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Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–1 MANUAL DO PARTICIPANTE Ética e Cidadania – CBFPM 2020 3 UD III – Relação do policial militar com a sociedade Notas Objetivos Ao finalizar esta unidade, o participante deverá ser capaz de: 1. Conhecer os conceitos de ética, moral e cidadania; 2. Identificar nos dispositivos formais codificados as disposições referentes à ética e moral; 3. Compreender as diversas aplicações da ética nas relações sociais; 4. Compreender o papel social da atividade policial diante da formação da cidadania; 5. Conhecer a deontologia policial-militar como discussão contemporânea. CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–2 1. Cidadania Afinal, o que é Cidadania? Nunca se falou tanto sobre cidadania, em nossa sociedade, com nos últimos anos. Mas afinal, o que é cidadania? Segundo o Dicionário Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, "cidadania é a qualidade ou estado do cidadão", entende-se por cidadão "o indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um estado, ou no desempenho de seus deveres para com este". No sentido etimológico da palavra, cidadão deriva da palavra civita, que em latim significa cidade, e que tem seu correlato grego na palavra politikos - aquele que habita na cidade. No sentido ateniense do termo, cidadania é o direito da pessoa em participar das decisões nos destinos da Cidade através da Ekklesia (reunião dos chamados de dentro para fora) na Ágora (praça pública, onde se agonizava para deliberar sobre decisões de comum acordo). Dentro desta concepção surge a democracia grega, onde somente 10% da população determinava os destinos de toda a Cidade (eram excluídos os escravos, mulheres e artesãos). A mídia confunde muito entre o Direito do Cidadão e o Direito da Consumidor, por isso questiono o aspecto ideológico desta confusão intencional. Vejamos neste quadro sintético uma percepção pessoal sobre como se processa a "evolução" do Ser Humano até o Ser Cidadão. (Vanderlei de Barros Rosas) CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–3 O ser humano O ser indivíduo O ser pessoa O ser cidadão A dimensão do A dimensão do A dimensão de A dimensão de mercado de trabalho encontrar-se no intervir na convívio social. e consumo. mundo. realidade. O homem torna-se O ser humano O indivíduo torna- A pessoa torna-se torna-se indivíduo se pessoa quanto cidadão quando ser humano nas quando descobre toma consciência de intervém na relações de convívio seu papel e função si mesmo, do outro realidade em que social. social. e do mundo. vive. Quem estuda o Quem estuda o Quem estuda o Quem estuda o comportamento do comportamento do comportamento da comportamento do ser humano? Seria a indivíduo? Seria a pessoa? Seria a cidadão? Seria a Antropologia, a Filosofia, a Filosofia, a Sociologia, a História, ou a Sociologia ou a Sociologia ou a Filosofia ou as Sociologia? Psicologia? Psicologia? Ciências Políticas? Quem garante os Quem garante os Quem garante os Quem garante os direitos do ser direitos do direitos da pessoa? direitos do cidadão? humano? A consumidor? A própria pessoa A Constituição e Declaração O Código do (amor próprio ou suas leis Universal dos Consumidor. auto-estima). regulamentares. Direitos Humanos. Como podemos Existe realmente Que diferença existe intervir na CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–4 uma natureza entre o direito do O que significa realidade, humana? consumidor e o tornar-se pessoa no modificando as Teologicamente, direito do cidadão? nível psicológico e estruturas corruptas afirmamos que Ao consumidor social? A pessoa é o e injustas? Quando existe a uma deve ser dado o indivíduo que toma os direitos do natureza humana. direito de consciência de si cidadão lhe são Seguindo a corrente propriedade mesmo ("Tornar-se oferecidos, e o existencialista (J.P. enquanto ao cidadão Pessoa" de Karl mesmo passa a Sartre) negamos tal deve ser dado o Roger) exercê-lo, há natureza. direito de acesso modificação de comportamento. Papel Social do policial militar Para BARROS, Segurança pública é direito fundamental de cada cidadão e este direito concretiza-se pela figura do policial, que é o responsável por fazer valer a aplicação da lei, garantir a ordem pública e a prevenção de crimes, com a finalidade de proteger a sociedade de um modo geral. O que parece ser de difícil compreensão para certos policiais é que proteger não é desrespeitar, ameaçar ou até mesmo agredir (física, mental ou moralmente) o cidadão, seja ele o de bem, que cumpre com suas obrigações na lei, ou mesmo o cidadão que contraria a lei, ou seja, o que comete crimes, pois este último tipo, também possui direitos como qualquer outro ser humano, não devendo ser tratado a base