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98 reportagem A MENINA QUE SE DIZIA QUEBRADA A DEPRESSÃO É UMA REALIDADE ENTRE OS JOVENS EM TODO O MUNDO. O ÍNDICE DA DOENÇA ESTÁ AUMENTANDO GRADATIVAMENTE AO LONGO DOS ANOS NO BRASIL, E PARTE DOS CASOS NÃO É IDENTIFICADA E NEM TRATADA. por César Fontenelle Foto por Aimee Vogelsang em Unsplash 99 Enquanto adolescentes gritavam e corriam de um lado para o outro no pá- tio do Colégio Estadual Senador Teotônio Vilela, no Bairro Vera Cruz I, em Apareci- da de Goiânia; os adultos comentavam na “Sala dos Professores”: – A Fernanda? – Isso mesmo! – Essa tal de Fernanda... Nossa!!! A aluna mencionada pelos docentes do ensino médio matutino é a Fernanda Helena, na época, do 3⁰ ano 3. Neste tex- to, a pedido dela, vou chamá-la de apenas Helena. Entre seus professores, era co- nhecida como “questionadora”, devido ao seu senso crítico. Além de muito crítica, Helena, que hoje tem 18 anos, era muito “estourada” na sala de aula. Pelo menos nas aulas de História e Biologia. Isso, quando ela apa- recia na escola. A garota que usava preto, lia mangás e gritava durante a aula, não foi a melhor aluna ao longo dos três anos do ensino médio, mas fez o que esteve ao seu alcance para ser aprovada. À tarde, ela trabalhava como jovem aprendiz em uma empresa, graças ao Programa Jovem Aprendiz, que é resul- tado da Lei Aprendizagem, de número 0.097/2000, na qual determina-se que as empresas de médio a grande porte pos- suam uma porcentagem equivalente a 5% e 15% de jovens aprendizes em trabalho. Helena, assim como na escola, frequente- mente, estava ausente ali. O motivo de seu não-comparecimen- to nas aulas e no trabalho era a angústia inexplicável que ela sentia. Além disso, a jovem se culpava por tudo que fazia e até mesmo pelo que não fazia. Ela se sentia completamente inútil. A vida para ela ha- via perdido o sentido, nada mais a alegra- va. Era como se Helena estivesse morta, mas com o corpo vivo. Não sentia fome e nem sede. Só aos 14 anos, depois de muita demo- ra, o diagnóstico confirmou que a pequena Helena sofria de depressão. “O meu diag- nóstico foi demorado e negligenciado, com nove anos eu já tinha sintomas de depres- são, mas como minha mãe sempre foi mui- to religiosa, ela me levava em pastores e não em um médico especializado”, contou. O tratamento só foi iniciado aos 14 anos, quando a mãe viu cortes por todo o corpo da filha, principalmente, nos pul- sos. Então, a genitora, que é evangélica, levou-a ao pastor, que por coincidência era psicólogo. “Ele me deu algumas ses- sões de uma espécie de ‘terapia religiosa’”, lembrou Helena, que é ateia. “Na verda- de, a religião e o pastor viviam me dizen- do que eu estava errada, que estava sendo punida por algum pecado, ou que tinha algum ser maligno em mim. Coisas que só me fizeram sentir pior”. Nessa época, no início da adolescência, ela começou a pesquisar sobre a doença que acabara de ser diagnosticada. “Eu que- ria entender o porquê de eu ser ‘quebrada’, então, estudei um pouco sobre”, contou. Atualmente, a estudante do curso de Análise e Desenvolvimento de Sistemas é diagnosticada com Transtorno Depressi- vo Maior e Transtorno de Ansiedade Ge- neralizada. Normalmente, ela se sente cansada e, às vezes, tem ataques de pâni- co, sente falta de ar e desmaio. Sua imuni- dade é baixa por conta da depressão. Ela sente muita dor de cabeça, falta de apeti- te, desânimo, insônia e tem muitos pen- samentos negativos. Helena me contou que agora está con- trolada a base de remédios, mas que três anos atrás, teve uma crise muito severa, que a levou a tentar se matar. “Em 2015, aconteceram algumas coi- sas na minha vida, que prefiro não entrar em detalhes, mas que machucaram meu psicológico e meu corpo. Eu estava estag- nada, cansada de sempre acordar e não ver sentido no dia, não ter ânimo para ir ao trabalho, tão cansada de tudo. Então, numa tarde de quinta-feira, minha mãe saiu para ir ao supermercado e eu tomei quatro cartelas de remédios que sou alér- gica”, narrou. Depois de uma pausa e um respiro fun- do, Helena continuou: “Comecei a passar muito mal e perdi a coordenação motora. Eu não conseguia respirar direito, meu coração parecia que ia sair pela boca. Meu depressão 100 depressão irmão me achou no chão do quarto e cha- mou a vizinha, que