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Sabrina Blasius Faust Deise Warmling Sheila Rubia Lindner Elza Berger Salema Coelho Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem UFSC 2018 Sabrina Blasius Faust Deise Warmling Sheila Rubia Lindner Elza Berger Salema Coelho Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Florianópolis UFSC 2018 Catalogação elaborada na Fonte. Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária responsável: Rosiane Maria CRB 14/1544 A174 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem [recurso eletrô nico] / Sabrina Blasius Faust... [et al.]. -- Florianópolis : Universidade Federal de Santa Catarina, 2018. 66 p. Modo de acesso: www.unasus.ufsc.br Conteúdo do módulo: Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde. – O acolhimento dos homens na atenção básica. – A integralidade na atenção à saúde do homem ISBN: 978-85-8267-138-2 1. Atenção básica em saúde. 2. Saúde do homem. 3. Acolhimento. I. UFSC. II. Curso de Saúde do Homem. III. Faust, Sabrina Blasius. IV. Warmling, Deise. V. Lindner, Sheila Rubia. VI. Coelho, Elza Berger Salema. VII. Título. CDU: 364-7 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 5 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Créditos GOVERNO FEDERAL Presidente da República Ministro da Saúde Secretário de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES) Diretora do Departamento de Gestão da Educação na Saúde (DEGES) Coordenador Geral de Ações Estratégicas em Educação na Saúde Responsável Técnico pelo Projeto UNA-SUS UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA Reitor Ubaldo Cesar Balthazar Vice-Reitora Alacoque Lorenzini Erdmann Pró-Reitor de Pós-graduação Hugo Moreira Soares Pró-Reitor de Pesquisa Sebastião Roberto Soares Pró-Reitor de Extensão Rogério Cid Bastos 6 6 6 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE Diretor Celso Spada Vice-Diretor Fabrício de Souza Neves DEPARTAMENTO DE SAÚDE PÚBLICA Chefe do Departamento Fabrício Augusto Menegon Subchefe do Departamento Maria Cristina Marino Calvo EQUIPE TÉCNICA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE Coordenador Francisco Norberto Moreira da Silva Coordenadora - substituta Renata Gomes Soares ASSESSORES TÉCNICOS Juliano Mattos Rodrigues Michelle Leite da Silva Kátia Maria Barreto Souto Caroline Ludmilla Bezerra Guerra Cícero Ayrton Brito Sampaio Patrícia Santana Santos Thiago Monteiro Pithon Créditos GRUPO GESTOR Coordenadora do Projeto Sheila Rubia Lindner Coordenadora do Curso Elza Berger Salema Coelho Coordenadora de Ensino Deise Warmling Coordenadora Executiva Gisélida Garcia da Silva Vieira Coordenadora de Tutoria Carolina Carvalho Bolsoni AUTORIA DO CURSO Sabrina Blasius Faust Deise Warmling Sheila Rubia Lindner Elza Berger Salema Coelho REVISÃO DE CONTEÚDO Revisor Interno: Antonio Fernando Boing Revisores Externos: Helen Barbosa dos Santos Igor Claber 7 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Créditos ASSESSORIA PEDAGÓGICA Márcia Regina Luz ASSESSORIA DE MÍDIAS Marcelo Capillé DESIGN INSTRUCIONAL Soraya Falqueiro IDENTIDADE VISUAL E PROJETO GRÁFICO Pedro Paulo Delpino ESQUEMÁTICOS Tarik Assis Pinto DIAGRAMAÇÃO Laura Martins Rodrigues AJUSTES E FINALIZAÇÃO Adriano Schmidt Reibnitz REVISÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA E ABNT Eduard Marquardt PRODUÇÃO DE MATERIAL ONLINE Dalvan Antônio de Campos Naiane Cristina Salvi Cristiana Pinho Tavares de Abreu Thiago Ângelo Gelaim Rodrigo Rodrigues Pires de Mello PRODUÇÃO TÉCNICA DE MATERIAL: Ana Lúcia Nogueira Cobra 8 8 8 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 9 9 9 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Este curso traz conteúdos importantes para você compreender a relação dos homens com o serviço de saúde, destacando a importância de promover estratégias para um atendi- mento integral, bem como a relevância das ações preventivas e de promoção de saúde, transcendendo o atendimento agudo e pontual. Para tanto, apresentamos alguns desafios a serem superados e estratégias para o acesso e acolhimento, no sentido de auxiliar você, profissional da saúde, a qualificar suas práticas, com vistas à atenção integral à saúde do homem no âmbito da atenção básica. Compreendendo a saúde enquanto um direito do cidadão, devemos atuar junto aos serviços da área a fim de garantir o atendimento de qualidade, dentro dos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS). Para isso, é preciso repensar as práticas de saúde com base na lógica da humanização, considerar a dinamicidade dos processos de cuidado e a partici- pação ativa dos sujeitos, além de promover diálogos entre usuários e profissionais a fim de construir projetos coletivos. Para o acolhimento do homem nos serviços de saúde, é necessário considerar as barreiras sócio-culturais e institucionais, como também as possibilidades de organização dos serviços de saúde e, dentro desse contexto, alcançar um atendimento qualificado na atenção básica. Nesta etapa, vamos discutir, inclusive, a relevância do acesso e a reorganização dos serviços para aproximar o homem do serviço de saúde. Para que isso ocorra, os profissionais têm pa- pel fundamental, proporcionando uma escuta qualificada, atendendo de maneira resolutiva e realizando os encaminhamentos necessários, de forma articulada com a rede. Apresentação do curso 10 10 10 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Apresentação do curso Existem desafios a serem enfrentados para o acesso dos homens aos serviços de saúde, e discutiremos três dimensões principais: relativos ao homem-usuário, aos profissionais da equipe e à estrutura e organização dos serviços. Apesar dos desafios, também encontramos potencialidades nas práticas de saúde, e a partir destas pode haver a transformação das práticas cotidianas. Esperamos que você se aproxime deste debate, reflita e busque possibilidades para transfor- mar as práticas de saúde em seu território, junto à sua equipe, no âmbito da atenção básica. 11 11 11 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Este curso busca refletir sobre as estraté- gias de ações de acesso e do acolhimento das populações masculinas, sob a ótica da humanização e da integralidade. Objetivos de aprendizagem para este curso Ao final deste curso, você será capaz de identificar estratégias de acesso e acolhi- mento para a população masculina, pro- veniente da demanda espontânea ou pro- gramada, nas diferentes especificidades de gênero, com vistas à consolidação da PNAISH. Carga horária de estudo 30 horas Objetivos de aprendizagem e carga horária 12 12 12 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 13 13 13 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Unidade 1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde 14 1.1 A humanização do cuidado 18 1.2 O acesso e a qualidade na atenção aos usuários 21 1.3 A importância do papel da equipe de saúde na garantia do acesso e atendimento humanizado 26 1.4 Recomendação de leituras complementares 29 Unidade 2 O acolhimento dos homens na atenção básica 30 2.1 O cuidado em saúde na população masculina 32 2.2 O acolhimento na saúde do homem 36 2.3 Dispositivos do acolhimento e estratégias de aproximação do homem ao cuidado em saúde 38 2.4 Recomendação de leituras complementares 41 Unidade 3 A integralidade na atenção à saúde do homem 42 3.1 A integralidade no acesso e acolhimento 44 3.2 O agir em rede para a integralidade na assistência 50 3.3 Desafios e possibilidades para a atenção integral à saúde do homem 54 3.4 Recomendação de leituras complementares 58 Resumo do curso 59 Referências 61 Sobre os autores 65 SumárioUN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde 15 15 15 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 16 16 16 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 16 16 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde Em âmbito internacional, a discussão sobre os direitos sociais, e em especial sobre o direito à saúde, iniciou em 1948 com a De- claração Universal dos Direitos Humanos. Este documento reitera que todo homem e sua família têm direito à saúde e bem es- tar, incluindo nesta perspectiva o acesso a alimentos, vestuário, habitação, cuidados médicos, direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, ve- lhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle (ONU, 1948). No Brasil, a Constituição de 1988 foi a pri- meira a conferir a devida importância à saúde, tratando-a como direito social fun- damental, cujo texto apresenta dispositivos que tratam expressamente da saúde. O arti- go 196 da Constituição retrata este direito, e dispõe que: þþ A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políti- cas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso univer- sal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recu- peração (BRASIL, 1988). Desta forma, a saúde passou a ser um direito público, que subsidia a formulação e imple- mentação de políticas sociais e econômicas que visem garantir aos cidadãos o acesso universal e igualitário à assistência à saúde. Importante! Diante deste cenário, é fundamen- tal a compreensão de que a saúde é um direito e deve assegurar uma atenção integral, huma- nizada, de qualidade e dentro dos princípios e diretrizes preconizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Para a consolidação do direito à