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PATOLOGIA Ana Paula Aquistapase Dagnino Inflamação: processos agudos e crônicos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Reconhecer que a inflamação é uma resposta inespecífica do sistema imunológico contra agentes patogênicos que podem provocar lesões em tecidos e células. Identificar e descrever os sinais cardinais da inflamação. Diferenciar inflamação aguda e crônica. Introdução A inflamação é uma reação de proteção gerada pelo nosso organismo em resposta a um agente agressor. A inflamação visa proteger o corpo contra a lesão celular provocada por microrganismos e suas toxinas, assim como uma possível consequência de necrose. Mediadores essenciais da resposta inflamatória são as células fagocitárias, os macrófagos e neutrófilos, as proteínas do sistema complemento e os anticorpos. Esses mediadores são enviados ao local lesionado ou necrótico, são ativados e atuam com o objetivo de eliminar os microrganismos nocivos. O processo da inflamação é fundamental para o reconhecimento da infecção e para a cicatrização de feridas. Neste capítulo, você compreenderá a complexidade da resposta inflamatória, com a ação essencial de células da imunidade inata, como macrófagos, neutrófilos, células natural killers, células dendríticas e células epiteliais. A ação anti-inflamatória dessas células em conjunto com o papel desempenhado pelas proteínas do sistema complemento é primordial para a destruição dos agentes patogênicos. Os sinais clássicos da infla- mação serão descritos e vinculados com as distintas etapas que ocorrem durante a inflamação aguda. Você entenderá também que a inflamação aguda poderá progredir para uma inflamação crônica se não for resolvida. 1 Inflamação Nosso organismo conta com um arcabouço de células que constituem a resposta imunológica para os distintos tipos de microrganismos aos quais podemos estar expostos e que podem provocar danos celulares e teciduais. Em um primeiro contato com um microrganismo, nosso corpo tenta eliminá-lo através de bar- reiras epiteliais existentes na pele e nos tratos gastrointestinal e respiratório. Diante de um cenário em que o agente patogênico rompe essas barreiras, as células do sistema imunológico natural, também denominado de imunidade inata ou inespecífi ca, reagirão contra os microrganismos com a ativação da infl amação e da defesa antiviral. De acordo com Abbas, Lichtman e Pillai (2011, p. 485) “[…] a infl amação é defi nida como uma reação complexa à infecção, exposição a toxinas ou dano celular que envolve o acúmulo extravascular de proteínas plasmáticas e leucócitos”. A inflamação é uma resposta inespecífica aos microrganismos, ou seja, manifesta-se de uma maneira igual contra diferentes agressores patogênicos, independentemente de seu tipo. Na inflamação, há o recrutamento de leucócitos e de proteínas do plasma para os tecidos. Entre as células recrutadas, existem dois principais tipos de leucócitos, os neutrófilos e os monócitos (ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2011). Os neutrófilos induzem uma resposta rápida e de curta duração, já que sua meia-vida média corresponde a 6 horas. Durante uma resposta inflamatória, a medula óssea produz uma grande quantidade de neutrófilos que chegam ao tecido em resposta a citocinas inflamatórias. Os mecanismos pelos quais os neutrófilos atuam na imunidade inata e colaboram com a inflamação são des- critos a seguir (ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2011; BARRETT et al., 2014). Os neutrófilos aderem à superfície endotelial por meio da ligação entre a molécula de adesão integrina presente nos neutrófilos e a molécula de adesão presente no endotélio, a selectina. Então, pelo processo de diapedese, entram nos vasos sanguíneos, passando entre as células endoteliais. Os neutrófilos são atraídos por quimiocinas para a área infectada, em um processo denominado quimiotaxia. A quimiotaxia ocorre pela ação de agentes quimiotáticos como a proteína C5a do sistema complemento, leucotrienos e polipeptídeos de leucócitos (linfócitos, mastócitos e basófilos). Os neutrófilos possuem grânulos com substâncias ativas, como prote- ases e defensinas, estas descarregadas por meio da