de tapas, murros ou chutes, pela autoridade que o aborda. Deveras, o equilíbrio das ações do policial na tentativa de manter sua função na segurança pública é de imprescindível relevância e configura um assunto que deve ser tratado com extrema delicadeza. Pois o seu modo errado de agir pode prejudicar não só o cidadão, mas também o próprio policial. O policial deve atentar-se para o não cometimento do “abuso de autoridade”, pois esta atitude também configura crime e a pessoa incumbida de prevenir crimes não deve justamente deixar que ocorra o contrário consigo mesma, ainda mais que o resultado, mesmo que individual, dessa ação acaba por refletir como um todo na sociedade. Cria um sentimento de revolta e indignação, somado a descrença popular com a autoridade, que passa a ser temida e descriminada tanto quanto o verdadeiro criminoso. CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–5 É importante para o policial ter um preparo emocional e inclusive fazer o possível para a manutenção constante deste preparo, sabendo distinguir seus problemas pessoais com os problemas enfrentados no decorrer de sua carreira. Tão importante quanto o preparo emocional é o preparo técnico, jurídico-legal, sobretudo, ou seja, o policial deve estar ciente do modo correto de atuar mediante a legislação e principalmente lembrar que o cidadão não tem apenas obrigações e que o policial não está ali apenas para fazer garantir que estas obrigações sejam cumpridas. Deve lembrar também que o cidadão possui direitos e que a lei os assegura, conseqüentemente cabe a autoridade assegurá-los também. Policiar significa civilizar, sendo o policial agente da civilização, da virtude social, devendo agir em prol do cidadão e não contra ele. Aquele que pensa de outro modo está fadado à ignorância, a prepotência e a falta de respeito ao gênero humano, pois o policial que apela para a violência sem necessidade é justamente aquele em que menos se encontra indícios de profissionalismo ou uma formação ética solidificada. Este tipo compromete cada pessoa que o rodeia bem como toda a corporação a que representa. Vale lembrar aos policias, que estes também são cidadãos e que com toda certeza não gostariam, embora não se trate de uma questão apenas de gosto, mas sim de legalidade, de serem tratados sem o respeito devido ao ser humano, se estivessem no lugar da população. Papel do policial militar nas suas relações interpessoais, subjetivismo e o policial como garantidor (cuidador) da cidadania Estes três tópicos referentesà ética policial serão abordados com base no texto de Ricardo Balestreri, ex-Secretário Nacional de Segurança Pública. Leia e reflita sobre as informações contidas em cada parte do texto abaixo. Treze reflexões sobre polícia e direitos humanos Durante muitos anos, o tema Direitos Humanos foi considerado antagônico ao de segurança pública. Produto do autoritarismo vigente no país, entre 1964 e 1984, e da sociedade e polícia, como se a última não fizesse parte da primeira. Polícia, então, foi uma atividade caracterizada pelos segmentos progressistas da sociedade, de forma equivocadamente conceitual, como necessariamente afeta à repressão antidemocrática, à truculência, ao CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–6 conservadorismo. Direitos Humanos como militância, na outra ponta, passaram a ser vistos como ideologicamente filiados à esquerda, durante toda a vigência da Guerra Fria (estranhamente, nos países do socialismo real, eram vistos como uma arma retórica e organizacional do capitalismo). No Brasil, em momento posterior da história, a partir da rearticulação democrática, agregou-se a seus ativistas a pecha de defensores de bandidos e da impunidade. Evidentemente, ambas visões estão fortemente equivocadas e prejudicadas pelo preconceito. Estamos há mais de uma década construindo uma nova democracia e essa paralisia de paradigmas das partes (uma vez que assim ainda são vistas e assim se consideram) representa um forte impedimento à parceria para a edificação de uma sociedade mais civilizada. Aproximar a polícia das ONGs que atuam com Direitos Humanos e vice-versa é tarefa impostergável para que possamos viver, a médio prazo, em uma nação que respire cultura de cidadania. Para que isso ocorra, é necessário que nós, lideranças do campo dos Direitos Humanos, desarmemos as minas ideológicas das quais nos cercamos, em um primeiro momento, justificável, para nos defendermos da polícia, e que agora nos impedem de aproximar-nos. O mesmo vale para a polícia. Podemos aprender muito uns com os outros, ao atuarmos como agentes defensores da mesma democracia. Nesse contexto, a partir de quase uma década de parceria no campo da educação para os Direitos Humanos junto a policiais e das coisas que vi e aprendi com a polícia, é