saúde, a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) 17 17 17 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 17 17 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde surgiu como resultado de experiências vi- venciadas por vários atores, como os usuá- rios, os gestores, os movimentos sociais, você, profissional de saúde, e outros traba- lhadores da área, a fim de consolidar e for- talecer o SUS. Alinhada à PNAB, que é a porta de entra- da ao SUS, o Ministério da Saúde publicou a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), que apresenta estratégias de humanização em saúde, em consonância com os princípios do SUS, pro- movendo ações a partir da compreensão da singularidade masculina nos diversos con- textos socioculturais e político-econômicos, com vistas à redução de morbimortalidade por causas evitáveis e o consequente au- mento da expectativa de vida. A Estratégia de Saúde da Família (ESF) tem privilégio neste desafio do SUS, podendo evitar a seg- mentação dos serviços a partir do trabalho em equipe e do planejamento de atendimen- tos e ações, fortalecendo serviços em rede e cuidados da saúde. Ocorre uma invisibilidade dos homens nos serviços de atenção básica, e para propiciar que os homens acessem a rede de atenção à saúde do SUS é necessário que se enten- da os caminhos na busca pelo cuidado em saúde pela população masculina ao invés de culpabilizar os homens pela alta incidên- cia de agravos em saúde que geram inter- nações e mortalidade precoce em compara- ção às mulheres (SANTOS, 2013). Não apenas a garantia de acesso é neces- sária, mas sim viabilizarmos estratégias para que os homens referenciem estes ser- viços em suas demandas de saúde. No Bra- sil, sabemos que antes da emergência do SUS, somente trabalhadores de carteira de trabalho assinada tinham garantidos cer- tos direitos de acesso à saúde (CARRARA, 2005). Na esfera do Programa de Saúde da Famí- lia uma das questões discutidas é a predo- minância de mulheres e crianças entre os frequentadores dos serviços de atenção básica. Os homens procuram os serviços como idosos e não como categoria sexual, tendência esta alimentada pelo imaginário social e pela organização dos serviços de atenção primária, que historicamente privi- legiaram a saúde materno-infantil. A maior resistência dos homens em buscar os ser- viços de saúde, principalmente na aten- ção básica, relaciona-se também à crença de que a prevenção e o autocuidado estão relacionadas à fragilidade, ao contrário da exposição a situações de risco e invulnera- bilidade a que está relacionada uma visão hegemônica de masculinidade (CARNEIRO, et al. 2016). Contudo as maiores vítimas de mortalidade são homens, negros de 14 a 24 anos, e a produção de cuidado ainda se dá na posição materno-infantil (SARTI, 2005). 18 18 18 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 18 18 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde Portanto, é preciso que a saúde, sob essa perspectiva de direito, seja uma prática ro- tineira em nossos serviços. Por isso, propo- mos repensar as práticas com base na lógi- ca da humanização. Nesta primeira unidade abordaremos a humanização como estratégia transfor- madora de práticas e sujeitos, e o acesso como forma de assegurar o direito à saú- de. Acompanhe! 1.1 A humanização do cuidado Na trajetória de construção e efetivação do SUS, sabemos que muitos obstáculos fo- ram vencidos e muitos direitos foram con- quistados, com destaque para a implanta- ção de políticas, o avanço na discussão de saúde integral e o atendimento humaniza- do. No contexto deste curso, vale destacar a implantação da PNAB, a Política Nacional de Humanização (PNH) e a PNAISH. Todas essas políticas foram criadas com a finalidade de efetivar os princípios do SUS no cotidiano das práticas de saúde. A PHN surgiu como uma política trans- versal ao SUS e atravessa e problematiza diferentes ações do sistema, como a dis- cussão da PNAB, da PNAISH e de outras políticas, buscando construir trocas so- lidárias e comprometidas com a produ- ção de saúde, traduzindo os princípios do SUS em modos de operar dos diferentes equipamentos e sujeitos da rede de saúde (BRASIL, 2013). Mas o que seria essa humanização da saú- de, considerando que todos somos huma- nos? Para a PNH, a humanização é enten- dida como a inclusão das diferenças nos processos de gestão e cuidado, que impac- tam em mudanças práticas. Mas estas não se constroem a partir de uma pessoa ou de um grupo isolado; devem ser efetivadas de maneira coletiva e compartilhada. E como você, profissional de saúde pode pro- mover a inclusão das diferenças? Dentre as alternativas está a realização de rodas de conversa, a atuação em rede e junto aos movimentos sociais, e a gestão dos conflitos existentes nos serviços. A participação dos trabalhadores na gestão é fundamental para que eles sejam ativos nas mudanças dos seus processos de tra- balho. A inclusão dos usuários e suas re- des sociofamiliares também é um recurso importante, uma vez que amplia a corres- ponsabilização do autocuidado (BRASIL, 2013). Humanizar significa ir além de uma boa educação ou colocar-se no lugar do outro, humanizar é respeitar os sujeitos, sua auto- nomia, garantir saúde e acesso à informa- ção, ao serviço. 19 19 19 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 19 19 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde A PNH, com base nas experiências exitosas de humanização, afirma que há um “SUS que dá certo”. E, a partir dele, formulam-se prin- cípios que operam de acordo com diretrizes norteadoras para suas ações, permitindo o surgimento de arranjos e dispositivos capa-zes de induzir redes cooperativas, a fim de superar o caráter centralizado, fragmentado e verticalizado dos processos de gestão e atenção. Os princípios da PNH (BRASIL, 2013) são o que sustenta e dispara um determinado movimento na perspectiva de política pú- blica. São eles: • Transversalidade – a PNH é uma política transversal à medida que deve estar in- serida em todas as políticas e programas do SUS. Indica a ampliação do grau de comunicação entre sujeitos e serviços, visando à transformação nas relações de trabalho e a alteração das relações de poder hierarquizadas entre profissional e usuário. • Indissociabilidade entre atenção e ges- tão – afirma que há uma relação inse- parável entre modos de cuidar (prestar serviços), gerir e se apropriar do traba- lho. É importante que os trabalhadores e usuários conheçam as formas de ges- tão e redes de atenção à saúde, sabendo como participar dos processos de toma- da de decisão. Entretanto, a responsa- bilidade pelo cuidado é compartilhada entre a equipe de saúde e o usuário, que também deve assumir uma postura pro- tagonista. • Protagonismo, corresponsabilidade e autonomia dos sujeitos e coletivos – as mudanças que consideram a autonomia e vontade das pessoas tornam-se mais concretas, pois acontecem com o reco- nhecimento da importância do papel de usuários e trabalhadores de forma con- junta. As diretrizes da PNH são as orientações clínicas, éticas e políticas, que podem ser melhor entendidas a partir de alguns con- ceitos norteadores e suas formas de exe- cução, conforme o quadro a seguir. Fonte: Fotolia Figura 1 - Humanização da assistência à saúde 20 20 20 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 20 20 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde Quadro 1 - Diretrizes da Política Nacional de Humanização (PNH): conceitos e formas de se colocar em prática. Diretriz O que é? Como você pode colocar em prática? Acolhimento É o reconhecimento do que o outro traz como legítima ne- cessidade de saúde. Sustenta-se na relação entre equipe e usuário, visando à construção de relações de confiança, compromisso e vínculo. Por meio de uma escuta qualificada, que possibilite ao usuário expor suas demandas em saúde, garantindo o acesso oportuno às tecnologias necessárias e tornando efetivas as práticas de cuidado. Gestão participativa e cogestão É a inclusão de novos sujeitos nos processos de decisão referentes à gestão. Alguns grupos de trabalho, tais como colegiados gestores, mesas de negociação, contratos in- ternos de gestão, Câmara Técnica de Humanização (CTH), Grupo de Trabalho de Humanização (GTH), Gerência de Porta Aberta (GPA) são possibilidades de efetivação da cogestão na saúde. Ambiência Consiste na viabilização de espaços saudáveis, acolhedo- res, que propiciem mudanças no processo de trabalho e encontros entre as pessoas. A ambiência pode se efetivar a partir da decisão compartilhada da organização dos espaços físi- cos, de acordo com as necessidades de ambos, usuários e trabalhadores. Por exemplo, garantir que tenha uma cadeira para o homem no consultório de forma a facilitar a inclusão deste nas consultas e colocar cartazes que inclua os homens. Clínica ampliada É uma ferramenta que permite a compreensão da singu- laridade do sujeito, da complexidade do processo saúde- doença e a superação da fragmentação do conhecimento. Uma forma de colocá-la em prática é a partir da qualificação do dialogo entre profissionais e profissional-usuário, o que desencadeia decisões compartilhadas. Valorização do trabalhador Consiste no reconhecimento da experiência dos profissio- nais e sua inclusão nos processos de tomada de decisão. Buscar espaços de diálogo, para reflexão e análise do que causa sofrimento e adoecimento, bem como do que fortalece o grupo de trabalhadores, qualificando as formas de agir no serviço de saúde. Também é relevante a participação dos tr’abalhadores nos espaços coletivos de gestão. Defesa dos direitos dos usuários O direito à saúde é garantido por lei, e os serviços de saúde têm o papel de informar os usuários sobre isso e assegurar que os direitos sejam efetivados. Assegurar o direito do cidadão de acesso à saúde; mantê-lo informado sobre seu estado de saúde e tomar decisões compartilhadas sobre as intervenções necessárias para o seu cuidado. Fonte: Política Nacional de Humanização (BRASIL, 2013). 