
Constituições estaduais. 
No entanto, poder-se-ia sugerir que o conteúdo dos prolegômenos se aproxima 
de uma norma programática, no sentindo de estar consubstanciada em valores a 
serem alcançados. Assim, haveria valores sociais de cunho cristão quando da 
promulgação da Carta Política, que podem ser posteriormente alcançados quando da 
realização de políticas públicas. 
Paulo Roberto Lyra Pimenta classifica normas programáticas: 
 
(…) 
Com base nessa separação, evidencia-se que as normas programáticas 
criam para o particular o direito a algo, ou seja, direito a prestações positivas 
por parte do Estado, as quais podem consistir em prestações fáticas ou 
normativas. 
As normas programáticas em sentido estrito estabelecem programas, 
exigindo que o legislador os implemente por meio de lei, vale reafirmar. Sendo 
assim, criam para os seus destinatários direito subjetivo a prestações 
normativas, pois normas gerais deverão ser veiculadas por meio de lei para 
que o direito seja satisfeito. 
(…)11 
 
De tal sorte, é entendido que, por meio da norma programática, será disparado 
um comando para o Estado alcançar o exercício de direito por parte de um cidadão. 
 
10 ADI 2.649, voto Ministra Relatora Cármen Lúcia, Julgamento ocorrido em: 08-5-2008, P, DJE de 
17-10-2008. 
11 PIMENTA, Paulo Roberto Lyra. As normas constitucionais programáticas e a reserva do possível. 
Disponível em: 
https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/496554/000940642.pdf?sequence=1. Acesso em: 
20 ago. 2019. 
 
17 
Podemos vislumbrar claramente o teor programático do Art. 6º, caput, e do Art. 
7º, IV, da Carta Magna. Porém, torna-se mais nebuloso atribuir o mesmo 
entendimento para o preâmbulo. 
Pode-se afirmar, no entanto, que um valor a ser atingido não fica esgotado em 
um único dispositivo, sendo reforçado ao longo do texto constitucional. Podemos 
mencionar o princípio da legalidade, nas searas penal e tributária, acarretando 
limitações ao poder de império e garantindo equilíbrio democrático ao jurisdicionado 
na relação jurídica em curso – a defesa contra a acusação e a previsão legal cumprida 
quando da exação. 
Os direitos sociais mencionados no preâmbulo coadunam-se posteriormente 
ao Art. 6º, caput; também ao Título VIII, que trata da ordem social. Assim, temos 
diversos comandos constitucionais no sentindo de se alcançar determinado fim ao 
cidadão, tendo uma consonância temática e política com o outro. Da mesma forma, o 
preâmbulo constitucional encontra-se germinado por diversos dispositivos no decorrer 
do texto constitucional. 
 
 
 
 
18 
2. FEDERAÇÃO E SUAS CARACTERÍSTICAS REPRESENTADAS NA 
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 
 
Conforme mencionado anteriormente, o Estado é a união de três elementos 
distintos: o povo, o território e a soberania. A Carta Magna de um país é o documento 
que o constitui uníssono entre aqueles três fatores. 
Nas palavras de Celso Ribeiro Bastos, o Estado é: 
 
(…) a organização política sob a qual vive o homem moderno. Ela caracteriza-
se por ser a resultante de um povo vivendo sobre um território delimitado e 
governado por leis que se fundam num poder não sobrepujado por nenhum 
outro externamente e supremo internamente.12 
 
O elemento que delineia o poder sobre o qual se funda encontra-se justamente 
no seu texto constitucional. 
Porém, em decorrência de fatores histórico-políticos, nem todo Estado 
organizou-se de maneira semelhante, o que reflete em elementos peculiares em sua 
constituição, caso comparemos com a brasileira. 
Nesse sentido, o nascimento de um Estado está indissociável do modo em que 
foi tecido seu respectivo Diploma Político. 
A cisão pela qual veio tal preceito deu-se pelo paradigma edificado após a 
Revolução Francesa. Tínhamos que o poder constituído era imbuído ao monarca, e a 
origem desse poder teria base metafísica e abstrata. A partir do Período das 
Revoluções, tal poder deveria estar constituído materialmente por intermédio das 
instituições de Estado. 
Uma Constituição reparte o todo o poder em esferas funcionais, como os 
Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo, além de descentralizações 
administrativas, na forma de províncias, comunas, municípios ou unidades federadas. 
A soberania é exercida quando, de forma unitária, esse poder todo é avocado 
por uma descentralização administrativa de cunho maior, para expor qual o alcance 
da nova ordem jurídica. 
Para compreendermos melhor a natureza da Constituição Federal de 1988 e 
da República Federativa do Brasil, necessário se faz perscrutar as principais 
características acerca do Estado e as de uma federação, além de compreender os 
tipos de constituição. 
 
