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PAPER - ÁLVARES DE AZEVEDO E A MINHA RELAÇÃO COM O MUNDO

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ÁLVARES DE AZEVEDO: PEQUENAS REFLEXÕES SOBRE A MINHA RELAÇÃO COM O MUNDO A PARTIR DO SEU POEMA “NAMORO À CAVALO”
Henrique Eduardo de Oliveira[footnoteRef:1] [1: Discente do curso de Licenciatura em Letras, Língua Portuguesa, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte ] 
1 PALAVRAS INICIAIS
Antes de iniciar a minha fala sobre a relação que tenho com o mundo a partir do poema, nada melhor do que apresentar o autor e suas obras. Manoel Antônio Álvares de Azevedo nasceu em São Paulo, em 1 de setembro de 1831. Aos dois anos de idade, muda-se com sua família para o Rio de Janeiro. Ainda na sua infância, a morte de seu irmão mais novo em 1836 o deixa bastante abalado. Sempre foi um aluno brilhante e elogiado, ingressando em 1845 no Colégio Pedro II, retornando para São Paulo em 1847. Em 1848 ingressa na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, onde logo cedo começou a se destacar diante de suas precoces produções literárias, passando a conviver com vários escritores românticos.
Trata-se de uma pessoa bastante dedicada aos estudos e com enorme facilidade para aprender novos idiomas. Durante o curso de Direito, por exemplo, traduziu O Quinto Ato de Otelo, de Shakespeare; traduziu Parisina, de Lord Byron; fundou a revista Sociedade Ensaio Filosófico Paulistano, em 1849; fez parte da Sociedade Epicureia; e iniciou o poema épico O Conde Lopo, do qual só existem fragmentos nos dias atuais. Álvares de Azevedo passou parte de sua vida dedicada aos livros e a escrever suas poesias. Vale salientar que toda a sua obra poética foi escrita durante os quatro nos que cursou a faculdade de Direito. O sentimento de solidão e tristeza refletido em sua obra trata-se da expressão da saudade da família que deixara no Rio de Janeiro enquanto seguia os seus estudos.
Não chegou a concluir o curso de Direito, uma vez que foi vítima de uma tuberculose pulmonar, exatamente nas férias de 1851-1852, agravando-se pela presença de um tumor na fossa ilíaca, ocasionado por uma queda de cavalo, falecendo aos 21 anos no Rio de Janeiro, em 25 de abril de 1852. O seu poema Se Eu Morresse Amanhã! escrito a alguns dias antes de sua morte, foi declamada no seu enterro, pelo escritor Joaquim Manoel de Macedo.
Álvares de Azevedo foi um poeta, escritor e contista, que participou ativamente da segunda geração romântica, conhecido como “o poeta da dúvida”, fazendo parte de um seleto grupo de poetas que deixaram em segundo plano os temas nacionalistas e indianistas, muito usados na primeira geração romântica, para tratar das inquietações de seu mundo interior, com temas voltados para a questão do tédio da vida, das frustrações amorosas e do sentimento de morte. Durante a sua breve vida, não conseguiu publicar nenhuma obra. O livro Lira dos Vinte Anos trata-se da única obra preparada pelo poeta e publicado um ano após a sua morte. Destacam-se ainda duas outras obras publicadas post mortem: A obra Macário, em 1855, que se trata de uma peça de teatro ou uma narrativa, dividida em dois episódios e escrita pelo poeta em 1850 e Noite na Taverna, que se trata de um livro estruturado como uma narrativa moldura contendo cinco contos, cada conto narrado por um grupo de cinco rapazes que se encontrava abrigado em uma taverna. Nesta obra o autor utiliza o pseudônimo de Job Stern.
2 A MINHA RELAÇÃO COM O MUNDO DEPOIS DE CONHECER O AUTOR E SUA OBRA
A essência da obra de Álvares de Azevedo pode ser percebida a cada palavra, a cada verso escrito ou mesmo diante de seus contos e demais produções literárias. Em sua obra Lira dos Vinte Anos, Alvares de Azevedo apresenta em seus versos alguns traços que o identifica com a poesia moderna, seja pela incorporação da ironia, como pela capacidade de atribuir uma nota dissonante ás idealizações romanescas, através de algumas cenas marcadas pelo sarcasmo e acontecimentos do cotidiano.