21 21 21 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 21 21 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde A articulação entre os princípios, as diretrizes e os dispositivos da PNH sustenta o que se caracteriza como intervenções para transfor- mação dos processos de trabalho e práticas de saúde. Desse modo, constrói-se a perspec- tiva de uma rede de produção de saúde em conexão, na qual sujeitos e pontos de atenção se interligam. Esta é uma tarefa de reinven- ção, que se faz com um trabalho constante de produção de outros modos de vida, de novas práticas de saúde, de outros modos de cuidar, sendo imprescindível a atuação e inovação dos profissionais da saúde sob três grandes dimensões: atenção, gestão e controle social. Temos na PNH um método que encontra seus caminhos por meio dos seus partici- pantes, isto é, uma metodologia inclusiva e participativa dentro da capacidade e possibi- lidade daqueles que pensam, planejam e exe- cutam suas ações. Para a inclusão de sujei- tos, é necessário que o processo de trabalho se aprimore, que haja planejamento de ações, considerando que as estratégias podem fun- cionar ou não e que irão funcionar à medida que a equipe der conta de incluir e lidar com os fatores que intervêm nas ações. Desta forma, você percebe que o planejamento faz sentido quando ele é discutido e incluído no processo de trabalho da sua equipe. A produção da saúde é um processo em rede que envolve sujeitos, processos de trabalho e ainda diferentes saberes e poderes. A for- ma como agimos em nosso trabalho cotidia- no pode contribuir ou não para uma transfor- mação social. É na tentativa de superação da separação entre o usuário e profissional, e pela construção de uma relação mais ho- rizontal que estamos propondo reflexões so- bre a humanização do cuidado. 1.2 O acesso e a qualidade na atenção aos usuários Para que se possa intervir na situação de saúde da população, o acesso e o acolhi- mento são dimensões essenciais do atendi- mento. O processo de saúde e doença é uma constante na vida de todo cidadão, já que sempre haverá necessidade de procura pelo serviço de saúde. O modo como o usuário é recebido e a oferta de atenção no ambien- te da instituição de saúde, considerando os aspectos de estrutura, acolhimento, as in- formações repassadas e a rede de atenção construída a partir do encontro, todos são elementos que favorecem a reorganização da assistência e qualificam o atendimento. Inicialmente, é importante trazer a definição de acesso, que é: o alcance do uso adequa- do dos serviços para o atendimento das demandas dos usuários. Ou seja, é a forma com que a pessoa experimenta o serviço de saúde ao procurá-lo (SOUZA, 2008). Também é importante destacar que acesso difere de acessibilidade, visto que a segun- 22 22 22 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 22 22 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde da se caracteriza pela possibilidade de as pessoas chegarem aos serviços de saúde, mais relacionada à existência ou não de unidades de saúde no local e ao transporte adequado para tal. Desta forma, acesso e acessibilidade são conceitos que devem ser abordados de forma complementar (STAR- FIELD, 2004). Existem diferenças nos acesso aos ser- viçosde saúde entre homens e mulheres, sendo que as mulheres geralmente pos- suem uma vasta oportunidade de acesso à atenção básica (AB) para prevenção, pro- curando o serviço para realização de exa- mes de rotina. Desta forma, a AB pode ser considerada como porta de entrada ao ser- viço de saúde para elas. Já o homem, na grande maioria das vezes, procura o servi- ço de saúde quando está com algum caso de dor ou doença aguda; logo, sua porta de entrada, na maioria das vezes, é a atenção secundária ou terciária. Importante! Pesquisadores anseiam que para uma adequada adesão da população masculi- na, com idade entre 20 e 59 anos, esta deveria acessar os serviços de saúde da atenção bási- ca ao menos uma vez por ano (LEAL, FIGUEI- REDO, NOGUEIRA-DA-SILVA, 2012). Você e sua equipe já refletiram sobre a pro- cura do homem pelo serviço de saúde da sua instituição? Enquanto profissional da prática de saúde, você pode já ter se questionado sobre o acesso dos homens, uma vez que os serviços de saúde geralmente estão lotados e com profissionais sobrecarregados: como, então, incluir e garantir o acesso do homem na agenda de atendimentos? Para a melhoria do acesso do homem aos serviços de saúde, faz-se necessária a reorga- nização do atendimento de acordo com a ló- gica preconizada nas políticas públicas. Para isso, são necessárias ações de fortalecimen- to e qualificação da AB que possibilitem a rea- lização de atividades de promoção de saúde, prevenção de doenças e agravos evitáveis. Para aumentar esse acesso, são necessá- rias, no âmbito das equipes da ESF, refle- xões para a construção de mecanismos para qualificar a assistência a esse públi- co. Em estudo feito na região Sul do Brasil (JULIÃO; WEIGELT, 2011), foram referidas as seguintes estratégias para o cuidado da saúde do homem na atenção básica: • realização de exames periódicos para detecção de neoplasias ou doenças crônicas; • orientações sobre planejamento reprodutivo; • uso de preservativos e prevenção do uso abusivo de drogas; • criação de grupos de educação em saúde. Estratégias para o cuidado da saúde do homem na atenção básica: 23 23 23 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 23 23 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde Em estudo que investigou as perspectivas de implantação da PNAISH, os autores pro- blematizaram a relação entre a oferta de serviços e as necessidades em saúde da po- pulação masculina. Questionou-se se as de- mandas dos homens são principalmente as situações de urgência e prevenção focadas nos exames de próstata, ou se é o próprio do serviço que, por estar organizado para atender essas necessidades, torna-as mais visíveis para os profissionais (KNAUTH; COUTO; FIGUEIREDO, 2012). Convidamos você, profissional de saúde, a refletir se a baixa procura dos homens pelas ações de saúde deve-se ao modelo tradicional de masculinidades, ou, então, se por não haver a oferta de serviços, as demandas em saúde do homem permanecem invisibilizadas. Qual a sua opinião? Embora existam aspectos culturais que fa- zem com que os homens procurem menos a AB para assistência em saúde, os servi- ços possuem papel fundamental na rees- truturação das ofertas em saúde para esse público, a fim de aproximá-lo das unidades de saúde. Uma forma de viabilizar o maior acesso dos homens à unidade de saúde é, certamente, ampliar o horário de atendimento, voltando a organização dos locais de atendimento também para a necessidade do usuário. Figura 2 - Horários alternativos para atendimento aos ho- mens Fonte: Fotolia Estudos têm apontado que locais que dis- ponibilizaram atendimento durante os finais de semana, horário de almoço, no período noturno ou durante 24 horas, obtiveram maior frequência do público masculino nos novos horários implementados (VIEIRA et al., 2013; LEVORATO et. al. 2014). Para a ampliação do horário de trabalho das UBS, cada equipe deve avaliar, preferencial- mente em conjunto com a população, as ne- cessidades de cada local. É preciso pensar na viabilidade, na eficiência e na efetividade da ação. Pode inclusive não ser necessário o atendimento 24 horas em todos os locais para que o serviço seja mais acessível ao homem. Contudo, disponibilizar horários al- ternativos ao horário de trabalho da maioria dos homens da comunidade, em geral, pos- sui efeitos positivos em relação ao desafio do baixo acesso. Eficiência > Capacidade administrativa de pro- duzir o máximo de resultados com o mínimo de recursos. Efetividade > Diz respeito ao resultado con- creto, ou às ações que fizeram acontecer esse resultado concreto. 