é enfermeira. Ela me fez vomitar a maior parte da medicação, e eu desmaiei. Não me lembro de mais nada, só de acordar tomando antialérgico na veia”, terminou, não querendo mais falar sobre. Ela me contou que tem medo de ten- tar suicídio novamente e seus pais a in- ternarem. Fato que pode vir a acontecer, já que o psiquiatra que a acompanha alertou-a sobre a alta probabilidade disso se concretizar. Hoje, Helena toma, diariamente, dois comprimidos de Sertralina de 50mg pela manhã. À noite, um comprimido de Zol- pidem de 10mg. Não faz psicoterapia. Diz que já fez, porém não gostou e, por isso, parou. Perguntada o porquê de não ter gostado, preferiu não me responder. Sem muitos amigos, por não conseguir se socializar, Helena conta que os poucos que tem sabem da depressão e não sabem lidar com isso. Então, se afastam durante os episódios de crise. Esse é um dos moti- vos pelos quais ela nunca gostou de ir à es- cola; no fundamental, ela sofria bullying. Já sobre o ensino médio, não sente sau- dades da escola. A “questionadora” lem- bra que estava sempre atrasada e cheia de matérias perdidas pelo fato de faltar muita aula. “Eu cheguei a me ausentar por uma semana toda”, lembrou. No tra- balho, os chefes não sabiam da depressão, apenas os colegas. Na família, Helena disse que sua mãe ficou muito chateada quando recebeu o diagnóstico. “Até hoje ninguém consegue entender, então, só ignoram o assunto. Porém, meu namorado sempre me ajuda durante minhas crises”. Na conversa entre os professores du- rante o recreio, Maikon dos Santos Silva observava, criticamente, a atitude de seus colegas para com a aluna. Professor de Biologia da Rede Estadual de Ensino do Estado de Goiás há oito anos e irmão de um depressivo, ele se aproximou de Hele- na para ajudá-la. Foi no primeiro semestre do último ano dos alunos, que ele falou do irmão em sala. A frequente ausência da aluna – e até mesmo o mau cheiro de Helena – le- vou Maikon a querer acolher e apoiar a estudante. Assim, eles conversavam sobre a doença e sobre o estado em que ela se encontrava no momento. “Eu gosto de tirar um tempo da aula para falar com a turma sobre alcoolismo e discutir com eles o que leva uma pessoa a beber muito. Não é só sem-vergonhice. O meu irmão era um alcoólatra amarrado na depressão. Quando ele tinha a crise forte, a válvula de escape dele era a bebida, por exemplo. Então, para exemplificar que não é tão simples assim, eu contei para meus alunos essa questão particular”, me narrou Maikon na recepção de sua escola especia- lizada em acompanhamento escolar. Do docente que a acompanhou duran- te todo o ensino médio, Helena se lembra com carinho. “O Maikon sempre contava que o irmão dele era depressivo, então, eu me abri com ele”. Perguntada se o pro- fessor a ajudou, ela respondeu que sim. “O professor me escutava sempre que eu queria conversar, ele dava uns conselhos e brincava com a situação, mas sempre era gentil comigo. Isso me ajudou bastante”. Helena, que significa “a reluzente”, “a resplandecente”, não conseguiu ver luz e brilho durante os episódios de crise que teve. A médica psiquiatra Suzy Mara Maia dos Reis Alfaia me recebeu numa tarde em sua casa e me contou que essa “falta de luz”, ou seja, de ânimo, é um dos primei- ros sintomas da depressão. Suzy explicou que a depressão é um quadro de rebaixamento do humor, que se inicia e aumenta progressivamente. Triste- za, desânimo, apatia e pensamentos pessi- mistas são os primeiros sintomas,de acor- do com a psiquiatra. “A depressão é uma doença que chega a mudar não só a energia da pessoa, mas também a forma de pensar. Deixa mais pessimista, a pensar que tudo vai dar errado, que a vida está ruim, que não quer viver, chegando ao ponto, enfim, a pensar no autoextermínio”. A alteração do sono e do apetite, além de sintomas cognitivos como desatenção, lentidão, esquecimento e erros frequentes no dia a dia são sinais importantes de se 101 notar em um adolescente com depressão, de acordo com a psiquiatra. “A depressão pode alterar o corpo como um todo. Não só apresentando sintomas cognitivos, mas também físicos, somáticos, como dor no corpo, alteração no intestino, diarreia, gastrite e manchas na pele”, elucidou. A Organização Mundial da Saúde (OMS) define a depressão como uma do- ença mental. No entanto, Suzy