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Livro do Professor Volume 8 Arte ©Editora Positivo Ltda., 2015 Presidente: Ruben Formighieri Diretor-Geral: Emerson Walter dos Santos Diretor Editorial: Joseph Razouk Junior Gerente Editorial: Júlio Röcker Neto Gerente de Arte e Iconografia: Cláudio Espósito Godoy Autoria: Maíra Weber; reformulação dos originais de: Clovis Marcio Cunha e Fabio Guilherme Poletto Supervisão Editorial: Jeferson Freitas Edição de Conteúdo: Enilda Pacheco (Coord.) e Luiz Lucena Edição de Texto: Tania Tatiane Cheremeta Revisão: Priscila Rando Bolcato, Mariana Bordignon e Fabrízia Carvalho Ribeiro Supervisão de Arte: Elvira Fogaça Cilka Edição de Arte: Marcelo Bittencourt Projeto Gráfico: YAN Comunicação Ícones: ©Shutterstock/ericlefrancais, ©ShutterStock/Myvector, ©Shutterstock/Macrovector, ©Shutterstock/Goritza, ©ShutterStock/style-photography, ©Shutterstock/Chalermpol, Corel Stock Photos Imagens de abertura: ©Creative Commons/Yves Picq, ©iStockphoto.com/baranozdemir Editoração: Flávia Vianna Ilustrações: Douglas Nogueira Pesquisa Iconográfica: Janine Perucci (Supervisão) e Susan Rocha de Oliveira Engenharia de Produto: Solange Szabelski Druszcz Produção Editora Positivo Ltda. Rua Major Heitor Guimarães, 174 – Seminário 80440-120 – Curitiba – PR Tel.: (0xx41) 3312-3500 Site: www.editorapositivo.com.br Impressão e acabamento Gráfica e Editora Posigraf Ltda. Rua Senador Accioly Filho, 431/500 – CIC 81310-000 – Curitiba – PR Tel.: (0xx41) 3212-5451 E-mail: posigraf@positivo.com.br 2018 Contato editora.spe@positivo.com.br Todos os direitos reservados à Editora Positivo Ltda. Dados Internacionais para Catalogação na Publicação (CIP) (Maria Teresa A. Gonzati / CRB 9-1584 / Curitiba, PR, Brasil) W373 Weber, Maíra. Arte : ensino médio / Maíra Weber ; reformulação dos originais de: Clovis Marcio Cunha, Fabio Guilherme Poletto ; ilustrações Douglas Nogueira. – Curitiba : Positivo, 2016. v. 8 : il. Sistema Positivo de Ensino ISBN 978-85-467-0400-2 (Livro do aluno) ISBN 978-85-467-0401-9 (Livro do professor) 1. Arte. 2. Ensino médio – Currículos. I. Cunha, Clovis Marcio. II. Poletto, Fabio Guilherme. III. Nogueira, Douglas. VI. Título. CDD 373.33 15 16 Sumário Arte do povo ............................................ 4 Esse tal de artesanato... ................................................................................. 5 Desde os primórdios até hoje em dia ...................................................................................................... 5 Arte popular e artesanato ...................................................................................................................... 8 Existe uma arte primitiva? ............................................................................. 10 Artes visuais indígenas: tudo no plural! ......................................................... 13 Cerâmica marajoara ............................................................................................................................... 15 Adornos dos indígenas brasileiros .......................................................................................................... 15 O corpo como suporte de uma arte ritualística ....................................................................................... 16 Quando o Brasil foi visto pelo mundo ....... 19 Artistas da colônia ......................................................................................... 20 Missão Artística no Brasil ............................................................................... 22 Artes visuais dos povos africanos ................................................................... 24 Sons da África: sons que influenciaram as músicas e as danças do Brasil ....... 26 Capoeira para escutar e dançar .............................................................................................................. 26 Ciranda ................................................................................................................................................... 27 Jongo, caxambu ou tambu ..................................................................................................................... 28 O samba da minha terra deixa a gente mole .......................................................................................... 28 Olé! Flamenco e suas influências ciganas ....................................................... 31 Acesse o livro digital e conheça os objetos digitais e slides deste volume. Arte do povo Ponto de partida 15 1 © Sh u tt er st oc k/ n ee ls ky Artesão do Ceará, Brasil Artesão do Vietnã Artesão da Índia Observe as imagens e converse com os colegas sobre as questões propostas. 1. Para você, o que é artesanato? 2. Você tem algum objeto de artesanato em casa? Como ele é? Como imagina ter sido feito? 3. Com que propósito os objetos de artesanato foram feitos no passado? E hoje em dia? © Sh u tt er st oc k/ A le ss io M oi ol a © Sh u tt er st oc k/ sh ev ts ov y 4 Objetivos da unidade: compreender o conceito de artesa- nato; entender o artesanato na Antigui- dade e nos dias atuais; identificar arte no artesanato; analisar elementos da arte primitiva; compreender as artes indígenas do Brasil; conhecer a estética da cerâmica marajoara; entender o corpo como suporte da arte indígena. Objetivos da unidade: compreender o conceito de artesa- Esse tal de artesanato... O artesanato diz respeito a tudo que é fabricado com trabalho manual e que constitui objetos que fazem parte da cultura popular, abrangendo trabalhos em cerâmica, tecido, madeira, pedras, crochê, renda, papel, pinturas, esculturas, bijuterias e confecção de instru- mentos musicais. cultura popular: aquela em que o povo (de cada região) atua in- tegralmente, mesclando arte, crenças e tradições, o que resulta em manifestações próprias, como dança, música e folclore. Os problemas suscitados pela utilização do conceito de “cultura” são no mínimo ainda maiores que os suscitados pelo termo “popular”. Uma razão para esses problemas é que o significado do conceito foi amplia- do na última geração à medida que os historiadores e outros intelectuais ampliaram seus interesses. Na era da “descoberta” do povo, o termo “cultura” tendia a referir-se a arte, literatura e música, e não seria incorreto descrever os folcloristas do século XIX como buscando equivalentes populares da música clássica, da arte acadêmica e assim por diante. Hoje, contudo, seguindo o exemplo dos antropólogos, os historiadores e outros usam o termo “cultura” muito mais amplamente, para referir-se a quase tudo que pode ser aprendido em uma dada sociedade – como comer, beber, andar, falar, silenciar e assim por diante. Em outras palavras, a história da cultura inclui agora a história das ações ou noções subjacentes à vida cotidiana. O que se costumava consi- derar garantido, óbvio, normal ou “senso comum” agora é visto como algo que varia de sociedade a sociedade e muda de um século a outro, que é “construído” socialmente e portanto requer explicação e interpretação social e histórica. [...] BURKE, Peter. Cultura popular na Idade Moderna. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. p. 22-23. Geralmente, o artesão participa de todas as etapas da confecção do produto: preparação da matéria-prima, desenvolvimento e acabamento final. É comum que as criações sejam desenvolvi- das em oficinas simples e por grupos que fazem trabalhos comunitários. O trabalho do artesão sempre foi produzido manualmente, ou com o uso de ferramentas rudimentares, com conhecimentos passados de pai para filho. Desde os primórdios até hoje em dia O artesanato originou-se na Pré-História em virtude da necessidade dos seres humanos de construir objetos (artefatos) que os ajudassem a sobreviver e a conviver em comunidade. No Período Neolítico, já eram produzidos diversostipos de artesanatos, como potes de cerâmica (para guardar e cozinhar alimentos), tecidos para fazer roupas (obtidos por meio da tecelagem de fibras animais e vegetais) e talheres para serem usados nas refeições, feitos de ossos de animais. Alguns arqueólogos encontraram, inclusive, objetos que provavelmente serviam tanto para decora- ção quanto para adornar a população, como joias, bijuterias e enfeites. struir Período Neolítico: chamado também de pedra polida, abrange de 10000 a.C. a 3000 a.C. © Sh ut te rs to ck /K ru gl of f 5 O trabalho dos artesãos, porém, ainda estava extremamente vinculado a serviços essenciais à sociedade. Com o passar do tempo, o artesanato, as técnicas de produção e as máquinas (ainda simples) que auxiliavam o processo de criação dos objetos foram se desenvolvendo, assim como os instrumentos de apoio, como martelo, pincel, agulha, tear, telas e tecidos. As peças criadas foram ficando cada vez