24 24 24 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 24 24 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde A questão do trabalho, que muitas vezes faz o homem deixar de buscar os serviços de saúde, também pode ser vista sob outro as- pecto. Em vez de um impedimento, pode vir a ser uma potencialidade. As ações de saú- de do trabalhador podem ser qualificadas no sentido de atender também demandas de prevenção e cuidados com a saúde que envolvam e sensibilizem os homens, trans- cendendo o papel burocrático dos pontuais exames periódicos (GOMES; NASCIMEN- TO, 2007). Os homens devem ser protagonistas dos processos de ações em saúde; as ações devem estar pautadas nas demandas e ne- cessidades da população masculina con- siderando seus diferentes segmentos. As ações que visam o acesso dos homens na atenção básica podem ocorrer no território em que os homens circulam, de acordo com os contextos loco-regionais. A partir da reorganização da assistência com vistas a ofertar e atender também as necessidades em saúde do homem, tem- -se a possibilidade de despertar no público masculino maior sensação de pertencimen- to a estes espaços. Sobre a estrutura das ofertas, é identificado como fator negativo para o acesso o tempo gasto para a realiza- ção dos procedimentos, de agendamento e encaminhamentos para serviços de referên- cia em saúde, além da dificuldade de aces- so a exames e atendimento, o que implica na baixa resolutividade da assistência. O fator do tempo gasto e da dificuldade de acesso a exames e atendimento é uma bar- reira que não é exclusiva da população mas- culina. Mas, em relação aos homens, este desafio pode gerar a impressão de que ape- nas eles não se importam com o cuidado da sua saúde. Percebemos, então, mais um desafio a ser superado: para o profissional, parece tratar-se de falta de interesse ou bai- xa procura do homem; e para o usuário, por não lhe ser acessível, acaba-se por afastá-lo dos serviços de saúde (KNAUTH; COUTO; FIGUEIREDO, 2012). Importante! É preciso compreender que os ho- mens são tão vulneráveis quanto os demais grupos (crianças, mulheres, idosos etc.), ne- cessitando que suas especificidades em saúde sejam reconhecidas e valorizadas. Tanto as questões estruturais dos serviços como os aspectos sociais da população, principalmente as questões de masculinida- des, em que o homem se considera “forte” em relação à saúde, interferem no acesso à atenção básica. E um dos caminhos pos- síveis para que os profissionais possam reduzir essas barreiras nos serviços é a construção do vínculo. O estabelecimento do vínculo entre profissional e usuário é o primeiro passo a ser dado para se romper 25 25 25 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 25 25 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde com a invisibilidade do homem nos servi- ços, valorizando-se os princípios de equida- de e integralidade do SUS. No estudo de Leal, Figueiredo e Silva (2012), investigou-se a percepção dos profissionaissobre a presença masculina nas unidades de saúde. Em geral, os usuários homens foram descritos como o acompanhante da mulher gestante, de crianças ou pessoas idosas; ou um mediador, que vem marcar uma consulta ou um exame para outra pessoa. Entende-se que, além de aumentar o acesso dos homens à unidade de saúde, é preciso que a equipe esteja sensível para reconhe- cer a população masculina também como usuária, acolhendo-a, aprimorando a comu- nicação e construindo vínculo para que esta possa estabelecer o cuidado em saúde ne- cessário. Desta forma, pode-se pensar jun- to com a equipe sobre as possibilidades de ampliação do atendimento e fortalecimento da atenção básica. A discussão sobre masculinidades nos ser- viços potencializa o rompimento do estereó- tipo socialmente construído da invulnerabi- lidade masculina, tornando os profissionais mais sensíveis às demandas de saúde do homem. Também torna essas necessida- des em saúde mais aparentes, favorecendo mudanças relevantes, e contribuindo para a ampliação da equidade, integralidade e uni- versalidade na assistência (STORINO; SOU- ZA; SILVA, 2013). A questão de vulnerabilidade masculina é vista sob dois ângulos distintos: há uma contradição entre os resultados das in- formações epidemiológicas, que apontam para a vulnerabilidade masculina, e o sen- so comum, que reforça a invulnerabilidade masculina. Ambas as percepções, embo- ra contraditórias, complementam-se, pois justamente por serem vistos como invulne- ráveis é que os homens tendem a se expor mais – tornando-se mais vulneráveis (GO- MES E NASCIMENTO, 2007). Convidamos você, profissional, a refletir sobre a colocação de Gomes e Nascimento (2007), que enxergam a questão de vulnerabilidade masculina sob dois ângulos distintos: há uma contradição entre os resultados das informa- ções epidemiológicas, que apontam para a vul- nerabilidade masculina, e o senso comum, que reforça a invulnerabilidade masculina. Ambas as percepções, embora contraditórias, comple- mentam-se, pois justamente por serem vistos como invulneráveis é que os homens tendem a se expor mais – tornando-se mais vulneráveis. É preciso que as equipes de saúde estejam atentas para esse fenômeno, a fim de pro- mover práticas e estratégias de cuidado que possam transcender este paradoxo, promo- vendo a saúde e a qualidade de vida desta população. 26 26 26 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 26 26 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde 1.3 A importância do papel da equipe de saúde na garantia do acesso e atendimento humanizado A disponibilidade e o acesso a um conjun- to de ações e serviços influenciam a saúde da população, mas não o suficiente para resolverem todas as questões implicadas. No contexto da implementação do SUS, os debates firmaram a perspectiva de que não basta aumentar a disponibilidade e o acesso ao atendimento; há que se pensar em que tipo de atendimento é esse. A for- ma como o serviço em saúde é oferecido potencializa o seu grau de resolubilidade. Não é suficiente que o usuário tenha aces- so ao SUS, se esse acesso não garante a sua saúde em todos os componentes en- volvidos no binômio saúde–doença. A ori- gem e o transcurso histórico dos problemas devem necessariamente ser considerados, bem como as diferentes conformações e os espaços onde se situam. Isso tem relação direta com a maneira de executar o trabalho em saúde – ou seja, como o processo de trabalho é orientado. Em seu cotidiano, você já deve ter percebido que apenas o conteúdo técnico da assistên- cia não é suficiente para resolver os proble- mas relacionados à saúde. Uma assistência de qualidade e ações de promoção e pre- venção são fundamentais, mas também é muito importante o comprometimento dos indivíduos envolvidos, ao que se denomina corresponsabilidade e coparticipação. Os trabalhadores de saúde, como você, possuem projetos individuais e coletivos próprios que de alguma forma interferem no contexto das unidades onde trabalham. Isso se dá porque, antes de serem traba- lhadores, são sujeitos que trazem no ato da produção de saúde a subjetividade, a histo- ricidade e os contextos da corporação a que pertencem. Subjetividade > É produzida por instâncias in- dividuais, coletivas e institucionais. Aquilo que produzimos – tecnologias, conceitos, ideias, técnicas – também transforma nosso modo de ser. Portanto, os “objetos” que produzimos interferem no processo de produção de subje- tividades (TEIXEIRA, 2003). A dimensão humana do trabalho reflete o vínculo dos profissionais com os usuários, assim como as próprias formas de viver o trabalho em saúde. Compreender o trabalho em saúde como relacional é imprescindível, considerando-o a interação entre trabalha- dores e usuários, envolvidos com a produ- ção do cuidado (CECÍLIO, 2001). Figura 3 - Interdisciplinaridade nas equipes de saúde Fonte: Shutterstock 27 27 27 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 27 27 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde Considerando o exposto, a atenção básica possui outro potencial para a integralidade do atendimento, que é a equipe de profissio- nais de saúde, considerando as equipes de ESF e o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF). O trabalho em equipe não deve ser apenas uma simples superposição de pro- fissionais em um mesmo espaço ou serviço de saúde. Este trabalho se caracteriza pela relação interativa entre os trabalhadores, que trocam conhecimentos e se articulam para a produção de saúde da comunidade, relacionando e interagindo dimensões com- plementares de trabalho. O sistema de saúde vigente preconiza a in- terdisciplinaridade. Para tanto, há a neces- sidade de dois ou mais profissionais que interajam e se comuniquem por meio de seus diferentes saberes. Porém, a interdis- ciplinaridade é um desafio percebido pelas equipes de saúde, que têm dificuldade de se relacionar devido aos níveis hierárqui- cos. Além disso, há certa fragmentação do trabalho, ocasionando contradições em que muitas vezes o profissional atua ape- nas individualmente. Para apoiar o usuário em suas necessidades – física, subjetiva, social –, é necessário que os trabalhado- res também constituam espaços de apoio à equipe, discutindo suas fragilidades e li- mites como sujeitos, como coletivo, como serviço. A humanização do cuidado passa por se considerar que as necessidades de saúde devam ser definidas tanto pelos profissio- nais quanto pelos usuários. Isso nos alerta para a necessidade de escutar com atenção, dando legitimidade à demanda apresentada pelo usuário, pois o sentido dado por ele ao problema pode ser a chave para uma solu- ção efetiva do caso. É alta a chance de que um usuário que não se sentiu minimamente compreendido em sua queixa desconsidere as orientações de tratamento. Uma tecnologia que possibilita acessar me- lhor o problema de saúde é a realização da escuta qualificada pelo trabalhador de saú- de. O adjetivo “qualificada” aqui significa que há um processo de reflexão desse tra- balhador sobre os sentidos que a escuta do outro tem na clínica, seja ela qual for: de me- dicina, de enfermagem, de psicologia etc. Escuta qualificada > É um dos dispositivos da PNH. A escuta qualificada deve ser prática corrente de toda a equipe de saúde, poden- do-se identificar os sinais de maior risco ou sofrimento do usuário, proporcionando a