exocitose sobre os Inflamação: processos agudos e crônicos2 vacúolos fagocíticos, promovendo uma ação antimicrobiana sobre os microrganismos fagocitados. Outra substância é a elastase, que age no colágeno, destruindo os agentes patogênicos. A defesa realizada pelo neutrófilo também decorre da formação de agentes oxidantes e bactericidas (O2 e H2O2), pela ação das enzimas NADPH oxidase e superóxido dismutase (SOD-1) liberadas pelo neu- trófilo. Já a enzima mieloperoxidase é responsável pela formação dos ácidos oxidantes HOCl, HOBr, entre outros. Na Figura 1, é possível identificar como é realizado o recrutamento de neutrófilos para os locais de inflamação. Figura 1. Etapas da migração de neutrófilos. As etapas são constituídas por rolamento, ativa- ção, adesão, perfuração do endotélio e, por fim, migração em direção aos quimioatraentes. Fonte: Kumar, Abbas e Aster (2016, p. 156). Os macrófagos, assim como os neutrófilos, são fagócitos com a função primária de identificação dos microrganismos. Os monócitos amadurecem e se transfor- mam em macrófagos no tecido. Essas células fagocíticas possuem receptores de reconhecimento, são ativadas e, posteriormente, englobam o agente patogênico e o ingerem. Os macrófagos também possuem outros receptores que se ligam a moléculas dos microrganismos, ativando mecanismos de destruição por meio da produção de radicais reativos (oxigênio e nitrogênio), além de enzimas lisossômicas. Outro mecanismo importante para o combate aos microrganismos é a produ- ção de citocinas por macrófagos e células dendríticas (ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2011). Além das estratégias dos macrófagos para destruir os micror- 3Inflamação: processos agudos e crônicos ganismos, essas células também atuam na reparação do tecido e na secreção de mediadores inflamatórios, essenciais para o início da resposta imune adaptativa ou inata. Os macrófagos atuam no processamento de microrganismos e na apresentação de antígenos para os linfócitos T nos órgãos linfoides. Essa mesma função de apresentação de antígenos é realizada também por células dendríticas epiteliais (ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2011; HAMMER; MCPHEE, 2016). Os mediadores inflamatórios possuem fontes distintas. Os mediadores derivados de células estão pré-formados em grânulos e são produzidos no local inflamado. Os mediadores derivados de proteínas plasmáticas são pro- duzidos, principalmente, pelo fígado e circulam livres pelo plasma em sua forma inativa, sendo ativados no local da inflamação. No Quadro 1, estão descritas as principais ações e fontes dos mediadores inflamatórios durante a inflamação (KUMAR; ABBAS; ASTER, 2013). Mediador Fonte(s) Principais ações Derivados de células Histamina Mastócitos, basófilos, plaquetas Vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular, ativação endotelial Serotonina Plaquetas Vasoconstrição Prostaglandinas Mastócitos, leucócitos Vasodilatação, dor, febre Leucotrienos Mastócitos, leucócitos Aumento da permeabilidade vascular, quimiotaxia, adesão e ativação de leucócitos Fator ativador plaquetário Leucócitos, mastócitos Vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular, aderência de leucócitos, quimiotaxia, desgranulação, explosão oxidativa Quadro 1. Mediadores inflamatórios e suas ações durante a inflamação (Continua) Inflamação: processos agudos e crônicos4 Fonte: Adaptado de Kumar, Abbas e Aster (2013 ). Mediador Fonte(s) Principais ações Espécies reativas do oxigênio Leucócitos Destruição de micróbios, lesão tecidual Oxido nítrico Endotélio, macrófagos Relaxamento do músculo liso vascular, morte de micróbios Citocinas (TNF, IL-1 IL-6) Macrófagos, células endoteliais, mastócitos Local: ativação endotelial (expressão de moléculas de adesão); Sistêmica: febre, anormalidades metabólicas, hipotensão (choque). Quimiocinas Leucócitos, macrófagos ativados Quimiotaxia, ativação de leucócitos Derivados de proteínas plasmáticas Complemento Plasma (produzido no fígado) Ativação e quimiotaxia de leucócito, opsonização (MAC), vasodilatação (estimulação de mastócito) Cininas Plasma (produzido no fígado) Aumento de permeabilidade vascular, contração do músculo liso, vasodilatação, dor Proteases