explica que pelo fato da mente estar no contro- le do corpo, vários outros reflexos, isto é, sintomas físicos, se manifestam nele. As- sim, a manifestação da doença é individu- al, cada pessoa a sente de uma forma. Andrew Solomon nasceu em Nova York, em 1963. Ele é escritor, ativista, conferen- cista e autor do best-seller “O demônio do meio-dia: uma anatomia da depressão”. No livro publicado no Brasil pela Compa- nhia das Letras, Solomon descreve sua ex- periência com a doença e os episódios de crise da forma mais poética possível. Para ele, depressão é a imperfeição no amor. “Para poder amar, temos que ser capazes de nos desesperarmos ante as perdas, e a depressão é o mecanismo desse desespero. Quando ela chega, des- trói o indivíduo e finalmente ofusca sua capacidade de dar ou receber afeição. É a solidão dentro de nós que se torna mani- festa e destrói não apenas a conexão com outros, mas também a capacidade de es- tar em paz consigo mesmo”. Solomon conta, em seu livro, que a de- pressão é tanto nascimento quanto morte. O autor compara a doença com a conhe- cida trepadeira. Para ele, o surgimento da depressão é o nascimento da planta: Há pouco tempo, voltei a um bosque em que brincava quando criança e vi um carvalho, enobrecido por cem anos, em cuja sombra eu costumava brincar com meu irmão. Em vinte anos, uma enorme trepadeira grudara-se a essa árvore sólida e quase a sufocara. Era difícil dizer onde a árvore termi- nava e a trepadeira começava. Esta enrolara-se tão completamente em torno da estrutura dos galhos da árvore que suas folhas pareciam à distância ser as da árvore. Só bem de perto podia-se ver como haviam sobrado poucos ramos vivos e quão poucos gravetos desesperados brotavam do carvalho, espetando- -se como uma fileira de polegares do tronco maciço, suas folhas continuando o processo de fotossíntese ao modo ignorante da biologia mecânica. Tendo aca- bado de sair de uma depressão severa, na qual eu dificilmente colhia os pro- blemas de outras pessoas, me senti cúmplice daquela árvore. Minha depressão havia tomado conta de mim como aquela trepadeira dominara o carvalho. Um dia antes da conversa com a psi- quiatra, a psicóloga clínica, Bárbara Bor- ghi, me recebeu para um bate-papo em seu consultório no Jardim Goiás. Entre um gole e outro do chá de erva-cidreira e comentários sobre o livro de Solomon, ela me contou que é perceptível o aumento de adolescentes e jovens que a procuram para tratar de depressão. Para Bárbara, a psicoterapia é impor- tante no tratamento do depressivo para entender, levando em consideração a história de vida do paciente, o porquê do sentimento e das respostas depressivas. Além, claro, de acolher ajudando, para que ele consiga interagir de uma forma melhor com o ambiente que o cerca. “O psicólogo vai tentar compreender o sofri- mento trazido pelo indivíduo e, a partir dessa compreensão, vamos traçar juntos estratégias de interação com o ambiente para promover uma qualidade de vida melhor”, explicou. Há um ano, a OMS lançou o relatório “Depressão e outros distúrbios mentais comuns: estimativas globais de saúde”. Nele, lê-se que 322 milhões de pessoas em todo o mundo vivem com este transtorno mental, a maioria mulheres. O documento ainda aponta que o nú- mero de pessoas que vivem com depres- são aumentou 18% entre 2005 e 2015. No Brasil, a depressão atinge 11,5 milhões de pessoas (5,8% da população), enquanto distúrbios relacionados à ansiedade afe- tam mais de 18,6 milhões de brasileiros (9,3% da população). A depressão, de acordo com o rela- tório, é uma doença comum em todo o mundo. Ela é diferente das flutuações re- gulares de humor e das respostas emocio- nais de curta duração aos desafios da vida cotidiana. Especialmente quando de lon- ga duração e com intensidade moderada ou grave, a depressão pode se tornar uma séria condição de saúde. O documento deixa bem claro que a depressão pode levar a um grande sofri- mento e disfunção no trabalho, na escola ou no meio familiar e ao suicídio. Cerca de 800 mil pessoas morrem por suicídio depressão 102 a cada ano – sendo a segunda principal causa de morte entre pessoas com idade entre 15 e 29 anos. No final da conversa que tive com a Helena, ela me contou que gostaria de di- zer que a maioria das pessoas pensam que depressivos são