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Linguística UNIDADE 4 1 UNIDADE 4 - A LÍNGUA NA SOCIEDADE DICIPLINA: LINGUÍSTICA I Na unidade anterior, você pôde ver os diversos tipos de gramáticas, dentre eles a gramática normativa. De maneira geral, você deve ter percebido que o senso comum, ao falar de gramática, normalmente associa a palavra à sua vertente normativa apenas. Além disso, você também deve ter percebido que normalmente, no senso comum, as pessoas ao falarem da língua pensam apenas nas regras que regem a gramática normativa. Em função dessa crença, boa parte das pessoas imagina que o ensino das línguas deve se pautar apenas em questões da gramática normativa e se aluno errar qualquer detalhe das regras do português, naturalmente vai achar que ele não fala Português. Dessa maneira, é comum ouvir frase do tipo: • Ele fala “a gente somos” e por isso não fala português. • Os jovens estão assassinando a língua portuguesa. • Com a internet, as pessoas estão ficando ignorantes porque não conseguem mais escrever em português. Provavelmente você já deve ter ouvido falar de frases como essa ou pode até mesmo já ter dito. De certo modo, essas frases demonstram que as pessoas se importam com a língua portuguesa e por isso querem preservá-la. No entanto, devemos pensar criticamente sobre o que é falado e principalmente ter coerência entre o que estudamos e o que praticamos! É importante que, enquanto estudante da ciência linguística, você desconfie de tudo que é dito sobre a língua com base apenas no senso comum. Afinal de contas, é nosso dever estudar a língua e fazer considerações pertinentes com base nos nossos estudos e não apenas com impressões apressadas sobre o nosso objeto de estudo. Para pensar sobre essa questão dos “erros” de português, leia o seguinte texto: Ai se sesse Cordel do fogo encantado Se um dia nois se gostasse Se um dia nois se queresse Se nois dois se empareasse Se juntim nois dois vivesse Se juntim nois dois morasse Se juntim nois dois drumisse Se juntim nois dois morresse Se pro céu nois assubisse 2 Mas porém acontecesse de São Pedro não abrisse a porta do céu e fosse te dizer qualquer tulice E se eu me arriminasse E tu cum eu insistisse pra que eu me arresolvesse E a minha faca puxasse E o bucho do céu furasse Tarvês que nois dois ficasse Tarvês que nois dois caisse E o céu furado arriasse e as virgi toda fugisse (Disponível em: http://letras.com/cordel-do-fogo-encantado/78514/) Perceba que no texto acima há diversos “erros” de português. De acordo com a norma padrão e com a ortografia da língua portuguesa, palavras como nois, juntim, drumisse, tarvês e outras estão todas erradas. Mas agora vamos relativizar a noção de erro. Do ponto de vista artístico, é coerente dizer que o texto está errado? E agora do ponto de vista linguístico, é correto afirmar que o texto está escrito em uma língua que não é a portuguesa falada no Brasil? Certamente nenhuma das duas perguntas pode ser respondida positivamente! Do ponto de vista artístico, o texto está adequado! O compositor da letra dessa música quis representar uma variedade específica da língua portuguesa falada no Brasil. As músicas compostas por esse grupo musical são uma clara referência à linguagem de cordel, que, por sua vez, faz modificações do padrão da língua portuguesa a fim de tentar representar a fala dos moradores da zona rural do sertão nordestino. Então, já pensou se o compositor optasse por escrever todo o texto seguindo as normas prescritas na gramática normativa? Certamente você não conseguiria apreender o sentido e, sobretudo a identidade cultural presente no texto. E agora sobre o ponto de vista linguístico, o texto está adequado? Faz parte da língua portuguesa? Sim! Como falante nativo de português do Brasil, é pouco provável que alguém não consiga compreender o texto. O texto é organizado a partir da sintaxe do português, as palavras utilizadas no texto mesmo que modificadas fazem parte do léxico da língua portuguesa. Enfim, o texto faz sentido! Ao não levar em consideração a gramática normativa, o texto não apresenta nenhum erro, muito pelo contrário! Se as regras gramaticais fossem seguidas, o texto perderia bastante do seu valor artístico. Nessa unidade, vamos discutir a relação fundamental entre língua, cultura e sociedade. E principalmente a visão da Linguística em torno desse tópico. É importante ressaltar que nessa unidade