O meu primeiro contato com a obra de Álvares de Azevedo aconteceu ainda durante a minha infância, mais precisamente quando ainda cursava a quarta série do primário. Sempre que havia alguma data festiva na escola, a minha avó (que me criou desde 1 ano de idade) fazia um poema e me entregava para eu recitar na escola. Eu aproveitava para decorar o poema e ia todo orgulhoso sabendo que aquele dia seria mais um dia especial para mim. Em um desses momentos, a minha professora me presenteou uma obra do referido autor, que mesmo sem entender direito o seu conteúdo, devorei o livro em apenas dois dias. 
Na realidade, eu já fazia os meus primeiros poemas, bastante simples e me preocupando mais com a rima. Mas, a partir do primeiro encontro com a obra de um poeta brasileiro e famoso, passei a me dedicar mais e procurar conhecer as principais regras de metrificação, temas entre outros detalhes que eu achava importante. Nunca me preocupei em interpretar um poema, pois desde cedo, ainda na mocidade, aprendi com Mário Quintana (1906-1994) que “não tem porque interpretar um poema. O poema já é uma interpretação”, cabendo apenas ao leitor afirmar a sua identificação (ou não) com o mesmo, ou até mesmo tecer comparações entre acontecimentos da época em que viveu o autor com a sua própria criação.
Diante disso, o poema que me identifico bastante e que me serviu como fonte de inspiração por muito tempo, trata-se do poema Namoro a Cavalo, uma vez que reflete os meus primeiros encontros e desencontros quando comecei a me aventurar com o namoro mais ou menos nos meus 13 anos de idade, tendo como resultados mais desencontros do que encontros, por não possuir nada de belo e atraente a não ser o desejo ardente de aprender sempre coisas novas e viver um dos mais difíceis momentos da vida em termos de situação socioeconômica. Vamos ao poema:
Eu moro em Catumbi. Mas a desgraça
Que rege minha vida malfadada
Pôs lá no fim da rua do Catete
A minha Dulcinéia namorada.
Alugo (três mil réis) por uma tarde
Um cavalo de trote (que esparrela!)
Só para erguer meus olhos suspirando
À minha namorada na janela...
Todo o meu ordenado vai-se em flores
E em lindas folhas de papel bordado
Onde eu escrevo trêmulo, amoroso,
Algum verso bonito... mas furtado.
Morro pela menina, junto dela
Nem ouso suspirar de acanhamento...
Se ela quisesse eu acabava a história
Como toda a Comédia — em casamento.
Ontem tinha chovido... que desgraça!
Eu ia a trote inglês ardendo em chama,
Mas lá vai senão quando uma carroça
Minhas roupas tafuis encheu de lama...
Eu não desanimei. Se Dom Quixote
No Rocinante erguendo a larga espada
Nunca voltou de medo, eu, mais valente,
Fui mesmo sujo ver a namorada...
Mas eis que no passar pelo sobrado
Onde habita nas lojas minha bela
Por ver-me tão lodoso ela irritada
Bateu-me sobre as ventas a janela...
O cavalo ignorante de namoros
Entre dentes tomou a bofetada,
Arrepia-se, pula, e dá-me um tombo
Com pernas para o ar, sobre a calçada...
Dei ao diabo os namoros. Escovado
Meu chapéu que sofrera no pagode
Dei de pernas corrido e cabisbaixo
E berrando de raiva como um bode.
Circunstância agravante. A calça inglesa
Rasgou-se no cair de meio a meio,
O sangue pelas ventas me corria
Em paga do amoroso devaneio!...
As minhas primeiras aulas de rimas intercaladas eu tive a partir da leitura desse poema. Ainda não entendia bem as regras gramaticais do português e algumas dúvidas aproveitei para tirar com a minha professora, que me ensinou o que era verso, rima, intercalação e outros demais a mais. Analisando o poema e verificando que o autor rimava o segundo com o quarto verso, em todo o seu poema, assim fui criando as minhas primeiras regras para os poemas que ia surgindo passo a passo, me distanciando das famosas “quadrinhas” que a minha avó me presenteava.