mais estilizadas, apesar de os artesanatos continuarem a ser feitos sempre manualmente. Do século XII ao XVIII, os artesãos passaram a organizar seus trabalhos em corporações de ofício, grupo que asso- ciava os trabalhadores que pertenciam à mesma categoria (sapateiros, alfaiates e padeiros). Essas corporações dividiam os artesãos em: • mestre – proprietário da oficina; • oficiais – artesãos contratados; • aprendizes – jovens que queriam aprender e não recebiam pelo ofício, mas podiam morar na casa do mestre. As corporações de ofício foram extintas com a chegada das fábricas, no final do século XVIII. Os produtos essenciais à vida humana passaram a ser feitos em grandes quantidades, por instrumentos que tinham a capacidade de fazê-los em série e padronizados. Na era da industrialização, muitos mestres, oficiais e aprendizes migraram para as fábricas. Outros tantos perderam seus empregos para as máquinas. Utensílios de cozinha pré-históricos feitos de ossos escavados. Anatólia central, cerca de 6000 a.C. Crânios do Período Neolítico (7000-6000 a.C.) cobertos com cerâmica e conchas nos olhos – escavados pela arqueóloga Dame Kathleen Kenyon em Jericó (a mais antiga cidade habitada do mundo). Atualmente, estão no Museu Arqueológico de Amã, Jordânia Colares de pedras e ossos do Período Neolítico, encontrados na Planície de Konya, na Turquia. As antigas joias estão no Museu das Civilizações da Anatólia, em Ancara Achados da cultura Mondsee, Período Neolítico, 3000-2200 a.C., Patrimônio Mundial da Unesco La tin St oc k/ Co rb is/ Na th an Be nn /O tto ch ro m e La tin St oc k/ C or b is /N at h an Be n n /O tt oc h ro m e La tin St oc k/ C or b is /W al te r G ei er sp er g er La tin St oc k/ C or b is /N at h an B en n /O tt oc h ro m e © Sh u tt er st oc k/ O le g G ol ov n ev Fábrica de sapatos em São Petersburgo, Rússia, 18886 Atualmente, enquanto um artesão tecelão faz sozinho uma peça, na in- dústria têxtil, as pessoas exercem funções distintas na fabricação dos te- cidos, como cozinhador, alvejador, tingidor, desengomador, carbonizador de lã, estampador, além de operadores de várias máquinas específicas. Mundo do trabalho Fazer artístico Reúna-se em grupo com os colegas e, juntos, pesquisem o trabalho de um tecelão e a fabricação de fios e tecidos. Depois, cada um deve construir um tear simples e produzir um pequeno tapete. A tecela- gem é uma técnica utilizada em várias culturas populares. Exercite a técnica para, em seguida, imprimir sua expressão pessoal. Solte a imaginação! Materiais • Fios de tecido • Um pedaço de papelão de aproximadamente 30 cm × 20 cm • Agulha para tecer • Tesoura 2 Encaminhamento metodológico. Confecção de uma toalha de mesa utilizando um tear de papelão © Sh u tt er st oc k/ M or en o So p p el sa © Sh u tt er st oc k/ d u b es s on eg o D ou g la s N og u ei ra . 2 01 5. M is ta . Artesã peruana utilizando um tear simples © Sh u tt er st oc k/ Fo to s5 93 O artesanato encontrou seu espaço e, atualmente, representa aspectos da cultura da região em que está inserido, ressaltando seus costumes, suas tradições e suas características locais. No Peru, por exemplo, há vários artesãos que trabalham com a tecelagem. A cultura desse país pode ser observada, por exemplo, nas cores fortes, influenciadas pela colonização espanhola, e na padronagem, característica empregada em tapetes, mantas, lenços e casacos de lã feitos no tear. O animal símbolo do país, a lhama, também aparece em diversos objetos de artesanato. A organização industrial fez com que um trabalho que normalmente era realizado por uma pessoa, do começo até o final, fosse organizado em especialidades para operar um processo produtivo em série. Mantas peruanas Denim – indústria têxtil Arte 7 Como fazer 1. Enrole o fio em volta do papelão, deixando um espaço aproximado de 1 cm entre um fio e outro, e dê um nó atrás, para fixá-lo. 2. Escolha uma cor de fio e comece a tecer a toalha. 3. Marque (com um clipe, por exemplo) a altura em que começará a tecer. 4. Dê um nó no fio colorido amarrando-o no fio que está na vertical. 5. Use a agulha para passar o fio na direção horizontal, por cima e por baixo dos fios que estão na vertical. 6. Chegando ao lado oposto, volte com o fio, fazendo o mesmo movimento. 7. Alterne as cores dos fios que estão tecendo o tapete na horizontal (para fazer sua criação pessoal). 8. Corte os fios que estão na direção vertical e amarre-os nos fios da horizontal. Pronto! Seu tapete está finalizado. Arte popular e artesanato O artesanato é fruto do trabalho manual cujo conhecimento é passado de geração em geração, nas camadas sociais menos favorecidas, inscrevendo-se assim em uma tradição cultural. Muitas vezes, a produção artesanal é com- plemento ou mesmo única fonte de renda dos artesãos, que se constituem, dessa forma, em profissionais autônomos. O artesanato produzido atualmente no mundo todo engloba um conjunto de obras criadas com as mais diferentes técnicas e materiais: esculturas de barro, pinturas em ladrilhos, bonecos de pano, bijuterias de toda sorte, roupas, tape- tes, cortinas, trabalhos em couro, pinturas, mosaicos... a lista é imensa e variada. Potes de artesanato feitos em grande quantidade Artesanatos expostos para venda em feira no Marrocos © Sh u tt er st oc k/ Lu ka sz J an ys t © Sh u tt er st oc k/ ap p le 24 99 Há diferença entre arte e artesanato? Essa é uma questão antiga para a qual não há resposta consensual. Não é de hoje que a discussão sobre a fragilidade da fronteira que costuma separar a chamada "cultura culta" da "cultura popular" ganha volume e consistência. E são cada vez mais nítidas as evidências de que, no fundo, o que efetivamente existe é um preconceito em relação às artes populares. É como se alguém tivesse o direito, baseado em critérios um tanto tênues, de determinar o que é arte e o que é artesanato, o que é cultura e o que é apenas pitoresco. É como se aos artistas populares fosse proibido o reconhecimento de que seus trabalhos têm outras qualidades, além do direito de ser primitivos. Como se a alta qualidade estética fosse um patamar reservado apenas aos artistas que tiveram educação formal, e cultura fosse monopólio que só por eles poderia ser exercido. E os equívocos e preconceitos não terminam aí: tornou-se usual estabelecer que a arte popular só pode ser encontrada fora dos grandes centros urbanos, como se fosse um triste privilégio das populações rurais. FROTA, Lélia Coelho. Pequeno dicionário do povo brasileiro: século XX. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2005. p. 9. 8 Volume 8 Uma definição bastante difundida atualmente é a de arte popular, que se diferencia do artesanato no processo de criação das obras. No artesanato, as peças são criadas com fins puramente comerciais, em uma produção em série, de repetição de uma técnica apreendida– distinguindo-se do trabalho industrial apenas por ser feito à mão. Na arte popular, primam a linguagem e a expressão do artista, conferindo à obra valor simbólico proveniente do poder estético e do potencial sensível que a distinguem. Dito de outra forma, a arte popular, mais que apresentar a estética equilibrada e harmônica das obras artesanais, surpreende, instiga e encanta por trazer algo novo em uma obra marcada pela tradição. Um dos artistas populares brasileiros de maior expressão é Vitalino Pereira dos Santos (1909-1963), conhecido como Mestre Vitalino. Nascido na vila de Ribeira dos Santos, que fica perto de Caruaru, em Pernambuco, esse artista, desde cedo, criou cerâmicas com forma de animais e brinquedos, pequenas esculturas de pessoas e louças para comercializar na feira da cidade. Seu trabalho chamou a atenção de críticos pelo forte senso estético. Em 1947, Vitalino participou de uma expo- sição no Rio de Janeiro que foi importante não somente para seu reconhecimento, mas para trazer à tona a discussão da arte popular existente em várias regiões do Brasil. Fo to s: R om ul o Fi al d in i/ Te m p o C om p os to Vitalino. Caldeira. Cerâmica policromada. Alto do Moura, Caruaru, Pernambuco. 17 x 26 x 15 cm. Museu do Homem do Nordeste. Recife – PE. Vitalino. Carro de boi. Argila. Alto do Moura, Caruaru, Pernambuco. 14 x 12 x 20,5 cm. Museu do Homem do Nordeste. Recife – PE. Vitalino. Tropa de burro. Alto do Moura, Caruaru, Pernambuco. 18 x 15 x 19 cm. Museu do Homem do Nordeste. Recife – PE. Vitalino. Casa de farinha. Cerâmica policromada. Alto do Moura, Caruaru, Pernambuco. 