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FASCICULO-3 (Curso Formação de Mediadores de Leitura-Demócrito Rocha)

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CURSO FORMAÇÃO DE 
mediadores de leitura
3 FASCÍCULO
Lílian Martins
A LEITURA
Literária
Gratuito!
34 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
A leitura da palavra não é apenas precedida pela 
leitura do mundo, mas por uma certa forma de 
“escrevê-lo” ou de “reescrevê-lo”, quer dizer, de 
transformá-lo através de nossa prática consciente. 
Paulo Freire, em A Importância de Ler.
Ao final, entenderá como esse gosto da 
leitura literária acompanha e estimula o 
desenvolvimento da prática leitora e como 
essas práticas podem criar condições para 
a formação de leitores mais críticos. 
Espero, sinceramente, que a partir de 
agora o seu olhar diante de uma obra literá-
ria seja outro, muito mais afetivo e disposto 
à aventura da entrega e do deleite que so-
mente a experiência com a linguagem lite-
rária pode nos oferecer. Está preparado(a)? 
Advirto logo: Você pode se apaixonar...
E se você ainda não se inscreveu em 
nosso curso gratuito, não perca tempo, to-
das os módulos, mesmo o(s) que você per-
deu, pode encontrar aqui:
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APRESENTAÇÃO
Caro(a) leitor(a), por meio deste módulo 
você terá um breve conhecimento sobre a 
Leitura Literária. 
No decorrer dos estudos, aprenderá a 
diferenciar um texto literário de outro que 
não pode ser entendido como literatura. 
Conhecerá também as razões pela escolha 
do trabalho com a leitura literária e o que 
a diferencia de outros tipos textuais para 
que possa atuar melhor como media-
dor(a) de leitura. 
Ao longo deste fascículo, você será 
capaz de identificar quais são os gêneros 
literários e a sua classificação. Em seguida, 
entenderá como funciona o ato de ler e as 
dimensões da leitura que perpassam muitos 
outros aspectos além do texto impresso. 
Desta forma, irá descobrir o porquê da 
leitura ser um instrumento de mudança 
social a partir da interação leitor-texto. 
Você compreenderá também a contri-
buição da leitura literária para a formação 
leitora e o que faz esse tipo de texto ser tão 
especial e mais adequado para desenvol-
ver o prazer de ler, o gosto pela leitura. 
Mágico, não é?
 CURSO FORMAÇÃO DE mediadores de leitura 35
1.
AFINAL, O QUE 
É MESMO ESSA 
LITERATURA?
A pergunta aparentemente singela traz 
uma dúvida bastante antiga de filósofos, 
estetas, críticos e historiadores. É por 
essa razão que qualquer tentativa de res-
pondê-la, de forma genérica, poderia nos 
fazer cair em erro, pois quando se fala em 
Literatura, ainda não há um consenso, 
portanto, mesmo os estudiosos preferem 
dizer somente sobre o seu conceito, evi-
tando, assim, a armadilha de sua possível 
definição. Vejamos: 
Desde a Antiguidade Clássica, já se per-
guntavam: o que é literatura? Esse vocábulo 
é originário do termo, em latim, littera que 
significa: “arte de escrever” e era utilizado 
para designar o ensino das primeiras letras. 
Ao escrever a Poética, Aristóteles diz: “a arte 
literária é mimese da realidade”. Posterior-
mente, este conceito foi revisto por Alfonso 
Reyes que defende mimese ser uma “imita-
ção de presença subjetiva, correspondente 
à coerência ou semelhança entre a casa que 
o arquiteto constrói e a que vislumbra em 
sua mente”. Desta forma, mimese não seria 
uma cópia, mas recriação em que o poeta 
(re-)cria, com seus próprios meios – a sua 
linguagem – um mundo à imagem e seme-
lhança do mundo real, porém que só exis-
te na experiência verbal. 
36 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
É importante lembrar que o conceito 
aristotélico se refere apenas à poesia, uma 
vez que a prosa literária como conhecemos, 
hoje, (conto, romance, novela e crônica) 
ainda não era cultivada. 
A partir do século XX, se irradiou a im-
portância da ficção como característica 
da Literatura por meio dos estudos de I. 
