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Fundação Biblioteca Nacional
ISBN 978-85-387-3052-1
Stélio Furlan
José Carlos Siqueira
LI
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LITERATURA
PORTUGUESA
LITERATURA
PORTUGUESA
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., 
mais informações www.iesde.com.br
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mais informações www.iesde.com.br
Stélio Furlan
José Carlos Siqueira
Literatura Portuguesa
IESDE Brasil S.A.
Curitiba
2012
Edição revisada
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., 
mais informações www.iesde.com.br
© 2008 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito dos autores e do detentor dos 
direitos autorais.
Capa: IESDE Brasil S.A.
Imagem da capa: Shutterstock
IESDE Brasil S.A.
Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 
Batel – Curitiba – PR 
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
Todos os direitos reservados.
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ 
________________________________________________________________________________
F984L
 
Furlan, Stélio
 Literatura portuguesa / Stélio Furlan, José Carlos Siqueira. - 1.ed., rev.. - Curitiba, PR : 
IESDE Brasil, 2012. 
 220p. : 28 cm
 
 Inclui bibliografia
 ISBN 978-85-387-3052-1
 
 1. Literatura portuguesa - História e crítica. 2. Movimentos literários. I. Siqueira, José 
Carlos. II. Título. 
12-6248. CDD: 869.09
 CDU: 821.134.3(09)
30.08.12. 11.09.12 038641 
________________________________________________________________________________
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Sumário
Trovadorismo: 1198-1418 | 7
Contexto histórico | 7
A poesia trovadoresca | 9
A Cantiga de Amor | 11
Cantiga de Amigo | 13
Cantigas de Escárnio e Maldizer | 16
Principais trovadores | 17
A permanência do Trovadorismo | 17
O Humanismo | 27
O homem como centro do universo | 27
O Humanismo em Portugal | 29
Gil Vicente (c. 1465-c. 1537): a grande figura literária do Humanismo | 30
Classicismo: 1527-1580 | 45
A Renascença Portuguesa | 45
Os gêneros clássicos | 46
Épica: Os Lusíadas, um prodígio arquitetônico | 47
Os Lusíadas: episódios | 49
Conclusão sobre Os Lusíadas | 55
A lírica camoniana | 56
Os sonetos de Camões | 57
Amor com engenho e arte | 58
Barroco: 1580-1756 | 67
Pode-se falar em Barroco? | 67
Poesia barroca portuguesa | 69
Prosa barroca portuguesa | 72
Conclusão | 75
Arcadismo: 1756-1825 | 83
A reação contra o Barroco literário | 83
Principais lemas dos poetas árcades | 85
Bocage e o Arcadismo | 89
Conclusão | 90
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O Romantismo: prosa | 101
Romantismo e burguesia | 101
A sensibilidade romântica e o gênero romance | 102
O estabelecimento do liberalismo em Portugal e o romance | 104
A sedimentação do romance em Portugal | 113
O Romantismo: poesia | 119
A arte como mercadoria | 119
A sensibilidade romântica e a poesia | 120
As ideias liberais, o ultrarromantismo e o nacionalismo | 124
A originalidade e a autenticidade tornadas convenção | 129
O Realismo: 1865-1890 | 137
O “realismo” como arma de crítica social e política | 137
A poesia realista | 143
A prosa realista | 146
Simbolismo | 159
Portugal simbolista | 163
O Simbolismo Português | 163
Modelos para o Modernismo | 169
O Saudosismo | 175
A Sociedade Renascença Portuguesa e o Saudosismo | 175
Florbela Espanca (1894-1930): uma poesia em suspensão | 180
Precursores do Modernismo | 182
Modernismo: Geração de Orpheu | 187
A revista Orpheu | 187
Fernando Pessoa (1888-1935) | 188
Mário de Sá-Carneiro (1890-1916) | 195
Almada-Negreiros (1893-1970) | 196
A epopeia portuguesa moderna: de Os Lusíadas a Mensagem | 197
Modernismo Presencista | 205
O direito à liberdade de criação | 205
A República e a ditadura de Salazar | 206
A revista Seara Nova (1919-1974) | 206
A revista Presença (1926-1940) | 208
A autonomia da literaturae sua relação mediada com a realidade | 213
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Apresentação
Chega mais perto e contempla as palavras. 
Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta, 
pobre ou terrível que lhe deres:
Trouxeste a chave?
Carlos Drummond de Andrade
“Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa: ‘Navegar é preci-
so, viver não é preciso’. Quero para mim o espírito (d)esta frase, transforma-
da a forma para a casar com o que eu sou: Viver não é necessário; o que é 
necessário é criar”: esta conhecida passagem de Fernando Pessoa serve-nos 
de mote para justificarmos as travessias e os percursos pelo vasto espaço da 
Literatura Portuguesa.
O objetivo principal é o de compreender elementos para o estudo 
crítico-produtivo das manifestações canônicas da Literatura Portuguesa, en-
tre 1189 e 1915, situando-a no contexto da literatura ocidental. 
Como estratégia de leitura, vamos centrar nosso investimento discur-
sivo e investigativo no que singulariza as diferentes manifestações literárias 
do medievo ao início do século XX, a saber: 
– Trovadorismo (1198-1418); 
– Humanismo (1418-1527); 
– Classicismo (1527-1580); 
– Barroco (1580-1765); 
– Arcadismo (1756-1825); 
– Romantismo (1825-1865); 
– Realismo (1865-1890); 
– Simbolismo (1890-1915); 
– Saudosismo (a partir de 1912); e 
– Modernismo (a partir de 1915). 
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Você deve se perguntar o porquê do ano 1189, o porquê do ano 1915. 
Utilizaremos essas datas menos como marcos definitivos que como balizas 
temporais para localizarmos, entre aproximações e distanciamentos, cada 
arte poética ao longo desse recorte temporal. 
Alguns estudiosos das origens da Literatura Portuguesa consideram 
1189 um dos anos prováveis da escrita da “Canção da Ribeirinha”, de Paio 
Soares de Taveirós, a quem se atribui o primeiro poema escrito em língua 
portuguesa. Outros pesquisadores consideram a publicação da revista 
Orpheu, em 1915, com a participação fundamental de Fernando Pessoa, 
o marco inicial do Modernismo em Portugal. Se tais datas não passam de 
convenções (não consensuais, diga-se de passagem), não é menos certo di-
zer que derivam de um esforço reflexivo e investigativo sobre as condições 
de possibilidade da textualidade lusitana. 
Em última instância, desejamos que estas páginas sobre Literatura 
Portuguesa estimulem a reflexão sobre a importância da Literatura como 
um modo privilegiado de conhecimento, como uma maneira especial de ver 
e dizer o mundo. E também que possam incentivar o contato prazeroso com 
o Texto, ao que chamaremos fruição textual. 
Em A Lírica Trovadoresca, Segismundo Spina escreve que para se 
compreender a Literatura da Idade Média é necessário amá-la. Pode-se 
acrescentar que não só a compreensão da literatura medieval, mas a Litera-
tura Portuguesa de modo geral, das primeiras cantigas de amor e de amigo 
às textualidades contemporâneas, solicita um envolvimento amoroso. 
Nesse sentido, consideramos oportuno iniciarmos a nossa travessia 
literária com uma reflexão sobre a arte de amar (ars amatoria), tema por 
excelência do lirismo trovadoresco medieval.
Stélio Furlan e José Carlos Siqueira
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Trovadorismo: 1198-1418
Stélio Furlan1
José Carlos Siqueira2
Lo vers es fis e naturaus 
e bos celui qui be l’enten; 
e melher es, qui.l joi aten.3
Bernart de Ventadorn(1150-1180) 
Contexto histórico
Os primeiros registros escritos da Literatura Portuguesa são em 
verso. As produções do primeiro período medieval, que se estende dos 
séculos XII ao XV, são agrupadas no movimento literário conhecido como 
Trovadorismo.
Essa expressão deriva do verbo provençal trobar, que exprimia o 
fazer poético da época enquanto ação de compor, de inventar, de criar. 
Em A lírica trovadoresca, livro indispensável aos estudiosos da poética 
medieval, Segismundo Spina sugere que entre tantas etimologias pro-
postas a mais aceitável se associa à tese litúrgica da poesia trovadoresca. 
Assim, trobar derivaria do vocábulo tropare, “decalcada sobre tropo – in-
terpolação, adição ou introdução de texto literário e musical numa peça 
da liturgia. Daí tropare – fazer tropos, compor (um poema, uma melodia), 
inventar, descobrir” (SPINA, 1996, p. 407).
1 Doutor em Literatura pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), mestre em Literatura Brasileira pela UFSC e graduado em História 
pela UFSC.
2 Mestre em Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP) e bacharel em Linguística pela USP.
3 “A canção é autêntica e sincera, / capaz de honrar àquele que a compreenda bem; / Mas melhor é para aquele que aguarda as alegrias do 
amor.” – tradução de Segismundo Spina.
Iluminura medieval com 
representação de uma cena 
trovadoresca.
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8 | Trovadorismo: 1198-1418
Chamava-se trobador o poeta que criava, instrumenta-
va e, por vezes, entoava suas próprias composições poéticas. 
As cantigas também eram criadas e divulgadas pelo segrel, o 
trovador profissional, que ia de corte em corte com o seu jogral 
(dançarino, acrobata, mímico). O músico era o menestrel.
Um dos mais notáveis trovadores medievais foi, por cer-
to, o rei D. Dinis (1261-1325). As suas cantigas evidenciam um 
dos momentos mais altos da poesia no sentido da apropriação 
dos recursos verbais e da sua adequação ao dizer poético. D. 