nos aproximamos mais dos estudos linguísticos contemporâneos, e, dessa maneira, poderemos comentar mais sobre as contribuições da ciência linguística para o campo do ensino de língua materna. Então vejamos como se organiza o guia de estudo da unidade 4: • Língua, cultura e sociedade: começaremos discutindo sobre a relação que a língua, nosso objeto de estudo, mantém com a sociedade e a cultura. Como 3 vimos anteriormente, o início da Linguística foi marcado pela separação da língua e do seu uso, por meio da dicotomia língua e fala do linguista genebrino, Ferdinand de Saussure. Você poderá aprofundar as leituras sobre esse tema pelas páginas 99, 100 e 101 do livro-texto. • Variação linguística e norma padrão: já focamos anteriormente na questão da norma padrão, mas agora vamos situá-la dentro das variações linguística para que dessa maneira você possa consolidar a ideia de que o padrão não representa a totalidade das línguas. Você irá compreender que o padrão é apenas uma variante privilegiada em meio a diversas outras variantes que constituem a língua. Nesse capítulo, vamos trabalhar com a Sociolinguística, área da Linguística que é especializada nesse assunto. Essa seção é abordada nas páginas de 105 a 125 do livro-texto. • Atitudes e preconceitos linguísticos: por fim, discutiremos o que são atitudes e preconceitos linguísticos, de onde eles surgem e o impacto social e educacional ocasionado por eles. Nessa seção você também traçará um paralelo entre esses conceitos e o ensino de línguas. No seu livro-texto, você pode encontrar mais sobre essa discussão nas páginas 126 a 131. 1 - Língua, Cultura e Sociedade Nesta seção, o mais importante é compreender a relação entre esse tripé: língua, cultura e sociedade. Então comecemos com o conceito de cultura. O que seria cultura? Todos nós temos uma ideia do que é cultural. No senso comum, dizemos que artesanatos, danças típicas e outras tradições regionais fazem parte da cultura de uma região. Entretanto, devemos considerar cultura de uma maneira mais ampla. Vamos utilizar como exemplo diferenças culturais entre diferentes países. Nos Estados Unidos é comum fazer uma refeição pequena e leve durante o almoço e uma refeição maior e pesada durante o jantar. Em países como o Brasil isso soa estranho, pois costumamos ter a maior refeição do dia no almoço. Apesar de simples, o aspecto mencionado acima faz parte dos nossos costumes, portanto é uma referência dessas culturas. Reconhecemos esse aspecto como pertencente à vida dos brasileiros e dos americanos. Então a cultura no nosso caso é entendida como o conjunto dessas referências. Como você pode perceber, a cultura é muito mais ampla do que os traços folclóricos de uma região, ela também está nas banalidades e amenidades da vida de um lugar. Depois de reconhecer o que é cultura, somos levados ao seguinte questionamento: a língua é uma referência cultural? Certamente, a língua faz parte da cultura. Falar português nos constitui como brasileiros, mesmo que falemos bem uma língua estrangeira, o nosso vernáculo será o português do Brasil, ou seja, essa é a língua com a qual nos sentimos mais confortáveis nas situações de menor monitoramento. Por outro lado, é necessário reconhecer o papel de destaque que a língua recebe em 4 relação a outros artefatos culturais. Ora, é através da língua que nos constituímos como seres humanos! É justamente por falar uma língua que nos diferenciamos dos animais, então a língua ocupa uma posição de maior importância na cultura de um povo. Conforme vimos nas unidades 1e 2, de acordo com a hipótese de Sapir-Whorf, bastante aceita na ciência linguística, a cultura é limitada pela língua. Pensando no nosso conceito de cultura, é fácil de reconhecer que as pessoas de uma dada região, apesar de partilharem as referências culturais, não são iguais. Cada indivíduo possui diferentes contextos sociais que o faz se diferenciar dos outros. Por exemplo, mesmo que duas pessoas tivessem nascido em meio à cultura brasileira, elas terão referências diferentes se elas estiverem em classes sociais distintas. O mesmo acontece se elas têm idades muito diferentes, se elas vivem na zona rural ou nos grandes centros urbanos, se elas moram em regiões distintas do Brasil. Por isso consideramos que na cultura há diversas condições que podem mudar as referências culturais dos indivíduos. Mas e na língua? Como essas diferenças culturais