ativadas durante a coagulação Plasma (produzido no fígado) Ativação endotelial, recrutamento de leucócitos IL-1, IL-6, interleucinas 1 e 6; MAC, complexo do ataque à membrana; TNF, fator de necrose tumoral. Quadro 1. Mediadores inflamatórios e suas ações durante a inflamação (Continuação) 5Inflamação: processos agudos e crônicos Os mastócitos atuam nas respostas inflamatórias com início depen- dente de imunoglobulinas IgG e IgE, combatendo os parasitas que in- vadem o tecido. Também atuam na resposta imune inata inespecífica, liberando TNF-α para o combate a infecções (HAMMER; MCPHEE, 2016). As células natural killer, ou NK, são recrutadas para o local da inflamação e são responsáveis pela citotoxicidade mediada por células anticorpo- -dependentes. Para realizar essa função, as células NK ligam-se, através de seus receptores de membrana, para as imunoglobulinas IgG, que estão revestindo a substância estranha, desencadeando citólise (HAMMER; MCPHEE, 2016). O agente patogênico pode ser resistente às respostas celulares no tecido, podendo entrar posteriormente no sangue. Como resposta, o microrganismo é reconhecido pelas proteínas plasmáticas recrutadas durante a inflama- ção. As principais proteínas plasmáticas são as do sistema complemento. As proteínas da via alternativa do complemento possuem a capacidade de lisar os agentes patogênicos, além de servirem como revestimento atuando como opsoninas, facilitando a ação de células fagocíticas (opsonização). Também são responsáveis pela defesa contra os agentes nos locais de infecção em tecidos extravasculares. Quando o sistema do complemento é ativado, há a produção das anafilotoxinas C3a, C4a e C5a que atuam sobre os mastócitos, estimulando a liberação de histamina. Essa substância é responsável pelo aumento da permeabilidade dos vasos sanguíneos, juntamente com a bradicinina (ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2011; HAMMER; MCPHEE, 2016). Durante a resposta inf lamatória, citocinas pró-inflamatórias (IL-1, IL-6, IFN-γ e TNF-α) são responsáveis pelo desenvolvimento de febre, de sinais de inflamação, bem como pelo desencadeamento de respostas catabólicas (HAMMER; MCPHEE, 2016). A Figura 2 apresenta os com- ponentes da inflamação encarregados da resposta inflamatória aguda e crônica. Inflamação: processos agudos e crônicos6 Figura 2. Inflamações agudas e crônicas possuem diferentes componentes que têm o objetivo de eliminar o patógeno que está causando a infecção ou a lesão tecidual. Durante a resposta inflamatória, células como macrófagos, neutrófilos, mastócitos e linfócitos são recrutadas e desencadeiam a inflamação por meio da liberação de mediadores químicos. Células endoteliais, proteínas da matriz extracelular e fibroblastos induzem a inflamação por meio da secreção de citocinas e óxido nítrico e o reparo tecidual. Fonte: Kumar, Abbas e Aster (2013, p. 30). 2 Sinais cardinais da inflamação Os sinais cardinais da infl amação são reconhecidos há séculos e são os seguin- tes: rubor (vermelhidão, eritema), tumor (inchaço), calor, dor e perda de função. Esses sinais clínicos clássicos da infl amação foram descritos primeiramente em um papiro egípcio em 3000 a.C. e, posteriormente, pelo escritor romano Celsus, do primeiro século depois de Cristo. Já no século XIX, Rudolf Vir- chow descreveu o quinto sinal da infl amação, a perda de função (HAMMER; MCPHEE, 2016; KUMAR; ABBAS; ASTER, 2016). A inflamação apresenta distintas fases que definem os sinais clínicos desse processo. O edema é ocasionado pelo aumento do número de células inflamatórias e da quantidade de líquido no local. O calor, o rubor e o inchaço são ocasionados pela dilatação dos vasos sanguíneos, por hiperemia arterial, pelo alto fluxo arterial e pelo aumento do número de eritrócitos, com posterior aumento da temperatura no local. Já a dor é originada pela ação dos mediadores inflamatórios sobre os 7Inflamação: processos agudos e crônicos leucócitos, que liberam metabólitos tóxicos e proteases, gerando dano ao tecido. Esse dano leva à dor devido à liberação de prostaglandinas, neuropeptídios e citocinas. Por fim, a perda de função é secundária ao inchaço e à dor, que impedem o movimento e tornam difíceis qualquer atividade do local