que gostaria de tecer as singelas treze considerações a seguir: Cidadania, dimensão primeira 1ª - O policial é, antes de tudo um cidadão, e na cidadania deve nutrir sua razão de ser. Irmana-se, assim, a todos os membros da comunidade em direitos e deveres. Sua condição de cidadania é, portanto, condição primeira, tornando-se bizarra qualquer reflexão fundada sobre suposta dualidade ou antagonismo entre uma sociedade civil e outra CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–7 sociedade policial. Essa afirmação é plenamente válida mesmo quando se trata da polícia militar, que é um serviço público realizado na perspectiva de uma sociedade única, da qual todos os segmentos estatais são derivados. Portanto não há, igualmente, uma sociedade civil e outra sociedade militar. A lógica da Guerra Fria, aliada aos anos de chumbo, no Brasil, é que se encarregou de solidificar esses equívocos, tentando transformar a polícia, de um serviço à cidadania, em ferramenta para enfrentamento do inimigo interno. Mesmo após o encerramento desses anos de paranoia, sequelas ideológicas persistem indevidamente, obstaculizando, em algumas áreas, a elucidação da real função policial. Policial: cidadão qualificado 2ª - O agente de segurança pública é, contudo, um cidadão qualificado emblematiza o Estado, em seu contato mais imediato com a população. Sendo a autoridade mais comumente encontrada tem, portanto, a missão de ser uma espécie de porta voz popular do conjunto de autoridades das diversas áreas do poder. Além disso, porta a singular permissão para o uso da força e das armas, no âmbito da lei, o que lhe confere natural e destacada autoridade para a construção social ou para sua devastação. O impacto sobre a vida de indivíduos e comunidades, exercido por esse cidadão qualificado é, pois, sempre um impacto extremado e simbolicamente referencial para o bem ou para o mal-estar da sociedade. Policial: pedagogo da cidadania 3ª - Há, assim, uma dimensão pedagógica no agir policial que, como em outras profissões de suporte público, antecede as próprias especificidades de sua especialidade. Os paradigmas contemporâneos na área da educação nos obrigam a repensar o agente educacional de forma mais includente. No passado, esse papel estava reservado unicamente aos pais, professores e especialistas em educação. Hoje, é preciso incluir com primazia no rol pedagógico também CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–8 outras profissões irrecusavelmente formadoras de opinião: médicos, advogados, jornalistas e policiais, por exemplo. O policial, assim, à luz desses paradigmas educacionais mais abrangentes, é um pleno e legítimo educador. Essa dimensão é inabdicável e reveste de profunda nobreza a função policial, quando conscientemente explicitada através de comportamentos e atitudes. A importância da autoestima pessoal e institucional 4ª - O reconhecimento dessa dimensão pedagógica é, seguramente, o caminho mais rápido e eficaz para a reconquista da abalada autoestima policial. Note-se que os vínculos de respeito e solidariedade só podem constituir-se sobre uma boa base de autoestima. A experiência primária do querer-se bem é fundamental para possibilitar o conhecimento de como chegar a querer bem o outro. Não podemos viver para fora o que não vivemos para dentro. Em nível pessoal, é fundamental que o cidadão policial se sinta motivado e orgulhoso de sua profissão. Isso só é alcançável a partir de um patamar de sentido existencial. Se a função policial for esvaziada desse sentido, transformando o homem e a mulher que a exercem em meros cumpridores de ordens sem um significado pessoalmente assumido como ideário, o resultado será uma autoimagem denegrida e uma baixa autoestima. Resgatar, pois, o pedagogo que há em cada policial é permitir a ressignificação da importância social da polícia, com a consequente consciência da nobreza e da dignidade dessa missão. A elevação dos padrões de autoestima pode ser o caminho mais seguro para uma boa prestação de serviços. Só respeita o outro aquele que se dá respeito a si mesmo. CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–9 Polícia e superego social 5ª - Essa dimensão pedagógica, evidentemente não se confunde com dimensão demagógica e, portanto, não exime a polícia de sua função técnica de intervir preventivamente no cotidiano e repressivamente em momentos de crise, uma vez que democracia nenhuma se sustenta sem a contenção do crime, sempre fundado sobre uma moralidade mal constituída e hedonista, resultante de uma complexidade causal que vai do social ao psicológico. Assim como nas famílias é preciso, em ocasiões extremas, que o adulto sustente, sem vacilar, limites que possam balizar moralmente a conduta de crianças e jovens, também em nível macro é necessário