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Laboratório de Materiais III – 2019/3 1 ANÁLISE DE FALHA DE UMA CORRENTE DE CORREIA TRANSPORTADORA PARA BOTIJAS DE GÁS Felipe Marinho Romão1, Iago Areas Cazotto1 1-Departamento de Engenharia Mecânica, Centro Tecnológico, Universidade Federal do Espírito Santo, 29075-910, Vitória, ES – Brasil 1. Introdução Uma correia transportadora é utilizada para transporte de botijas de gás em uma empresa. Após certo tempo de serviço, a corrente do sistema começa a apresentar solavancos, e, então, falhas, sem que os trabalhadores soubessem realmente o motivo. Considerando o funcionamento de uma correia transportadora, é normal que a região mais solicitada seja o pino da corrente, devido a tração que atua no sentido longitudinal da correia, entretanto, a falha não ocorria nesse local. O problema foi levado à Universidade Federal do Espírito Santo por um de seus graduandos que estagiava na empresa. Assim, utilizando os serviços e equipamentos disponíveis no Laboratório de Caracterização de Superfície de Materiais, LCSM, e no Laboratório de Tribologia, Corrosão e Materiais, TRICORRMAT, o presente trabalho propõe uma análise de falha para a corrente fraturada. 2. Procedimento experimental O procedimento de análise foi estruturado da escala macro para micro, compreendendo o problema desde o âmbito mais simples, ao mais complexo. A figura 1 apresenta a peça em questão e a região onde ocorreu a falha. (a) (b) Figura 1 – Corrente que sofreu a falha. Seção fraturada Seção fraturada Laboratório de Materiais III – 2019/3 2 O próximo passo foi a análise no estereoscópio óptico. Em seguida foram realizados ensaios de dureza Brinell, tanto na região da fratura quanto fora dela, a fim de identificar possíveis diferenças traduzidas por distintas propriedades mecânicas do material nas duas áreas. A carga empregada foi de 187 kgf, e o diâmetro do penetrador, de 2,5 mm. Na figura 2 estão dispostas as medidas realizadas. Figura 2 - Ensaio de dureza Brinell. Por fim, foi feita a análise microestrutural das áreas, a fim de investigar características relativas à granulometria e à identificação dos elementos que compõem o material da peça. Os ensaios foram realizados com auxílio de um microscópio Nikon MA 200 Invertido utilizando como reagente Nital 2% e podem ser observados na Figura 6. 3. Resultados Partindo de uma visão macroscópica, nota-se um desgaste maior na parte superior da seção fraturada da corrente quando comparada às outras superfícies. Segundo o operador do equipamento, a corrente encavalava durante o uso, o que, pode ter resultado em mais impactos nessa região, acelerando o processo de falha. Vale ressaltar que não se observou nenhum erro grosseiro de fabricação da peça. Na figura 3, é possível observar pequenos entalhes orientados próximos à superfície, semelhantes às marcas de sargento, muito comuns em materiais que sofreram falha por fadiga. A B C Laboratório de Materiais III – 2019/3 3 A figura 4 apresenta a borda direita da seção fraturada. Nota-se pequenos riscos alinhados, cuja direção pode ter sido a de propagação de trincas. Já na figura 5 é focalizada a borda esquerda da seção, onde observa-se uma região de aspecto liso e brilhante, o que se suspeita ser originada de fratura frágil, principalmente considerando os impactos relatados no funcionamento da peça. Entretanto, a seção apresentou majoritariamente aspectos típicos de fratura dúctil, com destaque nas microcavidades e dimples. Figura 4 – Detalhe da borda direita da seção fraturada. Imagem de estereoscópio. Figura 3 – Entalhes orientados próximos a superfície da seção fraturada Laboratório de Materiais III – 2019/3 4 Após as análises de escala macro e micro, o próximo passo é a identificação do material. Com base na infraestrutura disponível, este trabalho buscou identificar o material com base em sua micrografia e em suas propriedades mecânicas, no caso, a dureza. Os resultados do ensaio de dureza Brinell estão apresentados na Tabela 1. Tabela 1 - Ensaio de dureza Brinell Identificação da impressão Medida [mm] Dureza [HB] A 0,8618 ± 0,0604 311,59 B 0,9117 ± 0,0177 277,31 C 0,9190 ± 0,0333 272,77 Resultado 287,22 ± 22,22 HB Após devida preparação metalográfica, obteve-se a seguinte microestrutura, representada na figura 6. Figura 5 – Detalhe da borda esquerda da seção fraturada. Imagem de estereoscópio. Laboratório de Materiais III – 2019/3 5 Figura 6 - Microestrutura do material analisado A faixa de dureza obtida se enquadra na faixa admitida para ferros fundidos, segundo a ABNT [1]. Aprofundando a análise, é possível ver na microestrutura a presença de estruturas circulares dispostas sobre todo o material. Assim, sugere-se que o material em questão seja o ferro fundido nodular, o qual possui grafita em formato esférico disposta sob a microestrutura. A figura 6 se assemelha também a micrografia de outros estudos na literatura envolvendo ferros fundidos nodulares [2, 3]. Além disso, a suspeita do tipo de material é ratificada ainda mais considerando a sua gama de aplicações. As peças de ferro fundido nodular são comumente utilizadas em casos que demandam maior resistência mecânica, sendo utilizadas, em grande parte, em elementos de maquinas sujeitos a cargas de choque e fadiga, características que condizem com a situação de trabalho da peça alvo deste trabalho. Apesar da necessidade de se analisar outras regiões da peça, é interessante notar que não há vestígios de inclusões ou de elementos segregados no material. Assim, pode-se estabelecer uma hipótese de que a falha não ocorreu por defeitos de fabricação, como por exemplo, defeitos durante um tratamento térmico. 4. Conclusão As hipóteses e vestígios apresentados levam a conclusão de que a falha provavelmente não ocorreu devido a erros no processo de fabricação, visto que a peça apresentou conformidade com o material sugerido tanto no quesito de propriedades mecânicas, tanto na microestrutura. Laboratório de Materiais III – 2019/3 6 As marcas encontradas superficialmente indicam que a corrente sofreu demasiado desgaste, vide principalmente a direção dessas marcas. O desgaste superficial pode ter provocado entalhes, o que possivelmente desencadeou um processo de fadiga. Considerando o tipo de trabalho ao qual a peça estava submetida, impactos e ciclos de tensão, as hipóteses aqui apresentadas se tornam mais prováveis ainda. Portanto, tendo em vista as possíveis causas para o início do problema, é plausível que o sistema mecânico em questão necessitava de manutenção e reforço na lubrificação, o que poderia ter reduzido os danos com desgaste, e, consequentemente, o processo de falha como um todo. 5. Referências William D. Callister, JR., “Materials Science and Engineering an Introduction”, John Wiley & Sons, Inc. [1] ABNT NBR 6916:2017, Ferro fundido nodular ou ferro fundido com grafita esferoidal — Especificação [2] Douglas Ferreira Vidal, “Análise de estrutura e propriedades mecânicas de um Ferro Fundido nodular em processo de fundição produzido pela técnica de imersão de sino”, Dissertação de mestrado, Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, 2013 [3] Raphael F., Eduardo D., Diego R. S. de Lima, “Análise da microestrutura e propriedades mecânicas de um ferro fundido nodular FE-40015 em função do tempo de vazamento”, Semana da Ciência e Tecnologia,I nstituto Federal Catarinense, 2017
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