Dinis levou a bom termo o desejo de todo trovador medieval, 
a saber, a plena realização da aliança entre motz el son, entre a 
palavra e música. Leia-se:
Quer’eu em maneira de proençal
fazer agora un cantar d’amor,
e querrei muit’i loar mia senhor
a que prez nen fremusura non fal,
nen bondade; e mais vos direi en:
tanto a fez Deus comprida de ben
que mais que todas las do mundo val. (DOM DINIS, 2008)4
De imediato, surgem estas perguntas:
Como esse fragmento textual chegou até nós se foi escrito por volta de 700 anos atrás?::::
Em que língua foi escrito? O que significa compor um “cantar d’amor” ao modo provençal?::::
Enfim, o que se entende por “amor” e qual a importância de se estudar textos medievais?::::
Ora bem, a referida estrofe e as demais composições da lírica trovadoresca medieval encon-
tram-se preservadas em três compilações manuscritas chamadas de cancioneiros. Se o mais antigo é 
o Cancioneiro da Ajuda, composto de 310 cantigas (acredita-se que compilado entre os séculos XIII e 
XIV), o mais completo é o Cancioneiro da Biblioteca Nacional, formado de 1.647 manuscritos de cantigas 
líricas e satíricas. O nosso interesse se volta para o Cancioneiro da Vaticana, assim designado por ter 
sido encontrado na Biblioteca do Vaticano, contendo 1.205 cantigas de vários autores, entre os quais 
D. Dinis e suas 137 cantigas. Você pode acessar todas as cantigas de D. Dinis pela Biblioteca Digital da 
Universidade Federal de Santa Catarina, disponível em <http://bibdigital.inf.ufsc.br/bdnupill/>, ou pelo 
Portal Galego da Língua, disponível em <http://www.agal-gz.org/modules.php?name=Biblio.> Neste 
último, afora uma galeria de imagens do medievo, você encontrará também uma biografia do chamado 
Rei Trovador.
4 “Quero fazer agora uma canção de amor ao modo provençal. E quero louvar a minha senhora, a quem honra nem formosuras não faltam, 
nem bondade; e mais vos direi ainda: tanto Deus a fez cheia de virtudes, que no mundo não há outra igual.”
D. Dinis, sexto rei de Portugal, subiu ao trono 
em 1279 e governou até 1325. Afora o incentivo 
à agricultura, destacou-se pela fundação da 
primeira universidade de Portugal, em 1290, 
então sediada na cidade de Lisboa.
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9|Trovadorismo: 1198-1418
A poesia trovadoresca 
Os poemas recebiam o nome de cantigas (ou canções e mesmo cantares)
pelo fato de o lirismo medieval associar-se intimamente com a música: a poesia era cantada, ou entoada e instrumen-
tada. Letra e pauta musical andavam juntas de molde a formar um corpo único e indissolúvel. Daí compreender que o 
texto sozinho, como o temos hoje, apenas fornece uma incompleta e pálida imagem do que seriam as cantigas quan-
do cantadas ao som do instrumento, ou seja, apoiadas na pauta musical. (MOISÉS, 1997, p.15)
Observe essa necessária proximidade na seguinte iluminura:
Cantiga de Afonso X , o Sábio. 
Um fólio da cantiga “Ondas do mar de Vigo”, de Martin 
Codax.
Note-se que a cantiga de D. Dinis foi grafada em galego-português, que era a língua utilizada por 
todos os poetas do período, por conta da importância de Santiago de Compostela (capital da Galiza), 
situada na extremidade noroeste da Península Ibérica.
Portugal, que a partir do século XII se firmou como reino independente, mantinha laços econô-
micos, sociais e culturais com a Galiza e tais relações favoreceram o surgimento de uma língua de traços 
específicos: o galego-português. Isso justifica o fato de a produção literária da época ter sido elaborada 
nessa variação linguística.
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10 | Trovadorismo: 1198-1418
Mapa da península ibérica no século XII, à época do esplendor do trovadorismo.
Características da poesia trovadoresca 
As cantigas medievais se dividem em composições líricas e satíricas. No primeiro caso, situam-se as 
cantigas de amor e as cantigas de amigo. Já as composições satíricas se dividem em cantigas de escárnio 
e cantigas de maldizer.
Se as cantigas líricas versam em geral sobre o amor ou sua ausência, nas cantigas satíricas faz-se a 
crítica a pessoas, comportamentos ou instituições do mundo feudal. Caso a crítica seja velada, indireta, 
temos uma cantiga de escárnio. Já a zombaria direta, agressiva, com expressões de baixo calão, define 
uma cantiga de maldizer.
É interessante notar que os critérios que diferenciavam tais modalidades da poética trovadoresca 
galego-portuguesa foram sistematizados na chamada Arte de Trovar, redigida no século XIII, que se 
encontra anexa ao Cancioneiro da Biblioteca Nacional. Leia-se:
E como há algumas cantigas em que falam tanto eles como elas, por isso é importante que entendais se são de amor 
ou de amigo, porque se falam eles na primeira cobra e elas na outra, é de amor, pois move-se segundo a argumentação 
dele (como vos dissemos antes); e se falam elas na primeira cobra, então é de amigo; e se falam ambos em uma cobra, 
então depende de qual deles fala primeiro na cobra. (VIEIRA, 2008)
Em síntese, o que define uma canção de amor ou de amigo é a voz do poema presente na primeira 
cobra ou estrofe. Se a voz que abre o poema é a de um eu lírico masculino, esse poema é classificado 
como uma canção de amor, a exemplo da composição de D. Dinis.
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11|Trovadorismo: 1198-1418
A poesia trovadoresca em Portugal
D. Dinis demonstra consciência artesanal ao revelar o modo do seu fazer poético: tecer uma can-
ção à maneira de proençal, o que gera toda uma expectativa de leitura. A estrofe é reveladora das regras 
da arte que chegam a Portugal no século XII, oriundas da Provença, a região Sul da França medieval, 
palco do esplendor do trovadorismo. O trovadorismo à provençal não só se difundiu para o continenteeuropeu como também influenciou o lirismo europeu dos séculos vindouros.
Na cantiga Quer’eu en maneira de proençal, ao revelar a firme disposição de louvar a “mha senhor”, 
a qual não faltam a honra, a formosura e a bondade, D. Dinis cede à descrição física e moral da mulher 
prevista pelas regras da arte daquele tempo. É de se notar que o trovador mantém em sigilo a identida-
de da sua musa. E o sentimentalismo hiperbólico típico dos trovadores medievais se exibe nesse encare-
cimento do feminino: ela é um verdadeiro prodígio criado por Deus, uma coleção de excelências – logo, 
inigualável perante as demais.
A Cantiga de Amor
Ao cantar uma dama de eleição (“mha senhor”), o trovador comporta-se como um vassalo dian-
te do seu suserano. A expressão mha senhor utilizada pelo trovador significava “minha senhora”. No 
medievo, o termo senhor se associava a senhorio, significando tanto uma propriedade territorial quanto 
os meios de que dispõe um senhor feudal “para se apropriar do rendimento do trabalho realizado por 
homens sob o seu domínio” (FRANCO JÚNIOR, 1995, p.192). Assim, uma forma de organização social é 
sugerida a partir do texto poético. Em outras palavras, o ritual amoroso da cantiga de amor reproduz 
a relação entre senhor e vassalo típico do medievo. Comentando essa transposição do esquema social 
criado pelo feudalismo, Segismundo Spina afirma que o amor se tornou um “serviço” (culto) prestado 
pelo trovador à sua dama, como compromisso que se estabelecia entre o senhor e vassalo.
Segismundo Spina apresenta-nos um quadro bastante convincente dos aspectos mais relevantes 
da mensagem poética do amor cortês à provençal:
Do princípio de que o Amor é fonte perene de toda Poesia, e de que o amor é leal, inatingível, sem recompensa (porque 
a dama é sans merci) decorre todo o formalismo sentimental dessa poesia:
a submissão absoluta à sua dama;::::
uma vassalagem humilde e paciente;::::
uma promessa de honrá-la e servi-la com fidelidade;::::
o uso do :::: senhal (imagem ou pseudônimo poético com que o trovador oculta o nome da mulher amada);
a mesura, prudência, moderação, a fim de não abalar a reputação da dama (:::: pretz), pois a inobservância deste 
preceito acarreta a sanha da mulher;
a mulher excede a todas do mundo em formosura (de que resulta o tema do elogio impossível);::::
por ela o trovador despreza todos os títulos, todas as riquezas e a posse de todos os impérios;::::
o desprezo dos intrigantes da vida amorosa;::::
a invocação de mensageiros da paixão do amante (pássaros);::::
a presença de confidentes da tragédia amorosa. (SPINA, 1996, p. 363)::::
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12 | Trovadorismo: 1198-1418
Isso explica o respeito constante, a moderação, a mais completa submissão do trovador diante 
da mulher. Tais elementos estão associados a uma das principais concepções medievais sobre o amor: 
o que se convencionou chamar amour courtois ou “amor cortês”. Sobre as especificidades do amor cortês, 
Georges Duby afirma que “Esse amor, os historiadores da literatura corretamente o chamaram cortês. Os 
textos que nos fazem conhecer suas regras foram todos compostos no século XII, em cortes, sob a ob-
servação do príncipe e para corresponder às suas expectativas.” Nesse sentido, o autor afirma que as 
regras do “amor delicado” vinham reforçar as regras da moral vassálica, o que o leva a assinalar as corres-
pondências entre o que essas canções expõem e “a verdadeira organização dos poderes e das relações 
da sociedade” (DUBY, 1989, p. 59-65). A compreensão desse formalismo sentimental, que torna a arte de 
amar uma etiqueta cerimoniosa de corte, em consequência, em signo de distinção da nobreza, ajuda a 
explicar aquele famoso verso de Camões: amor “é servir a quem vence o vencedor”.