A. Richards, R. Ingarden, Günther Müller, 
W. Kayser, R. Wellek e Manfred Kridl. As 
origens desse conceito de Literatura como 
ficção remontam a Lessing e Goethe. Por 
isso, podemos dizer que Literatura é ficção 
se entendermos esses conteúdos como 
compostos das “imagens” deformadas e 
transfundidas do mundo real. Desta ma-
neira, se admite a equivalência entre ima-
ginação e ficção. 
Ficção:
criação artística (teatral, literária, 
cinematográfica) em que o(a) autor(a) 
faz uma leitura particular e original da 
realidade; prosa literária construída 
a partir de elementos imaginários 
baseados na realidade e/ou de 
elementos da realidade inseridos em 
um contexto imaginário.
 CURSO FORMAÇÃO DE mediadores de leitura 37
Metáfora: 
designação de um objeto ou qualidade 
mediante uma palavra que designa outro 
objeto ou qualidade que tem com o 
primeiro uma relação de semelhança.
A arte literária se define, portanto, 
como expressão dos conteúdos da imagi-
nação, conforme um duplo movimento de 
representação em que essas imagens ora 
seriam representações objetivas, ora repre-
sentações sensíveis da realidade expressas, 
muitas vezes, por meio de metáforas.
Nas últimas décadas, esse conceito tem 
se consolidado com contribuições de im-
portantes críticos como Tzvetan Todorov, 
Christopher Butler, Alvin B. Kernan e Stanley 
E. Fish. Assim, se entende que a literatura, e 
por extensão a arte literária, não se reduz a 
um mero texto de raso entretenimento, mas 
como bem exemplificou Massaud Moisés: 
A Literatura constitui uma forma de conhe-
cer o mundo e os seres humanos: convicta 
de ser acionada por uma “missão”, ela co-
labora para o desvendamento daquilo que 
todos nós, conscientemente ou não, perse-
guimos durante a existência. E, portanto, se 
a vida de cada um corresponde a um esfor-
ço persistente de conhecimento, superação 
e libertação, à Literatura cabe um lugar de 
relevo, como ficção expressa por meio de 
vocábulos polivalentes. (MOISÉS, 2012, p.28)
38 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
Diante do que foi salientado, você pode 
ainda perguntar: mas por que especifica-
mente o trabalho com a leitura literária 
é importante? Por que a escolha pelo texto 
literário e não outro? A resposta é: porque 
a leitura literária provoca e exige variados 
mecanismos de compreensão, podendo o 
texto literário dar vazão às mais variadas 
leituras, dependendo das potencialidades, 
características e gostos de cada indivíduo 
que o lê, justamente porque ele não apre-
senta restrições ou finalidades definidas 
e, sobretudo, por ser a linguagem literária 
multisignificativa, dialógica, capaz de 
provocar emoções diferentes em um 
mesmo leitor, dependendo, por exemplo, 
da sua leitura e/ou releitura. 
Para Rangel, quanto mais produtivo for 
o diálogo provocado pelo texto no leitor, 
mas proficiente será a leitura. Essa carac-
terística aplica-se diretamente à leitura lite-
rária porque:
[...] o texto comporta uma concepção que 
não se esgota nele mesmo, mas no diálogo 
que provoca com o leitor. O diálogo será tan-
to mais produtivo quanto mais o texto puder 
possibilitar condições de identificação do 
leitor com ele, considerando que o autor, ao 
criar o texto, não tem objetivo de conformar 
o leitor, mas de tê-lo como coprodutor, par-
ceiro, dando-lhe também possibilidades de 
criar outros textos. A obra, então, não é ape-
nas um objeto que apresenta uma visão de 
mundo acabado, mas um espaço que pode 
contribuir na formação do leitor reflexivo 
(RANGEL, 2009, p. 27). 
 
Proficiente: competente, capaz, mais 
preparado, que tira maior proveito.
