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PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO EM RELAÇÕES PÚBLICAS Fernanda Lery Pereira Constante Cidadania e responsabilidade social Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Descrever cidadania empresarial. Relacionar cidadania empresarial com responsabilidade social. Identificar como ações de relações públicas podem colaborar para a imagem da organização. Introdução Neste capítulo, você será apresentado a dois conceitos altamente discu- tidos nos dias de hoje: cidadania empresarial e responsabilidade social. Você vai entender como surgiram e evoluíram, bem como a visão e as diferentes linhas de pensamento de diversos autores e estudiosos em relação a eles. Será abordada, também, a diferença entre cidadania, responsabilidade social e filantropia. Esse assunto renderia muitas páginas, já que abre um vasto leque de outros assuntos diretamente ligados a ele. No entanto, procuramos apre- sentar a você, de forma resumida, o que há de mais representativo quando falamos em cidadania e responsabilidade social. Se ainda não conhece, você será apresentado ao Instituto Ethos e à ISO 26000, dois tópicos im- portantíssimos ao tratarmos desses conceitos. Esse é um tópico presente no dia a dia das organizações. Sem dúvida, quem não estiver realmente envolvido e engajado terá poucas chances de sobreviver no mercado. Contextualizando e descrevendo cidadania empresarial Atualmente, muito se fala em diferentes conceitos como responsabilidade so- cial, balanço social, cidadania empresarial ou corporativa, ou ainda, programas de voluntariado. Os limites e as ações de responsabilidade empresarial são altamente discutidos, cobrados, questionados e, inclusive, determinam uma nova forma de gestão das organizações. A sociedade exige das organizações, cada vez mais, uma posição para que estas divulguem, além dos seus resultados fi nanceiros, informações que mostrem e comprovem sua transparência em relação a seus impactos ambientais e sociais. Kunsch (2016) lembra que a exploração desse tema não é um assunto novo. Desde o início do século XX, alguns estudiosos já chamavam a atenção para a necessidade de uma maior responsabilidade social por parte das organizações. No entanto, a autora enfatiza que: “As iniciativas que existiam, nessa direção, no mercado profissional e empresarial, eram isoladas e, na maioria, revestidas de um cunho assistencialista. Não havia preocupação com um trabalho mais cooperativo e engajado” (KUNSCH, 2016, p. 129). Mais de um século depois, mesmo vivendo em uma nova realidade e com uma nova mentalidade, muitas ações empresariais ainda têm um cunho muito mais filantrópico do que um real engajamento social. Muitas campanhas ou ações sociais são realizadas para atender a demandas específicas, e não por um envolvimento aprofundado com uma determinada causa. Kunsch (2016) ilustra essa diferença no Quadro 1. Fonte: Adaptado de Kunsch (2016). Filantropia Compromisso social Motivação humanitária Sentimento de responsabilidade Participação reativa Participação proativa Doador Ações integradas A ação é por opção pessoal do dirigente Incorporada na cultura da empresa, a ação envolve todos os colaboradores Resultados: gratificação pessoal Resultados: preestabelecidos Sem preocupação em associar imagem da empresa e ação social Transparência na atuação e busca por multiplicar iniciativas Sem preocupação em se relacionar com o Estado Complementa-se a ação do Estado numa relação de parceria e controle Quadro 1. Diferença entre filantropia e compromisso social Cidadania e responsabilidade social2 Torquato (2015) afirma que a importância dada a esse assunto nos dias de hoje é resultado de fortes resistências de segmentos de gestão empresarial. Os setores de qualidade das organizações se destacaram e passaram a desenvolver ações para que as empresas se dedicassem não só às leis fiscais, mas também às leis sociais. Toda e qualquer empresa, independentemente do seu porte, está inserida em nossa sociedade e prestando serviços a ela. Nesse sentido, o papel de uma empresa não está limitado apenas à produção de bens de consumo ou à prestação de serviços. Além disso, não está limitado apenas gerar riqueza para os acionistas. As organizações que ainda mantêm o foco somente em gerar lucro próprio estão certamente fadadas ao fracasso. A riqueza que deve ser gerada tem um sentido bem mais amplo. Ao oferecer produtos e serviços de qualidade, ao se preocupar com o bem-estar da comunidade, uma empresa agrega valor à sua imagem perante o público e amplia sua capacidade de ser útil e surpreender positivamente todos os seus stakeholders. Alves (2001) traduz esse outro tipo de riqueza em termos de conhecimento, tecnologia, empregos, infraestrutura energética e de comunicações. O autor explica ainda: As economias externas criadas pelas grandes empresas, ademais, contri- buem para