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PSICOLOGIA NOITE Amor-Fati E sua aplicação na Clínica Alunos: Débora Isidório Araújo da Silva: 201608019462 Francisco Robério Nunes: 201607220504 Professor: Thompson Hoger Pinheiro Silva FORTALEZA 2020 INTRODUÇÃO Como aplicar os conceitos da filosofia de Nietzsche na clínica gestáltica? Sabemos que os conceitos filosóficos de Nietzsche, em sua maior parte são totalmente interligados, por exemplo: Vontade De Potência leva ao Vir-A-Ser, este por sua vez leva o indivíduo à concepção do Eterno Retorno e do eterno retorno que emerge o Amor-Fati. O Amor Fati (do latim, amor ao destino) levaria o indivíduo a uma visão jubilosa da vida com suas nuances e variantes. Não se trata de acolher os fatos de uma maneira resignada e conformista, pois é essa atitude que o filósofo alemão acreditou ser um dos males da tradição judaico-cristã, a inércia e a aceitação passiva de tudo o que acontece ao redor, como se o indivíduo fosse um mero espectador de uma peça teatral. Eterno Retorno é uma espécie de mito introduzido na filosofia por Nietzsche que descrevera a "condição humana", sob uma forma astrológica, para designar a doutrina no movimento cíclico absoluto e infinitamente repetido de todas as coisas. Em Ecce Homo (1888), tem sua primeira intuição, quase mística, do eterno retorno: se o tempo não é linear, não faz sentido a distinção entre o "antes" e o "depois". Se tudo retorna eternamente, o futuro já é um passado; e o presente é tão passado quanto o futuro. O cliente que entra no consultório de um terapeuta humanista da abordagem Gestalt Terapia terá que fazer uma jornada de descobertas gloriosas a respeito de seu ser, sua existência e seus sofrimentos, incluindo o “por quê” de estar naquela situação. Claro que tudo isto sem ter um pingo de noção de filosofia nietzschiana, que é o mais incrível! Cabe ao psicólogo guiar estas descobertas por meios técnicas que não abordarei aqui. Neste trabalho tentarei falar um pouco sobre Amor-Fati, mas para entendê-lo e como chegar até a contemplação pratica deste conceito devemos fazer uma jornada pelos elos anteriores, já citados acima, que nos leva a tão gloriosa aceitação dos fatos de maneira recicladora. DESENVOLVIMENTO Na obra Assim Falava Zaratustra (1885), o filósofo alemão vai identificar vontade de potência com a própria vida: “somente onde há vida, há também vontade: mas não vontade de vida, e sim – assim vos ensino – vontade de potência.” Nesse instante que se caracteriza a vontade de potência como vontade orgânica; ela é própria não unicamente do homem, mas de todo o ser vivo. Neste sentido, a vida como vontade de potência se manifesta como um polo de forças, como uma arena de luta. O construir e destruir, esse movimento cósmico que se repete com periodicidade, surge da guerra dos opostos. Universal, a guerra está em toda a parte; sem trégua ou termo, ela é permanente.” Se podemos falar em uma ordem nessa guerra dos opostos, essa ordem seria o embate ininterrupto entre o construir e o destruir, o criar e o findar. O produto dessa construção e desconstrução, constantes e contínuas, é o vir- a-ser. Não há mais espaço para o ser como algo estático, imutável e suprassensível. Em um segundo momento, Nietzsche vai considerar a vontade como afetividade: “É preciso reconhecer um sentir e mesmo todas as espécies do sentir como ingredientes da vontade e, do mesmo modo, em segundo lugar, também o pensamento, pois em cada ato de vontade há um pensamento que manda – e não se deve crer que se possa separar este pensamento do ‘querer’, como se depois restasse vontade! Em terceiro lugar, a vontade não é apenas um complexo de sentir e pensar, acima de tudo, um afeto; e este, afeto de mando.” (Além do Bem e do Mal § 19) Para entender este conceito de Nietzsche, é preciso compreender o Eterno Retorno e suas implicações. É na obra Gaia Ciência que há o primeiro registro da concepção do Eterno Retorno: “E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: “Esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há indivisamente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e sequência – e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez – e tu com ela, poeirinha da poeira!” Não te lançarias ao chão e rangerias os dentes e amaldiçoarias o demônio que te falasses assim? Ou viveste alguma vez um instante descomunal, em que lhe responderas: “Tu és um deus e nunca ouvi nada mais divino!” Se esse pensamento adquirisse poder sobre ti, assim como tu és, ele te transformaria e talvez te triturasse: a pergunta diante de tudo e de cada coisa: “Quero isto ainda uma vez e inúmeras vezes?” Pesaria como o mais pesado dos pesos sobre o teu agir! Ou, então, como terias de ficar de bem contigo e mesmo com a vida, para não desejar nada mais do que