 CURSO FORMAÇÃO DE mediadores de leitura 39
 
Outro aspecto relevante a se conside-
rar é que a leitura literária sempre irá exigir 
mais do leitor, seja pela observação ao rit-
mo de um poema ou aos traços psíquicos 
de determinada personagem, ou mesmo 
observando o que diz o narrador ou, ainda, 
percebendo o discurso semioculto conti-
do nasentrelinhas da narrativa. É por isso 
que os mecanismos cognitivos utilizados ao 
se ler um texto literário são maiores e, por 
conseguinte, exigem maior compreensão 
por parte do leitor. Por essa razão, muitas 
pessoas não compreendem determinados 
textos ou autores por os considerarem difí-
ceis ou, ainda, por não compreenderem sua 
mensagem. Dizem logo: “não gosto desse 
livro”, “não gosto desse autor!”
Entretanto, essa opinião pode mudar a 
partir do instante em que esse(a) leitor(a) 
iniciar um esforço individual de compreen-
são leitora ou quando puder contar com 
uma figura que pode fazer a diferença nesse 
processo de compreensão e reflexão tex-
tual, que é o mediador de leitura.
PUXANDO
PROSA
Literatura ou 
Bibliografia?
Agora, atenção: se a obra literária 
pressupõe a leitura, nem todo 
texto escrito se classifica como 
literário. Em razão de um mal-
entendido que passou a considerar 
literário todo e qualquer texto 
impresso que se destina à leitura, 
fala-se em “literatura médica”, 
“literatura política”, “literatura 
automobilística” etc. Entretanto, 
o que observamos com isso é 
um erro em razão da extensão 
do sentido da palavra “literatura”. 
Neste caso, o correto seria 
utilizar o termo “bibliografia” 
e deixar a Literatura para definir o 
tipo de texto em que, por meio da 
arte, a linguagem expressa seja pela 
palavra escrita, seja ela falada, não 
apenas um meio de comunicação, 
mas um objeto de admiração, 
como espaço da criatividade.
40 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
2.
OS GÊNEROS 
LITERÁRIOS
Todos os gêneros são bons, afora o gênero tedioso.
Voltaire
Este é um tema que interessa não apenas para a Teoria da 
Literatura, mas também para a História e Filosofia. Isso, em parte, 
se deve ao fato de que as doutrinas acerca dos gêneros literários 
se confundem com o início da história da Estética, da Filosofia e da 
própria crítica literária. 
A estrutura clássica compreendia três gêneros (Lírico, Dramático 
e Épico). Hoje, entretanto, quando à sua classificação, podemos 
dizer que os gêneros se dividem em: Prosa e Poesia. 
Essa atual classificação dos gêneros literários marca a expressão 
de dois modos fundamentais de o escritor ver o mundo e nos 
situarmos perante a realidade. O primeiro, a prosa, voltado para 
fora e o segundo, a poesia, para dentro. Ao lado deles temos as 
espécies e as formas. Para entendermos melhor, vejamos o quadro 
explicativo abaixo:
Gêneros Literários Espécies Formas
Poesia
Lírica
Épica
Soneto, ode, canção, 
elegia, vilancete, 
balada etc.
Poema, poemeto, 
epopeia.
Prosa -----------
Conto
Novela
Romance
 CURSO FORMAÇÃO DE mediadores de leitura 41
Ao contrário do que este quadro pode 
parecer, os gêneros literários e as suas 
respectivas espécies e formas não são es-
truturas fixas e estagnadas. Esta é apenas 
uma sugestão de organização, proposta 
por Massaud Moisés, em que não se exclui 
a ideia de que cada gênero pode incluir 
componentes de outro gênero, de uma 
de suas espécies ou formas. Ficaram de 
fora deste quadro, gêneros como o Teatro, 
a Crônica, o Ensaio, a Fábula, o Apólogo, 
entre outros, por se tratarem de formas 
híbridas ou paraliterárias. De nenhum 
modo, estas são consideradas menores 
e/ou menos literárias. Apenas, res-
peitamos aqui os postulados da 
escolha teórica do crítico men-
cionado anteriormente.
 É importante que, ao tra-
balharmos com a leitura dos 
gêneros literários, possamos 
utilizá-los levando em consi-
deração toda a sua poten-
cialidade e não apenas 
trabalhar exclusivamente 
seus aspectos formais. 