com a inflamação (HAMMER; MCPHEE, 2016; KUMAR; ABBAS; ASTER, 2016). As reações celulares e vasculares da inflamação aguda são descritas na Figura 3. Figura 3. Diferenças entre o tecido normal e o tecido apresentando reações celulares durante a inflamação aguda. No tecido inflamado, ocorre eritema e calor pela dilatação dos vasos e pelo aumento do fluxo sanguíneo, além de edema devido ao extravasamento de líquido e proteínas do plasma. Neutrófilos são recrutados e acumulam-se no local da lesão. Fonte: Kumar, Abbas e Aster (2013, p. 31). Inflamação: processos agudos e crônicos8 O desenvolvimento patológico tem sido associado ao desequilíbrio dos sinais cardinais. Doenças cardiovasculares como aterosclerose, assim como pancreatite, hepatite crônica, doenças inflamatórias intestinais (Doença de Crohn e colite ulcerosa), câncer, asma e artrite são correlacionadas com uma resposta inflamatória aguda excessiva ou falha dessa resposta, gerando efeitos nocivos para o organismo do indivíduo. A doença de Gra- ves, uma enfermidade autoimune, é caracterizada por uma disfunção da glândula tireoide (hipertireoidismo), além de bócio e de oftalmopatia. Algumas vezes, o mixedema (edema firme) pré-tibial e o eritema podem estar presentes em pacientes com essa doença. Na Figura 4, são obser- vados o mixedema e o eritema, apresentações clínicas da inflamação na doença de Graves (BRUINSTROOP et al., 2019; FREIRE; VAN DYKE, 2013; HANNOODEE; NASURUDDIN, 2020; TOMÁS-VELÁZQUEZ; PANADERO MESEGUER; AGUADO, 2019). Figura 4. Relatos de casos de dois pacientes com doença de Graves. (a) Mixedema pré-tibial com placas vermelhas alaranjadas na doença de Graves. (b) Análise histológica da biópsia da pele. O indivíduo apresenta a derme reticular com deposição de mucopolissacarídeo. Imagem am- pliada 10 vezes. (c) Placas eritematosas e inchaço na área pré-tibial bilateral. (d) Análise histológica por coloração com hematoxilina-eoxina, com infiltração inflamatória perivascular polimórfica. Fonte: (a) e (b) Bruinstroop et al. (2019, documento on-line); (c) e (d) Tomás-Velázquez, Panadero Meseguer e Aguado (2019, p. 655). O edema pode ser causado por doenças sistêmicas ou localizadas. Como causas sistêmicas, temos doenças cardíacas, hepáticas e renais, assim como reações alérgicas, urticária e angioedema. Entre as causas localizadas, estão celulites, insuficiência venosa crônica, trombose venosa profunda, obstrução da veia ilíaca e lipedema. Na doença cardíaca, o edema é ocasionado pela permeabilidade capilar aumentada devido à hipertensão 9Inflamação: processos agudos e crônicos venosa sistêmica e pelo aumento do volume plasmático (Figura 5a). Na celulite, a permeabilidade capilar aumentada ocasiona o edema (Figura 5b) (TRAYES et al., 2013). Figura 5. (a) Edema pontual bilateral em paciente com insuficiência cardíaca congestiva. (b) Trombose venosa profunda aguda com celulite sobrejacente. Fonte: Trayes et al. (2013, p. 107). 3 Inflamação aguda e crônica A indução da infl amação aguda é o principal mecanismo da resposta imune inata para combater infecções e lesões teciduais. Ela é iniciada após o estímulo dos receptores de reconhecimento de antígenos das células do sistema imune residentes no tecido (macrófagos, mastócitos e células do endotélio), com posterior produção de citocinas e mediadores infl amatórios por essas células. A infl amação aguda é caracterizada por alterações vasculares, por edema e pela infi ltração das células e substâncias no sítio de infecção ou lesão descritas a seguir (ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2011; KUMAR; ABBAS; ASTER, 2016). Leucócitos: os neutrófilos são os principais leucócitos recrutados no início da defesa inata. À medida que o tempo passa, os macrófagos começam a se tornar proeminentes nesse recrutamento. Fluidos derivados do sangue e proteínas plasmáticas (anticorpos, proteí- nas de fase aguda e proteínas do sistema complemento): os componentes sanguíneos chegam até o sítio inflamatório por meio de três etapas principais, o aumento do fluxo sanguíneo, da adesão dos leucócitos ao endotélio e da permeabilidade de capilares e vênulas. Inflamação: processos agudos e crônicos10 Na inflamação aguda, a ocorrência do edema deve-se