34 x 23,5 x 16 cm. Museu do Homem do Nordeste. Recife – PE. As peças do Mestre Vitalino retratam cenas do cotidiano nordestino, a seca, a migração, figuras relacionadas ao trabalho, animais, etc. Sua estética influenciou a produção de diversos outros artesãos. Arte 9 Reúna-se em grupo com os colegas e, juntos, pesquisem um artesão da cidade que faça arte popular, com foco na intenção criativa e estética. Escrevam, então, um texto sobre a vida dele, seu método e concepção de trabalho. Depois, tirem uma foto do artista e produzam um cartaz com as informações coletadas. Existe uma arte primitiva? A arte primitiva é um conceito abrangente que abarca desde as manifestações artísticas tradicionais dos povos não europeus (da África, da América e do Pacífico Sul), com seu caráter ritualístico e vinculado à espiritualidade, até mani- festações que nutrem relações com a arte europeia. Entre as tradições artísticas não europeias, estão as artes indígenas e africanas, essenciais à formação da identidade brasileira. Na vertente ligada à arte europeia, o primitivismo se manifesta na chamada arte naïf, uma tendência que tinha como referência a arte dos artistas que não frequentaram nenhuma escola de arte formal e, também, a arte que se remete à feita pelas crianças. Os pintores primitivos não se prendiam a nenhuma técnica usual de representação e passavam longe das regras acadêmicas relacionadas à perspectiva, à composição e às cores. Pintavam intuitivamente, utilizando elementos da fantasia e da natureza como inspiração. Alguns estudiosos consideram que o termo primitivismo é carregado de uma visão preconceituosa dos europeus em relação aos povos de localidades com menor desenvolvimento econômico. O fato é que, no final do século XIX, muitos artistas europeus passaram a explorar outras culturas, como as das colônias, especialmente na África, na Ásia e na Oceania, e encontraram uma arte feita de traços instintivos e verdadeiros, diferente da realizada no continente a que pertenciam. Esse choque cultural resultou no desenvolvimento de uma arte natural e cheia de fantasia, livre das convenções e com muita vitalidade. [...] Esse estilo de arte simples e descomplicado, como pode ser visto em A encantadora de serpentes (1907[...]), de Henri Rousseau (1844-1910), foi inicialmente combatido pelas autoridades estabelecidas, mas considerado inovador e inspirador por jovens artistas de vanguarda. Pablo Picasso (1881-1973), Paul Gauguin (1848-1903), Emil Nolde (1867-1956), Henri Matisse (1869- 1954), Constantin Brancusi (1876-1957), Ernst Ludwig Kirchner (1880-1938) e Amadeo Modigliani (1884- 1920) foram apenas alguns dos artistas que reagiram afirmativamente às distorções da forma, aos contor- nos fortes e às cores contrastantes da arte tribal que libertaram os artistas das regras de representação. Eles Mestre Vitalino conseguiu imprimir a iden- tidade de sua narrativa estética em toda sua obra: falou de seu povo, sua história, da vida no campo e do Nordeste. Viajou pelo Brasil para ensinar sua técnica e expor seus trabalhos, mas foi somente em 1947 que passou a assinar suas obras. Atualmente, é reconhecido internacio- nalmente e tem obras em diversos museus. Casa onde o ceramista Mestre Vitalino viveu e criou suas esculturas de barro, em Caruaru, PE, Brasil naïf: palavra francesa que quer dizer “ingênuo”. © Sh u tt er st oc k/ M ar ci o Jo se B as to s Si lv a 3 Encaminhamento metodológico. Sugestão de atividades: questões 1 e 2 da seção Hora de estudo. i t OCoisas da gente 10 Volume 8 começaram a fazer experiências com formas e traços simples, com códigos simbólicos, distorções e estampas. Excluíram detalhes, realismo, a perspectiva linear e as cores naturais a fim de criarem obras abstratas de uma maneira até então impossível. Esses artistas também celebravam a sensualidade e o conceito do inconsciente. FARTHING, Stephen (Ed.). Tudo sobre arte: os movimentos e as obras mais importantes de todos os tempos. Rio de Janeiro: Sextante, 2011. p. 343. Henri Rousseau (1844-1910) é um artista francês autodidata que, apesar de ter suas obras rejeitadas no início de sua carreira, tornou-se o mais conhecido artista naïf. Em suas obras, utilizava cores vivas, optava por não respeitar a perspecti- va, priorizava os elementos planos e escolhia temas que descreviam um universo exótico. Na verdade, suas obras não eram nada simples. As pinturas, as cores e a iluminação dos elementos eram muito bem planejadas. Para expressar profundidade e espaço e conquistar o efeito de duas dimensões, como se a tela tivesse colagem de tecidos, Rousseau pintava em camadas. O primitivismo foi uma referência importante para a continuidade da produção artística do século XX e permanece como influência para vários artistas da arte contemporânea, podendo ser visto também na escultura e na música. ROUSSEAU, Henri. A encantadora de serpentes. 1907. 1 óleo sobre tela, color., 189 cm x 169 cm. Museu D’Orsay, Paris, França. Museu D’Orsay/Fotógrafo desconhecido Arte 11 Fazer artístico Curiosidades A arte primitiva já foi bastante desde- nhada por pintores e críticos de arte, sendo considerada uma arte menor. Recentemente, o quadro Nafea Faa Ipoipo, do pintor francês Paul Gauguin, foi vendido por, aproximada- mente, R$ 835 milhões, batendo o recorde de preços praticados em toda a história da arte. Como Rousseau, Gauguin também foi um artista sem formação acadêmica em artes. Ele tinha uma carreira de sucesso no mercado financeiro e se dedicava à pintura GAUGUIN, Paul. Nafea Faa Ipoipo. 1892. 1 óleo sobre tela, color., 102 cm × 78 cm. Öffentliche Kunstsammlung, Basileia, Suíça. Gauguin desejava cultivar a arte em estado primitivo e selvagem. Com a obra O leão faminto, Rousseau passou a ser admirado pela crítica e a influenciar outros artistas importantes. 4 Encaminhamento metodológico. ROUSSEAU, Henri. O leão faminto. 1905. 1 óleo sobre tela, color., 201,5 cm × 301,5 cm. Fundação Beyeler, Basileia, Suíça. Fu n d aç ão B ey el er /F ot óg ra fo d es co n h ec id o 1. Analise a obra O leão faminto, pesquise outras obras de arte naïf e descreva os aspectos encontrados. 2. Observando a técnica de privilegiar traços e cores instintivos, abstratos, infantis e o uso do inconsciente,crie uma obra inspirada na arte naïf. Para isso, proceda da seguinte forma: • escolha uma situação para retratar e o cenário que sua pintura vai enfocar; • produza, primeiramente, um desenho e, depois, uma pintura utilizando pincel e tintas de diversas cores; • apresente sua obra à turma. C or el S to ck P h ot os 12 Artes visuais indígenas: tudo no plural! apenas como hobby. Após a quebra da bolsa de Paris, decidiu se dedicar exclusivamente à pintura. Sem pers- pectivas na França, passou um tempo no Taiti, onde realizou obras sem elevado grau de técnica, inspirado em uma visão idealizada da cultura da Polinésia Francesa. Lá, estudou artesãos locais e tornou sua arte mais pri- mitiva, instintiva e pura, da maneira como via os povos indígenas. O uso de cores de forma não naturalista e a distorção formal que imprimia em suas obras influenciaram muitos artistas de vanguarda no século XX. Orientação didática.5 NÓBREGA, Antônio; FREIRE, Wilson. Chegança. In: Pernambuco falando para o mundo. São Paulo: Eldorado, 1998. 1 CD. Faixa 3. Sou Pataxó, Sou Xavante e Cariri, Ianomâmi, sou Tupi Guarani, sou Carajá. Sou Pancaruru, Carijó, Tupinajé, Sou Potiguar, sou Caeté, Fulniô, Tupinambá [...] Como você definiria o índio? Eduardo Viveiros de Castro, professor de Antropologia do Museu do Índio (UFRJ), explica que índio é qualquer membro de uma comunidade indígena que seja reconhecido por ela como tal. Esse conceito abarca quase um milhão de pessoas em território nacional, sem falar nos outros milhares espalhados pelo restante da América. É importante esclarecer que não existe índio brasileiro como identidade única e genérica. Existem mais de 300 etnias indígenas brasileiras, entre as quais ianomâmis, caiapós, bororos, xavantes, tremembés, pataxós, tupis, jurunas, munduru- cus, aruas, macuxis, caingangues, arauetés, anambés, tabajaras, carijós, apinaiés, potiguares, caetés, tupinambás e terenas. Cada uma das 300 etnias tem características próprias que a distinguem das demais: história, língua, crença, aparência física, forma de organização social, hábitos, técnicas, valores e formas de contato com a sociedade envolvente. É evidente que as sociedades indígenas com- partilham um conjunto de características comuns – são essas características que as diferenciam de nossa sociedade e de outros tipos de sociedade. Mas, ao mesmo tempo, elas são extremamente diversifica- das entre si. Cada uma habita uma área ecológica distinta, tem sua lógica própria e sua história espe- cífica, tendo experimentado situações peculiares de contato e de troca com outros grupos humanos. Cada sociedade indígena tem sua própria identi- dade, se pensa e se vê como um todo homogêneo e coerente e procura manter suas especificidades, ape- sar dos efeitos destrutivos do contato. [...] BRASIL. Ministério da Educação. Cadernos da TV escola – Índios do Brasil 1. Brasília: MEC/SEED/SEF, 2001. p. 18. Lideranças indígenas na Câmara dos Deputados, em Brasília, 2015 Agência Senado/Geraldo Magela ! a e o nte da Indígena pataxó © Cr ea tiv e Co m m on s/ Yv es P ic q Arte 13 Informações sobre o status da arte.6 DEBRET, Jean-Baptiste. Família de um chefe Camacã preparando-se para uma festa. [entre 1820 e 1830]. 