frescos, ou que tomando um remédio estarão bem como se fosse uma gripe. Ela continuou: “Mas não é as- sim. A dor continua ali, os pensamentos continuam me torturando, eu continuo me culpando e me cobrando mesmo sem conseguir sair do lugar”. Por fim, Helena confessou esperar fi- car melhor. “100%”, em suas palavras. Ela contou também querer viajar muito, co- nhecer outras culturas e outros países. Logo, quando estiver velha, se lembrar da sua adolescência e juventude como dias que a fizeram mais forte. “OS 13 PORQUÊS” No dia seis de junho, fui surpreen- dido com a seguinte manchete em um portal de notícias: “Nem fãs de 13 Re- asons Why querem nova temporada: ‘Só fazem pelo dinheiro’”. O anúncio de que a série ganhará uma terceira temporada em 2019 levou milhares de jovens a discutirem se há, verdadeira- mente, a necessidade de uma continu- ação da história. Na rede social Twitter, telespectado- res afirmaram que o drama deveria ter acabado logo na primeira temporada. O internauta Glauber Monteiro defen- deu que a continuidade da série não é problemática apenas pela falta de his- tória, mas por prestar um desserviço à sociedade e fazer sensacionalismo com temas como saúde mental e depressão. O site especializado em cinema e séries “Adoro Cinema” também ques- tionou a continuação da produção da Netflix. “Ame ou odeie, 13 Reasons Why foi um dos lançamentos mais populares de 2017. Sem medo de falar sobre alguns assuntos bem pesados no universo ado- lescente, a série rapidamente se tornou um grande fenômeno nas redes sociais. Diante de tamanho sucesso, a Netflix não perdeu tempo em anunciar a reno- vação do show. Agora, fica a pergunta que não quer calar: a continuação é re- almente necessária?”. 13 Reasons Why é uma série de tele- visão baseada no livro de mesmo nome, do escritor americano Jay Asher, e adap- tado por Brian Yorkey para a plataforma Netflix. A trama gira em torno da per- sonagem Hannah Baker, uma estudante que se suicida após uma série de falhas culminantes, provocadas por pessoas selecionadas dentro de sua escola. Uma caixa de fitas cassete gravadas pela garo- ta antes de se matar relata treze motivos pelos quais ela tirou sua própria vida. Além disso, mostra-se, de maneira ex- plícita, como a personagem tira a pró- pria vida – ponto que poderia ser visto como um “tutorial” de suicídio. depressão A imagem de divulgação do seriado não exibe os perigos que pode trazer a quem o assistir 103 ENTRE SEM BATER Há muito desconhecimento quanto à Psicoterapia na sociedade brasileira. Ainda é comum ouvir que o psicólogo é um es- pecialista que sóatende “louco”. Por conta dessa ignorância, pessoas necessitadas de acolhimento prolongam o sofrimento. A psicologia é extremamente ampla e apresenta diferentes facetas. Numa conversa com Jaquelyne Rosatto Melo, psicóloga clínica, mestre em Psicologia e professora da Unialfa, ela diz acredi- tar que existe algo que une as mais di- ferentes abordagens teóricas e atuações da psicologia: a preocupação com o ser humano e o seu bem-estar. Por causa do seriado, a depressão, que era dita como assunto tabu, esteve nas ro- das de discussão no mundo e chegou aos Trendings Tops. Inclusive, no grupo de psiquiatras que a doutora Suzy faz parte. Na visita que a fiz, ela me contou que não assistiu ainda à série, pois está muito ocu- pada cuidado da filhinha de um ano. Entretanto, me relatou que a discus- são entre seus colegas psiquiatras foi so- bre a capacidade que o adolescente tem de absorver a coletividade. Eles viram a série como um estímulo, pois, de acordo com os especialistas, o adolescente quer se identificar. Por isso, a preocupação. Porém, ela acredita que a depressão e a sua maior consequência, o suicídio, de- vem ser discutidos nos meios de comu- nicação como prevenção. Hannah era uma adolescente comum de 17 anos. Ela passou pelo o que a psi- quiatra chama de “crise da adolescên- cia”, período em que não se acha amado, sente ausência de afeto, ou de querer se revoltar, ou seja, normal. Porém, Suzy alerta que esses sinais são normais até certo ponto. Ao perce- ber sintomas descritos no início deste texto, a atenção deve ser redobrada. “Se um coleguinha começou a pensar que a vida não vale a pena, é bom procurar por ajuda, de falar com alguém para que isso não se aumente. Conversar