à abundância de f luido no tecido intersticial ou nas cavidades serosas. Esse f luido pode ser um exsudato ou um transudato. Assim, as células sanguíneas, as proteínas e os f luidos saem dos vasos sanguíneos e se deslocam para o tecido in- tersticial ou para as cavidades corporais, formando o f luido extravascular exsudato, formado pelo aumento dos espaços entre as células endoteliais e pela permeabilidade vascular. O pus é um exsudato inflamatório purulento, com excesso de leucócitos, células mortas e microrganismos. Por outro lado, um fluido extracelular com baixos níveis de proteína, poucas células e baixa gravidade específica é chamado de transudato, e o seu extrava- samento ocorre pelo aumento da pressão hidrostática ou pela redução da pressão osmótica. Na inflamação, há formação do exsudato. A Figura 6 demonstra a diferença entre exsudato e transudato, que podem formar um edema (KUMAR; ABBAS; ASTER, 2016): Figura 6. Formação de exsudatos e transudatos. (a) Pressão hidrostática normal de, apro- ximadamente, 32 mm de Hg na porção terminal arterial de um leito capilar e de 12 mm de Hg na porção terminal venosa; a pressão osmótica coloidal média dos tecidos é de, aproximadamente, 25 mm de Hg, que é igual à pressão capilar média. Portanto, o fluxo total de líquido que passa através do leito vascular é quase nulo. (b) Extravasamento de exsudato. (c) Extravasamento de transudato. Fonte: Kumar, Abbas e Aster (2016, p. 153). 11Inflamação: processos agudos e crônicos A vasodilatação é estimulada por mediadores inflamatórios como a hista- mina, liberados nos músculos lisos vasculares. Em seguida, ocorre aumento na permeabilidade dos vasos, extravasamento de fluido, diminuição do fluxo sanguíneo, adesão dos leucócitos ao endotélio e seu extravasamento para o tecido intersticial. A Figura 7 mostra os mecanismos responsáveis pela permeabilidade aumentada das vênulas pós capilares. Figura 7. Permeabilidade vascular na inflamação. (a) Permeabilidade vascular normal. (b) Permeabilidade aumentada pela contração das células endoteliais induzida pela ação da histamina, da bradicinina, dos leucotrienos, entre outros mediadores químicos. Com resposta transitória imediata, de 15–30 minutos. (c) Permeabilidade aumentada pela lesão do endotélio devido a lesões graves, como queimaduras, ou pelo efeito de agentes patogênicos e suas toxinas, com possível ampliação da lesão por ação dos neutrófilos. A resolução do extravasamento leva horas até o reparo ou trombose dos vasos. Fonte: Kumar, Abbas e Aster (2016, p. 154). Inflamação: processos agudos e crônicos12 Os mediadores da inflamação começam e regulam as reações infla- matórias e são produzidos por diferentes tipos de células. A seguir, estão descritos os principais mediadores da inflamação aguda (KUMAR; ABBAS; ASTER, 2016). Histamina — Liberada primariamente durante a infl amação, é encontrada em mastócitos, basófi los e plaquetas. É liberada diante de estímulos como lesão física, ligação de anticorpos aos mastócitos e presença de anafi lo- toxinas. Sua função é dilatar as arteríolas, aumentando a permeabilidade das vênulas. Leucotrienos — São sintetizados por mastócitos e leucócitos. Os leucotrienos possuem funções variadas e importantes, como de potente agente quimiotático, geração de espécies reativas do oxigênio, liberação de enzimas lisossômicas (LTB4) ou ocasionando vasoconstrição, broncoespasmo e aumento da per- meabilidade (LTC4, LTD4 e LTE4). Produtos de ativação do complemento — As proteínas do complemento na forma inativa estão no plasma e tornam-se ativas com função proteolítica. Os produtos da clivagem pelas proteínas ativas proporcionam aumento da permeabilidade vascular, quimiotaxia e opsonização. Prostaglandinas — São produzidas por muitos tipos celulares, como mastóci- tos, macrófagos e células endoteliais. Possuem efeitos locais, onde a PGD2 e a PGE2 têm a função de aumento da vasodilatação e permeabilidade, promovendo a formação do edema. As prostaglandinas também têm papel na patogênese da dor e da febre. Citocinas — São sintetizadas por macrófagos, linfócitos, células den- dríticas ativadas, células epiteliais e endoteliais. As diferentes citocinas possuem muitas funções, como recrutamento de leucócitos, ativação de macrófagos, aumento da produção de IFN-γ, além da estimulação da secreção de outras citocinas e da expressão de moléculas de adesão. A Figura 8 traz a descrição dos efeitos das principais citocinas que atuam na inflamação aguda. 