funcionam? Ora, de certa maneira, é fácil perceber se você notar a maneira como as pessoas ao seu redor falam! Perceba como seus avós falam e notem que é diferente da maneira como você fala. Há certos modos de falar, certas palavras que você não usaria, mas que eles usam. Agora pense nos seus amigos de outras regiões do Brasil, pense em como os brasileiros têm diferentes maneiras de pronunciar as palavras, na quantidade de palavras que é utilizada apenas na sua região e que não é utilizada em outras. Agora pense em como é diferente a fala de uma pessoa não escolarizada que passou pouco ou nenhum tempo na escolar em relação aos seus professores da faculdade, que possuem curso superior. Depois de ter pensado nisso, você deve ter chegado à conclusão de que a língua varia. Mesmo pensando na mesma língua, o português falado no Brasil, há diferentes formas de falar, de construir as frases, de escolher as palavras. Dessa maneira, podemos dizer que nas línguas há o que chamamos de variação linguística. Você se lembra dos tipos de gramática que estudamos na unidade 3? Lembra-se mais especificamente da gramática normativa? A gramática normativa é aquela constituída pelas regras do bem dizer, ou seja, as regras que são consideradas as mais adequadas em contextos culturais formais. Mas você deve se lembrar também que já comentamos que essas regras não esgotam as possibilidades em uma língua, que não representam a totalidade de uma língua como nos faz crer o senso comum na maior parte das vezes. Em vista do exposto, a gramática normativa pode ser considerada uma variação linguística dentre as diversas variedades que a língua apresenta. Com essa afirmação, muitas pessoas acreditam que os linguistas recomendam que o ensino de línguas não deva levar em consideração o ensino da gramática, contudo essa afirmação é completamente equivocada, ou seja, está errada! De certa forma, é consenso em Linguística que as diversas variações linguísticas devem ser levadas em consideração no ensino de língua materna, no entanto a norma padrão deve ser ensinada porque é no ambiente escolar que as regras da gramática normativa podem ser internalizadas e dessa maneira os alunos poderão circular em diversas esferas formais, como os 5 ambientes profissional e acadêmico, por exemplo. É notório que o aluno já traz de casa uma porção de conhecimento adquirido com suas famílias, seus amigos etc. Essa porção de conhecimento não deve ser descartada, um bom professor consegue fazer conexões entre o que os alunos já sabem e o que a escola requer que ele aprenda. Portando um bom professor de língua materna deve trabalhar com as variedades linguísticas que os alunos já têm e compará-las com as regras trazidas pela gramática normativa, mostrando aos alunos a multiplicidade de possibilidades que a língua pode lhe proporcionar. Ao tratar das variações linguísticas, o ensino tem que deixar claro para os alunos que a variação linguística existe e que tem seu espaço, por outro lado o ensino também deve dar conta da missão de letrar os aprendizes. Mas o que seria então letrar? Como definir o termo letramento? Para começar vamos pensar em um conceito que você já deve ter ouvido falar: alfabetização. Todos nós passamos por um momento em que aprendemos as letras do alfabeto e também aprendemos que essas letras correspondem a sons da nossa língua, a partir desse aprendizado pudemos começar a ler algumas palavras e sentenças, e também nos tornamos capazes de escrever algumas dessas palavras e sentenças. Contudo, esse processo de ensino visava nos tornar capazes de “decodificar” a língua, ou seja, corresponder um dado som a uma letra ou letras do alfabeto. Esse processo de ensino é conhecido como alfabetização. Mas uma pessoa apenas alfabetizada é capaz de ler e compreender os textos que tem circulação social? Provavelmente não! O processo de leitura é muito mais complexo do que a mera decodificação de letras em sons. É necessário que o leitor tenha algum conhecimento prévio, histórico, social e até mesmo técnico, também é preciso ter senso crítico, questionar a condição de verdade das ideias, ter a capacidade de relacionar as ideias a outras. Enfim, há vários processos necessários para que alguém seja capaz de ler! Podemos chamar de letramento, o processo pelo qual os aprendizes são ensinados a não apenas decodificar letras em sons, mas também que possam ler e compreender textos