sobre de- pressão deve ser algo normal”, finalizou. “Em todos os campos de atuação que já exerci na psicologia, é sempre esse o objetivo, pensar sobre formas de con- tribuir com o bem-estar do ser huma- no. Longe de uma visão romântica de bem-estar, que estaria mais próximo a ideia de plenitude e completude, mas um bem-estar que se relaciona com a responsabilização desse indivíduo sobre sua própria vida, o que pode lhe garantir uma maior autonomia nas suas tomadas de decisões e a forma como se coloca no mundo”, declarou a psicóloga. No nosso bate-papo, Jaquelyne disse que não compartilha da noção de que o psicólogo “ajuda” as pessoas, para ela, esse termo vai de encontro a concep- ção de autonomia que deve orientar o trabalho de um psicólogo. “No lugar de ajudar, podemos dizer que o psicólogo é um profissional preparado para acolher o sofrimento do outro”, disse. É dessa forma também que Barbara Borghi, já citada neste texto, vê o exercício da profissão. Quando ela me recebeu em seu consultório, contou que dependendo do estado de saúde e financeiro do pacien- te, o valor da sessão pode ser revisto para que não haja abandono do tratamento. Jaquelyne explicou ainda que o psi- cólogo é aquele que acolhe sem precon- ceitos, sem julgamentos e sem, a priori, tudo aquilo que for dito. Ela disse en- tender o sofrimento como inerente ao ser humano. “Todos sofremos, por isso, não acredito que seja o sofrimento que leve o sujeito a procurar ajuda psicoló- gica, acredito que seja o desejo de fazer algo com a dor que o sujeito sente”. A professora de Psicologia Social e Psicanálise da Unialfa lamenta ainda encontrar socialmente alguns estigmas que dificultam o acesso da psicologia àqueles que precisam, como a ideia de que psicólogo é coisa de “doido” ou que ir ao psicólogo é sinal de fraqueza. Ja- quelyne concluiu nossa conversa afir- mando que ir ao psicólogo é sinal de força. “Só quem realmente se propôs a realizar a árdua tarefa de pensar e falar sobre si sabe como é difícil se ver com depressão 104 questões que muitas vezes escondemos de nós mesmo”, finalizou. Pensando em facilitar a busca por essa ajuda, a partir de 30 de junho deste ano, os 26 estados do Brasil mais o Dis- trito Federal passaram a ser contempla- dos pelo atendimento gratuito por meio do número 188. O Centro de Valorização da Vida (CVV) é uma associação civil sem fins lucrativos, filantrópica, reconhecida como de Utilidade Pública Federal, desde 1973. O CVV presta serviço voluntário e gratuito de apoio emocional e preven- ção do suicídio para todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo e anonimato. Os contatos com o CVV são feitos pelo telefone 188 – 24 horas e sem custo de ligação – ou pessoalmente, nos 89 pos- tos de atendimento, ou pelo site www. cvv.org.br, por chat e e-mail. Nesses ca- nais, são realizados mais de 2 milhões de atendimentos anuais, por aproxima- damente 2.400 voluntários, localizados em todo Brasil. Além dos atendimentos, o CVV desen- volve, no país, outras atividades relaciona- das a apoio emocional, com ações abertas à comunidade que estimulam o autoconhe- cimento e melhor convivência em grupo e consigo mesmo. Para obter mais informa- ções, é interessante visitar o site do Cen- tro, por ser bem claro e explicativo. A psiquiatra Suzy informou que a pre- feitura de Goiânia oferece os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), que são uni- dades específicas para atendimento di- ário a pacientes psiquiátricos e pessoas com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas. As unidades são responsáveis por orga- nizar a rede de atenção em saúde mental e regular sua porta de entrada. O serviço comunitário funciona com porta aberta e de forma substitutiva aos hospitais psi- quiátricos e tratamento via internação. A seguir, estão listados alguns pontos de apoio psicológico em Goiânia. As clí- nicas-escola costumam ter períodos de triagem e algumas prestam atendimento emergenciais. GRATUITO: CLÍNICA-ESCOLA – UFG Tel.: (62) 3209-6208 Horário de atendimento: segunda à sexta das 7h30 às 19h30. CLÍNICA-ESCOLA – CEPSI – PUC/GO Tel.: (62) 3946-1198/3946-1249 Horário de atendimento: segunda à sexta das 7h às 12h30 e das 13h às 22h. Sábado, das 08h às 12h. CENTRO DE PSICOLOGIA APLICADA – UNIP Tel.: (62) 32818581 SERVIÇO DE