Mesmo sem entender ainda o que significava plano imagético (fanopeia), esta quinta estrofe era a parte que mais me chamava a atenção, porque me via na mesma situação que ele: azarado, sem chances para namorar a menina que eu achava mais linda da turma, principalmente porque tinha que andar a pé uma longa distância através de uma estrada que naquele tempo não era calçada ou asfaltada, a Rua Jaguarari,desde o bairro de Lagoa Nova até a Avenida Bernardo Vieira e muitas vezes chegava todo sujo de barro e poeira na escola, servindo de chacota para os alunos e alunas que chegavam de carona com seus pais, bem arrumados, cabelos penteados e material escolar novinho em folha. Na realidade, eu sabia que era Álvares de Azevedo em miniatura e que precisava mudar essa situação, nem que fosse através da poesia.
Ontem tinha chovido... que desgraça!
Eu ia a trote inglês ardendo em chama,
Mas lá vai senão quando uma carroça
Minhas roupas tafuis encheu de lama...
Nesta estrofe, fica fácil criar uma imagem de uma estrada cheia de lama, após um dia chuvoso, onde o cavalheiro montado em seu cavalo, ignora a cena e caminha a trote inglês rumo à casa de sua amada (uma das garotas que eu mais admirava morava ao lado da escola e eu sempre ia comprar balas na cantina ao lado da casa dela, procurando impressioná-la de alguma forma) . A sua roupa tafuis emite uma ideia de um jovem cavaleiro de classe média, bem vestido, que em determinado momento, observa a sua roupa toda encharcada de lama, diante de uma carroça que passa e ignora a sua presença de honrado e bem vestido cavaleiro. Vale salientar que roupa taful naquela época, significava uma roupa luxuosa.
Finalmente, a intertextualidade que o autor apresenta na sexta estrofe, trazendo para o seu texto os personagens Dom Quixote e Rocinante, me fez atiçar a curiosidade pela leitura de uma forma geral. Queria a qualquer custo saber quem era esse tal de Dom Quixote, e para a minha surpresa, depois de pegar emprestado o livro da biblioteca da escola, acabo descobrindo que esse personagem era eu sendo representado na literatura:
Eu não desanimei. Se Dom Quixote
No Rocinante erguendo a larga espada
Nunca voltou de medo, eu, mais valente,
Fui mesmo sujo ver a namorada...
O autor praticamente incorpora a figura de Dom Quixote que, com sua espada, caminha com seu cavalo Rocinante, diante de todas as tristezas, dissabores e dificuldades da vida, mas firme, ereto em seu propósito de defender as donzelas virgens. Da mesma forma, o poema apresenta o eu lírico que caminha firmemente ao encontro de sua amada, sem se preocupar com as dificuldades que tenha de enfrentar em todas as suas visitas, mesmo que chova, mesmo que infortúnios aconteçam e assim seguia eu durante todo o transcorrer do ensino fundamental, diante das minhas (des)ilusões sobre o ato de namorar, já que amar ainda era muito cedo para que eu soubesse o que realmente isso poderia significar para mim..
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir desse encontro com a obra de Álvares de Azevedo e da sugestiva obra em seu poema que me desperta o desejo de conhecer Dom Quixote, eu que era apenas um menino morador de favela na década de 1980 aprendi a gostar da literatura de uma forma geral e criar o meu mundo (paralelo até certo ponto) que me ajudou a vencer todas as dificuldades da vida. 
Vale salientar que de todas as crianças e adolescentes que moravam no mesmo bairro nessa época, entre as ruas São José e Avenida Lima e Silva, formando aproximadamente cerca de 300 famílias, apenas algumas dezenas terminaram o ensino médio, 10 ou 15 jovens chegaram a cursar o ensino superior e exatamente cinco pessoas contando comigo possuem pós-graduação. Muitos morreram pelo caminho vítimas principalmente da criminalidade, outros não continuaram os estudos por terem se casado ou por se contentarem com qualquer tipo de trabalho pesado que a vida foi lhe presentando ao passar do tempo.
Também tive que passar 15 anos sem estudar, entre o ensino médio e a minha primeira graduação iniciada em fevereiro de 2006, mas se depois de todo esse tempo eu hoje me encontro em minha terceira e última graduação, com duas pós-graduações e pronto para alçar meu voo no Mestrado, agradeço principalmente ao dia em que a minha professora da quarta série primária me presenteou um dos livros de Álvares de Azevedo. Se por algum motivo isso não acontecesse, com certeza eu jamais estaria tendo a oportunidade de compartilhar esses mágicos momentos com vocês.

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