essa última, eterna confirmação e chancela?” (A Gaia Ciência, § 341) Inicialmente no trecho de Gaia Ciência, Nietzsche começa sutilmente com um ‘se’. Isso faz a diferença em sua explanação, pois ele não quer impor uma ideia, mas pretende seduzir o leitor através de uma proposta. É através de seu discernimento propositivo que inicia a concepção do eterno retorno. Para tal trabalho, os elementos muito conhecidos da cultura judaico-cristã: deus, demônio e a busca incessante de sentido, são válidos. Logo, o eterno retorno tem relação direta com as questões de cunho existenciais, bem como a experiência humana em sua plenitude. Para Nietzsche, o mundo é idealizado como um centro de forças, forças que constroem e forças que destroem, fazendo que haja inúmeras combinações de séries que se repetem diversas vezes. O pensamento seletivo do Eterno Retorno filtra essas forças, separa-as entre ativas e reativas. O amor fati é o resultado da seleção das forças ativas. “Amor fati: seja este, doravante, o meu amor! Não quero fazer guerra ao que é feio. Não quero acusar, não quero nem mesmo acusar os acusadores. Que a minha única negação seja desviar o olhar! E, tudo somado e em suma: quero ser, algum dia, apenas alguém que diz sim.” (A Gaia Ciência, § 276) O filósofo Nietzsche (1888) afirma que: “Minha fórmula para a grandeza no homem é amor fati: nada querer diferente, seja para trás, seja para frente, seja em toda a eternidade. Não apenas suportar o necessário, menos ainda ocultá-lo (...), mas amá-lo...”. Nietzsche ensina que um sim justifica toda a existência, trazendo novos sentidos para este mundo e navegando através do niilismo, abandonando qualquer transcendência. A princípio, ele não define o que é amor fati, somente explica o que é o seu amor. Todavia, dá a entender, que a definição de amor fati, passa inicialmente pela desconstrução da cultura e da moral ocidental. Nietzsche questiona as dialéticas verdade – beleza, falso – feiura, construções valorativas concebidas pela tradição judaico-cristã. Coloca em questão a identificação de que tudo o que é verdadeiro é belo, e que tudo o que é belo é verdadeiro, como também critica a concepção de que tudo o que é falso seja feio, ruim, e que tudo o que é feio seja falso. O amor fati está intrinsecamente relacionado com aquilo que Nietzsche diz ser grande no homem - sua capacidade de mergulhar sem reserva alguma nas nuances da vida. Amor fati implica em aceitar o que nos foi dado e tirado. Todos os acontecimentos se inserem numa ordem causal da natureza, assim como cada um de nós, dessa forma, poderia ter acontecido de outra forma, nada poderia ter sido diferente, de nada adianta nos lamentarmos.CONCLUSÃO Nesta altura do processo o cliente será levado (ou se levará) a afirmar até mesmo o erro, afinal de contas, ele não é um erro, ele era absolutamente necessário naquele momento e só pode ser interpretado como um erro se tomarmos formas superiores e transcendentes para nos guiar. Seria aceitar os acontecimentos que origina sobre todos nós de maneira realista, sem negar aquilo que possa vir de negativo, aceitando-o com todas as suas dificuldades e possibilidades, bem como aceitar, óbvio, os momentos positivos. Não haveria espaço para pensar no passado, nem no futuro, somente no presente, naquilo que está sendo. É amando o destino como ele mesmo se apresenta, aceitando a realidade que se impõe sobre o indivíduo, não como uma simples conformação ou resignação diante daquilo que se manifesta, mas é uma perspectiva positiva, abraçar com todas as forças os momentos positivos e negativos que sempre retornam pela lógica do eterno retorno. Porém, sabe-se que a vivência plena e a interiorização do amor fati é complicada, devido estarmos flutuantes no niilismo passivo, assim encontrando extrema dificuldade em aceitar a realidade como ela é. O caminho para o amor fati é a completa incorporação do pensamento do Eterno Retorno. Se, por um lado, o eterno retorno seria uma radical forma de niilismo, por outro lado, o amor fati, é a superação do niilismo. Alguns podem não perceber, mas todo este processo nos traz a uma purificação da alma, ou pelo menos uma parte dos problemas são amenizados pela contemplação do todo; o cliente por sua vez passa a entender melhor sua existência e o a terapia tem seu auge, pelo menos até que outra queixa emerja no consciente de indivíduo. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA NIETZSCHE, F.W.. A Gaia Ciência, 1ª ed., Companhia Das Letras, São Paulo, 2001; FERRARA, R.C.. Uma fisionomia do amor fati de Nietzsche, São Paulo, v. 1, p. 185-208, jan./jun. 2017; NIETZSCHE, F.W.. Além do Bem e do Mal, 1ª ed., Edição de bolso, São Paulo, 2005; NIETZSCHE, F.W.. Ecce Homo, 1ª ed., L&PM, p. 42, Covilhã, 2008.
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