que alguma instituição se encarregue da contenção da sociopatia. A polícia é, portanto, uma espécie de superego social indispensável em culturas urbanas, complexas e de interesses conflitantes, contendora do óbvio caos a que estaríamos expostos na absurda hipótese de sua inexistência. Possivelmente por isso não se conheça nenhuma sociedadecontemporânea que não tenha assentamento, entre outros, no poder da polícia. Zelar, pois, diligentemente, pela segurança pública, pelo direito do cidadão de ir e vir, de não ser molestado, de não ser saqueado, de ter respeitada sua integridade física e moral, é dever da polícia, um compromisso com o rol mais básico dos direitos humanos que devem ser garantidos à imensa maioria de cidadãos honestos e trabalhadores. Para isso é que a polícia recebe desses mesmos cidadãos a unção para o uso da força, quando necessário. Rigor versus violência 6ª - O uso legítimo da força não se confunde, contudo, com truculência. A fronteira entre a força e a violência é delimitada, no campo formal, pela lei, no campo racional pela necessidade técnica e, no campo moral, pelo antagonismo que deve reger a metodologia de policiais e criminosos. CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–10 Policial versus criminoso: metodologias antagônicas 7ª - Dessa forma, mesmo ao reprimir, o policial oferece uma visualização pedagógica, ao antagonizar-se aos procedimentos do crime. Em termos de inconsciente coletivo, o policial exerce função educativa arquetípica: deve ser o mocinho, com procedimentos e atitudes coerentes com a firmeza moralmente reta, oposta radicalmente aos desvios perversos do outro arquétipo que se lhe contrapõe: o bandido. Ao olhar para uns e outros, é preciso que a sociedade perceba claramente as diferenças metodológicas ou a confusão arquetípica intensificará sua crise de moralidade, incrementando a ciranda da violência. Isso significa que a violência policial é geradora de mais violência da qual, mui comumente, o próprio policial torna-se a vítima. Ao policial, portanto, não cabe ser cruel com os cruéis, vingativo contra os antissociais, hediondo com os hediondos. Apenas estaria com isso, liberando, licenciando a sociedade para fazer o mesmo, a partir de seu patamar de visibilidade moral. Não se ensina a respeitar desrespeitando, não se pode educar para preservar a vida matando, não importa quem seja. O policial jamais pode esquecer que também o observa o inconsciente coletivo. A visibilidade moral da polícia: importância do exemplo 8ª - Essa dimensão testemunhal, exemplar, pedagógica, que o policial carrega irrecusavelmente é, possivelmente, mais marcante na vida da população do que a própria intervenção do educador por ofício, o professor. Esse fenômeno ocorre devido à gravidade do momento em que normalmente o policial encontra o cidadão. À polícia recorre-se, como regra, em horas de fragilidade emocional, que deixam os indivíduos ou a comunidade fortemente abertos ao impacto psicológico e moral da ação realizada. CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–11 Por essa razão é que uma intervenção incorreta funda marcas traumáticas, por anos ou até pela vida inteira, assim como a ação do “bom policial” será sempre lembrada com satisfação e conforto. Curiosamente, um significativo número de policiais não consegue perceber com clareza a enorme importância que têm para a sociedade, talvez por não haverem refletido suficientemente a respeito dessa peculiaridade do impacto emocional do seu agir sobre a clientela. Justamente aí reside a maior força pedagógica da polícia, a grande chave para a redescoberta de seu valor e o resgate de sua autoestima. É essa mesma visibilidade moral da polícia o mais forte argumento para convencê-la de sua responsabilidade paternal (ainda que não paternalista) sobre a comunidade. Zelar pela ordem pública é, assim, acima de tudo, dar exemplo de conduta fortemente baseada em princípios. Não há exceção quando tratamos de princípios, mesmo quando está em questão a prisão, guarda e condução de malfeitores. Se o policial é capaz de transigir nos seus princípios de civilidade, quando no contato com os sociopatas, abona a violência, contamina-se com o que nega, conspurca a normalidade, confunde o imaginário popular e rebaixa-se à igualdade de procedimentos com aqueles que combate. Note-se que a perspectiva, aqui, não é refletir do ponto de vista da defesa do bandido, mas da defesa da dignidade do policial. A violência desequilibra e desumaniza o sujeito, não importa com que fins seja cometida e não se restringe a áreas isoladas, mas, fatalmente, acaba por dominar-lhe toda a conduta. O violento se dá uma perigosa permissão de exercício de pulsões negativas, que vazam gravemente sua censura moral e que, inevitavelmente, vão