1 aquarela sobre papel, color., 18,6 cm x 29,3 cm. Museu Castro Maya, Rio de Janeiro. (Detalhe). Índios da etnia mundurucu, em pintura de 1828 Outro pressuposto considera que as artes indígenas se materializam quase exclusivamente pelas formas transportáveis e perecíveis, os artefatos. Os objetos indígenas resultam da execução de técnicas variadas, clas- sificadas como cerâmica, entalhe, cestaria, plumária e tecelagem; apreciados, nas grandes cidades, em museus antropológicos ou em lojas de artigos turísticos. Do passado nos chegam tradições artísticas indígenas que se caracterizam pela extrema permanência, como os registros rupestres, pintados ou gravados nos abrigos ou afloramentos rochosos, encontráveis em praticamente todo o território nacional [...]. Apesar da grande diversidade de manifestações, as artes indígenas não são criadas para ser contempladas. Revestem-se antes de particularidades expressivas e cons- tituem, na maior parte das vezes, meio para a transmissão de concepções de fundo social ou cosmológico. Possuem, dessa forma, funções representativas e utilitárias, além de outros objetivos e eficácias. A experiência estética cons- titui, para os índios, elemento fundamental na transmis- são de conhecimentos e de valores sociais, por meio dos quais pode ser definida sua especificidade, ou seja, a natureza ou a essência de sua própria humanidade. [...] VAN VELTHEM, Lucia Hussak. Artes indígenas: notas sobre a lógica dos corpos e dos artefatos. Textos escolhidos de cultura e arte populares, Rio de Janeiro, v. 7, n. 1, p. 19-29, maio 2010. 7 Orientação didática. Tribo indígena que vive isolada no interior do Acre, sem contato com nenhum outro grupo humano M u se u C as tr o M ay a/ Fo tó g ra fo d es co n h ec id o G ov er n o d o A cr e/ G le ils on M ira n d a Outro ponto para reflexão é que o conceito de arte é uma criação do homem ocidental não indígena, portanto estrangeiro às sociedades indígenas. Arte, aliás, é uma palavra inexistente na maioria das línguas indígenas. Quando um indígena cria uma cerâmica, pinta seu corpo para um ritual ou faz um cocar, geralmente não é movido por nenhuma intenção artística. Apesar dessa diferença, há uma produção de objetos e expressões que tem, do passado aos dias de hoje, alto valor estético e simbólico e que colabora substancialmente para a definição da identidade do povo brasileiro. As artes indígenas brasileiras, tomadas aqui como o conjunto das produções (artes visuais, músicas, danças e repre- sentações) de todas as etnias indígenas do país, são milenares e existem desde antes da colonização do Brasil. © C re at iv e C om m on s/ H ér cu le s Fl or en ce 14 Volume 8 Cerâmica marajoara Urnas funerárias marajoaras Uma das sociedades indígenas cuja produção artística merece destaque é a marajoara, da região da Ilha de Marajó, na foz do Rio Amazonas, entre os estados do Pará e do Amapá. Acredita-se que a cultu- ra marajoara foi uma das sociedades mais complexas que se desenvolveu na Amé- rica, e dela legamos uma vasta produção de cerâmicas, atualmente distribuídas em museus de várias parte do mundo. [...] As pesquisas realizadas pelos arqueólogos Betty Meggers (1921) e Clifford Evans (1920-1981), entre as décadas de 1940 e 1960, identificam distintas tradições cerâmicas amazônicas pelos tipos de decoração empregados. A hachurada, que remonta às primeiras ocupações da ilha, pelos ananatubas, ceramistas mais antigos da região (primeiro milênio a.C.); a borda-incisa, característica da região do Solimões; a inciso-pon- teada, do baixo e médio Amazonas; a de Santarém, atribuída aos índios tapajós; e a policrômica, notável pela riqueza da decoração, complexidade de motivos, uso de cores (vermelha, branca e preta) e técnicas variadas, como modelagem, incisão e excisão. A essa tradição pertence a fase marajoara dos povos que se instalam na ilha, na região do lago Arari. ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL. Arte marajoara. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo5353/arte-marajoara-ceramica- marajoara>. Acesso em: 1 jun. 2015. Essa sociedade teve grande expressão na produção de cerâmicas (de 400 d.C. a 1350 d.C.) de várias formas e com traçados simétricos e repetições, característicos da tribo – centrados em símbolos que representavam figuras huma- nas e animais da floresta. Há representações de animais (zoomorfismo), de pessoas (antropomorfismo) e mesmo de pessoas misturadas com animais (antropozoomorfismo). As cerâmicas tinham diversos fins: vasos, bancos, miniaturas, estátuas, pratos, tangas (ou tapa-sexos), potes, chocalhos, apitos, brinquedosinfantis e, entre os mais impactantes, urnas funerárias. A decoração dos objetos é repleta de motivos geométricos com padrões repetidos, pintados com tintas extraídas de vegetais e minerais encontrados na Região Amazônica: o vermelho extraído do urucum; o branco, do caulim; e o preto, do jenipapo e do carvão. A peça cerâmica era queimada em fogueira a céu aberto ou dentro de um buraco e, depois, recebia um tipo de verniz retirado do jatobá. Esses objetos históricos podem ser apreciados em museus e, ainda hoje, cerâmicas do mesmo estilo são produzidas por artesãos de Belém e da Ilha de Marajó. 8 Orientação didática. © C re at iv e C om m on s/ M ar ie -L an N g u ye n © C re at iv e C om m on s/ D ad er ot © C re at iv e C om m on s/ M ar ie -L an N g u ye n © C re at iv e C om m on s/ D ad er ot Adornos dos indígenas brasileiros Indígena da etnia enawene-nawe Indígena da etnia terena Indígena da etnia bororo © C re at iv e C om m on s/ Yv es P ic q A Br /V al te r C am p an at o A Br /V al te r C am p an at o No livro Maíra, Darcy Ribeiro narra a cena de um ritual e os detalhes dos adornos utilizados pelos índios da fictí- cia tribo dos mairun, criada a partir de características de várias tribos indígenas brasileiras. 15 No centro do círculo, bem destacado, de costas para o sol, está o velho aroe. Leva na cabeça o maior de todos os cocares. É feito de flechas emplumadas, que saem de sua cabeça para cima, para os lados e para trás, formando um sol de raios. É tão grande que, com ele, mesmo sentado, Remui é maior que Teró que está de pé, estacado a seu lado, levando nas costas o couro especado do jaguarouí acaguçu. Atrás dele, também com grandes cocares, mas muito menores, estão Jaguar e Náru. Jaguar com um cocar de penas amarelas de cauda de japuí, montado como um pequeno sol sobre uma armação de varetas. Náru com um cocar de penas de araras-azuis. Além dos tembetás, pulseiras e todos os demais adornos. Estão também esplendidamente pinta- dos: Jaguar todo rubro de vermelho-urucum, Náru, negro-azulado de jenipapo. O velho aroe leva apenas seu enorme acanitar solar, Teró somente o pelame negro luzidio que contrasta com seu corpo branco de tabatinga. A grande roda do povo Mairum vê, de frente, com toda unção, o Sol-Coraci que nasce, enorme, vermelho, dentro do cocar gigantesco de Remui, e sobe, lentamente, azulando o céu e colorindo o mundo. [...] RIBEIRO, Darcy. Maíra. São Paulo: Global, 2014. p. 118. O cocar é formado por penas presas geralmente a uma fita de couro e utilizado na cabeça. Como descrito no texto de Darcy Ribeiro, sua utilização é ritualística, pois acredita-se que o cocar, mais do que cumprir uma função estética, empodera quem o usa para o cumprimento de funções espirituais e políticas. O corpo como suporte de uma arte ritualística O corpo é um suporte importante para a caracterização dos indígenas aos rituais. Essa caracterização obedece a um sistema de comunicação visual rigidamente estruturado, geralmente formado por desenhos de motivos abstratos relacionados a elementos da natureza: peixes, aves, mamíferos, plantas, serpentes e quelônios. Pintar o corpo é uma forma de sobrepor uma “pele social” à biológica, frequentemente desnuda. Há uma variedade imensa de grafismos aplicados sobre o corpo, sempre respeitando um código prévio do grupo, relativo à simbologia do ritual. Normalmente, as pinturas são feitas com algum tipo de pincel e com as mãos, e as tintas são provenientes do urucum, do carvão, do jenipapo e de outras sementes e raízes. Máscaras também são confeccio- nadas com pó de casca de ovo, cera de abelha, resina, algodão e penugens. A Br /V al te r C am p an at o Cocares, colares, pulseiras, brincos, máscaras e narigueiras estão entre os adornos mais comuns utilizados pelos indígenas. 