O fragmento textual de D. Dinis apresentado ganha interesse como poema-síntese de uma das 
manifestações líricas do medievo – a canção de amor. Graças à consciência artesanal do trovador, 
assegura-se a qualidade estética de versos tecidos ao gosto provençal.
Também de D. Dinis, a composição a seguir, sendo inequivocamente de amor, é uma verdadeira 
obra-prima da poesia medieval.
Em gram coita, senhor, (gram coita: “grande sofrimento”)
que peior que mort’é,
vivo, per bõa fé, (per bõa fé: “na esperança”)
e polo voss’amor
esta coita sofr’eu
por vós, senhor, que eu
vi polo meu gram mal;
e melhor mi será
de moirer por vós já;
e, pois me Deus nom val, (nom val: “não me socorre”)
esta coita sofr’eu
por vós, senhor, que eu
polo meu gram mal vi;
e mais mi val morrer
ca tal coita sofrer
pois por meu mal assi
esta coita sofr’eu
por vós, senhor, que eu
vi por gram mal de mi,
pois tam coitad’and’eu. (DOM DINIS, 2008)
Observe que D. Dinis faz uso, com maestria, das técnicas da composição poética comuns ao 
lirismo trovadoresco: o refrão, o paralelismo, a atafinda e a fiinda.
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13|Trovadorismo: 1198-1418
O refrão ou estribilho – fragmento poético ao qual se regressa ao final de cada estrofe (esta coyta 
sofr`eu ⁄ por vós, senhor, que eu) – sugere a existência de um coro ou de um solista, assim decorrendo da 
inseparabilidade entre letra e pauta musical.
O refrão se encadeia à estrofe seguinte pelo processo de encadeamento ou atafinda, e isso per-
mite que o lamento plangente do eu lírico se desenvolva sem interrupção até o final da cantiga, rema-
tada com um dístico (ou estrofe de dois versos). Conforme a Arte de Trovar medieval, trata-se da fiinda. 
Leia-se:
As fiindas são coisas que os trovadores sempre costumaram pôr no fim das suas cantigas, para concluírem e acabarem 
melhor nelas os argumentos (razones) que disseram nas cantigas, chamando-lhes fiinda, porque quer dizer conclusão 
de argumento. E essa fiinda podem fazê-la de uma ou de duas ou de três ou de quatro palavras (versos). (MONGELLI, 
2003, p. 147)
Afora o refrão, você pode observar também o uso do paralelismo, um processo repetitivo que 
envolve versos com a mesma estrutura sintática e/ou semântica no corpo da composição – no caso, “Vy 
polo meu gram mal, Polo meu gram mal vy”.
No aspecto temático, D. Dinis retoma os lugares-comuns típicos da cantiga de amor. Embora o 
foco não esteja voltado à celebração das virtudes da donna, sua idealização é evidente. Observe que 
nesse poema a coyta (ou, conforme um termo utilizado por Caetano Veloso, a queixa) derivada do 
tormento passional do sujeito poético masculino se associa ao olhar. O olhar é, por certo, janela da 
alma e nesse caso não surge como o responsável pela transmissão do amor ao coração, pois antes disso 
expressa a perdição do eu lírico.
Vale lembrar que o olhar como causa do tormento amoroso é uma constante, não só na lírica 
medieval, mas circunstância típica da tópica amatória da poesia romântica luso-brasileira, como os 
poemas “Este inferno de amar”, de Almeida Garrett e “Olhos verdes”, de Gonçalves Dias.
Cantiga de Amigo 
É interessante notar que o sentimento de perda da continuidade 
do relacionamento amoroso remete a um dos primeiros textos poéticos 
escritos da literatura portuguesa. Há quem diga que a cantiga de amigo 
“Ai eu coytada”, de D. Sancho I (1154-1211), rei de Portugal, dedicada à 
formosa Maria Paes Ribeiro, merece ser considerada o manuscrito inau-
gural da literatura portuguesa. Observe como o trovador incorpora poeti-
camente o ponto de vista feminino para descrever o sentido saudosismo 
da mulher perante a ausência do amado:
Ai eu coitada!
Como vivo en gran cuidado (cuidado: “aflição”)
 por meu amigo
que ei alongado! (ei alongado: “tenho esperado”)
 Muito me tarda
o meu amigo na Guarda!
 Ai eu coitada!
Iluminura medieval das Cantigas 
de Santa Maria, de Afonso X.
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14 | Trovadorismo: 1198-1418
Como vivo en gran desejo (desejo:“recordação saudosa”)
 por meu amigo
que tarda e non vejo!
 Muito me tarda
o meu amigo na Guarda! (apud SPINA, 1996, p. 319)
O manuscrito dessa composição se encontra registrado no Cancioneiro da Biblioteca Nacional, sob 
o número 456. Logo no primeiro verso, a mulher se diz coytada. Como dissemos, a palavra coyta traduzia 
o tormento passional dos amantes. Ela sofre de saudade (en gran desejo) de tanto esperar (que ei alon-
gado) por seu namorado que se está em uma cidade distante (na Guarda). O fato de não vê-lo intensifi-
ca ainda mais a recordação saudosa.
A aparente simplicidade dessa cantiga é típica de uma das manifestações da poesia lírica que 
se desenvolveu na Península Ibérica. Nas cantigas de amigo, que têm origem galego-portuguesa, 
percebe-se o papel ativo da mulher na busca de soluções para os seus anseios erótico-sentimentais. A 
composição é válida para se pensar um tipo peculiar de cantiga de amigo,
o das paralelísticas, que aliam uma simplicidade de motivos e recursos semânticos ao elaborado arranjo da sua 
expressão, através de um esquema de repetitividade que enriquece o sentido pelo tom de litania e sugestão encanta-
tória, muitas vezes magoada, perplexa ou interrogativa, que cria. (CANTIGAS DE AMIGO, 2008)
Em outras palavras, entre os temas desenvolvidos nas cantigas de amigo, encontramos situações 
da vida amorosa das moças casadoiras. A mulher expressa os seus ciúmes e dúvidas, ou faz confidên-
cias dos seus sucessos amorosos.
As cantigas de amigo também podem ser dialogadas, embora o sujeito poético feminino não 
dirija necessariamente o seu lamento para o destinatário do seu amor (o amigo), mas para a mãe ou 
amigas, ou mesmo para elementos inanimados (árvores, ondas).
Afora o tipo de voz que inicia as cantigas, o espaço é decisivo para a sua classificação. As canções 
de amor são identificadas por traduzirem o ponto de vista de um sujeito poético masculino e pelo 
cenário palaciano. Já as cantigas de amigo se ambientam fora do palácio e do templo: ora no campo, 
sob frondosas avelaneiras ou pinheiros, ora junto ao mar, ora à frente das igrejas.
Enfim, não se pode esquecer que essas duas modalidades da lírica medieval se destinavam ao 
canto e a dança. O esquema paralelístico e o estribilho ou refrão são os elementos formais que punham 
em evidência essa relação.
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15|Trovadorismo: 1198-1418
Descoberto por Pedro Vindel este pergaminho contém as letras e as respectivas pautas musicais das cantigas de Martim 
Codax (segunda metade do séc. XIII).
Segundo Spina, o esquema paralelístico diz respeito a um processo repetitivo que constitui o 
fundamento da poesia popular, sendo que na sua base “estão presentes a música e a dança alternada a 
dois coros” (SPINA, 1996, p. 396). A presença do coro é sugerida pelo refrão ou estribilho: “um fragmento 
poético no corpo da composição, ao qual regressa constantemente o coro (às vezes cantados por um 
solista), entre a execução de uma estrofe e outra” (SPINA, 1996, p. 400).
É o que ocorre na cantiga de D. Sancho, tanto pela presença do refrão (“Muito me tarda / o meu 
amigo na Guarda!”), quanto pelo recurso à estrutura simples da forma paralelística: “Como vivo en gran 
cuidado / Como vivo en gran desejo”. A repetição de versos semelhantes, com alterações nas palavras 
finais, permite que a ideia principal se reproduza ao longo do poema, facilitando sua memorização.
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16 | Trovadorismo: 1198-1418
Cantigas de Escárnio e Maldizer 
Apesar de alguns estudiosos considerarem a vertente satírica do trovadorismo como uma 
produção menor dentro desse movimento (MOISÉS, 1980, p. 28), acreditamos que ela tenha qualidade 
e significado relevantes dentro da literatura medieval. As modalidades satíricas que estudaremos são 
escárnio e maldizer.
Nas cantigas de escárnio, como já dissemos, o trovador critica sem individualizar a pessoa que 
estaria sendo criticada. As de maldizer são aquelas em que a pessoa criticada é mencionada. Fazendo 
um esquema, temos:
cantiga de escárnio:::: – sátira a alguém com sutileza, sendo que o processo estilístico utilizado é 
a ironia;
cantiga de maldizer:::: – sátira direta, com linguagem obscena.
Tais cantigas revelam aspectos típicos da vida dos jograis ou segreis, bem como da corte. Os 
jograis levavam uma vida diferente do artificialismo cortês ou do regime servil a que estava sujeito 
o trabalhador comum. Socialmente, esses artistas eram párias. Nas suas canções, eles contavam suas 
experiências com mulheres da vida, bebedeiras, fidalgos de menor expressão com pretensões a senhor 
feudal, as sovinices de um senhor etc.
No entanto, esse tipo de cantiga não se restringia ao jogral, pois qualquer trovador, até mesmo o rei 
D. Dinis, trataram dessa temática e lançaram mão desse gênero poético. Em algumas cantigas, podemos 
inclusive ver a rivalidade entre jograis e trovadores: os primeiros queriam ascender da condição de 
executantes para a de compositores, enquanto os segundos defendiam a manutenção da hierarquia.