alastrando-se em todas as direções de sua vida, de maneira incontrolável. CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–12 Ética corporativa versus ética cidadã 9ª - Essa consciência da autoimportância obriga o policial a abdicar de qualquer lógica corporativista. Ter identidade com a polícia, amar a corporação da qual participa, coisas essas desejáveis, não se podem confundir, em momento algum, com acobertar práticas abomináveis. Ao contrário, a verdadeira identidade policial exige do sujeito um permanente zelo pela limpeza da instituição da qual participa. Um verdadeiro policial, ciente de seu valor social, será o primeiro interessado no expurgo dos maus profissionais, dos corruptos, dos torturadores, dos psicopatas. Sabe que o lugar deles não é polícia, pois, além do dano social que causam, prejudicam o equilíbrio psicológico de todo o conjunto da corporação e inundam os meios de comunicação social com um marketing que denigre o esforço heroico de todos aqueles outros que cumprem corretamente sua espinhosa missão. Por esse motivo, não está disposto a conceder-lhes qualquer tipo de espaço. Aqui, se antagoniza a ética da corporação (que na verdade é a negação de qualquer possibilidade ética) com a ética da cidadania (aquela voltada à missão da polícia junto a seu cliente, o cidadão). O acobertamento de práticas espúrias demonstra, ao contrário do que muitas vezes parece, o mais absoluto desprezo pelas instituições policiais. Quem acoberta o espúrio permite que ele enxovalhe a imagem do conjunto da instituição e mostra, dessa forma, não ter qualquer respeito pelo ambiente do qual faz parte. Critérios de seleção, permanência e acompanhamento 10ª - Essa preocupação deve crescer à medida em que tenhamos clara a preferência da psicopatia pelas profissões de poder. Política profissional, Forças Armadas, Comunicação Social, Direito, Medicina, Magistério e CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–13 Polícia são algumas das profissões de encantada predileção para os psicopatas, sempre em busca do exercício livre e sem culpas de seu poder sobre outrem. Profissões magníficas, de grande amplitude social, que agregam heróis e mesmo santos, são as mesmas que atraem a escória, pelo alcance que têm, pelo poder que representam. A permissão para o uso da força, das armas, do direito a decidir sobre a vida e a morte, exercem irresistível atração à perversidade, ao delírio onipotente, à loucura articulada. Os processos de seleção de policiais devem tornar-se cada vez mais rígidos no bloqueio à entrada desse tipo de gente. Igualmente, é nefasta a falta de um maior acompanhamento psicológico aos policiais já na ativa. A polícia é chamada a cuidar dos piores dramas da população e nisso reside um componente desequilibrador. Quem cuida da polícia? Os governos, de maneira geral, estruturam pobremente os serviços de atendimento psicológico aos policiais e aproveitam muito mal os policiais diplomados nasáreas de saúde mental. Evidentemente, se os critérios de seleção e permanência devem tornar-se cada vez mais exigentes, espera-se que o Estado cuide também de retribuir com salários cada vez mais dignos. De qualquer forma, o zelo pelo respeito e a decência dos quadros policiais não cabe apenas ao Estado, mas aos próprios policiais, os maiores interessados em participarem de instituições livres de vícios, valorizadas socialmente e detentoras de credibilidade histórica. Direitos humanos dos policiais —humilhação versus hierarquia 11ª - O equilíbrio psicológico, tão indispensável na ação da polícia, passa também pela saúde emocional da própria instituição. Mesmo que isso não se justifique, sabemos que policiais maltratados internamente tendem a descontar sua agressividade sobre o cidadão. CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–14 Evidentemente, polícia não funciona sem hierarquia. Há, contudo, clara distinção entre hierarquia e humilhação, entre ordem e perversidade. Em muitas academias de polícia (é claro que não em todas) os policiais parecem ainda ser adestrados para alguma suposta guerra de guerrilhas, sendo submetidos a toda ordem de maus-tratos (beber sangue no pescoço da galinha, ficar em pé sobre formigueiro, ser afogado na lama por superior hierárquico, comer fezes, são só alguns dos recentes exemplos que tenho colecionado a partir da narrativa de amigos policiais, em diversas partes do Brasil). Por uma contaminação da ideologia militar (diga-se de passagem, presente não apenas nas PMs mas também em muitas polícias civis), os futuros policiais são, muitas vezes, submetidos a violento estresse psicológico, a fim de atiçar a raiva contra o inimigo (será, nesse caso, o cidadão?). Essa permissividade na violação interna dos Direitos Humanos dos policiais pode dar guarida à ação de personalidades