PSICOLOGIA APLIADA – FACULDADE ESTÁCIO Tel.: (62) 3601-4934 Horário de atendimento: segunda à sexta das 8h às 21h. Sábados, das 8h às 16h. NÚCLEO DE PSICOLOGIA APLICADA – UNIVERSO Tel.: (62) 3238-3719 Horário de atendimento: 08h às 21h. CLÍNICA-ESCOLA UNIALFA Tel.: (62) 3272-5089 Horário de atendimento: segunda à sexta-feira das 14h às 19h. Sábado, das 08h às 13h. VALOR SOCIAL: REDE DE PSICOLOGIA Tel.: (62) 3922-3204/ 98111-4882 ARMAZÉM DE DENTRO Tel.: 39223902 INSTITUTO OLHOS DA ALMA SÃ Tel.: (62) 3204-2565 ITGT – INSTITUTO DE TREINAMENTO E PESQUISA EM GESTALT-TERAPIA DE GOIÂNIA Tel.: (62) 3941-9798 INSTITUTO SKINNER Tel.: (62) 3609-0942/ (62) 98148-1881 depressão 105 reportagem Eu sei, pessoalmente, que não há nada no mundo que o corpo físico possa sofrer que se compare à desolação e à prostração da mente. Charles Spurgeon pastor batista “ ” 106 Cinema PARA APRENDER VENDO Im ag em d e di vu lg aç ão 107 Cinema SINOPSE CURIOSIDADES DETALHES FONTE Data de lançamento: 30 de abril de 2015 Duração: 1h 42min Direção: Daniel Barnz Elenco: Jennifer Aniston, Adriana Barraza, Anna Kendrick e mais Gênero: Drama Nacionalidade: EUA Título original : Cake Distribuidor: California Filmes Ano de produção: 2014 Tipo de filme: longa-metragem Idiomas: Inglês, Espanhol www.adorocinema.com Claire Simmons (Jennifer Aniston) é uma mulher traumatizada e depressi- va, que busca ajuda em um grupo para pessoas com dores crônicas. Lá, ela des- cobre o suicídio de um dos membros do grupo, Nina (Anna Kendrick). Claire fica obcecada pela história desta mulher, e começa a investigar a sua vida. Aos poucos, começa a desenvolver uma re- lação inesperada com o ex-marido de Nina, Roy (Sam Worthington).- Jennifer Aniston se inspirou em sua amiga e colega, Stacy Courtney. Courtney trabalhou como dublê até que, envolveu-se em um grave aci- dente imobilizando suas pernas, que imediatamente pôs uma pausa em sua carreira. Ela vivia com dor crôni- ca por anos, passou por 23 cirurgias e tornou-se viciada em OxyContin. No entanto, ela não desistiu e ‘ressusci- tou’ sua carreira. Ela trabalhou como coordenadora de dublês neste filme. - Jennifer Aniston não usou ma- quiagem alguma no filme, exce- to para criar suas falsas cicatrizes e quando Roy (Sam Worthington) vai almoçar em sua casa. Foto por maxime caron em Unsplash OS DESAFIOS PARA O COMBATE À DEPRESSÃO NO BRASIL Tema 7 • O rascunho da redação deve ser feito no espaço apropriado. • O texto definitivo deve ser escrito à tinta, na folha própria, em até 30 linhas. • A redação com até 7 (sete) linhas escritas será considerada “insuficiente” e receberá nota zero. • A redação que fugir ao tema ou que não atender ao tipo dissertativo-argumentativo receberá nota zero. • A redação que apresentar proposta de intervenção que desrespeite os direitos humanos receberá nota zero. • A redação que apresentar cópia dos textos da Proposta de Redação ou do Caderno de Questões terá o número de linhas copiadas desconsiderado para efeito de correção. OBSERVAÇÕES: A partir da leitura dos textos motivadores seguintes e com base nos conhecimentos construídos ao longo de sua formação, redija um texto dissertativo-argumentativo em norma padrão da língua portuguesa sobre o tema OS DESAFIOS PARA O COMBATE À DEPRESSÃO NO BRASIL apresentando proposta de intervenção que respeite os direitos humanos. Selecione, organize e relacione, de forma coerente e coesa, argumentos e fatos para defesa de seu ponto de vista. Retirado de: nexojornal.com.br Retirado de: atribuna.com.br A depressão é considerada uma das doenças mentais mais comuns do mundo. Frequentemente, ela se apresenta de forma crônica, o que significa que é parte constante da vida de quem sofre dela. É um problema agravado pelo estigma, que associa a depressão à fraqueza ou inadequação. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013, conduzida pelo IBGE em parceria com o Ministério da Saúde, apontam que cerca de 7,9% da população brasileira sofre de depressão. Entre essas pessoas, 78,8% não recebem nenhum tipo de tratamento, que chega de forma desigual aos pacientes. Os dados fazem parte do trabalho “Desigualdades no acesso ao tratamento de depressão: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde Brasileira - PNS”, publicado em novembro de 2016 no “Jornal Internacional por Igualdade na Saúde” por pesquisadores da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e da USP (Universidade de São Paulo). O estudo descobriu que brancos têm uma probabilidade menor de sofrer de depressão no país. E a maior probabilidade de obter tratamento. A pesquisa também apontou que as regiões Norte e Nordeste são aquelas onde a maior proporção de depressivos não têm nenhum tratamento. Entender quem são os depressivos do Brasil e quais deles não se tratam é importante porque, além de piorar a qualidade de vida de forma geral, a depressão está associada diretamente a outros problemas que poderiam ser mitigados por meio do cuidado adequado. Segundo dados recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS), a depressão afeta 322 milhões de pessoas no mundo. Em dez anos, de 2005 a 2015, esse número cresceu 18,4%. E esse total, que representa cerca de 5% da população mundial, só deve aumentar com o tempo, fazendo com que a doença se torne a segunda maior preocupação em termos de saúde pública no planeta. Quando nos voltamos ao Brasil, temos 5,8% da população sofrendo de depressão, ou seja, um total de 11,5 milhões de brasileiros. Ainda de acordo com a OMS, entre os países da América Latina, o Brasil é o que possui maior número de pessoas em depressão. “São números assustadores e, ainda assim, nos deparamos com muito preconceito disseminado culturalmente. Por exemplo, é como ouvir pessoas dizendo que depressão não é doença e, sim, frescura; que para ficar bom é só ter força de vontade; que para se ajudar tem que sair de casa; entre tantas outras falácias do mundo pós-moderno’’, explica a psicóloga e neuropsicóloga Elaine Di Sarno. O tratamento de depressão é um privilégio no Brasil Brasil tem o maior número de casos de depressão da América Latina Como seria esse tema no Enem 110 redação TEMA OS DESAFIOS PARA O COMBATE À DEPRESSÃO NO BRASIL Autor Victor Uchôa Dissertação Em seu quadro “Noite Estrelada”, Vincent Van Gogh desenhou um céu extremamente limpo e brilhan-te. Clássico impressionista, essa obra foi elaborada em um dos momentos de loucura do pintor, no qual encontrava-se preso em um manicômio e sonhava com sua liberdade. Metaforicamente, pode-se afirmar, de forma irrefutável, que o cenário da depressão no Brasil é um símbolo atemporal do manicômio, o qual o tecido social enfrenta desafios para se libertar. Essa conjuntura é fruto inegável do sistema capitalista vigente que promove uma vivência social patológica. Assim, entre os elementos que cristalizam esse panorama, salientam-se, expressivamente, o âmbito escolar altamente normativo, juntamente com a atuação tendenciosa da mídia que solidifica tal problemática estarrecedora. Observa-se, pois, que o sistema de ensino contemporâneo, aliado ao capitalismo em vigor, alicerça a dificuldade em combater o cenário depressivo em pauta. Essa realidade advém do fato de as escolas, respaldadas no discurso capitalista de aceleração cotidiana e de necessidade de indivíduos adaptados a esse ritmo, disseminarem um ideal sobre o imaginário coletivo que visa padronizar os alunos, criando, desse modo, um sistema educacional que não entende que a preparação emocional do sujeito é fundamental para a preparação de uma sociedade em que as pessoas tenham autonomia e felicidade, gerando uma ignorância coletiva que dificulta o combate à depressão. Esse raciocínio assemelha-se a afirmação do filósofo Immanuel Kant, que defendeu que “o homem não é nada além daquilo que a educação faz dele”, dado que diante dessa ausência de serviço psicológico e comunicativo por parte dos colégios, desenvolvem-se analfabetos emocionais exponencialmente vulneráveis à depressão. Ademais, a parcialidade dos meios midiáticos é outro fator que, adjunto ao sistema de acumulação de capitais que rege o corpo social, aprofunda os desafios para combater a depressão enunciada. Tudo isso ocorre pela razão de a mídia atuar como uma empresa de comunicação que defende seus patrocinadores para não perder sua monetização, sendo esses investidores, majoritariamente, adeptos de ideias conservadoras, as quais não classificam a depressão como uma doença, fazendo, assim, com que a mídia reproduza esses estereótipos ao reduzir e silenciar esse assunto letárgico. Essa ideia é análoga ao pensamento do imperador