13Inflamação: processos agudos e crônicos Figura 8. As citocinas TNF e IL-1 produzem efeitos locais, com o aumento da permeabilidade dos vasos e o recrutamento de leucócitos para o local da lesão. As citocinas TNF, IL-1 e IL-6 induzem efeitos protetores sistêmicos em órgãos como o cérebro, o fígado e a medula óssea. Contudo, efeitos patológicos sistêmicos também podem ser observados no coração, nos vasos sanguíneos e em tecidos como o músculo esquelético. Fonte: Kumar, Abbas e Aster (2013, p. 48). A inflamação crônica ocorre em resposta à continuidade da infecção ou da ocorrência da lesão do tecido por tempo prolongado. Caso a inflamação aguda não evolua para os desfechos de regeneração ou cicatrização do tecido, poderá evoluir para a cronicidade. Dessa maneira, a inflamação crônica se desenvolve posteriormente à inflamação aguda ou pode começar de maneira insidiosa, latente e com uma reação de baixo grau. Nesse tipo de inflama- ção, tanto células da imunidade inata quanto da imunidade adaptativa estão envolvidas, e macrófagos, linfócitos e plasmócitos são recrutados e ativados. Eventos de angiogênese e fibrogênese participam do remodelamento do sítio inflamatório, como tentativas de reparo do tecido. Na inflamação crônica, as células inflamatórias envolvidas podem levar à destruição tecidual (ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2011; KUMAR; ABBAS; ASTER, 2016). Na inflamação crônica, as células mais proeminentes são os macrófagos, atuando de diversas maneiras diferentes (Figura 9). Os macrófagos secretam citocinas e fatores de crescimento que destroem os agentes patogênicos ou ativam células como os linfócitos T, entre outras. Como podemos observar na Inflamação: processos agudos e crônicos14 Figura 9, os macrófagos podem ser ativados pelas vias clássica e alternativa. Os macrófagos são classicamente ativados (macrófagos M1) por produtos microbianos, por substâncias estranhas e por IFN-γ liberado por outras célu- las, sendo essenciais para muitas reações inflamatórias. Quando ativados de maneira alternativa (macrófagos M2) por IFN-γ, IL-4 e IL-13, os macrófagos atuam no reparo do tecido através da secreção de fatores de crescimento, induzindo angiogênese, ativação de fibroblastos, além de estímulo à produção de colágeno (KUMAR; ABBAS; ASTER, 2016). Figura 9. Ativação clássica e alternativa de macrófagos. Fonte: Kumar, Abbas e Aster (2016, p. 187). Os macrófagos também induzem lesão tecidual na inflamação crônica, pro- movendo reações inflamatórias através da secreção de TNF, IL-1, quimiocinas e eicosanoides. Os macrófagos ativados promovem o recrutamento de outras células importantes na inflamação crônica, os linfócitos, especialmente envolvidos na inflamação granulomatosa. Os linfócitos T CD4+ induzem diferentes tipos de inflamação por meio da ativação clássica de macrófagos, ativação de eosinófilos e secreção de quimiocinas com recrutamento de monócitos e neutrófilos. A interação entre macrófagos e linfócitos é primordial para a propagação da infla- mação crônica, como demonstra a Figura 10 (KUMAR; ABBAS; ASTER, 2016). 15Inflamação: processos agudos e crônicos Figura 10. Interação entre macrófagos e linfócitos na inflamação crônica. Fonte: Kumar, Abbas e Aster (2016, p. 189). Na inflamação crônica, outras células são amplamente distribuídas: os mastócitos, eosinófilos e neutrófilos. Suas respectivas atuações são descritas a seguir (KUMAR; ABBAS; ASTER, 2016). Mastócitos: em reações de hipersensibilidade imediata. Eosinófilos: em reações imunológicas mediadas por IgE e em infecções parasitárias. Neutrófilos: em osteomielite e na lesão induzida pelo tabaco nos pulmões. São diferentes as causas da inflamação crônica, destacando-se: 1. infecções persistentes ocasionadas por microrganismos que induzem a hipersensibilidade do tipo tardia, com inflamação caracterizada, muitas vezes, por reação granulomatosa; 2. doenças de hipersensibilidade (autoimune e alérgicas) em que o sis- tema imunológico