o desenvolvimento sustentável, às vezes, independentemente dos objetivos imediatos da empresa e de seus métodos de gestão. Ao colaborar com o desenvolvimento, a empresa pode até contribuir para a estabilidade de um país ou de uma região, com implicações políticas e estratégicas. O papel da empresa como principal geradora de riqueza suscita, portanto, a questão de saber se a empresa tem uma função social e se, nesse caso, é possível ou desejável estabelecer que tenha determinadas obrigações com a sociedade, além da geração de riqueza material (ALVES, 2001, documento on-line). O que efetivamente significa a expressão cidadania empresarial? Alves (2001) esclarece que a cidadania empresarial, “[…] entendida como um conjunto de princípios e sistemas de gestão destinados à criação ou pre- servação de valor para a sociedade, pode ser englobada no conceito mais amplo de governança — o qual inclui o conceito de governança corporativa, mas não se restringe a ele” (ALVES, 2001, documento on-line). 3Cidadania e responsabilidade social De acordo com Alves (2001), a governança tem como objetivo melhorar o compor- tamento de pessoas e instituições. Assim, no caso da governança corporativa, esse objetivo se materializa nos métodos usados para gerir a empresa. Já na governança ambiental, o foco está nas maneiras de preservar o meio ambiente. Além disso, o autor destaca também a governança pública, que se dedica a combater subornos e corrupção no serviço público. Chanlat (1999) afirma que uma empresa cidadã é aquela que se preocupa com seus atos e todas as consequências que eles vão ter na sociedade. Uma empresa cidadã leva em consideração todos os que têm direitos, não apenas os acionistas da organização. Ela ainda deve se recusar a ganhar caso isso faça com que a sociedade perca em algum sentido. De acordo com Carroll (1991 apud COUTINHO; MACEDO-SOARES, 2002, documento on-line), “[…] para ser considerada uma empresa-cidadã, uma organização deveria, então, ser lucrativa, obedecer às leis, ter comportamento ético, seguindo padrões moralmente aceitos nas sociedades em que atua e praticar a filantropia, engajando-se ativamente em atos ou programas que promovam o bem-estar humano”. Coutinho e Macedo-Soares (2002) apontam os princípios da cidadania empresarial, listados a seguir. Gerir o negócio com ética. Conciliar as necessidades de todos os stakeholders. Proteger o meio ambiente. A cidadania empresarial pode ainda ser entendida como um modo de gestão que se ocupa com os interesses de diversos públicos, como “[…] funcionários, clientes, fornecedores, acionistas, comunidade na qual a organização está inserida, entre outros” (PINTO; SILVA, 2009, documento on-line). Ashley (2005, p. 20), no livro Ética e Responsabilidade Social nos Negócios, para construir uma empresa cidadã, é preciso: Cidadania e responsabilidade social4 • criar espaço para que os colaboradores se realizem no ambiente de trabalho por meio de uma gestão participativa, na qual a inovação, a criatividade, o talento de cada umpossam emergir, contribuindo efetivamente para resultados; • gerar uma nova cultura, fazendo da empresa uma comunidade de apren- dizagem em que todos ensinam e todos aprendem, como um caminho para enfrentar, por meio da renovação contínua, as mudanças constantes; • estabelecer, com os fornecedores e clientes, relações de parceria duradou- ras, tendo a ética, a transparência, a confiança e a colaboração mútua como requisitos vitais para o êxito; • fazer-se solidária e assumir o papel de cidadã, contribuindo com o bem comum. Analisando todos os conceitos aqui apresentados, bem como os princípios da cidadania empresarial, observamos que o conceito de ética está sempre presente, tanto implícita quanto explicitamente. Um comportamento ético seria aquele que busca o equilíbrio entre o interesse organizacional e o interesse dos stakeholders. Coutinho e Macedo-Soares (2002, documento on-line) explicam: A ética empresarial engloba princípios e padrões morais que orientam o com- portamento no mundo dos negócios. É a partir do crivo dos diferentes grupos de stakeholders que determinado comportamento será classificado como certo ou errado e ético ou antiético. Estes grupos irão influenciar a aceitação ou a rejeição das condutas de uma empresa pela sociedade em que atua. A cidadania empresarial tem como consequência de atitudes socialmente responsáveis um cuidado com nosso planeta, com o bem-estar da sociedade e com o futuro de todos nós. Uma empresa cidadã não toma atitudes isoladas; ela tem uma preocupação em seu DNA e está realmente engajada e envolvida com causas maiores. Um dos principais fomentadores da responsabilidade social e da cidadania empresarial no Brasil é o Instituto Ethos. Criado em 1998, tem a missão de promover e disseminar práticas empresariais socialmente responsáveis e contribuir para que as empresas e a sociedade alcancem um desenvolvimento