prio- rização do atendimento e fazendo os devidos encaminhamentos. Nesta reflexão sobre a escuta, a pessoa que fala deixa de ser um mero informante, que fornece ao profissional de saúde da- dos objetivos sobre seu problema, e pas- sa a ser compreendida como um sujeito atravessado por uma subjetividade,que é singular, que interage com o profissional durante o atendimento e que pode ser uma 28 28 28 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 28 28 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde manifestação ativa, protagonista da mu- dança na sua própria saúde. Na escuta qualificada, informações, dados, fatos e demandas são considerados, mas não somente isso. Os afetos e vínculos que podem ser estabelecidos ali também são alvo de atenção, pois o que o usuário sabe, pensa e sente em relação à situação que está enfrentando é crucial para o processo de atenção à saúde. Figura 4 - Escuta qualificada do profissional da saúde com o usuário Fonte: Fotolia Exatamente por identificar demandas que não estavam explícitas na queixa inicial, e que frequentemente são decisivas para a melhora geral do quadro de saúde do usuá- rio, a escuta qualificada nos possibilita sa- ber quando um caso demandará conversas com outros profissionais, possibilitando um cuidado mais integral. Mas, se a escuta qualificada é tão potente, por que ela acontece com uma frequência bem menor do que gostaríamos nos serviços de saúde? As estratégias de saúde do homem devem estar contempladas em outras políticas de saúde existentes no contexto da atenção básica, como saúde bucal, saúde da mu- lher, saúde da população negra, saúde do adolescente. Ou seja, a saúde do homem, constituída enquanto política de saúde estar contemplada no cotidiano dos ser- viços, sem desconsiderar que as popula- ções masculinas sofrem determinadas ini- quidades e desta forma ações específicas são necessárias para fomentar o acesso destes. Aprendemos, geralmente, em nossa for- mação na saúde, a valorizar condutas objetivas, neutras, junto ao usuário, por estarem associadas ao que convenciona- mos designar rigor científico. Tal escuta “objetiva” deixa de lado tudo aquilo que não é da ordem da “evidência científica”. Assim, o portador de cefaleia crônica, por exemplo, na maioria das vezes, será con- duzida apenas com base em perguntas de ordem técnica ou protocolar. Esse tipo de atendimento consegue captar pouco das singularidades do usuário, reduzindo a es- cuta a um ato protocolar, a uma técnica de coleta de evidências. Uma escuta assim pode reduzir ou enquadrar o usuário em uma identidade estereotipada, reducio- nista como, por exemplo, supostamente 29 29 29 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 29 29 UN1 Humanização e acesso: garantindo o direito à saúde alguém que ao expressar suas queixas e reclamações legítimas acaba sendo intitu- lado de “reclamão”. A escuta qualificada tem se organizado de modos distintos nas diferentes experiên- cias de acolhimento em curso pelo país. Em geral, é realizada em espaço privativo, podendo ser acionada em diferentes mo- mentos, por diferentes profissionais. A fim de garantir melhor acesso e resolutividade possível, já sabemos que a escuta qualifica- da é fundamental. Além dela, é importante analisarmos nosso processo de trabalho para organizá-lo de modo que nos ajude a: • atender a todos com resolutividade; • priorizar o que é mais grave; • encaminhar adequadamente o que preci- sa de continuidade no atendimento. Processo de trabalho Escuta qualificada Atendimento resolutivo Priorização do que é mais grave Encaminhamento adequado Para alcançar tais objetivos, há ferramentas que nos auxiliam nessa organização do aco- lhimento. Vale lembrar que este sempre será um processo singular, específico em cada serviço, envolvendo um conjunto de ações articuladas que deverão ser construídas co- letivamente, para refletirem as vontades e o entendimento não só da equipe de saúde, mas também dos usuários e gestores. 1.4 Recomendação de leituras complementares Para aprofundar seus estudos sobre a hu- manização e acesso da população mascu- lina aos serviços de saúde, sugerimos as seguintes leituras: BRASIL. Humaniza SUS: Política Nacional de Humanização, 2013. Disponível em: <http:// bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politi- ca_nacional_humanizacao_pnh_folheto.pdf>. MACHADO, M. F.; RIBEIRO, M. A. T. Os discursos de homens jovens sobre o acesso aos serviços de saúde. Interface (Botucatu), Botucatu, v. 16, n. 41, p. 343-356, jun. 2012. Disponível em: <http:// www.scielo.br/pdf/icse/2012nahead/aop2912>. UN2 O acolhimento dos homens na Atenção Básica 31 31 31 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 32 32 32 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 32 32 UN2 O acolhimento dos homens na Atenção Básica Para iniciar o estudo desta etapa, é importante lembrar que a partir da criação da Política Na- cional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), em 2009, começou-se a buscar o fortalecimento da assistência ao homem, a garantia do acesso e a qualidade da atenção para o tratamento de agravos, além da pre- venção de doenças e promoção da saúde, sob uma perspectiva integral de cuidado. Como temos ressaltado, a PNAISH está ali- nhada com a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB). Desta forma, para o acesso, o acolhimento e o atendimento às necessi- dades em saúde da população de homens foi priorizada a atenção básica (AB) com foco na Estratégia Saúde da Família (ESF), como portas de entrada principais. A partir da compreensão dos aspectos socio- culturais e político-econômicos que influen- ciam nas especificidades em saúde da po- pulação masculina, e em consonância com as estratégias de humanização, a PNAISH emerge no sentido de reconhecer as especi- ficidades em saúde da população masculina enquanto uma questão relevante e que preci- sa ser observada com a devida atenção pelos profissionais das equipes de saúde. Para a consolidação da PNAISH, é preciso compreender os contextos nos quais estão imersos os homens, para que seja possível aos profissionais tornarem suas práticas mais qua- lificadas e avançarem em direção ao acesso e acolhimento, rumo a uma atenção integral à saúde do homem no âmbito da atenção básica. 2.1 O cuidado em saúde na população masculina Para iniciar o diálogo sobre o cuidado em saúde da população masculina, é impor- tante termos clareza sobre qual cuidado estamos falando. O cuidado é algo que se produz no próprio ato de cuidar e se esta- belece nas relações entre usuários e profis- sionais de saúde. O cuidado apresenta-se 33 33 33 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 33 33 UN2 O acolhimento dos homens na Atenção Básica enquanto um processo relacional comple- xo, multifacetado e plural, que se constitui a partir de olhares e significações diversas. Essa definição de cuidado está associada ao conceito de saúde adotado pelo SUS, o qual está expresso na Lei nº 8080/90: þþ Os níveis de saúde expressam a orga- nização social e econômica do País, tendo a saúde como determinantes e condicionantes, entre outros, a ali- mentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, a atividade física, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais (BRASIL, 1990). Para que se contemple a complexidade deste conceito ampliado de saúde, o exer- cício do cuidado necessita ser mais que um momento de atenção e zelo. É preciso que se estabeleça entre o profissional e o usuá- rio uma relação de preocupação, responsa- bilização e desenvolvimento afetivo mútuo. A PNAISH enfatiza a necessidade de mudan- ças de paradigmas relativas à percepção da populaçãomasculina a respeito do cuidado com a sua saúde. Assim, é essencial que os serviços públicos de saúde sejam organiza- dos para acolher e fazer com que o homem sinta-se parte integrante destes. Importante! Embora a PNAISH tenha como porta de entrada os serviços de atenção bási- ca, conforme preconizado pela PNAB, os ser- viços especializados de atenção secundária e terciária ainda são onde ocorrem os principais acessos da população masculina aos serviços de saúde (BRASIL, 2008). Para se compreender por que os homens entre 20 e 59 anos procuram menos os serviços de saúde (e, consequentemente, cuidam menos da sua saúde), foi realizado um estudo em uma Unidade Básica de Saú- de (UBS) do Sul do Brasil. Nesta pesquisa, constatou-se que um dos motivos é o fato de se sentirem saudáveis, o que os deixa até 10 anos ou mais sem procurar por aten- dimento em saúde. Destaca-se como moti- vo pela baixa procura dos serviços o medo de descobrir que algo está errado, e evitam os atendimentos como uma forma de evitar receber um diagnóstico desanimador. Além de ter que depender de outras pessoas para se recuperar, atrapalhar sua vida diária e in- fluenciar no desempenho do trabalho (TEI- XEIRA, 2016). O horário de funcionamento da UBS também é outra fator limitante, pois muitas vezes choca com o horário de tra- balho (VIEIRA et al., 2013). A influência das masculinidades hegemô- nicas também aparecem como um fator para a não procura dos serviços de saúde, em especial os da atenção básica, que pos- sui enfoque preventivo e de promoção da saúde. Esta representação é predominante na sociedade, quer seja entre os usuários homens, quer seja entre os profissionais do setor da saúde (FIGUEIREDO, 2005). 