Em termos políticos, a sátira foi pouco utilizada, mas ela é o documento de uma época, pois a 
condição dos jograis – andando de castelo em castelo, de feira em feira – possibilita-nos o conhecimento 
daquela realidade sob variados aspectos. Tomemos como exemplo disso a canção de João Garcia 
Guilhade:
Ai dona fea! foste-vos queixar 
porque vos nunca louv’en meu trobar 
mais ora quero fazer un cantar 
en que vos loarei toda via; 
e vedes como vos quero loar: 
dona fea, velha e sandia!
Ai dona fea! se Deus mi perdon! 
e pois havedes tan gran coraçon 
que vos eu loe en esta razon, 
vos quero já loar toda via; 
e vedes qual será a loaçon: 
dona fea, velha e sandia!
Dona fea, nunca vos eu loei 
en meu trobar, pero muito trobei; 
mais ora já un bon cantar farei 
en que vos loarei toda via; 
e direi-vos como vos loarei: 
dona fea, velha e sandia! (GUILHADE, 2008)
O poeta João Garcia Guilhade foi um importante trovador português do século XIII e nos deixou, 
além de cantigas de escárnio como “Ai Dona Fea”, também cantigas de amor e de amigo (COHEN, 1996). 
No poema citado, o trovador se dirige a uma dama que se queixava de nunca receber versos dele, 
louvando sua pessoa. Irritado com a cobrança, o poeta explica que os únicos elogios que lhe poderia 
fazer eram “feia, velha e louca”. 
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17|Trovadorismo: 1198-1418
Principais trovadores 
João Soares de Paiva – considerado o mais antigo poeta em português com a canção “Ora faz ::::
host’o senhor de Navarra”. O poema se encontra no Cancioneiro da Vaticana.
Paio Soares de Taveirós – visto como o autor de um dos primeiros textos em português, “Canção ::::
da Ribeirinha” (1189 ou 1198). Sua obra se encontra no Cancioneiro da Ajuda.
D. Afonso X, o Sábio – rei de Leão e Castela, era avô de D. Dinis. Escreveu numerosos versos, ::::
sendo os mais conhecidos as Cantigas de Santa Maria.
D. Dinis – a figura mais proeminente do trovadorismo português. Foi rei de Portugal, grande ::::
incentivador das artes e do conhecimento (fundou a Universidade de Coimbra) e um dos 
melhores e mais profícuos poetas do período. Frequentou todos os gêneros poéticos da época: 
cantigas de amor, amigo, escárnio e maldizer.
Martim Codax – sua história é pouco conhecida, mas as poucas composições (sete cantigas de ::::
amigo) que nos deixou foram compiladas junto com a notação musical dos poemas.
A permanência do Trovadorismo 
Aproveitando o fio da meada, ao longo do século XIX e do século XX ocorreu uma verdadeira 
revisitação à cultura medieval. Se a Era Clássica escolheu o passado greco-latino como modelo, o 
Romantismo escolheu para si a recriação do passado medieval.
Enquanto estética do século XIX, o Romantismo se relaciona com a reação aos preceitosclássicos 
e a busca da identidade nacional. Daí a valoração do medievo, berço da nação lusitana e da cristandade. 
O gosto pelo medievo se constata tanto na arquitetura com a (re)construção de templos góticos como 
também nos motivos poéticos e procedimentos compositivos da literatura medieval.
Vamos dar dois exemplos.
Alexandre Herculano, principal escritor do movimento romântico em Portugal, escreveu um ::::
romance histórico intitulado Eurico, o Presbítero (1844), ambientado no século VIII, que revive 
o clima das novelas de cavalaria e o espírito das Cruzadas típicas da prosa medieval. O autor 
também era poeta e um de seus versos é autoexplicativo: “Eu, o cristão, trovador do exílio” 
(HERCULANO, 2008).
Almeida Garrett, no melhor livro de poemas do romantismo português, intitulado :::: Folhas 
Caídas, retoma o lirismo fluente, de ritmos populares, das composições medievais. Leia-se o 
poema intitulado “Barca Bela”:
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18 | Trovadorismo: 1198-1418
A retomada dos processos de composição da arte poética medieval se observa pela escolha 
da chamada medida velha – no caso, as redondilhas (os dois primeiros versos possuem sete sílabas 
poéticas). Note-se ainda que esse poema reitera um mesmo verso, à guisa de refrão, como remate de 
cada estrofe. Enfim, a repetição de versos com a mesma identidade semântica, na primeira e na última 
estrofe, lembra a estrutura paralelística das cantigas trovadorescas.
Para Garrett, a reação romântica contra a literatura clássica de feições greco-latinas “trouxe a 
renascença da poesia nacional e popular”. Segundo ele, “nenhuma coisa pode ser nacional se não for 
popular” (FERREIRA, s.d., p. 5). Assim, Garrett deixa bem claro que essa retomada é uma contribuição à 
busca da cor local, ou dos matizes da identidade pátria.
Dicas de estudo
A propósito das manifestações da Literatura Medieval, consulte o site <http://alfarrabio.::::
di.uminho.pt/vercial/trovador.htm>, que apresenta vários exemplos das modalidades da 
poesia trovadoresca. Vale dizer que esse site é considerado a maior base de dados sobre a 
Literatura Portuguesa, do medievo às textualidades contemporâneas.
Consulte também o Portal Galego, <http://www.agal-gz.org/modules.php?name=Biblio.>. ::::
Nele você vai encontrar um excelente elenco de cantigas e uma bela galeria de iluminuras 
medievais.
Texto complementar 
Vamos ler os fragmentos que restaram da Arte de Trovar conservados nos fólios 3 e 4 do Cancioneiro 
da Biblioteca Nacional (também conhecido pelo nome de Cancioneiro Colocci-Brancuti), que definem 
aspectos fundamentais da poética trovadoresca. Em seguida, os pertinentes comentários da professora 
Yara Frateschi Vieira.
Pescador da barca bela, 
Onde vais pescar com ela, 
Que é tão bela, 
Ó pescador?
Não vês que a última estrela 
No céu nublado se vela? 
Colhe a vela, 
Ó pescador!
Deita o laço com cautela, 
Que a sereia canta bela... 
Mas cautela, 
Ó pescador!
Não se enrede a rede nela, 
Que perdido é remo e vela 
Só de vê-la, 
Ó pescador,
Pescador da barca bela, 
Inda é tempo, foge dela, 
Foge dela 
Ó pescador! (ALMEIDA GARRETT, 2008)
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19|Trovadorismo: 1198-1418
A Poética Galego-Portuguesa
(VIEIRA, 2008)
Capítulo Quarto
E como há algumas cantigas em que falam tanto eles como elas, por isso é importante que 
entendais se são de amor ou de amigo, porque se falam eles na primeira cobra e elas na outra, é de 
amor, pois move-se segundo a argumentação dele (como vos dissemos antes); e se falam elas na 
primeira cobra, então é de amigo; e se falam ambos em uma cobra, então depende de qual deles 
fala primeiro na cobra.
Capítulo Quinto
Cantigas d’escárnio são aquelas que os trovadores fazem, querendo dizer mal de alguém nelas, 
e dizem-lho por palavras cobertas que tenham dois entendimentos, para que não sejam entendidas... 
ligeiramente: e essas palavras chamam os clérigos equivocatio. E essas cantigas se podem fazer 
também de mestria ou de refrão. E embora alguns digam que há algumas cantigas de “joguete 
d’arteiro”, essas não são mais do que de escárnio, nem têm outro entendimento. Mas também dizem 
ainda que há outras “de risabelha”: essas ou são de escárnio ou de maldizer; e chamam-lhes assim 
porque riem por causa delas às vezes os homens, mas não são coisas em que haja sabedoria ou 
qualquer outro bem.
Capítulo Sexto
Cantigas de maldizer são aquelas que fazem os trovadores [contra alguém] descobertamente: 
nelas entrarão palavras em que querem dizer mal e não terão outro entendimento se não aquele 
que querem dizer claramente. [...]
O quarto capítulo em que se contêm seis capítulos.
Capítulo quarto
As fiindas são coisas que os trovadores sempre costumaram pôr no fim das suas cantigas, 
para concluírem e acabarem melhor nelas os argumentos (razones) que disseram nas cantigas, 
chamando-lhes fiinda, porque quer dizer conclusão de argumento.
E essa fiinda podem fazê-la de uma ou de duas ou de três ou de quatro palavras (versos). E se 
a cantiga for de mestria, a fiinda deve rimar com a última cobra; e se for de refrão, deve rimar com o 
refrão. E ainda que diga que a cantiga deve ter uma delas, houve alguns (trovadores) que lhe fizeram 
duas ou três, segundo a vontade de cada um deles. E também outros houve que as fizeram sem 
fiindas, mas a fiinda dá um melhor acabamento.
Capítulo quinto: contém dois capítulos
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20 | Trovadorismo: 1198-1418
Capítulo segundo
Além disso, como o disse, as cantigas [podem] fazer-se em rimas longas ou breves ou em todas 
misturadas. E por isso convém mostrarmos quais são as rimas longas ou as breves, embora não 
possamos mostrá-las todas cabalmente, porque são muitas e de muitas maneiras: no entanto, todas 
as rimas que acabam nestas vogais, as quais sejam as últimas, são longas, convém saber: as que 
acabam no a ou no o; após o a ou o o, põe o e ou qualquer das outras vogais que se ponham no fim 
da rima na última sílaba, ela sozinha. E as outras rimas todas que se acabam em letras breves, todas 
são curtas; por isso convém que o trovador que quiser trovar, se começar em sílabas longas ou em 
curtas, com elas acabe; poderá, porém, meter na cobra umas e outras, se quiser, contanto que, da 
maneira que as meter numa cobra, da mesma forma as meta nas outras. No entanto, convém que, 
se assim as meter, que faça rimar longas com longas e curtas [com curtas].