sustentável tanto no aspecto econômico quanto no social e no ambiental. O Instituto Ethos (2016, documento on-line) visa auxiliar as empresas a: 5Cidadania e responsabilidade social 1. compreender e incorporar de forma progressiva o conceito do comporta- mento empresarial socialmente responsável; 2. implementar políticas e práticas que atendam a elevados critérios éticos, contribuindo para o alcance do sucesso econômico sustentável em longo prazo; 3. assumir suas responsabilidades com todos aqueles que são atingidos por suas atividades; 4. demonstrar a seus acionistas a relevância de um comportamento social- mente responsável para o retorno em longo prazo sobre seus investimentos; 5. identificar formas inovadoras e eficazes de atuar em parceria com as co- munidades na construção do bem-estar comum; 6. prosperar, contribuindo para um desenvolvimento social, econômica e ambientalmente sustentável. Acesse o link a seguir e descubra muito mais sobre o Instituto Ethos. https://qrgo.page.link/V4bF Mesmo com todas as divergências conceituais entre cidadania empresarial e responsabilidade social, o ponto comum entre as definições é o quanto as empresas se preocupam em fazer mais do que simplesmente produzir bens de consumo ou prestar um serviço. As empresas cidadãs, ou responsáveis socialmente (como você preferir chamar), devem realmente se preocupar com o meio e a sociedade em que estão inseridas, prestando serviços além do seu escopo inicial, comprometendo-se com determinados valores e com as reais necessidades humanas. Tais ações acabam por agregar valor às organizações, gerando e consolidando maior confiança e fortalecendo a sua imagem entre todos os stakeholders e, principalmente, entre o consumidor. No entanto, uma empresa não se torna cidadã e socialmente responsável da noite para o dia. Essa transformação implica mudanças profundas em várias dimensões das organizações. E estas, por sua vez, devem estar preparadas e estruturadas para isso. Responsabilidade social e a ISO 26000 Não podemos tratar de cidadania empresarial e responsabilidade social sem falar sobre a norma ISO 26000. Você já ouviu falar sobre ela? Sabe o que Cidadania e responsabilidade social6 signifi ca? O termo ISO está relacionado à Organização Internacional de Nor- malização, que objetiva criar normas que promovam e garantam boas práticas de gestão nas empresas. No dia 1º de novembro de 2010, foi publicada a norma internacional ISO 26000 – Diretrizes sobre Responsabilidade Social, cujo lançamento foi em Genebra, na Suíça. No Brasil, a versão em português foi lançada alguns meses depois. O site do INMETRO (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia) apresenta a informação a seguir. Segundo a ISO 26000, a responsabilidade social se expressa pelo desejo e pelo propósito das organizações em incorporarem considerações socioambientais em seus processos decisórios e a responsabilizar-se pelos impactos de suas decisões e atividades na sociedade e no meio ambiente. Isso implica um comportamento ético e transparente que contribua para o desenvolvimento sustentável, que esteja em conformidade com as leis aplicáveis e seja con- sistente com as normas internacionais de comportamento. Também implica que a responsabilidade social esteja integrada em toda a organização, seja praticada em suas relações e leve em conta os interesses das partes interessadas (INMETRO, [2010a], documento on-line). Tal norma é apenas de uso voluntário e um importante instrumento para promover a responsabilidade social empresarial (RSE) nas organizações. Ela não visa fins de certificação. O seu objetivo é apenas o de fornecer orientações para todos os tipos de organização (independentemente de seu porte ou localização), a respeito de (INMETRO, [2010a], documento on-line): • conceitos, termos e definições referentes à responsabilidade social; • histórico, tendências e características da responsabilidade social; • princípios e práticas relativas à responsabilidade social; • os temas centrais e as questões referentes à responsabilidade social; • integração, implementação e promoção de comportamento socialmente responsável em toda a organização e por meio de suas políticas e práticas dentro de sua esfera de influência; • identificação e engajamento de partes interessadas; • comunicação de compromissos, desempenho e outras informações refe- rentes a responsabilidade social. Ainda segundo o site do INMETRO e o texto oficial da norma, a respon- sabilidade social empresarial tem 7 princípios básicos. Observe o Quadro 2. 