É muito comum encontrar-
mos os gêneros literários nos 
livros didáticos como sendo tex-
tos narrativos desestruturados em 
que quando se trata, por exemplo, 
de poesia, são trabalhados apenas os 
aspectos que se referem ao conceito de 
estrofes, verso, rima, desprezando a men-
sagem de seu conteúdo. Em outra circuns-
tância, este mesmo gênero é usado apenas 
para fins ortográficos ou gramaticais, mais 
uma vez, levando os leitores ao esvaziamen-
to do texto e se prendendo apenas aos as-
pectos formais que rapidamente são deco-
rados para, em seguida, serem esquecidos. 
Portanto, somente a partir do momento 
em que nós, leitores, estivermos prontos 
para uma transformação de nossa prática 
leitora no que diz respeito à leitura literária, 
quando nos sensibilizarmos e acreditarmos 
que a leitura é o caminho que nos leva a 
mundos infinitos, dentro e fora de cada um 
de nós, aí, sim, estaremos propiciando uma 
compreensão adequada da literatura seja 
ela em qualquer gênero.
PUXANDO 
PROSA
Durante a Antiguidade Clássica, a 
divisão feita por Aristóteles classificava 
as obras literárias pertencentes ao 
gênero lírico quando o “eu” interior 
do poeta nos passava uma emoção 
ou um estado de espírito com forte 
carga subjetiva. Considerando 
o gênero dramático tínhamos, 
fundamentalmente, os conflitos das 
relações humanas representados por 
atores por meio de palavras e gestos. 
Por fim, o gênero épico era uma 
narrativa de fundo histórico em que 
eram narrados os feitos históricos e os 
grandes ideais de um povo. A presença 
de um poeta observador voltado para o 
mundo exterior conferia a este gênero 
bastante objetividade.
42 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
sociais”. (2004, p.48) E isso ocorre por-
que, historicamente, os livros são 
usados como ferramentas contra 
a alienação cultural, política e 
social. Outrora, também já fo-
ram queimados, em razão do 
caráter insubmisso de seus 
conteúdos para as estruturas 
ditatoriais vigentes que, um 
dia, já consideraram obras 
como, por exemplo, Gabrie-
la, Cravo e Canela, de Jorge 
Amado, subversiva. 
Percebemos, com isso, 
que a prática da leitura sofre 
modificações de acordo com as 
transformações da sociedade. A 
humanidade cresce, expande seus 
horizontes e os livros impulsionam 
esse avanço a depender da sua pro-
posta educativa. 
Conforme Paviani, “ler é uma com-
petência óbvia e necessária para qual-
quer profissional, e a arte de ler demanda 
reflexão e uma certa dose de solidão, a fim 
de percorrer os segredos de um texto, que 
é capaz de oferecer o prazer de descobrir o 
ser das coisas ou as artimanhas da razão”. 
(2003, p. 113) Ele acrescenta ainda que os 
leitores de literatura são aqueles que 
sabem buscar a plenitude dos saberes, 
o conhecimento que ultrapassa as 
definições e as classificações da 
ciência e os minguados dados 
de uma informação objetiva. De 
fato, quem lê cria a possibilida-
de de efetivar o ato de conhecer 
e, portanto, além de aprender, 
adquire consciência de que está 
3.
O ATO DE LER E AS 
DIMENSÕES DA 
LEITURA
Nós sabemos que a leitura não se limita a 
uma simples decodificação de códigos e 
linguagens, ela vai além, pois o leitor preci-
sa interagir com o que lê, atribuindo senti-
do às coisas. Dessa maneira, a leitura é um 
ato abrangente que articula as várias di-
mensões do ser humano: imaginativa, sen-
sorial, afetiva, intuitiva, inteligível, cultural, 
lógica etc. Essas dimensões articuladas 
com o desenvolvimento cognitivo do pen-
samento, a partir do ato de ler, faz descor-
tinar um novo horizonte na vida do indiví-
duo que, através do texto, se transforma 
em leitor(a) e amplia sua compreensão de 
mundo. Assim, a leitura promove também 
o desenvolvimento intelectual, podendo 
ressignificar a vida pessoal do sujeito, pos-
sibilitando a abertura de novos caminhos 
e perspectivas, resultado das dimensões 
proporcionadas pelo verdadeiro papel da 
leitura e dos profissionais nela inseridos.