Comentário
A Arte de Trovar anônima e fragmentária, que se encontra aposta ao atual Cancioneiro da Biblioteca 
Nacional de Lisboa, antigo Cancioneiro Colocci-Brancuti, é o único documento dessa natureza de que 
dispõe a lírica galego-portuguesa dos séculos XIII e XIV. Segundo o seu último editor, não é improvável 
que tenha sido redigido pelo Conde Barcelos, filho de D. Dinis, ou por um dos dois trovadores que 
devem ter colaborado com ele na organização do cancioneiro: João de Gaia e Estêvão da Guarda.
Pelo fato de ser o único texto a tentar uma sistematização da arte poética trovadoresca ga-
lego-portuguesa, é realmente uma pena que tenha chegado a nós em forma acéfala: antes de ter 
sido feita a única cópia que possuímos, já se tinham perdido os títulos um e dois e parte do ter-
ceiro. O tratado teria seis títulos, dividido cada um em capítulos. Podemos perceber uma certa or-
ganização na distribuição da matéria: assim, o terceiro título, além dos gêneros mais prestigiosos, 
trata de formas dialogadas e “dialógicas”, no sentido contemporâneo de um texto que utiliza outro 
já existente e o reelabora (as cantigas de “seguir”); o quarto título dedica-se a questões de estrutu-
ra textual, tais como o número de cobras por composição e de versos por cobra; procedimentos 
de coesão interestrófica, como a “palavra perduda”, a “ateúda”, a “fiinda”, o “dobre” e o “mozdobre”; 
o quinto títuloocupa-se da adequada utilização dos tempos verbais e da necessidade de manter 
a coerência temporal, embora remeta o leitor para o que se expôs anteriormente em relação ao 
“mozdobre”; outro procedimento de coerência textual é a estrutura rímica, que pode incluir rimas 
longas ou breves, mas não permite rimar longas com breves; finalmente, o último título trata mui-
to brevemente dos erros poéticos provenientes de encontros entre vocábulos que produzem “pa-
lavras feias” (cacófato), e de encontros entre vogais que produzem sons desagradáveis (hiato). O 
que nos resta do tratado começa no capítulo quarto do título terceiro, dedicado às cantigas dialo-
gadas em que falam o homem e a mulher. Podemos supor que pelo menos dois dos três capítulos 
anteriores tratassem dos dois gêneros maiores: a cantiga de amor e a cantiga de amigo, uma vez 
que, por um lado, como nos diz o autor anônimo, anteriormente já falara da cantiga de amor e, 
por outro lado, as cantigas de escárnio e maldizer ocuparão os capítulos cinco e seis. A descrição 
que o tratadista oferece da cantiga de amor é bastante sumária: nas suas próprias palavras, ela se 
move a razon d’ele – dito isso assim, de forma tão sintética, não fica muito claro o que queria dizer, 
embora possamos supor que significaria algo como “move-se segundo a argumentação dele”, ou 
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21|Trovadorismo: 1198-1418
desenvolve-se apresentando o ponto de vista do homem. Preferimos a versão “move-se segundo 
a argumentação dele”, porque o próprio texto declara que o critério decisivo para estabelecer se 
a cantiga dialogada é de amor ou de amigo é determinar quem fala primeiro na cobra, e a cantiga 
de amor é em geral um “arrazoado” sobre o amor do poeta (razon).
Os capítulos quinto e sexto desse título terceiro são importantes, porque nos elucidam acerca 
do critério para distinguir as cantigas de escárnio das de maldizer, embora já o próprio cancionei-
ro use a expressão às vezes de forma não discriminada, apresentando, na rubrica, algumas cantigas 
como de escárnio e maldizer. De qualquer forma, segundo o tratadista, é decisiva para a caracteriza-
ção dessas cantigas a presença ou a ausência daquilo que os letrados chamam de equivocatio, ou 
seja, ambiguidade. A cantiga de escárnio é, portanto, aquela que se vale dessa figura lógica ou retó-
rica para falar mal de alguém, por “palavras cobertas que tenham dois entendimentos, para que não 
sejam entendidas... ligeiramente: e essas palavras chamam os clérigos equivocatio, enquanto a can-
tiga de maldizer se faz “descobertamente: nelas entrarão palavras em que querem dizer mal e não 
terão outro entendimento senão aquele que querem dizer claramente”. É relevante observar que o 
autor do tratado exibe o seu conhecimento da cultura “clerical”, usando o termo latino para a figura 
lógica e retórica da ambiguidade e explicando o seu sentido. Oferece depois um elemento técnico, 
informando que essas cantigas tanto podem ser de mestria (isto é, sem refrão) como de refrão, o que 
nos leva novamente a supor que esses termos tivessem sido objeto de descrição anterior, num ca-
pítulo que tratasse desses dois tipos de estrutura poética comuns na lírica galego-portuguesa. Essa 
terminologia retorna no capítulo primeiro do título quarto, onde se discutem os “talhos” (a estrutu-
ra) das cantigas: o texto, porém, apresenta dificuldades de leitura, reconhecidas pelo seu editor, que 
impedem a cabal compreensão.
No capítulo segundo do título quarto, dá uma informação clara sobre a “palavra perduda”, isto 
é, o verso (ou dois versos) que alguns trovadores, para mostrarem maior mestria, colocaram na can-
tiga, sem que rimasse com nenhum outro verso da mesma estrofe; ela pode vir no começo, no meio 
ou no fim da estrofe, mas depois deverá ser repetida a mesma rima no mesmo lugar nas demais es-
trofes. Outros recursos estruturais merecem a sua atenção, como a “fiinda”, a forma de composição 
chamada “ateúda”, o dobre e o mozdobre (capítulos terceiro, quinto e sexto do título quarto). O capí-
tulo sobre as rimas supõe que o leitor conhece a terminologia empregada para os dois tipos de rima, 
isto é, a rima longa (oxítona ou aguda) e a rima breve (paroxítona ou grave). A explicação é muito 
mais perfunctória do que a que já antes víramos em outros tratados poéticos vernáculos, como no 
de Jofre de Foixá, pois deixa de lado a questão crucial do acento. O texto conclui com um tratamen-
to muito rápido de alguns erros que se podem cometer na composição trovadoresca, desculpando-
se o autor pela sua brevidade, porque “os erros são tantos – e de tantas maneiras – que não posso 
falar em todos completamente”.
O tratado galego-português impressiona, portanto, como geralmente pouco minucioso e 
pouco rigoroso nas suas definições e descrições. Não contém, tampouco, como alguns dos demais 
tratados vernáculos, exemplificação fornecida pelos textos. Nem seria de grande utilidade para o 
aspirante a poeta, embora algumas vezes o autor pareça dirigir-se a ele: por exemplo, quando diz 
algo como “convém que o trovador que quiser trovar”. As mais das vezes, porém, a sua intenção soa 
como mais descritiva do que didática, baseando-se de forma normativa na tradição seguida pelos 
trovadores, conforme o autor a percebe.
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22 | Trovadorismo: 1198-1418
O tratadista revela possuir um critério de mestria técnica (capítulo sobre a fiinda), marcado 
também pelo uso abusivo das expressões “convém que” ou “não convém que” e do verbo “dever”, 
e de “valor poético”, fundado no domínio da técnica, mas também, embora esse ponto não seja 
desenvolvido de forma suficiente, no campo da moral. Por esse motivo, exclui do rol das composições 
que devem ser registradas ou imitadas aquelas que “não são coisas em que haja arte ou qualquer 
outro bem”, e das composições, aquelas palavras que se aproximam da “caçorria ou lixo, que não 
convém ser posto numa boa cantiga”.
Atividades
1. A propósito das origens das cantigas de amor galego-portuguesas, António José Saraiva e Oscar 
Lopes afirmam, em sua História da Literatura Portuguesa, que os provençais eram os modelos a 
seguir. Cite versos de D. Dinis que podem corroborar essa tese.
2. O que significa escrever uma canção de amor à maneyra de proençal? Justifique apontando pelo 
menos três das suas principais características temáticas.
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23|Trovadorismo: 1198-1418
3. É possível estabelecer correspondências entre o que as canções de amor expõem e a organização 
da sociedade medieval? Justifique.
Referências
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25|Trovadorismo: 1198-1418
Gabarito
1. D. Dinis (1261-1325) foi um dos mais fecundos compositores galego-portugueses e os seus versos 
que denotam a origem provençal das cantigas de amor são estes:
 Quer’eu en maneyra de proençal
 fazer agora hun cantar d’amor..
2. Ao afirmar que deseja fazer canção de amor à maneyra de proençal, D. Dinis, o Rei Trovador, define 
o modo do seu fazer poético pautado nas regras da arte originárias da região da Provença, o Sul 
da França medieval. Entre as principais características podem-se mencionar que:
o sujeito poético (a voz do poema) é masculino;::::
a mulher é idealizada, geralmente chamada de “mia senhor”; e::::
a vassalagem amorosa é paciente e com respeito constante.::::
3. Sim, pois nas canções de amor o sujeito poético masculino deve se colocar em uma posição de 
inferioridade ou submissão absoluta diante da mulher, jurando fidelidade e demonstrar respeito 
constante. Ao exaltar as virtudes da “mia senhor”, o sujeito poético se comporta como um vas-
salo ou servo diante do seu suserano e desse modo reproduz e reforça as relações sociais típicas 
do feudalismo.
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26 | Trovadorismo: 1198-1418
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O Humanismo
José Carlos Siqueira
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
muda-se o ser, muda-se a confiança;
todo o mundo é composto de mudança,
tomando sempre novas qualidades.