34 34 34 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 34 34 UN2 O acolhimento dos homens na Atenção Básica Masculinidades hegemônicas > Traduz-se na representação de uma imagem de força, viri- lidade, sexualidade instintiva e autossuficiên- cia, que oculta a vulnerabilidade do homem e influencia na capacidade de falar sobre suas necessidades de saúde (BRASIL, 2008). Uma vez que essas características das masculinidades têm pouca afinidade com os sentimentos que muitas vezes acompa- nham a procura por assistência, tais como medo, insegurança e ansiedade (que se aproximam do papel social atribuído ao fe- minino), obtém-se como efeito a menor pro- cura pelos serviços de saúde. Isso faz com que homens adoeçam precocemente, uma vez que, no desempenho das características daquilo que acreditam e que é socialmente aceito como masculinidades, acabam dan- do pouca atenção às suas condições, pois não querem passar a imagem de fragilidade, indicada pela doença nesse contexto. A partir de uma perspectiva de gênero, as doenças passam a ser entendidas como uma combinação de efeitos biológicos e socioculturais. As questões de gênero in- fluenciam nos riscos a que os homens ex- põem sua saúde, uma vez que interferem na forma com a qual eles percebem e utili- zam seus corpos, caracterizando-se como determinantes sociais em saúde que de- vem ser observados para a qualificação da assistência e do cuidado (SCHRAIBER; GO- MES; COUTO, 2005). Gênero > O conceito de gênero é socialmente construído, e refere-se à organização das rela- ções sociais e econômicas entre os sexos, es- pecialmente na divisão do trabalho e do poder (GÓMEZ, 2011). Para a definição da categoria de gênero en- quanto um determinante social de saúde, não se trata apenas da diferenciação do sexo bio- lógico, mas sim dos papéis que são definidos socioculturalmente para homens e mulheres. A identidade do homem no contexto socio- cultural brasileiro posiciona-o como o res- ponsável pelo provimento financeiro da famí- lia. Dentre as constatações da PNAISH está que os homens tendem a buscar os serviços de saúde apenas quando perdem sua capa- cidade produtiva no trabalho. Em função da relevância do trabalho para os homens em geral, eles têm medo de descobrir alguma doença que os impossibilite de exercer suas atividades como provedor da família. Logo, eles passam a não considerar a possibilida- de de adoecer, motivo o qual os deixa menos sensíveis às políticas saúde. Dessa forma, o tempo de diagnóstico precoce e prevenção é muitas vezes perdido, ocasionando necessi- dades em saúde mais complexas. Importante! Quando estão estruturadas e or- ganizadas adequadamente, as equipes de saú- de da família têm no âmbito da atenção básica resolutibilidade de 85% das necessidades de saúde da sua população adscrita (BRASIL, 2008). A atenção básica, enquanto nível de aten- ção que deve ser a porta de entrada do sis- 35 35 35 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 35 35 UN2 O acolhimento dos homens na Atenção Básica tema de saúde, precisa reconhecer também a população masculina como um grupo que necessita de atenção integral à saúde. A partir das características sociais e epide- miológicas dos homens, os profissionais da saúde devem estar atentos e receptivos para desenvolver ações que acolham tam- bém o público masculino, tal como já ocorre em outros segmentos populacionais, como mulheres, crianças, adolescentes e idosos. Figura 5 - Construção de ações voltadas à saúde do homem Fonte: Fotolia Para auxiliar na compreensão do motivo pelo qual a oferta de serviços direcionados à população masculina ainda é um desa- fio para as equipes de saúde, é relevante refletir sobre a forma de organização da atenção básica. Esta esteve historicamente estruturada em torno de questões relativas à saúde materno-infantil. Apenas por meio de alguns programas para doenças crôni- cas, tais como o Hiperdia para hipertensos e diabéticos, além das campanhas de pre- venção do câncer de próstata, passaram a priorizar também demandas que são dos homens. Entretanto, verifica-se que a faixa etária da população masculina que mais acessa essas ofertas nas Unidades Bási- cas de Saúde (UBS) corresponde aos ido- sos, permanecendo ainda alheia aos servi- ços a parcela de jovens e adultos. A baixa frequência da população masculi- na nos serviços de saúde, em especial na atenção básica, além de onerar a sociedade pela maior procura aos níveis de atenção especializada, com maior custo, sobrecar- regam também emocionalmente as famí- lias que estão envolvidas. Para que você, profissional, possa ampliar o olhar sobre esta questão, a saúde do homem precisa ser destacada também como relevante, num movimento de promoção da igualdade de gênero, enquanto direito humano. O público masculino possui especificida- des em saúde permeadas por processos sociais que exigem um olhar profissional mais atento. A taxa mais elevada de mor- bimortalidade masculina é apenas um pa- râmetro a ser observado para o cuidado na saúde do homem. É importante que outros aspectos sociais e culturais sejam consi- derados e se tornem visíveis as vulnera- bilidades em saúde, com vistas à conso- lidação de um modelo de atenção integral (LEVORATO et al., 2014). Considerando estes aspectos, de que modo você, profissional, em conjunto com a sua equipe, pode analisar os principais temas re- lacionados à situação em saúde do homem no seu território? 36 36 36 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 36 36 UN2 O acolhimento dos homens na Atenção Básica Para que seja possível qualificar a atenção à saúde do homem, é preciso que os pro- fissionais estejam atentos ao contexto so- cial e epidemiológico, e também articula- dos como equipe, paraplanejarem ações específicas às necessidades em saúde que os homens apresentam. A fim de colaborar com o enfrentamento deste desafio, o próxi- mo tópico abordará o acolhimento como um instrumento potente para a aproximação da população masculina e para a promoção da atenção integral à saúde. 2.2 O acolhimento na saúde do homem Em uma perspectiva de cuidado integral, tan- to o acesso aos serviços de saúde como o acolhimento se articulam como dimensões relevantes das práticas em saúde a serem asseguradas. O acolhimento pode ser de- finido pela postura assumida nas relações de cuidado, nos encontros entre usuários e profissionais de saúde. Existem formas variadas de acolhimento, sendo válido ana- lisar como este se dá nos diferentes contex- tos, não bastando simplesmente considerar se ele existe ou não. Sendo o acolhimento um processo relacional, este se define me- nos enquanto conceito e mais nas práticas concretas de saúde pelas quais se consoli- da (BRASIL, 2013). Em consonância com a Política Nacional de Humanização, o acolhimento deve partir de uma postura ética assumida pelos pro- fissionais da equipe, que, ao terem contato com o usuário, devem colocá-la em prática, compartilhando saberes, angústias e deci- sões sobre as intervenções de saúde a se- rem adotadas. Chamamos a atenção para o fato de que acolher não é apenas ser edu- cado e tratar bem o usuário, pois além de civilidade e respeito, o acolhimento pressu- põe que seja assumida a responsabilidade de se adotar a melhor resolubilidade para o caso atendido. Importante! O acolhimento se distingue da triagem, pois tem como finalidade a inclu- são, que vai além da recepção. O ato de aco- lher pressupõe uma aproximação em relação a alguém. É nesse sentido que a PNH propõe o acolhimento, ou seja, no compromisso de envolver-se e potencializar os protagonismos dos sujeitos, acolhendo-os nas suas diferen- ças, dores, alegrias, modos de vida, sentir e estar na vida. O acolhimento não se restringe à recepção, ele só acontece quando é adotado por toda a equipe como parte do processo de produ- ção de saúde, podendo ser trabalhado em todos os encontros nos serviços de saúde. O acolhimento se estabelece como uma forma de reconhecer a capacidade de todos os membros de uma equipe para atuarem sobre os problemas de saúde, exercendo a atividade dentro de suas competências pro- fissionais específicas, em um trabalho cen- trado no usuário. 