Para Magda Soares, “o ato de ler tem 
sido ao longo da história uma prerrogativa 
das camadas dominadoras; sua assimila-
ção pela camada de base popular denota 
avitória de um elemento indispensável 
não somente à preparação cultural, como 
ainda à modificação de suas categorias 
Palavra puxa palavra, uma ideia traz outra, e assim se 
faz um livro, um governo, ou uma revolução; alguns dizem 
mesmo que assim é que a natureza compôs as suas espécies. 
Machado de Assis, no conto “Primas de Sapucaia”
 CURSO FORMAÇÃO DE mediadores de leitura 43
aprendendo. Em outras palavras, para Pa-
viani, a pessoa que adquiriu a compe-
tência da leitura tende a se tornar autô-
noma em seu pensamento e, assim, não 
depende das opiniões dos outros para 
formular suas próprias ideias.
A mediação da leitura literária se re-
fere a diferentes práticas de aproxima-
ção entre leitores e textos literários. 
Nas últimas décadas, ações e políticas 
públicas têm buscado garantir a consti-
tuição de acervos literários em bibliote-
cas, escolas e demais espaços públicos, a 
exemplo do Programa Nacional Bibliote-
ca da Escola (PNBE) ou, ainda, do exito-
so Programa de Alfabetização na Idade 
Certa (PAIC). No entanto, diferentes estu-
diosos têm apontado que a constituição 
de acervos bibliográficos não basta para a 
efetiva formação de leitores. Quando dedi-
camos atenção aos contextos escolares, por 
exemplo, verificamos que, muitas vezes, 
como observa Magda Soares, desenvolve-
-se uma “escolarização inadequada” da li-
teratura, quando a mediação não é feita 
com propriedade. Com essa inadequa-
ção, a escola acaba por distorcer a 
literatura e distanciar os alunos 
das práticas de leitura literária. 
Observamos isso quando professores 
utilizam o texto literário apenas para o 
ensino da gramática normativa ou em 
contextos transdisciplinares, de forma 
isolada. Por exemplo, utilizar o Iracema, 
de José de Alencar, nas aulas de Geogra-
fia e História para tratar, somente, da pai-
sagem e/ou da sociedade cearenses. 
Não quero, com isso, dizer que estas 
práticas escolares devem ser evitadas, pelo 
contrário, devem e merecem ser desenvolvi-
das, mas não de formas isoladas sem envol-
ver experiências que contribuam para o en-
contro entre os leitores e a arte literária. Esse 
encontro se dá com a linguagem, as nuan-
ces da narrativa e com o estilo do autor.
44 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
E se pensarmos o papel dos professores 
nesse processo como nossos primeiros 
mediadores de leitura, percebemos a im-
portância dessa ação desempenhada por 
cada um deles na construção de uma socie-
dade menos alienada e passiva diante de 
seus opressores. Mas, para que isso acon-
teça, é fundamental que esses docentes 
também sejam leitores e não permaneçam 
distantes das experiências literárias. Afinal, 
aquele que desempenha a importante ta-
refa de mediação da leitura literária, sendo 
professor, bibliotecário, educador social, 
agente voluntário, entre outros, se coloca 
no entre-lugar de aproximação do leitor e 
do livro e precisa dialogar intimamente com 
o texto literário seja na escola, na bibliote-
ca, no clube de leitura, na associação, no 
grêmio estudantil, na igreja ou até mesmo 
em sindicatos.
Através da leitura literária, o ato de ler 
tem dimensões e possibilidades muito 
mais profundas. Pois, se a leitura visa criar 
a consciência da realidade humana por 
meio da compreensão, interpretação e 
transformação do mundo, então, a leitura 
literária pode ser usada pelos mediadores 
de leitura como um instrumento de imagi-
nação, afetividade e raciocínio para a for-
mação crítica do indivíduo.
4.
A LEITURA LITERÁRIA E 
A SUA CONTRIBUIÇÃO 
PARA A FORMAÇÃO 
LEITORA
Os livros não mudam o mundo, 
quem muda o mundo são as pessoas. 
Os livros só mudam as pessoas. 