Luís de Camões
O homem como centro do universo 
No romance Os Maias (1888), do escritor realista Eça 
de Queirós, há um personagem bastante divertido chamado 
João da Ega, que pretende escrever um livro muito peculiar, As 
memórias de um átomo:
Este átomo (o átomo do Ega, como se lhe chamava a sério em 
Coimbra) aparecia no primeiro capítulo, rolando ainda no vago das 
Nebulosas primitivas: depois vinha embrulhado, faísca candente, na 
massa de fogo que devia ser mais tarde a Terra: enfim, fazia parte 
da primeira folha de planta que surgiu da crosta ainda mole do 
globo. Desde então, viajando nas incessantes transformações da 
substância, o átomo do Ega entrava na rude estrutura do Orango, 
pai da humanidade – e mais tarde vivia nos lábios de Platão. 
Negrejava no burel dos santos, refulgia na espada dos heróis, 
palpitava no coração dos poetas. [...] Achando-se finalmente no bico 
da pena do Ega, e cansado desta jornada através do Ser, repousava – 
escrevendo as suas Memórias... Tal era este formidável trabalho – de 
que os admiradores do Ega, em Coimbra, diziam, pensativos e como 
esmagados de respeito:
– É uma Bíblia! (QUEIRÓS, 1997, p. 1.116) Esboço dos movimentos de um homem, em 
desenho de Leonardo da Vinci.
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28 | O Humanismo
A graça desse texto está no fato de que a bíblia da modernidade 
seria o percurso de um átomo pela história, um átomo como outro 
qualquer, sem nada de especial, símbolo da materialidade da vida. 
Deus perde, assim, a prerrogativa de criar e de reger o universo. Essa 
exclusão da centralidade de Deus que, no século XIX – quando Eça 
escreveu o seu texto – é tomada de modo debochado e banal, no 
século XV e XVI foi uma grande revolução em Portugal e em toda a 
Europa. É o que ficou conhecido como humanismo, com o homem e a 
racionalidade humana tomando o lugar central na escala de valores do 
mundo ocidental.
Segundo Óscar Lopes e António José Saraiva, quem promoveu o Renascimento em Portugal fo-
ram os humanistas:
A palavra humanismo com que se designou este movimento, inspirada pelo conceito de humanitas (o de humanidade, 
ou qualidade humana, como cultura e estrutura moral) de Cícero, exprime a crença num conjunto de valores morais e 
estéticos universalmente humanos, os quais se achariam definidos tanto nas Escrituras e na Patrística como na cultura 
profana da Antiguidade. (LOPES; SARAIVA, 1979, p. 175-176)
Do ponto de vista político, os humanistas advogavam a escolha dos governantes segundo o saber e 
a capacidade, condenando a guerra e propondo soluções pacíficas para os conflitos políticos e religiosos. 
Da perspectiva do ensino, o ideal humanista propunha a realização harmoniosa das faculdades morais e 
estéticas do indivíduo, por meio da substituição da dialética e da retórica escolástica, que era baseada no 
aristotelismo, pela leitura e o comentário dos textos de autores clássicos, defendendo assim uma crítica de 
base filológica e histórica. Seus seguidores retomavam Platão e os filósofos neoplatônicos, como Plotino.
Apesar de o humanismo ser uma corrente de pensamento e não um programa estético, ele foi 
a base de toda arte e cultura renascentistas. Sua origem se deu na Academia Platônica de Florença, na 
Itália, seu local de origem e um de seus principais mentores foi o filósofo Marsílio Ficino (1433-1499). 
Ficino foi tradutor de Platão, Plotino, Jâmbico, Proclo e Sinésio, e recebeu na Academia as principais 
figuras de seu tempo, como o arquiteto 
Alberti, o filósofo Pico della Mirandola, 
o poeta Poliziano e até Maquiavel. E a 
Academia Platônica de Florença foi muito 
além da tradição grega antiga, gerando as 
bases para o pensamento humanista.
No âmbito da literatura, esses 
pensadores reconheceram a superioridade 
artística e literária das civilizações antigas 
e, a partir daí, conceberam a noção de 
homem completo (corpo e espírito), 
integrado na humanidade e participantedo vasto conjunto da natureza. Portanto, 
tais pensadores superaram a noção de 
homem individual pela noção mais ampla e 
complexa de humanidade. Isso tudo não 
negava a existência divina, mas colocava 
em primeiro plano o estudo do homem e da 
natureza.
Detalhe da pintura Zacarias no Templo (1490), de Domenico Ghirlan-
daio, na capela de Santa Maria Novella, em Florença. Aqui aparecem 
Marsílio Ficino (à esquerda), Cristoforo Landino, Angelo Poliziano e 
Demetrios Clakondyles.
Representação de um átomo 
de hélio.
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29|O Humanismo
O Humanismo em Portugal 
As ideias humanistas chegaram à literatura portuguesa por intermédio do contato de escritores 
portugueses com o meio literário italiano. Um dos casos clássicos desse intercâmbio foi o do poeta 
Francisco de Sá de Miranda (1481-1558). De 1521 a 1526, Sá de Miranda frequentou os meios literários 
italianos. Ao retornar dessa viagem, ele trouxe na bagagem a nova estética humanista, introduzindo na 
literatura portuguesa o soneto, a canção, a sextina, as composições em tercetos e em oitavas, o decassí-
labo. Além de várias composições poéticas, Sá de Miranda também escreveu comédias e tragédias.
Outro importante poeta desse momento foi Garcia de Resende (1470-1536), que era ainda 
cronista, músico, desenhista e arquiteto. Sua principal obra é o Cancioneiro Geral, na qual reúne compo-
sições de mais de 200 poetas das cortes de D. Afonso V, D. João II e D. Manuel I, além dos próprios traba-
lhos. É o maior repositório poético do final do período medieval e início do período clássico.
Entre os prosadores marcados pelo pensamento humanista, podemos destacar Fernão Lopes 
(c. 1380-c. 1460), cronista no reinado de D. Duarte, havendo escrito a história dos reis D. Pedro I, D. 
Fernando e D. João I. Também podemos nos lembrar de João de Barros (c. 1496-c. 1570), tesoureiro da 
Casa da Índia, Mina e Ceuta – o que lhe deu a oportunidade de escrever as Décadas da Ásia (1552-1563), 
que tratam dos descobrimentos portugueses no Oriente. Além das Décadas, João de Barros escreveu a 
Crônica do Imperador Clarimundo (1520), Ropicapnefma ou Mercadoria Espiritual (1532) e Gramática da 
Língua Portuguesa (1540).
No entanto, o escritor que é considerado o maior humanista português, e mesmo um dos maiores 
da Europa, chamava-se Damião de Góis (1502-1574). Na função de embaixador de Portugal, ele viajou 
por vários lugares da Europa, estabelecendo relações com reis, príncipes e diversas figuras de expressão 
no cenário político e cultural daquele momento. Por manter contato com Erasmo, Lutero e outros refor-
madores protestantes, acabou sendo acusado de heresia pela Inquisição. Foi um dos cronistas reais e 
escreveu Crônica do Felicíssimo Rei D. Manuel (1566-1567) e a Crônica do Príncipe D. João (1567).
Podemos ainda citar Fernão Lopes de Castanheda (1500-
1559), que escreveu a História do Descobrimento e Conquista da Índia 
pelos Portugueses (1551-1561), ou Fernão Mendes Pinto (c. 1510-
1583), autor de Peregrinação (1614), como outros dois importantes 
prosadores que produziram à sombra do humanismo português.
No âmbito da prosa, interessa-nos, no entanto, 
especialmente Bernardim Ribeiro (c. 1480-c. 1540), provavel- 
mente o primeiro escritor português a adotar a língua portuguesa 
na prosa erudita, já que até esse momento apenas o latim era 
considerado digno para tanto. Quase nada se sabe da vida de 
Bernardim Ribeiro, sendo incertas as datas de nascimento e 
morte. Acredita-se que tenha visitado a Itália na companhia de Sá 
de Miranda e frequentado o meio literário da corte portuguesa. 
De sua autoria, chegou-nos alguns poucos versos, o romance 
(gênero de poema) Ao Longo de uma Ribeira (1550) e a novela 
Menina e Moça (1554), havendo esta última se transformado em 
uma referência obrigatória da origem da prosa portuguesa, pois 
seria a primeira novela pastoril da península Ibérica.
A Crónica do Felicíssimo Rei D. Manuel, do 
humanista Damião de Góis.
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30 | O Humanismo
Alguns acreditam que Menina e Moça possa ser um roman à clef, isto é, um romance codifica-
do que retrata a própria vida amorosa do autor, já que há muitos possíveis anagramas1 nos nomes das 
personagens. Por exemplo, Binmarder seria um anagrama de Bernardim; Natércia, de Caterina; Arima, 
de Maria; e assim por diante. Menina e Moça é uma “novela sentimental”, que funciona como uma “can-
tiga de amigo” ampliada, resultando na visão feminina de uma “novela de cavalaria”.
Menina e moça me levaram de casa de minha mãe para muito longe. Que causa fosse então a daquela minha levada, 
era ainda pequena, não a soube. Agora não lhe ponho outra, senão que parece que já então havia de ser o que depois 
foi. Vivi ali tanto tempo quanto foi necessário para não poder viver em outra parte. Muito contente fui em aquela terra, 
mas, coitada de mim, que em breve espaço se mudou tudo aquilo que em longo tempo se buscou e para longo tempo 
se buscava. Grande desaventura foi a que me fez ser triste ou, per aventura, a que me fez ser leda. Depois que eu vi tan-
tas cousas trocadas por outras, e o prazer feito mágoa maior, a tanta tristeza cheguei que mais me pesava do bem que 
tive, que do mal que tinha. (RIBEIRO, 2002, p. ii).