2.1 O Estado e a Federação 
 
Historicamente, o ser humano sempre necessitou de uma força hierárquica 
forte e legitimada para impor ordem ao agrupamento do qual fazia parte. 
 
12 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de teoria do Estado e ciência política. SARAIVA: São Paulo, 1989, p. 
10. 
 
19 
Entre os registros mais consolidados acerca dessa força, somos, 
primeiramente, remetidos à Grécia Antiga, e posteriormente, ao século XVI, com o 
tratado de Maquiavel. 
Tínhamos, portanto, que as constituições eram classificadas conforme a forma 
de governo vigente. No contexto da Grécia, havia constituições monárquicas, 
aristocráticas e democráticas13. 
A concepção mais sofisticada do atual modelo parlamentar remonta ao século 
XII, quando o rei inglês era assessorado por um conselho, composto em maioria por 
barões e vassalos. 
Mas o que compete ao atual Direito Constitucional refere-se à estruturação das 
Unidades Federativas, componentes de um Estado, e a como tais entes comportam-
se frente à distribuição de competência na forma de sua Carta Magna. 
Uma federação perpassa pela questão territorial, onde entes agregados abrem 
parte de seu poder político para um ente maior representante do todo, a União. Assim, 
os entes de então tornam-se autônomos e o ente centralizador soberano. 
A federação está prevista no primeiro dispositivo constitucional, nos seguintes 
termos: 
 
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos 
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado 
Democrático de Direito e tem como fundamentos: 
 
No caso da Carta Magna de 1988, este fenômeno ocorre pela repartição de 
competências no seu texto, além das regras disciplinadoras e excepcionais aplicáveis 
(intervenção federal). 
Assim, para compreendermos melhor a institucionalização do Estado, 
adentraremos em novos conceitos, passando necessariamente pelas definições de 
dominância ou governo; a partir dessas, amoldam-se as formas de regime político e 
estruturação do Estado, como instituição. 
Assim, a monocracia, ou monarquia, caracteriza-se por ser o governo exercido 
por um único ente.Os poderes então constituídos voltam-se na centralização desse 
governante absoluto. 
O exemplo mais icônico está na figura do reino de Luís XIV, o rei sol, famoso 
pela expressão L’Êtat c’est moi14. Essa referência expõe muito bem a centralidade do 
poder na figura de uma pessoa, conforme a metáfora do sol, cujos raios atingem toda 
extensão da terra durante o dia. 
A estrutura mais moderna, desde a monarquia absoluta, consiste na monarquia 
parlamentar. Nesse modelo, dentre diversas formas de figurações dos seus Poderes, 
a Chefia de Estado ainda está consubstanciada na figura do monarca, enquanto a 
Chefia de Governo é exercida por um agente eleito pelo Parlamentar, órgão 
deliberativo e representativo da população. 
 