16 Volume 8 Padrões de desenho dos índios caiapó-xicrin para pintura facial: borboleta (I e II), casca de jaboti (III, IV e V), vértebra de cobra (VI, VII e VIII) ConexõesConexões Diversas tribos indígenas de diferentes etnias povoavam a América de norte a sul quando os europeus chegaram ao continente. Assim como no Brasil, no restante do continen- te americano, as tribos produziam artefatos sem uma preo- cupação exclusivamente estética, e sim no contexto de um cotidiano espiritualizado e interconectado com a cosmologia, e todas elas obedecendo a uma organização social e política própria. Povos indígenas da América Central protagoniza- ram um desenvolvimento cultural ímpar, de 2500 a.C. a 1500 d.C., quando foram dizimados pelo contato com os eu- ropeus. Ao longo desses três milênios de história, sistemas sociais foram criados, com exuberante arquitetura (como atestam as pirâmides no México), uma complexa organização política e uma arte desenvolvida em cerâmicas, pinturas, es- culturas, tapeçaria, ornamentos e vestimentas. Entre os povos mais importantes, estão os olmecas, os maias, os mixtelcas, os toltecas e os astecas. Na América do Norte, também existia uma profusão de línguas, organizações sociais e ambientes que moldaram as culturas de cada povo nativo. Ao mesmo tempo, havia exten- sas rotas comerciais ativas por todo o continente, permitindo um fluxo de ideias e materiais. Técnicas de cerâmica, escul- tura e tecelagem, por exemplo, foram passadas de uma tribo a outra, sendo incorporadas às antigas tradições culturais. 9 Encaminhamento didático. Nos dias atuais, em que as tribos vivem um crescente contato entre diferentes etnias, além de conexões com a socie- dade não indígena, o desenvolvimento das manifestações artísticas pertence a um processo de afirmação de identidade. 10 Orientação didática. D ou g la s N og u ei ra . 2 01 5. M is ta . Padrões de desenho dos índios caiapó-xicrin para pintura corporal, referentes a épocas da vida das mulheres. Da esquerda para a direita: com filho recém-nascido (primeira e quarta), fim de resguardo (segunda), fim de resguardo pós-nascimento do filho (terceira), pintura ritual (quinta) Arte 17 Hora de estudo 1. (ENEM) Queijo de Minas vira patrimônio cultural brasileiro O modo artesanal da fabricação do queijo em Minas Gerais foi registrado nesta quinta-feira (15) como patrimônio cultural imaterial brasileiro pelo Conselho Consultivo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O veredicto foi dado em reunião do conselho realizada no Museu de Artes e Ofí- cios, em Belo Horizonte. O presidente do Iphan e do conselho ressaltou que a técnica de fabricação artesanal do queijo está “inserida na cultura do que é ser mineiro”. Folha de S. Paulo, 15 maio 2008. Entre os bens que compõem o patrimônio nacional, o que pertence à mesma categoria citada no texto está representado em: Mosteiro de São Bento (RJ) Conjunto arquitetônico e urbanístico da cidade de Ouro Preto (MG) Sítio arqueológico e paisagístico da Ilha do Campeche (SC) Tiradentes esquartejado (1893), de Pedro Américo Ofício das paneleiras de Goiabeiras (ES) 2. (ENEM) Submergidos no interior da sociedade, sem reconhecimento formal, esses grupos passam a ser vis- tos de diferentes perspectivas pelos seus intérpretes, a maioria das vezes, engajados em discussões que se polarizam entre artesanato, cultura erudita e cultura popular. PORTO ALEGRE, M. S. Arte e ofício de artesão. São Paulo, 1985 (adaptado). O texto aponta para uma discussão antiga e recorrente sobre o que é arte. Artesanato é arte ou não? De acordo com uma tendência inclusiva sobre a relação entre arte e educação, a) o artesanato é algo do passado e tem sua sobrevivência fadada à extinção por se tratar de trabalho estático pro- duzido por poucos. b) os artistas populares não têm capacidade de pensar e conceber a arte intelectual, visto que muitos deles sequer dominam a leitura. X c) o artista popular e o artesão, portadores de saber cultural, têm a capacidade de exprimir, em seustrabalhos, deter- minada formação cultural. d) os artistas populares produzem suas obras pautados em normas técnicas e educacionais rígidas, aprendidas em escolas preparatórias. e) o artesanato tem seu sentido limitado à região em que está inserido como uma produção particular, sem expansão de seu caráter cultural. a) d) X e) b) c) 18 19 Ponto de partida 16 Quando o Brasil fo i visto pelo mundo Observe as imagens e converse com os colegas sobre as questões propostas. 1. O que essas obras retratam? 2. Quem, na Época Colonial, fez pinturas como essas? 3. Com que propósito? 4. Imagens como essas ajudaram a retratar o país? ECKHOUT, Albert. Dança dos Tarairiu (Tapuias). [16--]. 1 óleo sobre tela, color., 172 cm × 295 cm. Museu Nacional da Dinamarca, Copenhague. POST, Frans. Vista da cidade Maurícia e Recife. 1657. 1 óleo sobre madeira, color., 46 cm × 83 cm. Coleção particular. 1 Coleção particular/Fotógrafo desconhecido Museu Nacional da Dinamarca/Fotógrafo desconhecido No início do Brasil Colônia, quando os portugueses passaram a ingressar no território, era hábito que alguns artistas fizessem parte da comitiva de explora- ção do país a fim de pintar e retratar a geografia, a fauna, a flora, o clima e os costumes dos habitantes. O general holandês João Maurício de Nassau (1604-1679) chegou ao Brasil em 1637. No período que ficou na colô- nia, conseguiu desenvolver a economia do açúcar e do fumo, transformando Recife em uma capital moderna. Como Nassau tinha fortes interesses artísticos, trouxe em sua comitiva pintores e retra- tistas para documentar o Brasil. Os artistas encontraram uma região muito diferente de tudo o que já tinham visto, como a vegetação inexplorada e os animais exóticos, além da forma como os indígenas se comportavam – andando nus, dançando, realizando rituais e vivendo de alimentos retirados somente da natureza. Entre os seis pintores de Nassau, estavam Frans Post e Albert Eckhout, que retrataram o Brasil como um paraíso, pintando índios nus, paisagens, tipos étnicos, a fauna e a flora e fazendo com que a Europa tivesse uma visão idílica do país. O holandês Frans Post (1612-1680) tinha apenas 24 anos quando chegou ao Brasil e fez diversas pinturas para registrar suas expedições pelo Nordeste com Nassau. Artistas da colônia compreender as obras dos artistas europeus que pintaram retratos e paisagens do Brasil Colônia; entender as artes visuais dos povos africanos; reconhecer os sons africanos que influenciaram ritmos brasileiros; conhecer o flamenco e suas influências ciganas. que pintaram retratos e paisagens do Brasil Colônia; os; Objetivos da unidade: Mapa do Brasil de 1519, produzido por António Holanda idílica: visão poética e suave, ligada à fantasia e ao sonho. D ép ar te m en t d e C ar te s d e la B ib lio th éq u e N at io n al e/ Fo tó g ra fo d es co n h ec id o Pi n ac ot ec a d e Sã o Pa u lo /F ot óg ra fo d es co n h ec id o POST, Frans. Vila de Ipojuca. 1640. 1 óleo sobre tela, color., 45 cm × 59,7 cm. Pinacoteca Municipal de São Paulo, São Paulo. (Detalhe). O pintor e desenhista holandês Albert Eckhout permaneceu no Brasil por sete anos. A técnica utilizada em suas naturezas-mortas, nas quais as frutas eram mostradas em sua plenitude, com cores fortes, foi considerada inovadora para o século XVII. M u se u N ac io n al d a D in am ar ca /F ot óg ra fo d es co n h ec id o ECKHOUT, Albert. Índia Tupi. 1641. 1 óleo sobre tela, color., 274 cm × 163 cm. Museu Nacional da Dinamarca, Copenhague. ECKHOUT, Albert. Bananas, goiaba e outras frutas. [16--]. 1 óleo sobre tela, color., 91 cm × 91 cm. Museu Nacional da Dinamarca, Copenhague. Fazer artístico 2 Encaminhamento metodológico. Imagine que você é um pintor estrangeiro que chega pela primeira vez à sua comunidade – como aconteceu com os pintores que Maurício de Nassau trouxe ao Brasil. Observe atentamente, com “olhos virgens”, os elementos da natureza e dos costumes locais, como a vegetação, os animais, as moradias, as vestimentas e o modo de viver dos habitantes. Descreva, a seguir, suas descobertas e, depois, faça uma pintura retratando essa “realidade estrangeira”. Pessoal. M u se u N ac io n al d a D in am ar ca /F ot óg ra fo d es co n h ec id o Arte 21 Missão Artística no Brasil No início do século XIX, a Família Real portuguesa se exilou no Brasil para fugir da ameaça de invasão do exército de Napoleão Bonaparte, em virtude do confli- to entre a Inglaterra e a França. O príncipe regente D. João VI (1767-1826), sua família e uma comitiva de mi- lhares de pessoas chegaram ao Brasil Colônia em 1808. A vinda da família real para o Rio de Janeiro deu início a uma série de reformas administrativas, sociais, econômicas e culturais na cidade, a fim de adaptá-las às necessidades da nobreza. Fundaram- -se as primeiras fábricas, além de instituições como o Banco do Brasil, a Biblioteca Real e a Imprensa Régia. A partir daí, o Brasil passou a receber forte influência da cultura europeia, o que se evidenciaria ainda mais com a vinda da