Assim tem início o relato dos diversos sofrimentos amorosos que a narradora ouviu contar ou 
que, em parte, também experimentou. O tom sentimental, as diversas tramas amorosas e a exacerbação 
das sensações fizeram com que essa obra se transformasse em referência fundamental, já no século XIX, 
para os escritores portugueses ligados à escola romântica.
Gil Vicente (c. 1465-c. 1537): 
a grande figura literária do Humanismo 
O dramaturgo Gil Vicente caiu nas graças da corte quando, em 1502, a rainha D. Maria assistiu em 
seu quarto à apresentação do Auto da Visitação ou Monólogo do Vaqueiro, que saudava o nascimento de 
seu filho, o príncipe D. João. A partir de então, o rei D. Manuel nomeou Vicente como seu mestre de ce-
rimônias, cargo que ele manteve também no reinado de D. João III – o 
mesmo D. João que o dramaturgo vira nascer – e de quem chegaria a 
receber terças (propriedades feudais) e prêmios.
Gil Vicente conseguiu adquirir tanto prestígio na corte que, 
dentro de seu espírito humanista, chegou a censurar os frades de 
Santarém por explicarem o terremoto de 1531 como resultado da ira 
divina. E, em uma carta ao rei, ainda condenou a perseguição impin-
gida aos judeus.
Considerado o fundador do teatro português (e mesmo do teatro 
ibérico, ao lado de Juan del Encina), Gil Vicente é o expoente máximo 
do humanismo literário português. Pouco se sabe sobre sua vida. Pode 
ter sido ourives e autor da famosa custódia2 de Belém, obra-prima da 
ourivesaria portuguesa que se encontra atualmente no Museu de Arte 
Antiga de Lisboa. Mas certamente foi um grande dramaturgo, havendo 
trabalhado no mínimo durante 34 anos, de 1502 a 1536, data de sua 
última encenação, compondo cerca de 50 obras.
1 Anagrama: transposição de letras de palavra ou frase para formar outra palavra ou frase diferente.
2 Custódia ou ostensório: receptáculo em que a hóstia fica exposta à adoração dos fiéis.
Gil Vicente, o inventor do teatro 
português.
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31|O Humanismo
Também sobre as encenações das peças vicentinas pouco se sabe. 
Algumas provavelmente necessitariam de certa sofisticação material, 
como o Auto da Lusitânia, em que há a sugestão de que a ação se passa 
em dois andares distintos. A maioria, no entanto, exigia pouco aparato 
teatral para ser encenada.
O teatro vicentino e suas fontes 
A classificação dos autos de Gil Vicente em formas preestabele- 
cidas apresenta uma série de dificuldades. Na edição de suas obras 
realizada por seu filho Luís Vicente, em1562, já depois de sua morte, 
sob o título de Copilaçam de todalas obras de Gil Vicente, a obra vicentina 
aparece dividida em cinco livros:
obras de devoção;::::
comédias;::::
tragicomédias;::::
farsas;::::
obras miúdas (diversas).::::
Porém, muitos estudiosos discordam de tal distribuição porque o próprio Gil Vicente se refere 
a alguns de seus trabalhos como moralidades, evocando assim gêneros dramáticos já em desuso no 
momento de publicação da Copilaçam e oriundos do teatro medieval. O teatro medieval apresentava 
uma grande diversidade de gêneros, tais como:
mistérios:::: – encenações da vida de Cristo, com muitos atores;
moralidades:::: – peças curtas com alegorias dos vícios, das virtudes e de outros atributos, ou com 
tipos morais;
milagres:::: – encenações de vidas de santos ou intervenções milagrosas da Virgem;
farsas:::: – cenas satíricas de caráter popular;
sotties:::: – espécie de farsa protagonizada por parvos3;
sermões burlescos:::: e monólogos – mais curtos que os anteriores, encenados por atores ou jo-
grais mascarados com vestes sacerdotais;
autos pastoris:::: – éclogas dramáticas ambientadas no campo;
tragicomédias :::: – fantasias alegóricas de comemoração áulica ou política;
comédias sentimentais cavaleirescas:::: – tratavam do amor aristocrático e tinham final feliz.
Em Portugal, há poucos registros da existência de mistérios, moralidades ou milagres antes de 
Gil Vicente. Em documentos da Igreja, há apontamentos sobre possíveis representações, de modo geral 
indicando alguns excessos e solicitando sua proibição. Todavia, não se especifica a exata natureza de tais 
encenações. Assim, é de se supor que o dramaturgo tenha buscado o modelo para tais gêneros entre 
3 Indivíduos tolos, bobos.
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A custódia de Belém.
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32 | O Humanismo
seus contemporâneos espanhóis, mais especificamente no dramaturgo 
castelhano Juan del Encina, de Salamanca. Segundo os historiadores 
António José Saraiva e Óscar Lopes, o Auto da Visitação, que introduziu 
Gil Vicente na corte, teve por modelo obras desse dramaturgo espanhol. 
Vale lembrar que nessa época a corte portuguesa empregava tanto o 
português quanto o castelhano, uma vez que durante o século XVI 
todas as rainhas de Portugal eram castelhanas, isto é, nascidas no 
reino de Castela, na Espanha. Aliás, o próprio Gil Vicente também 
escreveu obras em castelhano. Assim, não é de se estranhar que ele 
tenha optado por começar sua produção teatral tomando um autor 
castelhano como modelo.
No entanto, nos trabalhos posteriores, Gil Vicente incorporou diversos novos elementos, muitos 
já presentes na tradição portuguesa, como o sermão burlesco, as ladainhas, os despropósitos de parvos. 
Além disso, integrou elementos da realidade portuguesa, por ele atentamente observada. Do exterior, 
importou ainda a fantasia alegórica do também castelhano Torres Naharro e as moralidades e os 
mistérios franceses e ingleses (se é que já não estavam integrados às encenações portuguesas da época, 
das quais se têm poucos registros). Além disso, é muito provável que a obra vicentina tenha sofrido 
influência de narrativas da tradição oral. A partir de tal quadro de referências estéticas, dificilmente a 
obra de Gil Vicente poderia ser enquadrada em formas estanques.
Classificando as obras vicentinas 
Como já indicamos, uma das principais dificul-
dades para os estudiosos da obra de Gil Vicente está na 
classificação de seus autos em gêneros. Todavia, Óscar 
Lopes e António José Saraiva procuraram fazer tal classi-
ficação e, assim, identificaram cinco grandes grupos de 
peças, observando que ainda assim uma mesma peça 
poderia se encaixar em mais de uma categoria.
Autos pastoris – autos ambientados no cam-::::
po, com os mais diversos propósitos (Auto 
Pastoril Castelhano, 1509; Auto de Fé, 1510; 
Auto da Sibila Cassandra, 1513; Auto da 
Mofina Mendes, 1515; Auto Pastoril Português, 
1523; Templo de Apolo, 1526; Tragicomédia 
da Serra da Estrela, 1527).
Autos de moralidade – subdividido em autos ::::
que resumem a teologia da Redenção (Auto 
da Sibila Cassandra, 1513; Auto dos Quatro 
Tempos, 1513; Auto da Mofina Mendes ou 
Mistérios da Virgem, 1515; Breve Sumário da 
História de Deus, 1527) e autos que, de forma 
acentuadamente alegórica, oferecem um 
Capa original da peça Tragicomédia Alegórica do 
Paraíso e do Inferno.
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33|O Humanismo
ensinamento religioso ou moral (Auto da Barca do Inferno, 1517; Auto da Alma, 1518, Auto da 
Barca do Purgatório, 1518; Auto da Barca da Glória, 1519; Auto da Feira, 1526).
Farsas – episódios cômicos flagrados na vida de personagem típica, sendo que, por vezes, não ::::
há unidade de ação mas apenas episódios independentes (Auto da Índia, 1509; Velho da Horta, 
1512; Quem tem Farelos?, 1515; Farsa de Inês Pereira, 1523; O Juiz da Beira, 1525 ou 1526; Farsa 
do Almocreves, 1527; O Clérigo da Beira, 1529 ou 1530).
Autos cavaleirescos (:::: Comédia de Rubena, 1521; D. Duardos, 1522; Auto de Amadis de Gaula, 
1523; Comédia do Viúvo, 1524).
Autos alegóricos de temas profanos –:::: uma alegoria central serve de eixo ou de espaço para 
o desenvolvimento de episódios, cenas, bailados (Exortação da Guerra, 1514; Cortes de Júpiter, 
1521; Frágua de Amor, 1524; Templo de Apolo, 1526; Nau de Amores, 1527; Triunfo do Inverno, 
1529; Romagem de Agravos, 1533).
Mas os próprios historiadores sabem que estão fora de tal classificação algumas peças como 
o Auto da Visitação ou Monólogo do Vaqueiro (1502) ou o Sermão Perante a Rainha D. Leonor (1506), 
que seriam respectivamente um monólogo e um sermão. Também a Exortação da Guerra ou a 
Tragicomédia da Serra da Estrela poderiam ser classificadas simplesmente como tragicomédias, as-
sim como os Mistérios da Virgem ou o Breve Sumário da História de Deus, poderiam ser tomados ape-
nas como mistérios.
No fundo, à época do dramaturgo os gêneros eram muitos e não possuíam uma definição única 
e rigorosamente normatizada. Desse modo, contaminavam-se uns aos outros: um auto de moralidade 
difere razoavelmente de um sermão burlesco ou de um monólogo, mas nem sempre é fácil distinguí-lo 
de um auto pastoril, de um auto de milagre ou mesmo de uma farsa.