13 BASTOS, Celso Ribeiro. Op. Cit. p. 46. 
14 O Estado sou eu. 
 
20 
Naturalmente, o sistema de freios e contrapesos é exercido nos moldes 
instituídos pela Carta Política vigente. 
Dando seguimento, há um termo deveras abrangente, referente à oligarquia, 
na qual o governo é exercido por uma classe social ou estamental. Com uso também 
de maneira pejorativa, tem-se nos moldes da aristocracia, não bastando que haja uma 
forma constituída juridicamente nos moldes da sua Constituição, mas sim que 
pragmaticamente uma classe específica usurpe institucionalmente os Poderes para 
seus próprios interesses. 
A última das três principais formas e mais moderna consiste na democracia, o 
governo realizado pelo próprio povo. Pragmaticamente difícil de ser exercida ao pé da 
letra, este regime viabiliza-se predominantemente pela representatividade indireta, na 
qual o povo, possuidor do poder constituído, elege um mandatário para representá-lo; 
e, excepcionalmente, exercido de maneira direta pelo povo. Seria o caso, conforme a 
Constituição Federal de 1988, do exercício dos institutos do plesbicito e do referendo, 
além da hipótese de iniciativa popular de leis. 
A República Federativa do Brasil é caracterizada nesse modelo e contém 
previsão expressa no parágrafo único do Art. 1º da Carta Magna, em que “todo o poder 
emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos 
termos desta Constituição”15. 
Minuciosamente a esses conceitos, existe uma forma de definir o sistema, a 
forma como se dá a dinâmica entre os Poderes, especialmente o Legislativo e o 
Executivo, no tocante ao sistema de controle e o relacionamento institucional. Nesse 
sentido, teremos os sistemas de governo. 
Um dos mais tradicionais é justamente o parlamentarismo, no qual o Poder 
Legislativo e o Executivo estão entrelaçados institucionalmente e aquele realiza um 
controle mais amplo sobre este último. Consiste em um sistema para monarquias e 
para repúblicas, embora sejam mais conhecidas as monarquias parlamentares. 
A pessoa incumbida da Chefia de Governo é escolhida pelo Parlamento, este 
o representante do povo. 
De maneira distinta, o presidencialismo, sistema vigente no Brasil, consiste na 
união da Chefia de Governo e da Chefia de Estado numa única pessoa, eleita pelo 
povo, havendo maior cisão relacional entre o Poder Executivo e o Legislativo, mas 
sem haver abolição do controle externo. 
O presidencialismo não abre mão do sistema de freios e contrapesos (checks 
and balances) apesar de ter essa dinâmica distinta do parlamentarismo. Assim, entre 
as competências exclusivas do Congresso Nacional, há a autorização para o 
Presidente da República declarar guerra ou celebrar paz (Art. 49, II) e para que se 
ausente do país por mais de quinze dias (Art. 49, III), e os casos de composição de 
cargos a serem sabatinados pelo Senado Federal quando escolhidos pelo Presidente 
da República (Art. 52, III, “b” e “d”) ou de realizar o processo e julgamento do 
Presidente da República em crimes de responsabilidade (Art. 52, I). 
As principais questões polêmicas acerca do controle externo ou da invasão de 
competências diz respeito à realização de atos por parte do Poder Legislativo ou a 
edição de normas pelo Poder Executivo. Este o faz de maneira mundana, quando 
 
15 BRASIL. Constituição (1988), de 05 de outubro de 1988. Disponível em: 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituição.htm. Acesso em: 12 set. 2019. 
 
21 
deveria fazê-lo excepcionalmente, como o caso de medidas provisórias. Podemos 
conjeturar essa circunstância nos moldes do seguinte julgado: 
 
EMENTA CONSTITUCIONAL. PROCESSO LEGISLATIVO. MEDIDA 
PROVISÓRIA. ESTABELECIMENTO DA ORGANIZAÇÃO BÁSICA DOS 
ÓRGÃOS DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA E DOS MINISTÉRIOS. 
ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 62, CAPUT e §§ 3º e 10, CRFB. 
REQUISITOS PROCEDIMENTAIS. REJEIÇÃO E REVOGAÇÃO DE 
MEDIDA PROVISÓRIA COMO CATEGORIAS DE FATO JURÍDICO 
EQUIVALENTES E ABRANGIDAS NA VEDAÇÃO DE REEDIÇÃO NA 
MESMA SESSÃO LEGISLATIVA. INTERPRETAÇÃO DO §10 DO ART. 62 
DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CONVERSÃO DA MEDIDA PROVISÓRIA 
EM LEI. AUSÊNCIA DE PREJUDICIALIDADE SUPERVENIENTE. 
ADITAMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. PRECEDENTES JUDICIAIS DO STF. 
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE. 
(…) 
4. O argumento de desvio de finalidade para justificar o vício de 
inconstitucionalidade de medida provisória, em razão da provável direção de 
cargo específico para pessoa determinada não tem pertinência e validade 
jurídica, porquanto, na espécie, se trata de ato normativo geral e abstrato, 
que estabeleceu uma reestruturação genérica da Administração Pública. 
Esse motivo, inclusive, autorizou o acesso à jurisdição constitucional abstrata. 
5. Impossibilidade de reedição, na mesma sessão legislativa, de medida 
provisória revogada, nos termos do prescreve o art. 62, §§2º e 3º. 
Interpretação jurídica em sentido contrário, importaria violação do princípio da 
Separação de Poderes. Isso porque o Presidente da República teria o 
controle e comando da pauta do Congresso Nacional, por conseguinte, das 
prioridades do processo legislativo, em detrimento do próprio Poder 
Legislativo. 
(…) 
(ADI n.º 5.709 – DF. Tribunal Pleno. Min. Relatora: Rosa Weber. Julgamento 
em: 27/03/2019. Publicação em: 28/06/2019) 
 