37 37 37 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 37 37 UN2 O acolhimento dos homens na Atenção Básica Dessa forma, o acolhimento deve ser com- preendido e trabalhado como um processo de encontro entre indivíduo, família, comu- nidade e trabalhadores de saúde, capaz de colocar em prática, na atenção à saúde, a integralidade, a equidade e a resolubilidade. O acolhimento, como processo de constru- ção do vínculo, humanização da atenção em saúde e escuta qualificada em relação às necessidades dos usuários, deve aconte- cer em todo e qualquer espaço de encontro no qual a atenção à saúde se realize, e não apenas na porta de entrada do sistema. A perspectiva do acolhimento, não como uma atividade específica, mas como prática de toda e qualquer atividade assistencial, possi- bilita ao usuário transitar em diferentes espa- ços da rede de saúde, consistindo em um pro- cesso contínuo de investigação, elaboração e negociação das necessidades de saúde. O acolhimento precisa ter continuidade me- diante a construção de uma rede de con- versação, efetivada por meio do serviço de saúde, e ao longo da qual são definidas as trajetórias que cada usuário e sua família necessitam na busca de satisfação para suas demandas. Ou seja: quando desenha- do na atuação da equipe, este processo orienta a organização do atendimento para responder adequadamente às necessida- des identificadas. Figura 6 - A importância do acolhimento adequado dos usuários Fonte: Fotolia Nos serviços de saúde, o acolhimento tem o potencial de transformar as relações entre usuários e profissionais e na maneira com que a população tem acesso aos cuidados em saúde. É um espaço no qual pode haver a informação e orientação sobre as ações disponíveis, de modo a atender o homem in- tegralmente (CAVALCANTI et al., 2014). Importante! O trabalho em equipe favorece a contribuição dos diferentes saberes, o que não deve eliminar o caráter particular de cada pro- fissional ou de cada profissão, pois todos de- vem participar de modo a articular um campo que assegure saúde à população e realização pessoal aos trabalhadores (CAMPOS, 2003). Como trabalhadores da saúde, devemos re- ceber os usuários de modo a conhecê-los pelo nome, procurando saber os motivos de sua vinda à unidade. O simples fato de darmos boas vindas já abre um leque para o usuário relatar com confiança suas reais 38 38 38 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 38 38 UN2 O acolhimento dos homens na Atenção Básica necessidades de saúde. O atendimento deve ser do tipo dialogado, como uma téc- nica de conversa possível de ser realizada por qualquer profissional, em qualquer mo- mento de atendimento – isto é, em qual- quer um dos encontros, que são, enfim, os “nós” dessa imensa rede de conversações que caracterizam os serviços (TEIXEIRA, 2005). Portanto, o acolhimento consiste na huma- nização das relações entre trabalhadores e serviço de saúde para com seus usuários. O encontro entre esses sujeitos se dá num espaço onde se produz uma relação de es- cuta e responsabilização, a partir do que se constituem vínculos e compromissos que norteiam as ações para o cuidado em saú- de. Esse espaço permite que o trabalhador use de sua principal tecnologia, o saber, tratando o usuário como sujeito portador e criador de direitos. 2.3 Dispositivos do acolhimento e estratégias de aproximação do homem ao cuidado em saúde O vínculo e o acolhimento são dispositivos que favorecem aos homens a percepção das suas necessidades em saúde. A partir do reconhecimento pelos profissionais das especificidades da saúde do homem, assim como do estabelecimento de ações para atendê-las, sob uma perspectiva de cuidado continuado e integral, os serviços de saúde passam a ser também reconhecidos pelos homens como um espaço onde podem en- contrar assistência. Em estudo feito na cidade de São Paulo (FI- GUEIREDO, 2005), a discussão sobre temas relativos às masculinidades e que impac- tam na saúde específica desta população destacou-se como estratégia de cuidado nas salas de espera dos serviços de saúde, a partir de assuntos como violência, alcoo- lismo e paternidade. Tanto homens quanto mulheres de diferentes idades participaram destas conversas. Observou-se que eram temas de grande interesse da população e também relevantes para a criação de novas práticas assistenciais. Estes momentos ti- nham o objetivo de sensibilizar a população como um todo, sobre a importância da saú- de do homem. Figura 7 - O profissional de saúde planejando ações inte- grais e integradas Fonte: Fotolia 39 39 39 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 39 39 UN2 O acolhimento dos homens na Atenção Básica Já os grupos de educação em saúde devem se realizar em um horário mais flexível, que não seja compatível com o horário de trabalho, para que os homens possam participar. Nos grupos pode haver trocas de experiência e discussão sobre temas cruciais, que forem de interesse da equipe e dos participantes (FIGUEIREDO, 2005). Para o chamamentodos participantes, a divulgação pode ser feita por meio dos Agen- tes Comunitários de Saúde (ACS) e demais profissionais da equipe durante as atividades na UBS e na comunidade; pela distribuição de cartazes e panfletos informativos, bem como pela utilização das mídias locais, tais como rá- dios, jornais, informativos impressos, parceria com líderes comunitários, entre outros. Em uma pesquisa realizada no interior da Paraíba (CAVALCANTI et al. 2014), traba- lhou-se com um grupo de homens existente na igreja da localidade, com o objetivo de conhecer os obstáculos para o acesso dos homens e traçar estratégias de superação para estes desafios. Encontraram-se como possibilidades: Possibilidades para aumentar o acesso dos homens Ampliação do horário de atendimento Maior resolutividade das ações Acolhimento caracterizado pelo bom atendimento Comunicação por meio da transmissão de informações relevantes ao usuário Estabelecimento de vínculo por meio das visitas domiciliares e fixação de profissionais na equipe de saúde Fonte: CAVALCANTI et al. 2014. Todas essas estratégias estão diretamente relacionadas à humanização do atendimen- to, tornando esta um ponto crucial na quali- ficação do acesso. Chamamos a atenção para o fato de que o estudo foi realizado em um grupo já existen- te, vinculado a um espaço coletivo local, no caso a igreja, que possuía em média 50 in- tegrantes. Ressalta-se que nem sempre as unidades de saúde precisam criar grupos próprios; é possível se articular com inicia- tivas já existentes na comunidade, facilitan- do a adesão dos participantes e o alcance do público-alvo. Importante! Não há um padrão ou protocolo a ser seguido, que seguramente será efetivo em qualquer unidade de saúde. É preciso conside- rar os aspectos socioeconômicos e culturais, bem como a dinâmica de cada local, juntamen- te com a avaliação de quais recursos humanos e materiais estão disponíveis pela unidade. Nesse contexto, as alternativas vistas cer- tamente servem para estimular que outras possibilidades sejam criadas, a fim de con- tribuir com práticas cotidianas que visem à atenção integral à saúde do homem. 40 40 40 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 40 40 UN2 O acolhimento dos homens na Atenção Básica Em função da predominância do acesso dos homens aos serviços de urgência e emergência, e menor frequência na atenção básica, tende-se a ter maior reconhecimen- to pela figura do médico. Em geral, estes usuários desconhecem ações de prevenção e o papel dos demais profissionais (CAVAL- CANTI et al. 2014). Entretanto, os demais profissionais da equipe de saúde da família possuem papel significativo na assistência integral à saúde do homem. Os ACS são elos importantes entre as uni- dades de saúde e a população, atuando na interlocução da marcação de consultas e exames, retirada de medicamentos, além da divulgação de quais serviços estão disponí- veis na UBS. Os ACS também contribuem para a identificação das necessidades da população, levando a demanda à equipe e orientando os usuários sobre a procura da unidade de saúde. O enfermeiro também tem um papel muito relevante, pois costu- ma prestar atenção individualizada desde o acolhimento às consultas e visitas domi- ciliares. Este profissional, como integrante da equipe de saúde da família, costuma participar do planejamento, organização e execução das ofertas em saúde conforme as necessidades da comunidade (JULIÃO; WEIGELT, 2011). Com a criação dos Núcleos de Apoio à Saú- de da Família (NASF), amplia-se o escopo e a oferta de serviços da atenção básica, o que pode contribuir de maneira valiosa para o cuidado da população masculina. De acordo com a Política Nacional de Huma- nização (PNH), o processo de humanização constitui-se em qualificar os serviços ofer- tados, articulando-se o acolhimento com os avanços tecnológicos em saúde, promoven- do a melhoria do ambiente de cuidado para o usuário e de trabalho para os profissionais (BRASIL, 2004). Os profissionais, para que estejam preparados para o acolhimento e atendimento integral, além de capacitados, devem problematizar a realidade da sua comunidade com usuários e gestores, a fim de propor estratégias inclusi- vas para este público (VIEIRA et al. 2014). A capacitação e a sensibilidade da equipe para o acolhimento e para a construção da lon- gitudinalidade do cuidado contribuem para que os homens se identifiquem como parte dos serviços de saúde, potencializando o seu acesso (SILVA et al., 2012). Compreende-se que quando o profissional busca o usuário, promove-se a aproximação entre ambos, es- tabelecendo-se o vínculo e a valorização do homem enquanto usuário dos serviços da atenção básica (CAVALCANTI et al., 2014). Longitudinalidade > Na Atenção Primária à Saúde, longitudinalidade é empregada para significar “uma relação pessoal de longa dura- ção entre os profissionais de saúde e os usuá- rios em suas unidades de saúde” (STARFIELD, 2002, p. 247). 41 41 41 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 41 41 UN2 O acolhimento dos homens na Atenção Básica Dessa forma, é importante lembrar que a humanização nos serviços de saúde é ca- racterizada pelo acesso, acolhimento, co- municação e construção de vínculo, sendo uma estratégia efetiva e fundamental para qualificar a assistência à saúde. É também relevante para o aumento da agilidade e re- solutividade nos serviços de saúde (CAVAL- CANTI, 2014). Importante! Quando há vínculo entre o pro- fissional e o usuário, os homens demonstram maior satisfação com o serviço, indicando que foram bem acolhidos. Mesmo compreenden- do-se que o vínculo isoladamente não asse- gura o atendimento integral, considera-se que essa relação de aproximação entre ambos é essencial para que se possa pensar em inte- gralidade (STORINO; SOUZA; SILVA, 2013). 