de circulação social. Essa inserção no mundo letrado também tem que levar em consideração a gramática normativa. Ora, se é função da escola trazer o aluno aos contextos formais de uso da língua, tais como trabalho e universidade, é necessário instrumentalizar os aprendizes com as regras gramaticais desses contextos. Dessa maneira, mesmo os alunos que são provenientes de contextos culturais bastante diversos podem se encaixar em situações culturais prestigiadas pela sociedade. Esse também é um objetivo do ensino pautado pelo letramento. Como exemplo, podemos trazer a realidade de crianças de comunidades extremamente pobres que muitas vezes veem os ambientes formais de uso da língua como muito distantes, sem que possam vislumbrar a possibilidade de frequentar a universidade ou bons empregos. Sem que haja um bom trabalho de letramento na escola, é improvável que esses aprendizes atinjam as expectativas sociais de alunos universitários. Por isso, é dever da escola garantir o letramento para proporcionar uma transformação social através da educação. 6 Esse processo de transformação através do ensino é conhecido pela palavra de língua inglesa emporwerment, ou seja, empoderamento. Por essa perspectiva, é função do ensino garantir que os alunos se apoderem gradativamente, de maneira que eles possam ascender socialmente. Para que um professor de língua materna possa atuar nessa missão é necessário que ele tenha um bom conhecimento das variações linguísticas e também da noção de preconceito linguístico. Esses dois conceitos são amplamente estudados pela Sociolinguística e serão abordados pelos nossos próximos tópicos, então vamos lá! 2 - Variação Linguística Como vimos na unidade II, na obra “Curso de Linguística Geral”, o linguista genebrino Ferdinand de Saussure, considerado por muitos como o pai da Linguística, estabeleceu dicotomias que acabaram por advogar uma Linguística centralmente preocupada com questões estruturais e abstratas que, de alguma maneira, negligenciava a parte mais concreta e funcional da língua. Conforme já vimos na unidade 2, o pensamento saussuriano foi bastante relevante para inaugurar a ciência linguística enquanto disciplina autônoma e iniciar todos os estudos que desenvolvemos hoje. Contudo diversos linguistas sentiram a necessidade de explorar mais profundamente a natureza da língua e desenvolver estudos que não só atendessem à porção estrutural da linguagem, mas que colocassem em foco a relação língua e uso. Dois grandes linguistas que iniciaram essa missão foram Eugenio Coseriu e William Labov. O primeiro é romeno, mas lecionou por muitos anos no Uruguai e Alemanha e o segundo é norte-americanoe atua na Universidade da Pensilvânia nos Estados Unidos da América, uma das melhores universidades deste país. Coseriu apresentou uma tríade que de alguma maneira sobrepunha a dicotomia de Saussure, língua e fala. Para Coseriu há uma tríade: sistema, norma e fala. O sistema se caracterizaria por todas as possibilidades que uma língua oferece, ou seja, seria um sistema abstrato de todas as combinações desde as fonéticas e às sintáticas possíveis em uma dada língua. Por outro lado, a norma seria que uma comunidade considerada certa, apropriado ou comum em relação a essas possibilidades. Por exemplo, observe as duas frases em português: • Eu estou estudando para a minha prova de Linguística na próxima semana. • Eu estou a estudar para a minha prova de Linguística na próxima semana. Perceba que as duas frases estão compreensíveis e são possíveis em língua portuguesa. Por outro lado, a primeira frase soa mais natural para um falante da língua portuguesa falada no Brasil. Então podemos concluir que as duas frases fazem parte do sistema da língua portuguesa, contudo somente a primeira faz parte da norma do português brasileiro. Ao mesmo tempo, você deve notar que a norma, de acordo com a perspectiva de Coseriu, é diretamente ligada à cultura da comunidade que fala a língua, porque nos exemplos que citamos acima você deve perceber que a segunda 7 frase, apesar de não fazer parte da norma brasileira, faz parte da norma do português falado em Portugal e em outros países da África. Por fim, Coseriu determina que a fala, a manifestação concreta e real da língua, também faz parte deste tripé. Então vemos nascer na Linguística uma preocupação com questões não apenas de ordem estrutural, mas também de ordem funcional, relativo