sádicas e depravadas, que usam sua autoridade superior como cobertura para o exercício de suas doenças. Além disso, como os policiais não vão lutar na extinta guerra do Vietnã, mas atuar nas ruas das cidades, esse tipo de “formação” (deformadora) representa uma perda de tempo, geradora apenas de brutalidade, atraso técnico e incompetência. A verdadeira hierarquia só pode ser exercida com base na lei e na lógica, longe, portanto, do personalismo e do autoritarismo doentios. O respeito aos superiores não pode ser imposto na base da humilhação e do medo. Não pode haver respeito unilateral, como não pode haver respeito sem admiração. Não podemos respeitar aqueles a quem odiamos. A hierarquia é fundamental para o bom funcionamento da polícia, mas ela só pode ser verdadeiramente alcançada através do exercício da CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–15 liderança dos superiores, o que pressupõe práticas bilaterais de respeito, competência e seguimento de regras lógicas e suprapessoais. Direitos humanos dos policiais — humilhação versus hierarquia 12ª - No extremo oposto, a debilidade hierárquica é também um mal. Pode passar uma imagem de descaso e desordem no serviço público, além de enredar na malha confusa da burocracia toda a prática policial. A falta de uma lei orgânica nacional para a polícia civil, por exemplo, pode propiciar um desvio fragmentador dessa instituição, amparando uma tendência de definição de conduta, em alguns casos, pela mera junção, em colcha de retalhos, do conjunto das práticas de suas delegacias. Enquanto um melhor direcionamento não ocorre em plano nacional, é fundamental que os estados e instituições da polícia civil direcionem estrategicamente o processo de maneira a unificar sob regras claras a conduta do conjunto de seus agentes, transcendendo a mera predisposição dos delegados localmente responsáveis (e superando, assim, a ordem fragmentada, baseada na personificação). Além do conjunto da sociedade, a própria polícia civil será altamente beneficiada, uma vez que regras objetivas para todos (incluídas aí as condutas internas) só podem dar maior segurança e credibilidade aos que precisam executar tão importante e ao mesmo tempo tão intrincado e difícil trabalho. A formação dos policiais 13ª - A superação desses desvios poderia dar-se, ao menos em parte, pelo estabelecimento de um núcleo comum, de conteúdos e metodologias na formação de ambas as polícias, que privilegiasse a formação do juízo moral, as ciências humanísticas e a tecnologia como contraponto de eficácia à incompetência da força bruta. CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–16 Aqui, deve-se ressaltar a importância das academias de polícia civil, das escolas formativas de oficiais e soldados e dos institutos superiores de ensino e pesquisa, como bases para a construção da Polícia Cidadã, seja através de suas intervenções junto aos policiais ingressantes, seja na qualificação daqueles que se encontram há mais tempo na ativa. Um bom currículo e professores habilitados não apenas nos conhecimentos técnicos, mas igualmente nas artes didáticas e no relacionamento interpessoal, são fundamentais para a geração de policiais que atuem com base na lei e na ordem hierárquica, mas também na autonomia moral e intelectual. Do policial contemporâneo, mesmo o de mais simples escalão, se exigirá, cada vez mais, discernimento de valores éticos e condução rápida de processos de raciocínio na tomada de decisões. Conclusão A polícia, como instituição de serviço à cidadania em uma de suas demandas mais básicas - segurança pública - tem tudo para ser altamente respeitada e valorizada. Para tanto, precisa resgatar a consciência da importância de seu papel social e, por conseguinte, a autoestima. Esse caminho passa pela superação das sequelas deixadas pelo período ditatorial: velhos ranços psicopáticos, às vezes ainda abancados no poder, contaminação anacrônica pela ideologia militar da Guerra Fria, crença de que a competência se alcança pela truculência e não pela técnica, maus-tratos internos a policiais de escalões inferiores, corporativismo no acobertamento de práticas incompatíveis com a nobreza da missão policial. O processo de modernização democrática já está instaurado e conta com a parceria de organizações como a Anistia Internacional (que, dentro e fora do Brasil, aliás, mantém um notável quadro de policiais a ela filiados). Dessa forma, o velho paradigma antagonista da segurança pública e dos Direitos Humanos precisa ser substituído por um novo, que exige CBFPM 2020 – Relação do policial militar com a sociedade NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 17–17 desacomodação de ambos os campos: Segurança Pública com Direitos Humanos. O policial, pela natural autoridade moral que porta, tem o potencial de ser o mais marcante promotor dos Direitos Humanos, revertendo o quadro de descrédito social e qualificando-se como um personagem central da democracia. As organizações não governamentais que ainda não descobriram a força e a importância do policial como agente de transformação, devem abrir-se, urgentemente, a isso, sob pena de, aferradas a velhos paradigmas, perderem o concurso da ação impactante desse ator social. Direitos Humanos, cada vez mais, também é coisa de polícia! Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–1 MANUAL DO PARTICIPANTE Ética e Cidadania – CBFPM 2020 4 UD IV – Ética profissional Notas Objetivos Ao finalizar esta unidade, o participante deverá ser capaz de:1. Conhecer os conceitos de ética, moral e cidadania; 2. Identificar nos dispositivos formais codificados as disposições referentes à ética e moral; 3. Compreender as diversas aplicações da ética nas relações sociais; 4. Compreender o papel social da atividade policial diante da formação da cidadania; 5. Conhecer a deontologia policial-militar como discussão contemporânea. Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–2 1. Ética profissional A ética profissional é um ramo da ética prática, a qual, de forma geral envolve todas as profissões, algumas havendo códigos de ética ou deontológicos específicos, como no caso da Psicologia e da Medicina, por exemplo. A Brigada Militar, como se nota no capítulo anterior, não possui um código específico para o comportamento ético. Existem regras na legislação constitucional, além de um regulamento disciplinar, que trazem preceitos éticos, mas não há um estatuto ético específico. Quanto à ética profissional cabe citar o conceito, dentro de um estudo jurídico, segundo Bittar (2002): Por sua vez, a ética profissional se destaca de dentro da ética aplicada como um ramo específico relacionado aos mandamentos basilares das relações laborais. É como especialização de conhecimentos aplicados que a ética profissional se vincula às ideias de utilidade, prestatividade, lucratividade, categoria laboral, engajamento em modos de produção ou prestação de serviços, exercício de atividades regularmente desenvolvidas de acordo com finalidades sociais. (BITTAR, 2002, p. 363) O mesmo autor prossegue analisando o objetivo da ética profissional, principalmente no concernente a diferença que existe entre regramentos legais, imposições de leis e preceitos éticos: Isso porque, na atualidade, a ética tem-se reduzido e simplificado de modo extremado a uma tecnologia ética. Talvez, na esperança de imediatizar o dever ético na consciência do profissional, talvez, dentro de uma onda positivista, tenha-se partido para uma tentativa de tornar concretos os princípios e deveres éticos, produzindo-se os códigos de ética ou códigos de dever, específicos para cada profissão. Ora, a consequência direta desse tipo de raciocínio é: a) a transformação das prescrições éticas em mandamentos legais; b) a retificação excessiva dos campos conceituais da ética; c) a compartimentação da ética em tantas partes quantas profissões existentes; d) a juridicização dos mandamentos éticos (BITTAR, 2002, p. 367). Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–3 Torna-se necessário explorar este entendimento nas aulas introdutórias de ética para policiais militares, após conhecerem os preceitos éticos, valores e compromisso de sua instituição, pois muito mais que imposições, deveres devem ultrapassar o externo e serem internalizados, pois estes vão além de uma prestação de serviço social, mas sim de uma vida diferenciada na defesa da ordem social. Dentro da ética profissional pode-se também refletir o papel social das atividades laborativas, a fim de se enquadrar em bons resultados e comportamentos relevantes para o desempenho profissional. Diante disso, tem-se a liberdade de exaltar recente trabalho realizado pelos pesquisadores Rosana Soibelmann Glock e José Roberto Goldim, (2003), na PUC/RS, abaixo transcrito: Conceituação: O que é Ética Profissional? É extremamente importante saber diferenciar a ética da moral e do Direito. Estas três áreas de conhecimento se distinguem, porém têm grandes vínculos e até mesmo sobreposições. Tanto a moral como o Direito baseiam-se em regras que visam estabelecer uma certa previsibilidade para as ações humanas. Ambas, porém, se diferenciam. A moral estabelece regras que são assumidas pela pessoa, como uma forma de garantir o seu bem-viver. A moral independe das fronteiras geográficas e garante uma identidade entre pessoas que sequer se conhecem, mas utilizam este mesmo referencial moral comum. O Direito busca estabelecer o regramento de uma sociedade delimitada pelas fronteiras do Estado. As leis têm uma base territorial, elas valem apenas para aquela área