Mário Quintana
Como vimos, a leitura literária corrobora 
para a vida social por ser capaz de consti-
tuir uma prática questionadora do mundo 
organizado, propondo outras direções de 
vida e de convivência cultural. Neste sen-
tido, a leitura literária contribui para a for-
mação leitora ao estabelecer com o texto 
lido uma interação prazerosa de criticidade 
através do emprego da literatura. O gosto 
da leitura acompanha o desenvolvi-
mento da prática leitora do sujeito. Em 
sociedades ágrafas, circulam textos literá-
rios orais, através de brincadeiras com sons 
das palavras, contações de histórias, além 
das criações de imagens desenhadas ou es-
culpidas. Essas práticas ocorrem também, 
hoje, entre sujeitos alfabetizados ou não, 
o que permite que se amplie o universo da 
interação leitor-texto. Tais ações também 
podem servir de estímulos para a prática 
leitora, tendo como ponto de partida e che-
gada o texto literário.
Ágrafas: diz-se de cultura, povo e lín-
gua que não têm registro escrito.
PUXANDO
PROSA
O que é a literatura para você?
Você se lembra de suas primeiras 
viagens literárias? Como foram?
Seus professores obrigavam você a ler 
ou não? Como eles apresentaram os 
textos literários para você? O que lhe 
pediam: fichas de leitura, trabalhos 
sobre livros lidos, redações?
Como isso lhe marcou?
Se você já atua como mediador, como 
acredita que a leitura literária pode ser 
um instrumento de afetividade?
 CURSO FORMAÇÃO DE mediadores de leitura 45
A leitura literária tem seu espaço bem 
marcado em nossa sociedade e, muitas ve-
zes, aparece inicialmente vinculada ao es-
paço escolar onde, infelizmente, nem sem-
pre é praticada de forma satisfatória. Graça 
Paulino, refletindo sobre a leitura literária 
na escola, alerta:
Como a leitura na escola é ensinada e 
aprendida de forma ligada a diversos dis-
cursos e gêneros textuais, especificidades 
da leitura literária convivem com as de 
outros tipos de leitura, como a científica, 
a filosófica, a informativa. Essas leituras, 
embora diversas e requerendo estratégias 
diferentes dos leitores, têm pontos em co-
mum, que podem ser trabalhados por pro-
fessores e alunos. Leitura alguma sobrevive 
bem como prática cultural, quando censu-
rada ou tolhida por autoridades do Estado, 
da família ou da escola. Especialmente 
a leitura literária requer liberdade, cujo 
único limite é o respeito pela leitura do ou-
tro, que pode apresentar suas singularida-
des. (PAULINO, p. 56, 2007)
Nesse sentido, algumas questões po-
dem ser abordadas quanto à importância 
do trabalhar-se com a leitura literária: 
•	 Quais as implicações desse tipo de 
texto que o fazem especial, ou mais 
adequado, para desenvolver o gosto 
pela leitura? 
•	 O que envolve o trabalho com o texto 
e a leitura literários? 
A leitura literária é capaz de capacitar 
o(a) leitor(a) a produzir inferências e ler o 
que está nas entrelinhas, nos intervalos 
entre as palavras, naquilo que não está es-
crito. Assim, a leitura literária traz, para o 
universo do leitor, possibilidades novas 
de sentido, colocando em questão suas 
verdades, desestabilizando-o e levando-o 
a reestruturar-se.
46 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
O envolvimento com o texto e a leitura 
literários implica liberdade. Isso significa 
que não podemos ir direto ao texto com 
ideias pré-estabelecidas ou inalteráveis, 
pois ao invés de ir pensando junto com o au-
tor, o(a) leitor(a) acaba se fechando, somen-
te para aquilo que acredita, transformando 
a leitura numa atividade difícil. Se acreditar-
mos que o mundo está absolutamente com-
pleto, que nada mais pode ser feito, a leitura 
não nos faz sentido algum. É preciso, então, 
tornar a atividade da leitura significativa. 
Cabe, então, ao mediador da leitura literária 
criar condições para a formação de leitores 
capazes de experienciar toda a força huma-
nizadora da literatura, não bastando ape-
nas ler, até porque não existe uma leitura 
simples, assim como também não há uma 
que seja impossível.
DESAFIO
Baseado no que você aprendeu aqui, 
é preciso criar um estado deespírito 
ideal para se “receber” o que vem com 
o texto literário, de forma a usufruir ao 
máximo do que ele pode nos oferecer. 