Tem-se, assim, que a Federação constituída para o Brasil é descentralizadora. 
A União Federal exerce maior poder e cumpre maiores competências, como a 
emissão de moeda (Art. 21, VII) e a realização de serviços de polícia marítima, 
aeroportuária e de fronteiras (Art. 21, XXII), afinal ela representa a República 
Federativa do Brasil no âmbito internacional. 
Entretanto, a União pode estipular regras genéricas e amplas (Art. 24, §1º), ou 
ainda, exercer competência comum com os Estados, DF, Territórios e Municípios, 
sendo que estes a exercem nas suas peculiaridades (Art. 23). 
Como exemplo, há a competência comum elencada nos Incisos do Art. 23, 
como a de proteção ao meio ambiente e combate à poluição (Art. 23, VI). 
Já, de maneira concorrente, a União e os Estados poderão legislar sobre direito 
financeiro e penitenciário (Art. 24, I), sendo o caso de a União estabelecer apenas 
regras gerais para os demais entes (Art. 24, §1º). 
Historicamente, a instituição do presidencialismo fora definida por intermédio 
de um plebiscito, conforme prescrição do Art. 2º do Atos das Disposições 
Constitucionais Transitórias – ADCT. 
 
22 
Na letra do dispositivo, constava que: 
 
no dia 7 de setembro de 1993 o eleitorado definirá, através de plebiscito, a 
forma (república ou monarquia constitucional) e o sistema de governo 
(parlamentarismo ou presidencialismo) que devem vigorar no País (BRASIL, 
1992). 
 
Foi, no entanto, antecipado para o dia 21 de abril de 1993, por força da Emenda 
Constitucional n.º 02 de 1992, e foram escolhidos como forma de governo a república 
e como sistema de governo o presidencialismo. 
A questão que pode ser suscitada com relação a isso é se um plebiscito de 
estatura constitucional estaria consubstanciado como cláusula pétrea. Afinal, as 
normas do ADCT são em sua maioria referentesa questões transitórias e adaptativas 
de uma ordem constitucional a outra. Esse debate foi trazido à tona em virtude do 
Mandado de Segurança n.º 22.972, do Distrito Federal. 
O remédio constitucional foi impetrado no ano de 1997 contra a tramitação da 
PEC n.º 20-A, de 1995, que tratava da implementação do parlamentarismo no Brasil. 
Ocorre que, pelo transcurso do tempo, os autores do mandamus não estão mais 
exercendo cargo como parlamentares; em razão disso, foi homologada a desistência 
da ação16. 
Assim, veio à tona a possibilidade de rediscutir a satisfação do povo com 
sistema e forma de governo, principalmente depois de muitos escândalos de 
corrupção e ingerência entre cargos do alto escalão dos Três Poderes. No entanto, é 
um debate que não se encontra pacificado, havendo posicionamentos voltados para 
a natureza de cláusula pétrea e outros advogando pela possibilidade de haver uma 
mudança. 
Conforme estipulado no Art. 60, §4º, Incisos I ao IV, da Carta Maior, não podem 
ser objeto de emendas constitucionais com o intuito de abolir a forma federativa de 
Estado: o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; e os 
direitos e garantais individuais. A doutrina e a jurisprudência entendem que o intuito 
de abolir também compreende a ideia de limitar as referidas matérias. No entanto, não 
há impeditivo para que haja mudança para instituto semelhante ou alternativa, desde 
que não implique limitação ou eliminação. Seria o caso da possibilidade de haver uma 
EC tornando o voto em facultativo. 
Nos dizeres do Min. Sepúlveda Pertence: 
 
(…) de resto as limitações materiais ao poder constituinte de reforma, que o 
art. 60, § 4º, da Lei Fundamental enumera, não significam a intangibilidade 
literal da respectiva disciplina na Constituição originária, mas apenas a 
proteção do núcleo essencial dos princípios e institutos cuja preservação 
nelas se protege17. 
 