2.4 Recomendação de leituras complementares Para aprofundar seus estudos sobre o aco- lhimento dos homens na atenção básica, sugerimos as seguintes leituras: BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Acolhimento à demanda espontânea. Cadernos de Atenção Básica, Brasília, n. 28, v. 1, 2013. Disponível em: <http://bvsms.saude. gov.br/bvs/publicacoes/acolhimento_deman da_espontanea_cab28v1.pdf>. ALVES, R. F. et al . Gênero e saúde: o cuidar do homem em debate. Psicologia teoria e práti- ca. São Paulo, n. 3, v. 13, dez. 2011. Dispo- nível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ptp/ v13n3/v13n3a12.pdf>. UN3 A integralidade na atenção à saúde do homem 43 43 43 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 44 44 44 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 44 44 UN3 A integralidade na atenção à saúde do homem Para a oferta de serviços e atendimento de qualidade, é fundamental uma discussão sobre a integralidade, considerando a rede de atenção à saúde e as potencialidades da relação profissional-usuário. O Sistema Único de Saúde (SUS) inclui a integralida- de como um princípio para sua efetivação. Desta forma, o atendimento integral está presente nas políticas de saúde como a PNAISH, de forma a responder as necessi- dades do homem. Neste contexto, a atenção básica torna-se um espaço importante para garantia da saúde integral do homem, uma vez que o ambiente é considerado pelo SUS como porta de entrada do usuário. Desta forma, precisa-se pensar nas potencialidades e oportunidades, além da estrutura das insti- tuições de saúde, garantindo assim o aces- so, o acolhimentoe um atendimento efetivo e resolutivo para os homens. A PNAISH está alinhada com a Política Na- cional de Humanização (PNH), trazendo à atenção básica o desafio de incluir os ho- mens de diferentes faixas etárias em suas particularidades de gênero no serviço de atenção à saúde. Desta forma, para a consolidação da PNAISH é preciso compreender as fragilidades e as potencialidades do contexto masculino, a fim de proporcionar ambientes favoráveis. Isso torna possível aos profissionais quali- ficarem suas práticas e construírem vínculo com a população masculina. 3.1 A integralidade no acesso e acolhimento A integralidade é uma das diretrizes que es- truturam o Sistema Único de Saúde (SUS) e está centrada na reorientação das práticas de cuidado no cotidiano dos serviços. Essa 45 45 45 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 45 45 UN3 A integralidade na atenção à saúde do homem diretriz emerge do contexto da reforma sa- nitária, com lutas e movimentos sociais em prol da saúde na década de 1980, que culminaram na construção do SUS (LUZ, 2006). A Política Nacional de Humanização (PNH) prioriza a integralidade e o acolhimento para a maior resolubilidade das necessida- des dos usuários do SUS. A ideia da inte- gralidade está relacionada ao acesso aos serviços de saúde, ou seja, a qualidade que buscamos nos serviços de saúde deve ter como eixo o acesso adequado e oportuno às ações e serviços de saúde que tenham potência de responder às necessidades das pessoas (BRASIL, 2007). Como um dos fundamentos da atenção bá- sica, a integralidade é ressaltada na PNAB, sendo definida como: Integralidade Integração de ações programáticas e demanda espontânea Articulação das ações de promoção, prevenção, vigilância à saúde, tratamento e reabilitação Trabalho interdisciplinar e em equipe Coordenação do cuidado na rede de serviços Fonte: Brasil, 2011. Importante! Temos muitos sentidos para a in- tegralidade, mas independentemente destes, refere-se à importância de tratar os sujeitos com suas particularidades e não como núme- ros ou marcadores de saúde, ampliando as for- mas de olhar para o contexto em determinada situação ou para o usuário. Neste sentido, retomamos a ideia de que para garantir práticas de cuidado com foco na integralidade, estas precisam ser pauta- das por uma estrutura de organização do processo de trabalho no cotidiano dos servi- ços, que necessitam conhecer as necessida- des de saúde da comunidade que abrangem. A PNAISH apresenta a integralidade como meta e busca orientar as práticas de saú- de com ações para a população masculina, primando pela humanização da atenção. Embora a integralidade seja um dos princí- pios norteadores do SUS, ainda há desafios para sua efetivação nas práticas assisten- ciais cotidianas. Para a sua efetivação, é necessário conhecer o contexto e a forma com que as pessoas vivem, levando-se es- tes fatores em conta para a estruturação do cuidado. O espaço da atenção básica é re- levante para a consolidação desta prática, 46 46 46 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 46 46 UN3 A integralidade na atenção à saúde do homem pois é o nível de atenção mais próximo do usuário do SUS e parte do reconhecimento do território para a organização dos servi- ços (MATTIONI; BUDÓ; SCHIMITH, 2011). Território > O território no qual o serviço está inserido é um espaço vivido, no qual são tra- vadas as relações sociais que dão sentido às características locais (SANTOS, 2001). Figura 8 - Construção do vínculo entre usuário e profissional Fonte: Fotolia É importante lembrar que uma forma para atender o desafio da consolidação da inte- gralidade é potencializar o acesso do usuá- rio. A integralidade exige que você, enquanto profissional de saúde, reconheça a varieda- de completa de necessidades relacionadas à saúde do usuário e disponibilize os recur- sos para abordá-las (Starfield, 2002). Para facilitar o acesso, o SUS apresenta como estratégia organizacional a Estratégia Saú- de da Família (ESF), que propõe a reorien- tação do modelo de atenção à saúde, histo- ricamente centrado na perspectiva da cura, passando a constituir uma nova prática as- sistencial, construindo relações de vínculos entre os serviços de saúde e a comunidade. Desta forma, a ESF potencializa o acesso, já que pode ir ao encontro do homem, no am- biente de trabalho, de lazer, em casa, pro- pondo atividades e cuidados para além do espaço físico das unidades de saúde. As interações e envolvimento entre profis- sional e usuário que acontecem além da unidade não fornecem apenas discernimen- to quanto aos prováveis determinantes da má saúde; podem oferecer informações e indicações quanto à saúde de outros ho- mens envolvidos naquele espaço. Ou seja: as mesmas predisposições à doença que ocorrem no usuário específico também po- dem existir em outros que vivem na mesma comunidade ou estão expostos às mesmas condições sociais, ambientais ou ocupacio- nais (STARFIELD, 2002). Importante! O acolhimento e o vínculo aumen- tam a capacidade de se prestar uma assistên- cia qualificada e integral. Embora a atenção básica não seja capaz de alterar isoladamen- te a atenção à saúde na rede assistencial, ela é a porta de entrada, e certamente impacta positivamente no acesso dos usuários e pela qualidade do atendimento quando é permeada por um olhar humanizado e integral (STORINO; SOUZA; SILVA, 2013). Em relação às estratégias de cuidado da saúde do homem, na atenção básica são comuns ações pontuais, tais como campa- nhas para prevenção de IST/AIDS, com dis- tribuição de preservativos, e campanhas de prevenção do câncer de próstata. Para que se alcance a integralidade do cuidado, essas estratégias devem ser complementadas por 47 47 47 Acesso e acolhimento na atenção à saúde do homem 47 47 UN3 A integralidade na atenção à saúde do homem outras mais amplas que considerem o aces- so, a resolubilidade e a qualidade do atendi- mento efetuado por toda a rede de saúde. Sinalizamos a nota técnica conjunta do MS sobre o rastreamento do câncer de próstata nas leituras complementares desta unidade, não deixe de ler. É preciso considerar que no Brasil a saúde do homem vem sendo inserida lentamen- te na pauta da saúde pública. Visto que as ações de saúde do homem muitas vezes são baseadas em procedimentos e exames que reforçam a centralidade da atenção no apa- relho genital masculino, ainda é necessário discutir com as equipes de saúde e com a população a incorporação da abordagem de gênero no serviço de saúde e a atuação da equipe a partir das particularidades dos homens que constroem aquela população, que são pescadores, agricultores, empresá- rios, pedreiros, mineiros, entre outros. Para que se contemple o atendimento integral, é importante valorizar a equipe multiprofis- sional, e não apenas a figura do médico. Você percebe como é preciso haver maior sensibilidade sobre a demanda do seu territó- rio? Percebe que para isso precisa haver uma compreensão ampliada dos aspectos diversos que influenciam o estado de saúde do usuário atendido? Quando o profissional tem um olhar ampliado sobre o contexto da comunidade, ele pode influenciar positivamente na capaci- dade de resolução das necessidades em saú- de pelos serviços. Foi realizado um estudo junto a uma equi- pe de saúde da família de um município da região Sul do Brasil, com o objetivo de se conhecer as formas de cuidado e a inter- face da integralidade com essas práticas. Observaram-se os seguintes aspectos do cuidado integral, sob a perspectiva de sa- beres e práticas, elencando-se cinco eixos principais para demonstrar
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