ao uso. Já Labov foi o fundador de uma área da Linguística, chamada de Sociolinguística variacionista, que de maneira geral estuda as variações da língua a partir de diversas camadas sociais, determinadas por variantes como gênero, idade, classe social, etnia, região geográfica etc. O trabalho de Labov teve uma importância muito grande porque demonstrou que as diferentes variações linguísticas faladas por diversas classes sociais, independentemente de seu poder aquisitivo apresentavam regras e poderiam ser entendidas como um sistema complexo. Alguns contemporâneos de Labov, como o britânico Bernstein nos seus primeiros trabalhos, advogavam que a língua dos alunos suburbanos de Londres era restrita e demonstrava problemas de ordem cognitiva. Em resposta a trabalhos como este, Labov através de pesquisas numéricas demonstrou que, na verdade, todas as variantes apresentam complexidade. O método de Labov é bastante reconhecido na área de Linguística e continua inspirando vários trabalhos de sociolinguística variacionista. Você pode encontrar os 5 princípios do método laboviano na página 109 do seu livro texto. Depois de entender como e por que motivos a Linguística começou a se preocupar mais intensamente com a relação entre língua e sociedade, vamos nos concentrar agora em compreender os termos que usamos para falar de variações linguísticas. Primeiramente, é necessário que você compreenda três conceitos básicos sobre variação linguística: • Variável: é qualquer elemento da língua que se manifesta de forma diferente. Vamos pegar como exemplo a maneira que o “S” é pronunciado de forma diferente. Pense na forma que as pessoas nascidas no Recife e no Rio de Janeiro falam o “S” com um som semelhante ao “X”, “mexmo” e na maneira como as pessoas em São Paulo falam o “S”, “mesmo”. Então a letras “S” no português falado no Brasil é uma variável. • Variante: é cada forma diferente que temos de falar a mesma variável. Então o “s” com som de “X” (Recife e Rio de Janeiro) e o “s” com som de “S” (São Paulo) são dois exemplos de variantes. • Variedade linguística: é um conjunto de variantes normalmente escolhidas por pessoas que partilham o mesmo contexto social, econômico e geográfico. Por exemplo, quais seriam as características de um indivíduo escolarizado que nasceu no Recife? A resposta a esse questionamento nos traria a variedade linguística desse contexto cultural. 8 Agora vamos pensar na seguinte pergunta: por que a língua varia? Bom, há diversos motivos que fazem a língua variar. Dentre eles a história! Quando vimos a dicotomia, sincronia e diacronia, pudemos constatar esse aspecto. Portanto um dos tipos de variação é a variação diacrônica. Vejamos agora as variações sincrônicas: Variações diatópicas ou regionais: são aquelas relativas ao lugar em que moramos. Observe mais uma vez a letra da música do grupo musical “Cordel do Fogo Encantado” e veja as variações diatópicas: Ai se sesse por Cordel do fogo encantado Se um dia nois se gostasse Se um dia nois se queresse Se nois dois se empareasse Se juntim nois dois vivesse Se juntim nois dois morasse Se juntim nois dois drumisse Se juntim nois dois morresse Se pro céu nois assubisse Mas porém acontecesse de São Pedro não abrisse a porta do céu e fosse te dizer qualquer tulice E se eu me arriminasse E tu cum eu insistisse pra que eu me arresolvesse E a minha faca puxasse E o bucho do céu furasse Tarvês que nois dois ficasse Tarvês que nois dois caisse E o céu furado arriasse e as virgi toda fugisse (Disponível em: http://letras.com/cordel-do-fogo-encantado/78514/) Variações diastráticas ou sociais: são aquelas relacionadas à camada ou grupo social a que o falante faz parte. Veja esse vídeo, que dura 2 minutos e 21 segundos, aqui o humorista Marcos Luque tenta de maneira humorística representar a fala de motoboys paulistanos. (https://www.youtube.com/watch?v=_TKqS56L5eM) Variações diamésicas (oralidade ou escrita): são as variações relativas à modalidade que utilizamos, se oral ou escrita. Observe o texto abaixo e perceba como há uma tentativa de representar a linguagem oral, mesmo no texto escrito: Diálogo da modernidade Alô? Quem tá falando? – É o ladrão! – Desculpe, eu não queria falar com o dono do banco. Tem algum funcionário aí? – Não, os funcionário tá tudo como refém! 