Procure ler mais sobre o tema, 
converse com colegas e nos mande 
suas impressões.
5. 
ANTES DE VIRAR A 
PÁGINA...
Assim, finalizamos este fascículo, acreditan-
do que você, a partir de agora, dispõe de um 
conjunto de informações que pode ajudá-lo 
no melhor desenvolvimento da sua forma-
ção como mediador de leitura. Não preten-
demos fechar o leque das possibilidades 
para novas reflexões acerca deste tema, 
mas, sim, estimular seus estudos sobre a 
Leitura Literária. Desta forma, esperamos 
contribuir para a sua reflexão e para o seu 
exercício enquanto agente fomentador da 
prática leitora. 
Mas, atenção: a presença da leitura li-
terária, por si só, nas práticas de mediação 
de leitura, não garante que os leitores vão 
ler com proficiência. 
Os leitores, seja por qualquer suporte (li-
vro impresso, tablets, smartphones) ou em 
qualquer lugar (casa, escola, clube), familia-
rizam-se com a leitura literária, ao mesmo 
tempo em que se encaminham para uma 
concepção ampla do fenômeno literário, a 
ponto de compreendê-lo de forma artística, 
mas também de maneira crítica e até polí-
tica. Desse modo, acreditamos que cons-
truindo uma sociedade leitora, teremos 
também uma sociedade mais justa, solidá-
ria e participativa!
 CURSO FORMAÇÃO DE mediadores de leitura 47
RANGEL, Jurema Nogueira Mendes. Leitura na 
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PAULINO, G.; COSSON, R. (orgs.). Leitura lite-
rária: a mediação escolar. Belo Horizonte: FALE 
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YUNES, E. (org.). Dizer e fazer. Rio de Janeiro: 
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PAVIANI, Jayme. Ensinar: deixar aprender. Porto 
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Maria Lílian Martins de Abreu (Autora)
É graduada em Letras Português, Espanhol e suas Literaturas pela Universidade Federal do Ceará (UFC), com especialização em Ensino de 
Língua Espanhola pela Faculdade Stella Maris e MBA em Jornalismo Político, Marketing e Comunicação Midiática pela Universidade do 
Parlamento Cearense. É mestre em Literatura Comparada pela UFC. É responsável pela apresentação e produção do programa literário 
semanal “Autores e Ideias” da Rádio FM Assembleia (96,7 MHz) vinculada à Assembleia Legislativa do Estado do Ceará desde 2007. Foi 
professora tutora do Instituto UFC/Virtual - UAB e, atualmente, trabalha no Núcleo de Educação a Distância do Centro Universitário 
Ateneu (UniAteneu). 
Rafael Limaverde (ilustrador)
É ilustrador, chargista e cartunista (premiado internacionalmente) e xilogravurista. Formado em Artes Visuais pelo Instituto Federal de 
Educação, Ciências e Tecnologia do Ceará (IFCE). Escreve e possui livros ilustrados nas principais editoras do Ceará e em editoras paulistas.
RealizaçãoApoio
EXPEDIENTE: FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA (FDR) João Dummar Neto Presidente André Avelino de 
Azevedo Diretor Administrativo-Financeiro Raymundo Netto Gestor de Projetos Emanuela Fernandes 
Analista de Projetos Tainá Aquino Estagiária UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE Viviane Pereira 
Gerente Pedagógica Luciola Vitorino Analista Pedagógica CURSO FORMAÇÃO DE MEDIADORES DE LEITURA 
Raymundo Netto Coordenador Geral e Editorial Lidia Eugenia Cavalcante Coordenador de Conteúdo 
Emanuela Fernandes Assistente Editorial Amaurício Cortez Editor de Design e Projeto Gráfico Marisa 
Marques de Melo Diagramadora Rafael Limaverde Ilustrador
ISBN: 978-85-7529-893-0 (Coleção)
ISBN: 978-85-7529-897-8 (Fascículo 3)
Este fascículo é parte integrante do Programa Fortaleza Criativa, em decorrência do Termo de Fomento celebrado 
entre a Fundação Demócrito Rocha e a Secretaria Municipal da Cultura de Fortaleza, sob o nº 05/2018.
Todos os direitos desta edição reservados à:
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