16 STF extingue processo que discutia parlamentarismo. Disponível em: 
https://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI281505,21048-
STF+extingue+processo+que+discutia+parlamentarismo. Acesso em: 30 ago. 2019. 
17 ADI nº 2.024 – DF. Tribunal Pleno. Ministro Relator: Sepúlveda Pertence. Julgamento em 03 maio 
2007. Publicado em: 22 jun. 2007. 
 
23 
 
Todavia, no rol mencionado não estão expressos como cláusula pétrea o 
sistema e a forma de governo. Daí, então, há o posicionamento pela possibilidade de 
mudar o sistema e a forma de governo. Pode-se, no entanto, questionar se o 
parlamentarismo afetaria a separação dos Poderes (Art. 60, §4º, III). 
 
CARACTERÍSTICAS DO GOVERNO NO BRASIL 
REGIME SISTEMA FORMA 
Democracia Presidencialismo República 
Fonte: Gomes, 2019. 
 
2.2 Tipos de constituição 
 
Após vermos as principais características dos sistemas e formas de 
organização de um governo, conhecer a classificação das constituições permite-nos 
ver como Constituição e Estado se amoldam de maneira harmoniosa. Tendo como 
critério a origem, as principais classificações voltam-se para o modelo de outorga, 
democrática, cesarista e dualista. 
Constituição outorgada, também denominada de autocrática, consiste na carta 
resultante da outorga do agente em poder, que unilateralmente a impõe ao povo. Na 
história do Brasil, as Constituições de 1824, de 1937 e de 1967 (e a EC n.º 01 de 
1969) nasceram da vontade do grupo dominante. Daí podemos considerar que sejam 
modelos pouco simpáticos para uma república democrática. 
No sentido oposto, a constituição democrática nasce da vontade popular – 
democraticamente. No exemplo recente, a Constituição Federal de 05 de outubro de 
1988 da República Federativa do Brasil nasceu desse modelo, no qual o povo estava 
representado na Assembleia Nacional Constituinte. 
Além do atual Texto Republicano, o Brasil já teve como constituição 
democrática a de 1891, a de 1934 e a de 1946. Quanto às formas cesaristas e 
dualistas, não existiram no curso da história do Brasil. 
A cesarista, também chamada de bonapartista, nasce de duas forças, 
exercendo atos contíguos: primeiramente, ela nasce do ato unilateral do poder 
dominante, e posteriormente é referendada pelo povo. Um exemplo deste modelo é a 
Carta Constitucional elaborada pelo General Augusto Pinochet, em 1981, no Chile. 
Por fim, a dualista, ou pactuada, nasce da colisão de duas classes ou poderes 
antagônicos. Historicamente, nasceu em virtude da decadência de uma monarquia e 
a ascensão de burgueses. 
Acerca da elaboração, costuma haver duas classificações: dogmáticas e 
históricas. 
As dogmáticas são sistematizadas, elas nascem a partir de valores e princípios 
vigentes em uma determinada época. Inauguram uma nova ordem a partir dos valores 
 