9 – Eu entendo. Trabalham quatorze horas por dia, ganham um salário ridículo, vivem levando esporro, mas não pedem demissão porque não encontram outro emprego, né? Vida difícil. Mas será que eu não poderia dar uma palavrinha com um deles? – Impossível!!! Eles tá tudo amordaçado! – Foi o que pensei. Gestão moderna, né? Se fizerem qualquer crítica, vão pro olho da rua. Não haverá, então, algum chefe por aí? – Claro que não, meu amigo! Quanta inguinorânça! O chefe tá na cadeia, que é o lugar mais seguro pra se comandar um assalto. – Bom… Sabe o que que é? Eu tenho uma conta… – Tamo levando tudo, ô bacana, o saldo da tua conta é zero! – Não, isso eu já sabia. Eu sou professor. O que eu queria mesmo era uma informação sobre juro. – Companheiro, eu sou um ladrão pé-de-chinelo. Meu negócio é pequeno. Assalto a banco, vez ou outra um seqüestro. Pra saber de juro é melhor tu ligar pra Brasília!!! – Sei, sei. O senhor tá na informalidade, né? Também, com o preço que tão cobrando por um voto hoje em dia… Mas, será que não podia fazer um favor pra mim? É que eu atrasei o pagamento do cartão e queria saber quanto vou pagar de taxa. – Tu tá pensando que eu tô brincando? Isso é um assalto manooo!!! – Longe de mim. Que é um assalto, eu sei perfeitamente. Mas queria saber o número preciso. Seis por cento, sete por cento? – Eu acho que tu não tá entendendo, ô mané. Sou assaltante!!! Trabalho na base da intimidação e da chantagem, saca? ?? – Ah, já tava esperando. Vai querer vender um seguro de vida ou um título de capitalização, né? – Não… Eu… Peraí, bacana, que hoje eu tô bonzinho e vou quebrar o teu galho. Um minuto depois … – Alô? O sujeito aqui tá dizendo que é oito por cento ao mês. – Puxa, que incrível! – Tu achava que era menos? – Não, achava que era isso mesmo. Tô impressionado é que, pela primeira vez na vida, consegui obter uma informação de uma empresa prestadora de serviço,pelo telefone, em menos de meia hora e sem ouvir “Pour Elise”!!! – Quer saber? Fui com a tua cara. Dei umas bordoadas no gerente e ele falou que vai te dar um desconto. Só vai te cobrar quatro por cento, tá ligado? – Não acredito! E eu não vou ter que comprar nenhum produto do banco? – Nadica. Tá acertado! – Muito obrigado, meu senhor. Nunca fui tratado dessa… – Ih, sujou! (tiros, gritos) A polícia…!!! – Polícia? Que polícia? Alô? Alô? (Sinal de ocupado!) – Alô?… Droga! P… Maldito Estado! Sempre intervindo nas relações entre homens de bem! (Disponível em: http://mesquita.blog.br/cronicas-dialogos-da-modernidade) 10 Variações diafásicas ou de estilo: são aquelas relacionadas ao estilo. Se o falante quer ser formal ou informal, polido ou rude etc. Vejam o seguinte exemplo como o autor do texto se utiliza de expressões bastante particulares para expressar formalidade: Prezado(a) Senhor(a), De acordo com a indicação do Sr. José dos Santos, envio meu currículo para avaliação. Há cinco anos atuo na área de promoção e markerting da empresa Faculdade do Momento, desenvolvendo projetos de divulgação de marca na área educacional e também na organização de eventos para o público interno e externo da empresa. Neste momento, busco novos desafios no mercado de trabalho, visando o desenvolvimento da minha carreira e gerando de resultados, para possibilitar crescimento qualitativo e quantitativo para os envolvidos. Agradeço a atenção e coloco-me ao inteiro dispor para contato pessoal. Assinatura (Disponível em: http://sereduc.com/Ug5LeG) Acima pudemos ver os principais tipos de variação linguística. Esses também, como já dissemos, são os principais motivos pelos quais as línguas variam! É importante para o linguista e também para o professor de línguas observarem todas essa questões relacionadas à variação a fim de evitar posicionamentos preconceituosos e equivocados em relação à língua das pessoas. Para abordar o tema do preconceito linguístico e concluir o nosso módulo de Linguística 1, vamos nos dedicar à leitura do texto do linguista brasileiro Sírio Possenti, da Universidade Estadual de Campinas: http://cienciahoje.uol.com.br/colunas/palavreado/preconceito-linguistico Com isso, concluímos nossa primeira disciplina de Linguística. Os conhecimentos aqui adquiridos serão fundamentais em nossa vida de professores e nas próximas disciplinas de Linguística. Vale a pena sempre reler o material do nosso curso, fazer os exercícios e buscar mais leituras a respeito dos temas de que tratamos. Bom descanso e até o próximo curso – Linguística II.
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