chamada Missão Artística Francesa. PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São Paulo: Ática, 2005. p. 139. No Brasil, a influência cultural europeia se intensificou com a chegada de um grupo de artistas franceses, conhe- cido como Missão Artística Francesa, que fundou a Academia Imperial de Belas Artes, no Rio de Janeiro, em 1826. A Missão Artística Francesa ensinava conhecimentos técnicos industriais e artísticos, como desenho de observação e cópia de moldes. A Academia Imperial de Belas Artes buscava o domínio técnico, o equilíbrio da composição e da proporção, se- guindo o modelo europeu do Neoclassicismo e adaptando as obras para a realidade local, especialmente paisagens, retratos (de nobres) e cenas históricas. Entre os artistas da Missão Artística Francesa, destacaram-se Nicolas-Antoine Taunay e Jean-Baptiste Debret, além de outro pintor europeu atraído pela beleza dos trópicos: Johann Moritz Rugendas, da Alemanha. Jean-Baptiste Debret (1768-1848), o mais conhecido artista da Missão Francesa, fez retratos da realeza e cenários para o Teatro São João. Foi professor e realizou, em 1829, a primeira exposição artística no Brasil. Mais tarde, quando retornou à França, publicou o livro Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, documentando a natureza e os costumes da sociedade do Brasil do início do século XIX. DEBRET, Jean-Baptiste. Negra tatuada vendendo cajus. 1827. 1 aquarela sobre papel, color., 15,7 cm × 21,6 cm. Museu Castro Maya, Rio de Janeiro. M us eu d e A rt e de S ão P au lo /F ot óg ra fo d es co nh ec id o M u se u C as tr o M ay a/ Fo tó g ra fo d es co n h ec id o DEBRET, Jean-Baptiste. O caçador de escravos. [ca. 1825]. 1 óleo sobre tela, color., 80 cm × 112 cm. Museu de Arte de São Paulo, São Paulo.22 Fazer artístico Em duplas, inspire-se no trabalho de Rugendas e, utilizando ape- nas o grafite, faça um desenho de observação de um colega (do rosto dele ou do espaço em que ele está). Procure caracterizar o entorno e respeitar as proporções. Materiais • Papel sulfite RUGENDAS, Johann Moritz. Botocudo típico (aimoré). [ca. 1835]. 1 litografia, 52 cm × 64 cm. Viagem pitoresca através do Brasil. Nascido na Alemanha, Johann Moritz Rugendas (1802-1858) se destacou como ilustrador e pintor da vida cotidiana de vários grupos sociais brasileiros. Desenhou plantas, animais, indígenas, africanos, retratos e paisa- gens. Usando os registros, fez o livro Viagem pitoresca através do Brasil, com cem desenhos. 3 Encaminhamento didático. • Lápis grafite Como fazer 1. Para respeitar as proporções do que está sendo observado, você deve comparar os tamanhos. Uma técnica simples é uti- lizar o lápis como parâmetro para medir, como se fosseuma régua, utilizada a distância. 2. Permaneça no mesmo local, se necessário, faça uma marca no chão. Ao fazer a medição, lembre-se de deixar o braço sempre na mesma posição, comparando o tamanho do lápis com o que quer retratar, tanto na horizontal quanto na vertical. Anote os pontos na folha. 3. Utilize efeitos de sombreamento, produzido com o próprio grafite, para mostrar regiões mais claras e mais escuras. Nicolas-Antoine Taunay (1755-1830) também foi um importante pintor da Missão Francesa. Ele havia pintado várias cenas de batalhas de Napoleão antes de vir ao Brasil, onde ficou por cinco anos e pintou diversas paisagens da região do Rio de Janeiro. D ou g la s N og u ei ra . 2 01 5. M is ta . TAUNAY, Nicolas-Antoine. Vista do Rio de Janeiro tomada do Alto da Boa Vista. 1819. 1 óleo sobre tela, color., 52 cm × 64 cm. Museu Castro Maya, Rio de Janeiro. Vi ag em p ito re sc a at ra vé s d o Br as il/ Fo tó g ra fo d es co n h ec id o. Museu Castro Maya/Fotógrafo desconhecido Arte 23 Artes visuais dos povos africanos As diversas sociedades africa- nas e o capital cultural oriundo de cada uma delas, que se diferen- cia tanto pelo contexto em que foi produzido quanto pela função, contribuíram imensamente para a formação cultural do Brasil. Os objetos criados pelos africa- nos eram, frequentemente, vistos como etnográficos, sendo, posteriormente, considerados pelos europeus como arte primitiva. Mas, para os povos que os desenvolviam, representavam poder, status, prestígio e a força de seus ancestrais. [tais objetos] nunca ou raramente são apenas decorativos ou estéticos, como grande parte da arte ocidental. Muitas vezes eles não eram feitos para serem admirados; alguns nem sequer podiam ser vistos por todos. O fundamental nestes objetos era seu sentido, a expressão de ideias e valores civilizatórios e a propriedade de colocar em ação forças a favor do ser humano. A ideia de “arte pela arte” é estranha aos africanos. O próprio termo “arte”, como atividade autônoma, separada da vida, é praticamente inexistente nas línguas africanas”. Apesar disso, tais objetos têm uma evidente qualidade estética, que inclui noções de equilíbrio, proporção, simetria – como expresso no conceito yoruba ojú-onà, que pode ser traduzido como “consciência do design”. Os artistas utilizam códigos reconhecidos por todo o grupo social, que resultam em características formais e iconografia específicas. Se o aspecto formal dos objetos não era um fim em si mesmo, ele não deixava de ser fundamental para expressar valores culturais. Desta maneira, o famoso “geometrismo” da arte africana, presen- te na decoração e no design das peças, através do uso de espirais, zigue-zagues e outros padrões geométricos, exprime a ideia de prosperidade, fertilidade, continuidade da vida e, mais que isso, procura propiciá-las. Da mesma forma, a simetria e a dualidade exprimem o equilíbrio entre dimensões complementares da vida hu- mana, como masculino e feminino, vivos e ancestrais, passado e futuro. A distorção das proporções naturais do corpo humano é usada para evidenciar hierarquias, seja dos atributos do próprio ser humano, associados a determinadas partes do corpo, seja entre indivíduos de um grupo social; longe de ser uma “imperfeição” ou “falta de técnica”, como acreditavam os europeus no século XIX, tal distorção é intencional e calculada para produzir sentidos e exprimir valores socioculturais. MAFRO – Museu Afro-brasileiro. Setor África: projeto de atuação pedagógica e capacitação de jovens monitores – Material do professor. Disponível em: <http://www.mafro.ceao.ufba.br/userfiles/files/Material%20do%20Professor%20-%20%C3%81frica.pdf>. Acesso em: 23 jul. 2015. Para se ter uma ideia do preconceito em relação às artes africanas, a coleção de mais de mil peças criadas a partir do século XIII – conhecida como os “bronzes de Benin”, proveniente do país da região ocidental da África – demorou anos para ser reconhecida como africana, tendo sua autoria dada primeiramente a europeus. Em virtude do alto apuro técnico e estético, essas esculturas sequer foram chamadas de objetos primitivos. Nas comunidades e aldeias da África contemporânea, ainda ocorre a produção desses objetos (máscaras, esculturas, emblemas, jogos divinatórios, instrumentos musicais, etc.), geralmente criados para garantir prosperidade, fertilidade e comunicação com ancestrais em rituais e orientar as ações da comunidade. A maioria das peças africanas não é naturalista, pois os artistas não tentam representar as coisas como são, mas segundo seus valores culturais e seus ideais. , a rica- s como eus La tin St oc k/ C or b is /C h ris tie 's Im ag es L td LatinStock/Alamy/Judith Collins/Alamy/Paul Williams, ©Shutterstock/Danshutter Máscaras africanas t “ t ” ti id d [Sem título]. 1500-1700. 1 escultura, bronze. Benin, África. 24 Volume 8 A arte primitiva, com seus traços simples e fortes, despertou o interesse de muitos artistas do início do século XX, e Pablo Picasso foi um dos que voltaram o olhar para essa forma de construção da imagem. O seu interesse por artefatos africanos é bem evi- dente na pintura Les Demoiselles d’Avignon. Essa tela, que representa a cena de um bordel de Barcelona, tornou-se um marco na pintura ocidental. Apesar da reação provocada, a inovação pictórica, principalmente no que se refere ao uso de ângulos agudos, garantiu que o quadro passasse a ser refe- rência para a pintura cubista, dominando o estilo de representação desse período. Nessa pintura, Picasso representa cinco mulheres e uma natureza-morta (mesa com frutas, na parte inferior) por meio de figu- ras distorcidas que parecem estar achatadas a ponto de se fundirem com o fundo. A figura da esquerda tem uma de suas pernas fragmentada, sugerindo a integração com o fundo ocre, e os traços da arte pri- mitiva foram usados com o objetivo de conferir um efeito selvagem às figuras. Interseção Segundo Gauguin, os fauvistas haviam descoberto o apelo estético da escultura da África e da Oceania; no entanto, foi Picasso, mais do que eles, quem usou a arte primitiva como um aríete contra a concepção clássica de beleza. Não somente as proporções, mas também a integridade orgânica e a continuidade do corpo humano são negados aqui, de modo que a tela (nas palavras precisas de um crítico) “assemelha-se a um campo de vidro quebrado”. [...] as Senhoritas não podem mais ser lidas como uma imagem do mundo exterior; elas têm o seu próprio mundo, análogo à natureza, mas construído segundo princípios diferentes. JANSON, H. W.; JANSON, Anthony F. Iniciação à história da Arte. São Paulo: Martins Fontes, 2009. p. 365-367. PICASSO, Pablo. Les Demoiselles d’Avignon. 