7Cidadania e responsabilidade social Fonte: Adaptado de INMETRO ([2010b]). Accountability Ato de responsabilizar-se pelas consequências de suas ações e decisões, respondendo pelos seus impactos na sociedade, na economia e no meio ambiente, pres- tando contas aos órgãos de governança e demais par- tes interessadas declarando os seus erros e as medidas cabíveis para remediá-los. Transparência Fornecer às partes interessadas de forma acessível, clara, compreensível e em prazos adequados todas as informações sobre os fatos que possam afetá-las. Comportamento ético Agir de modo aceito como correto pela sociedade — com base nos valores da honestidade, equidade e integridade, perante as pessoas e a natureza — e de forma consistente com as normas internacionais de comportamento. Respeito pelos interesses das partes interessadas (stakeholders) Ouvir, considerar e responder aos interesses das pes- soas ou grupos que tenham interesses nas atividades da organização ou por ela possam ser afetados Respeito pelo Estado de Direito O ponto de partida mínimo da responsabilidade social é cumprir integralmente as leis do local onde ela está operando. Respeito pelas Normas Internacionais de Comportamento Adotar prescrições de tratados e acordos internacionais favoráveis à responsabilidade social, mesmo que não haja obrigação legal. Direito aos humanos Reconhecer a importância e a universalidade dos direitos humanos, cuidando para que as atividades da organização não os agridam direta ou indiretamente,zelando pelo ambiente econômico, social e natural que requerem. Quadro 2. Os 7 Princípios da Responsabilidade Social segundo a ISO 26000 A norma também aponta 7 temas centrais, que devem ser considerados pelas organizações (INMETRO, [2010b], documento on-line): Cidadania e responsabilidade social8 Governança organizacional: Trata de processos e estruturas de tomada de decisão, delegação de poder e controle. O tema é, ao mesmo tempo, algo sobre o qual a organização deve agir e uma forma de incorporar os princípios e práticas da responsabilidade social à sua forma de atuação cotidiana. Direitos humanos: Inclui due diligence, situações de risco para os DH; como evitar cumplicidade; resolução de queixas; discriminação e grupos vulneráveis; direito civis e políticos, direitos econômicos, sociais e culturais; princípios e direitos fundamentais do trabalho. Práticas trabalhistas: Refere-se tanto a emprego direto quanto ao terceirizado e ao trabalho autônomo. Inclui emprego e relações do trabalho; condições de trabalho e proteção social; diálogo social; saúde e segurança no trabalho; desenvolvimento humano e treinamento no local de trabalho. Meio ambiente: Inclui prevenção da poluição; uso sustentável de recursos; mitigação e adaptação às mudanças climáticas; proteção do meio ambiente e da biodiversidade e restauração de habitats naturais. Práticas leais de operação: Compreende práticas anticorrupção; envolvimento político responsável; concorrência leal; promoção da responsabilidade social na cadeia de valor e respeito aos direitos de propriedade. Questões dos consumidores: Inclui marketing leal, informações factuais e não tendenciosas e práticas contratuais justas; Proteção à saúde e a segurança do consumidor; consumo sustentável; atendimento e suporte ao consumidor e solução de reclamações e controvérsias; proteção e privacidade dos dados do consumidor; acesso a serviços essenciais e educação e conscientização. Envolvimento e desenvolvimento da comunidade: Refere-se ao envolvi- mento da comunidade; educação e cultura; geração de emprego e capacitação; desenvolvimento tecnológico e acesso a tecnologias; geração de riqueza e renda; saúde e investimento social. Due Diligence é o nome que se dá, no campo das aquisições corporativas, à investigação de uma empresa quando existe a possibilidade de que um negócio seja fechado. Analisa-se as informações sobre essa empresa para que seja possível fixar o preço final de forma objetiva, analisar como estruturar o negócio e as garantias envolvidas. Assim, verifica-se os riscos da transação e, se for o caso, o negócio não é fechado (MENA, 2017). Logicamente, as organizações não precisam atender a todos esses temas. Cada empresa tem a liberdade de eleger a relevância de cada um dos temas propostos para o seu negócio e, assim, estabelecer suas próprias ações. 9Cidadania e responsabilidade social Cidadania empresarial e responsabilidade social é um assunto muito abrangente e reconhecido como vital pelas organizações. A sociedade tomou consciência dessa importância e cobra das empresas um retorno e um auxílio para a sociedade e para o meio ambiente. Não importa se estamos falando de pequena, média ou grande empresa. O principal é que todo e qualquer tipo de organização reconheça a importância dessa nova forma de gestão e a incorpore no seu dia a dia, trazendo sustentabilidade não só para seus negócios, mas também para a sociedade. ALMEIDA, F. O bom negócio da sustentabilidade. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2002. E-book. Disponível em: http://www.fernandoalmeida.com.br/livros/livro-fernando- -almeida-sustentabilidade.pdf. Acesso em: 19 ago. 2019. ALVES, L. E. S. Governança e cidadania empresarial. 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