As força dos personagens vicentinos
Por muito tempo, a tradição crítica afirmou que Gil Vicente não construiu personagens com densi-
dade psicológica capazes de se individualizarem por suas características. Mas o que dizer de perso-
nagens como Inês Pereira, por exemplo, que tem vontade e evolução própria dentro da farsa, ou de 
Constança, a adúltera senhora do Auto da Índia, ou de Oriana, da Tragicomédia de Amadis de Gaula, cujo 
titubear em crer no amor de Amadis a leva a viver um dos mais belos “dramas psicológicos” do teatro 
cavaleiresco? Portanto, fica difícil falar em total falta de densidade psicológica. De qualquer modo, a 
tônica dominante na elaboração dos personagens vicentinos está em caracterizar tipos sociais, ou cons-
truir alegorias, quando não se apropria de figuras da história mítica ou religiosa.
O interessante é que, com tal procedimento, Gil Vicente acaba por delinear tipos sociais que ainda 
hoje têm muita vitalidade, com os quais podemos nos deparar a qualquer momento. De fato, há em 
seus personagens a universalização de certos traços de caráter do homem dito ocidental. Representam, 
assim, alguns comportamentos morais que se tornaram exemplares, no bom ou no mau sentido – 
geralmente no mau.
Os personagens vicentinos mais comuns são:
tipos sociais – o parvo (o bobo), o pastor, a moça da vila, a alcoviteira, o camponês, o escudeiro, ::::
o frade folião etc.;
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34 | O Humanismo
personificações alegóricas– Roma (representando a Igreja) estações do ano etc.;::::
personagens bíblicas e míticas – profetas, deuses greco-romanos etc.;::::
figuras teológicas – santo Agostinho, são Tomás de Aquino, são Gregório ou são Martinho.::::
Quando o dramaturgo português começou a escrever, os gêneros do teatro medieval já se encon-
travam um tanto mesclados, como vimos. Todavia, pelo que foi exposto, ao menos em linhas gerais, é 
possível saber o que é uma moralidade ou uma farsa a fim de que possamos analisar duas peças muito 
famosas: O Velho da Horta e o Auto da Barca do Inferno. A primeira (uma farsa) é um episódio cômico 
flagrado na vida de uma personagem típica. A segunda (uma moralidade) é um auto que, de forma 
alegórica, oferece um ensinamento religioso ou moral.
O Velho da Horta 
A farsa O Velho da Horta foi representada pela 
primeira vez em 1512. Trata da súbita paixão do Velho 
agricultor pela Moça que vem comprar verduras em sua 
horta. Observe-se que ninguém tem nome próprio: são 
tipos sociais. A já experiente Moça, ao perceber a paixão 
do Velho, passa a zombar dele, estimulando-o com frases 
ambíguas. Mesmo censurado pela Mulher, ele mantém 
sua paixão. Em meio a isso, aparece a Alcoviteira, que 
passa a fazer a suposta mediação entre o Velho e a jovem. 
No entanto, a Alcoviteira apenas deseja tomar aos poucos 
todos os bens do Velho. Ao final, ela acaba sendo presa 
e o Velho toma conhecimento de que a Moça se casara 
com um belo rapaz, de modo que termina a peça infeliz e arrependido de ter gastado com uma ilusão 
amorosa tudo o que acumulara para a família.
Aqui a crítica recai sobre a então incipiente classe burguesa, que ainda possuía um estreito vínculo 
com o campo. Note-se que toda a ação se passa na horta, com poucos personagens em cena, todos eles 
vestidos sem qualquer ostentação. Isso fazia com que a peça pudesse ser representada em qualquer 
lugar, sem grande aparato ou dificuldade.
É também fácil observar que há um claro distanciamento dos princípios dramáticos clássicos, 
que, em seu conjunto, postulam que uma peça se construa a partir de uma lógica interna: todos os 
personagens, todas as cenas, todas as ações têm de ser muito bem amarradas, fazendo com que nada 
fique solto ou sem explicação clara. Em O Velho da Horta a entrada e a saída de alguns personagens não 
são muito claras. O tempo em que transcorre toda a ação da peça – um dia – é muito pouco para que 
o Velho se apaixone, seja explorado pela Alcoviteira e ainda se arrependa de perder suas economias. 
Apenas o espaço respeita a unidade aristotélica. A peça caminha quadro a quadro, sem que a motivação 
de um para o outro seja devidamente amarrada. Quando os guardas chegam para prender a Alcoviteira, 
por exemplo, a situação é um tanto inverossímil, pois não ficamos sabendo quem denunciou sua explo-
ração sobre o Velho. Todavia, o efeito surpresa que isso acarreta é mais forte e mais cômico do que se 
fôssemos preparados para tanto.
O Velho da Horta, montada pelo Grupo Polí-
cromo Alecrim, na Mostra Rio-São Paulo de 
Teatro de Rua de Paraty em 2005.
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35|O Humanismo
Os princípios clássicos logo passariam a ser muito valorizados em Portugal, definindo assim 
uma nova estética renascentista. Mas é importante lembrar que, de modo efetivo, o renascentismo 
só chegaria a Portugal 14 anos depois da estreia de O Velho da Horta: como vimos, isso ocorreu em 
1526, quando o poeta Sá de Miranda retornou a Lisboa, depois de sua viagem de estudos à Itália, tra-
zendo na bagagem todo o ideário estético renascentista. De qualquer modo, Gil Vicente jamais ade-
riu plenamente a ele, embora seja considerado, como já referido, o principal autor dos primórdios do 
Renascimento em Portugal, pois o dramaturgo foi sempre fiel ao seu humanismo – este sim em sinto-
nia com o mundo mental renascentista, conforme discutiremos adiante – bem como às formas do te-
atro de tradição medieval.
Lembremos ainda, com relação às farsas, que algumas delas não trabalham só com quadros, mas 
se prendem a um enredo mais denso. É o caso, por exemplo, da famosa Farsa de Inês Pereira, peça muito 
conhecida. Ali há toda uma progressão da ação:
Inês deve se casar;::::
é apresentada, mas rejeita Pero Marques, por ser ele simples e pobre;::::
aceita se casar com um elegante escudeiro;::::
desilude-se com esse escudeiro e sofre muito;::::
fica viúva e acaba por se casar com Pero Marques.::::
Mas se a ação lembra a trama de uma comédia clássica, o tratamento dado ao tempo não traz 
aquela amarração exigida pela tradição greco-romana. No mesmo momento em que conhece o escu-
deiro, Inês se casa com ele. No momento seguinte, o marido parte para África. Logo em seguida, já se 
passaram três anos e chega a notícia de sua morte. Como se vê, tudo com uma amarração bastante frá-
gil, o que demonstra como o teatro vicentino não é nada homogêneo, explorando diversas variações 
dentro do repertório dos gêneros dramáticos medievais.
Vale ainda lembrar que, apesar de se tratar de uma farsa, em O Velho da Horta há momentos de 
algum lirismo. Mesmo sendo ridicularizado em sua paixão, algumas falas do Velho trazem consigo uma 
quase renascentista concepção do amor, que é tomado como um sentimento paradoxal, um mal maior 
do que a morte, mas que todos desejam em vida: “O maior risco da vida e o mais perigoso é amar, que 
morrer é acabar e amor não tem saída [...].” (VICENTE, 2008).
A crítica ao comportamento do Velho que está embutida na peça tem, naturalmente, uma base ca-
tólica, pois condena o amor de um homem maduro e casado por uma jovem solteira. Mas também há um 
alerta para nossa fragilidade emocional, revelando como estamos todos sujeitos a transgredir as regras em 
qualquer fase de nossas vidas, isto é, há um alerta de que a paixão humana é algo sempre vivo e imprevisí-
vel, precisa ser domado pela razão constantemente, até o último dos nossos dias. O Velho é ridicularizado 
em seu amor, mas, ainda que fadado ao fracasso, esse amor aparece como profundo e verdadeiro.
Auto da Barca do Inferno
O Auto da Barca do Inferno foi representado pela primeira vez provavelmente em 1517, na Semana 
Santa, no quarto da rainha D. Maria (ela se encontrava enferma de um mal que a mataria) tal como ocor-
rera com o Auto da Visitação, 15 anos antes.
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36 | O Humanismo
Embora muito provavelmente não tenha sido escrita para com-
por uma trilogia, o grande sucesso obtido por sua representação ins-
pirou o dramaturgo a redigir duas outras peças, o Auto da “Praia” do 
Purgatório e o Auto da Barca da Glória. Assim, os três autos contemplam 
os três lugares em que um cristão, após a morte, pode ter por morada: 
o inferno, o purgatório e o paraíso.
O Auto da Barca do Inferno se passa em uma praia. Dois barcos es-
peram os que acabaram de morrer para os levar ou para o paraíso ou 
para o inferno, havendo uma sucessão de cenas envolvendo aqueles 
que chegam e também o Diabo e o Anjo, que recebem a todos. A con-
denação e a salvação de cada um é decidida de acordo com sua vida 
terrena. Os que chegam são o Fidalgo, o Onzeneiro (agiota), o Parvo, o 
Sapateiro, o Frade, Florença (amante do frade), Brísida Vaz (alcoviteira), 
o Judeu, o Corregedor, o Enforcado (ladrão) e quatro Cavaleiros. Desse 
modo, a peça é um conjunto de cenas sobrepostas, ligadas pelas figu-
ras do Diabo e do Anjo.
No Auto da Barca do Inferno, Gil Vicente critica as três instâncias sociais do mundo medieval: no-
breza, clero e trabalhadores, salvando apenas o Parvo e os Cavaleiros, realmente dignos desse nome. Tal 
como na farsa O Velho da Horta, os personagens são em sua maioria tipos sociais. Todavia, quem prota-
goniza a cena são figuras alegóricas do bem e do mal (o Anjo e o Diabo). Assim, diferentemente do que 
encontramos em uma farsa, temos aqui o recurso da alegoria, com uma fundamentação

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