pode atuar contra os tecidos do próprio indivíduo, de forma errônea ou exacerbada, ou estimular reações inesperadas a antígenos inofensivos; 3. exposição por longos períodos a substâncias exógenas ou endógenas com potencial tóxico, como a sílica, que ocasiona a doença pulmonar silicose, ou o colesterol, que leva à aterosclerose; 4. neoplasias com formação de tumores e doenças neurodegenerativas, como Alzheimer, diabetes tipo 2 e síndrome metabólica (KUMAR; ABBAS; ASTER, 2016). Inflamação: processos agudos e crônicos16 A inflamação crônica pode ser do tipo granulomatosa, em que há formação de granuloma, um nódulo de tecido inflamatório com um acúmulo das células mononucleares linfócitos T e macrófagos ativados, além de células epitelioides, com aspecto de células epiteliais. O desenvolvimento do granuloma é uma resposta ao combate a microrganismos de difícil eliminação. Na estrutura do granuloma, estão presentes as células gigantes multinucleares, onde macrófagos se fundem, formando o chamado sincício. Um exemplo são as células gigantes de Langerhans, com núcleo em forma de ferradura, encontradas no granuloma da tuberculose. O granuloma tuberculoso possui halo linfócitos, células gigantes de Langerhans e epitelioides, além da chamada necrose caseosa. A Figura 11 demonstra esse tipo de granuloma (KUMAR; ABBAS; ASTER, 2016). Figura 11. Granuloma tuberculoso característico com células gigantes de Langhans, células epitelioides, linfócitos e área de necrose central. Fonte: Kumar, Abbas e Aster (2016, p. 191). Existem dois diferentes tipos de granulomas, os imunes e os de corpos estranhos. Os granulomas imunes são ocasionados por uma resposta inflamatória dos linfócitos T que são ativados por macrófagos e produzem citocinas responsáveis pela ativação de outros linfócitos T e macrófagos. Já os granulomas de corpos estranhos formam-se ao redor de corpos estranhos talco ou suturas. Devido ao seu tamanho, esses corpos estranhos não podem ser fagocitados e não ativam uma reposta imunológica ou inflamatória (KUMAR; ABBAS; ASTER, 2016). O Quadro 2 mostra a inflamação granulomatosa como característica de várias doenças. 17Inflamação: processos agudos e crônicos Fonte: Adaptado de Kumar, Abbas e Aster (2016). Doença Causa Reação dos tecidos Tuberculose Mycobaterium tuberculosis Granuloma caseoso (tubérculo): foco de macrófagos ativos (células epitelioides), envoltos por fibroblastos, linfócitos, histiócitos, células gigantes de Langhan; necrose central com resíduos granulares amorfos; bacilos álcool-ácido resistentes. Hanseníase Mycobacterium leprae Bacilos álcool-ácido resistentes em ma- crófagos; granuloma não caseosos. Sífilis Treponema pallidum Goma sifilítica: lesão microscópica à ma- croscópica e parcialmente visível, parede circundante de histiócitos; infiltrado plas- mocitário; as células centrais são necróti- cas, sem perda do contorno celular. Doença da arranhadura do gato Bacilo gram-negativo Granuloma redondo ou estrelado con- tendo resíduos granulares centrais e neutrófilos reconhecíveis; células gigan- tes infrequentes. Sarcoidose Etiologia desconhecida Granulomas não caseosos com macrófa- gos ativos abundantes. Doença de Crohn Reação imune contra bacté- rias intestinais, possivelmente autoantígenos Granulomas não caseosos ocasionais na parede do intestino, com infiltrado inflamatório crônico denso. Quadro 2. Doenças com inflamação granulomatosa A inflamação possui a função elementar de proteção do organismo. Con- tudo, uma inflamação exacerbada é responsável pelo desenvolvimento de muitas doenças, como a artrite reumatoide. Por outro lado, doenças como leucemias e tumores metastáticos são desenvolvidas devido a uma inflamação deficiente, com carência de leucócitos. Dessa maneira, torna-se essencial a compreensão dos mecanismos envolvidos na inflamação aguda e crônica para a ampliação de possíveis alvos de tratamento. Inflamação: processos agudos e crônicos18 ABBAS, A. K.; LICHTMAN, A. H.; PILLAI, S. Imunologia celular e molecular. 7. ed. São Paulo: Elsevier, 2011. BARRETT, K. E. et al. Fisiologia médica de Ganong. 24. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014. BRUINSTROOP, E. et al. 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