francês Napoleão Bonaparte, que afirmara: “Tenha mais medo de três jornais do que cem baionetas”, visto que, ao não explicitar uma visão ampla sobre a depressão para manter o espaço de poder de seus patroci- nadores regressistas, a mídia acaba legitimando tal mazela e influenciando um comportamento público que dificulta o combate dessa determinada realidade. Destarte, é de vital importância contornar esses desafios para combater a depressão. Para tanto, é necessário focar no cerne da questão: o capitalismo. Logo, o Governo Federal, em conjunto com seus mi- nistérios, deve criar um Programa de Combate à Depressão que vise sanar tal problemática. Desse modo, esse Programa, com o auxílio do Ministério da Educação, deve rogar ao Congresso que elabore leis que modifiquem as Diretrizes Curriculares Nacionais a fim de implantar nas escolas disciplinas que debatam sobre a depressão. Além disso, esse Programa criará um Fundo Nacional que patrocine palestras públicas e propagandas midiáticas, as quais busquem instruir a nação sobre os males que essa determinada patologiatraz e como lidar com eles. Esse Fundo também poderá ser usado para contratar psicólogos para as escolas, visando frear esse quadro depressivo. Somente desse modo o país viverá sua noite estrelada perante ao cenário de depressão vigente. 111 redação TEMA OS DESAFIOS PARA O COMBATE À DEPRESSÃO NO BRASIL Autor Carlos Daniel Dissertação “Ouves-me, mas não me escutas”. A afirmação do poeta francês Jean Antoine de Baïf ilustra perfeita-mente os desafios para combater a depressão no Brasil, uma vez que ouvir remete ao sentido da audição e, escutar, é interpretar aquilo que se ouve; assim, ouve-se muito acerca da depressão, mas pouco se interpreta essa realidade. Inegavelmente, a origem inconteste desse cenário está no capitalismo, exclusor daqueles que não se padronizam de maneira formal. Desse modo, entre os fatores contribuintes para o aprofundamento dessa problemática, pode-se destacar o alto nível de normatividade social, bem como a escola formal. Em primeiro plano, as fortes normas sociais, aliadas ao capitalismo, alicerçam o desafiador combate à depressão no Brasil. Isso ocorre porque o sistema econômico vigente dita padrões estéticos, comportamentais e de felicidade que a sociedade almeja alcançar em todo o tempo e o indivíduo que não atinge esse ideal de sucesso é segregado, perenizando a depressão neste, já que estar fora do modelo de vida normativo é um fracasso na interpretação do depressivo, predisposto ao pessimismo. Esse raciocínio é análogo ao do sociólogo polonês Zygmunt Bauman, para quem “A invisibilidade é equivalente à morte”, dito que estar excluído da normatividade global e com depressão é estar socialmente morto, pois a depressão não é tendência capita- lista, logo, não será eficientemente combatida. Além disso, a escola formal, somada ao capitalismo exclusor, colabora com o contexto dos desafios para combater a depressão no Brasil. Esse contexto advém de o compromisso da escola não ser com o aluno, mas sim com o lucro gerado em seu sucesso acadêmico, cristalizando uma exigência da performance estudantil em testes padronizados que reduzem a função social da escola e legitimam um espaço que afirma estereótipos, hierarquias e normas sociais. Consequentemente, os jovens, ao terminarem a escola, tornam-se adultos sem ferramentas emocionais para lidar com o cotidiano. Exemplo claro dessa realidade é o Brasil ser o país mais depressivo da América Latina segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Diante do exposto, é nítido que as dificuldades para combater a depressão têm como cerne o capitalismo que exclui quem não se enquadra nos padrões de consumo e normatividade. Para resolver esse problema, o Governo Federal deve criar um Plano Nacional de Combate à Depressão que proponho ao Congresso a alteração das Diretrizes Curriculares Nacionais para incluir nos ensinos fundamental e médio disciplinas como educação emocional, espaço coletivo e cidadania. Também, é dever desse Plano criar um Fundo de Investimentos que destine verbas públicas para palestras em ambientes escolares e corporativos acerca da importância da diversidade e da depressão como um problema recorrente que pode sem combatido.
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