24 
de sua época (o repúdio ao racismo e o pluralismo político, por exemplo). A Carta 
Magna de 1988 é dogmática, o que pode ser constatado de maneira clara quando 
lemos o preâmbulo. 
As históricas nascem em virtude das tradições em curso, consolidando-se em 
torno de leis costumeiras. Não é comum em nosso legado do direito romano. Temos 
como principal exemplo, e talvez o maior, a Constituição inglesa. 
Com relação ao rigor empregado para a mutabilidade do texto constitucional – 
a sua estabilidade –, podem ser denominadas como imutável e rígida. Há variações 
conforme a doutrina, como o caso da super-rígida ou da semirrígida. Nesse aspecto, 
a atual Carta Magna do Brasil pode ser considerada rígida ou super-rígida, conforme 
a lavra doutrinária. 
A rigidez é conferida pelo grau de obstáculos ou rigor para realizar uma 
mudança no texto constitucional. Há, assim, um rito próprio, distinto do rito legislativo 
para as demais normas, além das limitações pétreas (Art. 60, §4º). Se a Constituição 
Brasileira, em seu todo, for rígida, pode-se afirmar que as cláusulas pétreas façam 
parte do texto constitucional super-rígido. 
As demais classificações elencadas pela Doutrina permitem estabelecer uma 
maior inter-relação entre as denominações18. A título de exemplo, a constituição-
garantia (classificada de acordo com a finalidade) assemelha-se à sintética 
(taxinomia empregada pela extensão) por serem consideradas constituições 
negativas, uma vez que buscam limitar a atuação do Estado frente à emancipação do 
indivíduo-cidadão. No sentido contrário, a constituição-dirigente se amolda com 
muita facilidade à denominação analítica, por haver uma extensa e detalhada 
disposição acerca das finalidades que o Estado deve alcançar. Temos como um claro 
modelo a Constituição de 1988. 
Considerando o conteúdo textual, as constituições podem ser nominadas como 
material ou formal. Essa classificação é importante considerando o histórico da teoria 
política, remetendo aos estudos de Carl Schmitt. 
A constituição material seria não apenas o texto constitucional em si, mas 
também os dispositivos específicos, referentes à estrutura do Estado e à vida política 
do país. Permite, então, haver normas de matriz constitucional fora do texto 
constitucional. Nesse diapasão, o Código Eleitoral e a Lei dos Partidos Políticos 
seriam normas materialmente constitucionais, por disciplinarem a participação da 
pluralidade social e o exercício da soberania popular pelo voto. 
Já quanto ao sentido formal de constituição, basta considerar como de estatura 
constitucional qualquer conteúdo do texto constitucional. Por essa perspectiva, o Art. 
242, §2º, que mantém o Colégio Pedro II na esfera federal, está em nível de igualdade 
com qualquer outra norma politicamente relevante do texto constitucional. 
Frente a isso, a Carta Republicana de 1988 se aproxima do conceito formal, 
não havendo distinção do teor dos dispositivos constitucionais nem se considerando 
normas infraconstitucionais como constitucionais em razão da matéria. Exceção a 
esta hipótese consiste na previsão de os Tratados Internacionais de Direitos Humanos 
aprovados por quórum de Emenda Constitucional terem a natureza jurídica destas 
últimas (Art. 5º, §3º),mesmo sendo elas leis. 
 
18 AGRA, Walber de Moura. Curso de Direito Constitucional. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 96 
 
25 
Quanto aos tratados internacionais sobre direitos humanos incorporados ao 
ordenamento jurídico brasileiro pelo rito legislativo ordinário, adquirirão o status de 
supralegal. 
Portanto, a título de exemplo, são equivalentes a emendas constitucionais a 
Convenção sobre Direito das Pessoas com Deficiência (Decreto n.º 6.949, de 25 de 
agosto de 2009) e o Tratado de Marraqueche para Facilitar o Acesso a Obras 
Publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com Outras Dificuldades 
para Ter Acesso ao Texto Impresso (Decreto n.º 9.522, de 8 de outubro de 2018). 
Tendo em vista essa diversidade de nomenclaturas ao texto constitucional, 
pode-se observar que não há uma superação de uma definição por outra mais nova, 
mas eventualmente tal fato pode ocorrer. O que ocorre com mais frequência é a 
complementação entre as definições trazidas e como se amoldam a um e outro 
sistema ou regime governamentais, até pela natureza histórica e circunstancial da sua 
realização. 
 
 
 
 
 
26 
REFERÊNCIAS 
 
AGRA, Walber de Moura. Curso de Direito Constitucional. Belo Horizonte: Fórum, 
2018. 
BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e democracia. 
Disponível em: 
http://www.direitofranca.br/direitonovo/FKCEimagens/file/ArtigoBarroso_para_Seleca
o.pdf. Acesso em: 12 ago. 2019. 
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de teoria do Estado e ciência política. São Paulo: 
Saraiva, 1989. 
FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. Salvador: 
Juspodivm, 2017. 
NUNES JÚNIOR, Flávio Martins. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Revista 
dos Tribunais, 2017. 
PIMENTA, Paulo Roberto Lyra. As normas constitucionais programáticas e a 
reserva do possível. Disponível em: 
https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/496554/000940642.pdf?sequen
ce=1. Acesso em: 20 ago. 2019.

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