1907. 1 óleo sobre tela, color., 244 cm × 234 cm. Museu de Arte Moderna, Nova Iorque. Fazer artístico Crie uma pintura, assim como fez Picasso, inspirada em máscaras africanas e na arte considerada primitiva. Materiais • Papel sulfite ou tela para pintura • Lápis de diferentes cores ou tintas Como fazer 1. Primeiramente, reúna-se em grupo com os colegas e, juntos, façam uma pesquisa sobra a arte africana. 2. Em seguida, em uma folha à parte, cada integrante do grupo deve desenhar uma máscara de traços fortes, que se remeta às africanas, com a finalidade de experimentação. 3. Para finalizar, em um papel ou uma tela de pintura, usando cores fortes, produza uma obra que contenha características da máscara criada. 4 Orientação didática. Museu de Arte Moderna de Nova Iorque/Fotógrafo desconhecido Arte 25 Sons da África: sons que influenciaram as músicas e as danças do Brasil Na época do Brasil Colônia, a chegada dos africanos ao nosso território trouxe muitas tradições culturais e diversos costumes característicos desses povos, que se uniram às manifestações indígenas aqui existentes e à cultura europeia, trazida pelos colonizadores.Capoeira para escutar e dançar A capoeira é uma das manifestações culturais de povos africanos que chegaram ao Brasil na época da escravidão. Ela se caracteriza por movimentos rápidos de chutes, rasteiras e acrobacias. O artista Rugendas ilustrou, em uma série de pinturas, grandes contribuições que os povos africanos trouxeram para o Brasil na Época Colonial, entre elas a ca- poeira, com sua música e dança. As danças de roda, como a capoeira, o coco, o jongo, o marimbondo, a ciranda, o lundu e o fandango, tiveram origem nas tradições e nas danças dos escravizados africanos trazidos ao nosso país. Em várias delas, os dançarinos imitam gestos dos escravizados fugindo de abelhas (marimbondo), quebrando cocos com os pés (coco), etc. Apesar do que o nome pode sugerir, as danças de roda não são necessariamente para crianças, mas manifestações popu- lares milenares que existem em diversas culturas ao redor do mundo. Essa obra mostra o jogo da capoeira – espécie de luta, dança e esporte, praticado em roda, com música cantada durante a prática RUGENDAS, Johann Moritz. Jogar capoeira. 1835. 1 litografia, color., 52 cm × 64 cm. Viagem pitoresca através do Brasil. mbondo), quebrando Pessoas jogando capoeira © Sh ut te rs to ck /A n to n io S co rz a Vi ag em p ito re sc a at ra vé s d o Br as il/ Fo tó g ra fo d es co n h ec id o 26 Volume 8 Ciranda A ciranda (palavra que tem origem no vocábulo espanhol zaranda, obje- to usado para peneirar farinha) é uma dança de roda que veio de Portugal, mas se mesclou com o ritmo dos instrumen- tos trazidos pelos africanos. Alguns his- toriadores acreditam que a ciranda foi criada por mulheres de pescadores, que, enquanto esperavam seus companheiros voltarem do mar, cantavam e dançavam. Daí surgiram os movimentos do corpo que lembram as ondas do mar. Dança típica da região litorânea, especialmente de Pernambuco, a ciranda se espalhou por outras regiões. Os curandeiros realizam a coreografia enquanto o mestre, o contramestre e os músicos entoam as canções e tocam instrumentos, como o tarol, o surdo, a zabumba, o mara- cá e o ganzá. A coreografia é simples, com um passo básico execu- tado com movimentos lentos: o pé esquerdo faz a marca- ção (com o som do surdo), e a roda gira para a direita. O mestre puxa o canto da ciranda em uma dança marcada pela alegria, pela colaboração e pelo sentimento de fazer parte de um grupo. BORGES, Severino. Ciranda. 1 xilogravura. Fazer artístico Ouça algumas cirandas com os colegas e, de- pois, experimente dançá-las. Para isso, siga os passos a seguir e as orientações do professor. 1. Com a música tocando e o grupo cantando junto, façam uma grande roda e fiquem de mãos dadas. 2. Com a roda girando para a direita, comecem a se movimentar. 3. No ritmo da música, coloquem o pé esquerdo para a frente, reposicionem o pé direito para o lado e tragam então o pé esquerdo para trás. 4. A cada movimentação dos pés, desloquem-se um pouco para a direita, movimentando a roda. 5. Abaixem os braços quando forem para trás, abrindo a roda, e os levantem quando derem o passo para a frente, fechando a roda. 5 Encaminhamento metodológico. La tin st oc k Br as il Zabumba Pulsar Imagens/Delfim Martins Ganzá ©Shutterstock/Skyline La tin st oc k/ Le o D ru m on d /N itr o Im ag en s Ciranda realizada em uma escola de Minas Gerais Arte 27 Troca de ideias Jongo, caxambu ou tambu O jongo, mescla de dança e música de origem africana, é um dos gêneros que influenciaram o surgimento do samba. Conhecido também como caxambu e tambu, expandiu-se principalmente no Sudeste do Brasil, nas regiões que tinham fazendas de café. Conta com instrumentos de percussão feitos de madeira e couro, além do candongueiro, da puíta (espécie de cuíca grande) e do guaiá (tipo de chocalho). Os dançarinos, chamados de jon- gueiros, ficam em círculo cantando e batendo palmas enquanto outros fazem coreografias ágeis no centro da roda. Uma das movimentações típicas tem o nome de umbigada, em que o dançari- no encosta seu umbigo em outra pes- soa, chamando-a para substituí-lo. A música é cantada por um ou mais solistas que entoam pontos, ou seja, desafios para o coro (outros dançari- nos e músicos) responder. Atualmente, o jongo é dançado principalmente em festas em homenagem a santos e divin- dades afro-brasileiras. Foto de uma apresentação do Grupo de Caxambu (Jongo) Michel Tannus em Porciúncula, RJ Em grupo, façam uma pesquisa sobre as músicas e as danças típicas de sua região. Procurem responder às seguintes questões: 1. Como essa música/dança se originou? 2. Como é tocada? Com quais instrumentos? 3. Como é dançada? 4. Ela teve influência das culturas africanas? 6 Orientação didática. O samba da minha terra deixa a gente mole O samba é um gênero de música e dança surgido no século XIX, na Bahia, como deriva- ção de ritmos africanos provenientes da Angola e do Congo. Depois, no início do século XX, de- senvolveu-se no Rio de Janeiro e se tornou uma das maiores manifestações culturais e caracterís- ticas do povo brasileiro. Desde seu surgimento, o samba foi tocado e dançado em roda ao som de palmas, canto e instrumentos, que foram, aos poucos, sendo incorporados ao gênero. Quilombola tocando pandeiro em uma comunidade remanescente de quilombolas do Curiau, em Macapá, Amapá © C re at iv e C om m on s/ Va n es sa F re ita s Latinstock/João Marcos Ro sa/Nitro Imagens 28 Volume 8 No centro, as pessoas dançavam. As letras das músicas traziam simplici- dade e ritmo contagiante, sincopado e repetitivo. O samba também é, muitas vezes, chamado de batuque e de samba de roda. O "encontrão", dado geralmente com o umbigo (semba, em dialeto angolado) mas também com a perna, serviria para caracterizar esse rito de dança e batuque, e mais tarde dar- lhe um nome genérico: samba [...]. Nos quilombos, nos engenhos, nas plantações, nas cidades, havia samba onde estava o negro, como uma inequívoca demonstração de resistência ao imperativo social (escravagista) de redução do corpo negro a uma máquina produtiva e como uma afirmação de continuidade do universo africano. SODRÉ, Muniz. Samba: o dono do corpo. Rio de Janeiro: Mauad, 2007. p. 12. d b i d d síncope: ausência de um compasso na mar- cação do tempo musical que repercute em outro mais forte. Dito em outros termos, é a batida que falta. O batuque era dançado ao som de vários instrumentos de percus- são. Antigamente, tanto as palavras batuque quanto samba diziam respeito a um baile popular, sendo também conhecidos como zambê, fandango, cateretê, arrasta-pé, brin- cadeira, balança-flandre, baiana, fobó, forró, pagode, forrobodó. Depois da abolição da escrava- tura, muitos negros, vindos princi- palmente da Bahia, foram para o Rio de Janeiro e se estabeleceram nos morros, levando o hábito de produ- zir músicas e dançar, chamando as Samba de roda com baianas festas que faziam de samba. Daí surgiu o samba hoje conhecido por todos nós e que, a partir do Rio de Janeiro, espalhou- -se pelo Brasil e caracteriza um dos principais ritmos do país, tocado especialmente no carnaval. [...] entre 1916 e 1933, o samba [passou a] in- tegrar um modo de ser ancorado na modernidade e na centralidade urbana, sinônimo de um jeito ca- rioca de ser. Dada a influência cultural e comercial da capital do país, o samba deixou de ser apenas carioca, para se tornar “brasileiro” [...] Ainda assim, não cessaram as perseguições policiais e as inúmeras vozes que viam no samba e no mundo dos sambistas a expressão do atraso e da ignorância nacionais. O Carnaval se expandia, a partir das escolas de samba, o mercado musical adotava o gênero cada vez mais, mas ainda faltava muito para o samba – e, por exten- são, para a música popular – ser reconhecido como monumento da culturabrasileira pelas elites letradas. Bateria em uma escola de samba no carnaval © Sh u tt er st oc k/ A .R IC A RD O © M in is té rio d a C u lt u ra NAPOLITANO, Marcos. A síncope das ideias: a questão da tradição na música popular brasileira. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2007. p. 31. (História do Povo Brasileiro). Arte 29 Curiosidades Di Cavalcanti (1897-1976), um dos maiores artistas plásticos brasileiros, é autor da obra Samba, tida por alguns teóricos da arte como o mais importan- te e representativo quadro da cultura do país. Essa obra foi feita em 1925 e mostra a influência africana na cultura do Brasil. Infelizmente, a obra foi destruída em um incêndio, em agosto de 2012. DI CAVALCANTI, Emiliano. Samba. 1925. 1 óleo sobre tela, color., 177 cm × 154 cm. Coleção Geneviève e Jean Boghici. [...] Eu nasci com o samba No samba me criei E do danado do samba Eu nunca me separei [...] Fazer artístico Faça um pandeiro, instrumento musical característico do samba, com materiais recicláveis. Depois, experimente fazer o ritmo do samba e criar uma música com o instrumento. Materiais • 1 prato de plástico duro (como de vasos de planta) • Tampinhas de metal de garrafas de vidro • Barbante • 1 prego • Tesoura • Martelo Como fazer 1. Amasse as tampinhas com um martelo. 2. Com um prego, faça um furo em cada uma delas. 3. Depois, marque com uma caneta e faça pequenos furos ao redor (na borda) do prato de plástico. 4. Passe o barbante pelos furos de duas ou três tampinhas. 5. Em seguida, passe uma ponta do barbante com as tampinhas por um dos furos feitos no prato de plástico e faça um nó. 6. Repita os dois últimos passos, preenchendo todos os furos do prato com tampinhas. Seu pandeiro está pronto! 7 Encaminhamento metodológico. C ol eç ão G en ev iè ve e J ea n B og h ic i/ Fo tó g ra fo d es co n h ec id o La tin St oc k/ M as te rf ile Mulher tocando pandeiro CAYMMI, Dorival. O samba da minha terra. Disponível em: <http://www. jobim.org/caymmi/bitstream/handle/2010.1/11789/osambadaminhaterra- letra1-2.jpg?sequence=2>. Acesso em: 15 set. 2015. Sugestão de atividades: questões 1 a 3 da seção Hora de estudo. Atualmente, o samba é tocado com instrumentos de percussão (tambor, tamborim, pandeiro), de cordas (violão, cavaquinho, bandolim) e, algumas vezes, também de sopro (como flauta e saxofone). 30 Volume 8 Olé! Flamenco e suas influências ciganas ConexõesConexões O movimento de miscigenação que constituiu as culturas locais ocorreu no mundo todo. A partir da segunda metade do século XIX, espanhóis, finlandeses, russos e la- tino-americanos procuraram retratar nas artes seus ideais de nacionalidade. Assim, compositores passaram a incluir em suas obras elementos das tradições rurais e fol- clóricas de seus países. Acreditava-se que essa era uma maneira de garantir maior originalidade às composições e, ao mesmo tempo, valorizar suas culturas nacionais de maneira artística. Se no Brasil a arte se beneficiou da miscigenação das culturas euro- peias, africanas e indígenas, na Espanha a mistura se deu com a música e a dança dos povos ciganos, marcados pela história de luta e caminhar nômade. Assim nasceu o flamenco, com origens pouco conhecidas, mas certamente a partir da combinação das tradições musicais dos espanhóis da região da Andaluzia e dos ciganos. O flamenco é considerado Patrimônio Cultural Imaterial pela Unesco. Sua força e beleza inspiraram muitos compositores a considerá-lo sinônimo de autêntica música espanhola. O termo flamenco aplica-se tanto ao canto (cante) quanto à dança (baile) e à música (toque), os quais, carregados de expressividade, revelam fortes e variadas emoções, como tristeza, alegria, tragédia e medo, em letras breves e simples, na dança característica e no toque expressivo da guitarra flamenca. Trata-se de uma arte de grande vitalidade rítmica e expressividade corporal, cuja performance normalmente agrega músicos e dançarinos. Dançado ao som de música, canto e palmas, o flamenco conta com um sapateado bastante característico, realizado em consonância com os violões e os instrumentos percus- sivos, como cajón e castanholas. Sobre um esquema básico de movimentos típicos, que exploram a dramaticidade e a sensualidade dos movimentos corporais, os bailarinos costumam fazer improvisações, o que possibilita a expressão da individualidade de cada um. As bailarinas usam saias lon- gas e rodadas nas danças, além de leques, xales e sapa- tos próprios para sapatear. Entre as principais es- truturas rítmicas do fla- menco, estão as seguintes: sevillanas, alegría, soleá, bule- rías, farruca, zapateado, tango e zambra. reu no mundo s, russos e la- dade. Assim, s rurais e fol- antir maior uras s co. mo de o (cante) sividade, edo, em a guitarra orporal cuja Paco de Lucía, um famoso violonista flamenco LatinStock/Corbis/DPA/Isabel Schiffler Companhia Antonio Gades, da Espanha, em apresentação no Festival de Teatro, Dança e Música das Ilhas Canárias, em 2010 © Sh u tt er st oc k/ cr ib en Arte 31 Hora de estudo 8 Orientação didática. 1. (ENEM) Torna-se claro que quem descobriu a Áfri- ca no Brasil, muito antes dos europeus, foram os próprios africanos trazidos como escravos. E esta descoberta não se restringia apenas ao reino linguístico, estendia-se também a outras áreas culturais, inclusive à da religião. Há ra- zões para pensar que os africanos, quando mis- turados e transportados ao Brasil, não demo- raram em perceber a existência entre si de elos culturais mais profundos. SLENES, R. Malungu, ngoma vem! África coberta e descoberta do Brasil. Revista USP, n. 12, dez./jan./fev. 1991-92 (adaptado). Com base no texto, ao favorecer o contato de indiví- duos de diferentes partes da África, a experiência da escravidão no Brasil tornou possível a: X a) formação de uma identidade cultural afro-brasileira. b) superação de aspectos culturais africanos por anti- gas tradições europeias. c) reprodução de conflitos entre grupos étnicos africanos. d) manutenção das características culturais específi- cas de cada etnia. e) resistência à incorporação de elementos culturais indígenas. 2. (ENEM) A recuperação da herança cultural africana deve levar em conta o que é próprio do pro- cesso cultural: seu movimento, pluralidade e complexidade. Não se trata, portanto, do res- gate ingênuo do passado nem do seu cultivo nostálgico, mas de procurar perceber o próprio rosto cultural brasileiro. O que se quer é cap- tar seu movimento para melhor compreendê-lo historicamente. MINAS GERAIS. Cadernos do Arquivo 1: Escravidão em Minas Gerais. Belo Horizonte: Arquivo Público Mineiro, 1988. Com base no texto, a análise de manifestações cultu- rais de origem africana, como a capoeira ou o candom- blé, deve considerar que elas a) permanecem como reprodução dos valores e costu- mes africanos. b) perderam a relação com o seu passado histórico. X c) derivam da interação entre valores africanos e a ex- periência histórica brasileira. d) contribuem para o distanciamento cultural entre ne- gros e brancos no Brasil atual. e) demonstram a maior complexidade cultural dos afri- canos em relação aos europeus. 3. (ENEM) A Lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003, in- clui no currículo dos estabelecimentos de ensi- no fundamental e médio, oficiais e particulares, a obrigatoriedade do ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira e determina que o con- teúdo programático incluirá o estudo da Histó- ria da África e dos africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil, além de instituir, no calendário escolar, o dia 20 de novembro como data comemorativa do “Dia da ConsciênciaNegra”. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 27 jul. 2010 (adaptado). A referida lei representa um avanço não só para a edu- cação nacional, mas também para a sociedade brasi- leira, porque a) legitima o ensino das ciências humanas nas escolas. b) divulga conhecimentos para a população afro- -brasileira. c) reforça a concepção etnocêntrica sobre a África e sua cultura. d) garante aos afrodescendentes a igualdade no aces- so à educação. X e) impulsiona o reconhecimento da pluralidade étnico- -racial do país. 32 Volume 8
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