geográfica onde uma determinada população ou seus delegados vivem. Alguns autores afirmam que o Direito é um subconjunto da moral. Esta perspectiva pode gerar a conclusão de que toda a lei é moralmente aceitável. Inúmeras situações demonstram a existência de conflitos entre a moral e o Direito. A desobediência civil ocorre quando argumentos morais impedem que uma pessoa acate uma determinada lei. Este é um exemplo de que a moral e o Direito, apesar de referirem-se a uma mesma sociedade, podem ter perspectivas discordantes. A Ética é o estudo geral do que é bom ou mau, correto ou incorreto, justo ou injusto, adequado ou inadequado. Um dos objetivos da Ética é a busca de justificativas para as regras propostas pela moral e pelo Direito. Ela é diferente de ambos - moral e Direito - pois não estabelece regras. Esta reflexão sobre a ação humana é que caracteriza a Ética. Ética Profissional: Quando se inicia esta reflexão? Esta reflexão sobre as ações realizadas no exercício de uma profissão deve iniciar bem antes da prática profissional. A fase da escolha profissional, ainda durante a adolescência Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–4 muitas vezes, já deve ser permeada por esta reflexão. A escolha por uma profissão é optativa, mas ao escolhê-la, o conjunto de deveres profissionais passa a ser obrigatório. Geralmente, quando você é jovem, escolhe sua carreira sem conhecer o conjunto de deveres que está prestes ao assumir tornando-se parte daquela categoria que escolheu. Toda a fase de formação profissional, o aprendizado das competências e habilidades referentes à prática específica numa determinada área, deve incluir a reflexão, desde antes do início dos estágios práticos. Ao completar a formação em nível superior, a pessoa faz um juramento, que significa sua adesão e comprometimento com a categoria profissional onde formalmente ingressa. Isto caracteriza o aspecto moral da chamada Ética Profissional, esta adesão voluntária a um conjunto de regras estabelecidas como sendo as mais adequadas para o seu exercício. Mas pode ser que você precise começar a trabalhar antes de estudar ou paralelamente aos estudos, e inicia uma atividade profissional sem completar os estudos ou em área que nunca estudou, aprendendo na prática. Isto não exime você da responsabilidade assumida ao iniciar esta atividade! O fato de uma pessoa trabalhar numa área que não escolheu livremente, o fato de “pegar o que apareceu” como emprego por precisar trabalhar, o fato de exercer atividade remunerada onde não pretende seguir carreira, não isenta da responsabilidade de pertencer, mesmo que temporariamente, a uma classe, e há deveres a cumprir. Um jovem que, por exemplo, exerce a atividade de auxiliar de almoxarifado durante o dia e, à noite, faz curso de programador de computadores, certamente estará pensando sobre seu futuro em outra profissão, mas deve sempre refletir sobre sua prática atual. Ética Profissional: Como é esta reflexão? Algumas perguntas podem guiar a reflexão, até ela tornar-se um hábito incorporado ao dia-a-dia. Tomando-se o exemplo anterior, esta pessoa pode se perguntar sobre os deveres assumidos ao aceitar o trabalho como auxiliar de almoxarifado, como está cumprindo suas responsabilidades, o que esperam dela na atividade, o que ela deve fazer, e como deve fazer, mesmo quando não há outra pessoa olhando ou conferindo. Podeperguntar a si mesmo: Estou sendo bom profissional? Estou agindo adequadamente? Realizo corretamente minha atividade? É fundamental ter sempre em mente que há uma série de atitudes que não estão descritas nos códigos de todas as profissões, mas que são comuns a todas as atividades que uma pessoa pode exercer. Atitudes de generosidade e cooperação no trabalho em equipe, mesmo quando a atividade é exercida solitariamente em uma sala, ela faz parte de um conjunto maior de atividades que dependem do bom desempenho desta. Uma postura pró-ativa, ou seja, não ficar restrito apenas às tarefas que foram dadas a você, mas contribuir para o engrandecimento do trabalho, mesmo que ele seja temporário. Se sua tarefa é varrer ruas, você pode se contentar em varrer ruas e juntar o lixo, mas você pode também tirar o lixo que você vê que está prestes a cair na rua, podendo futuramente entupir uma saída de escoamento e causando uma Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–5 acumulação de água quando chover. Você pode atender num balcão de informações respondendo estritamente o que lhe foi perguntado, de forma fria, e estará cumprindo seu dever, mas se você mostrar-se mais disponível, talvez sorrir, ser agradável, a maioria das pessoas que você atende também serão assim com você, e seu dia será muito melhor. Muitas oportunidades de trabalho surgem onde menos se espera, desde que você esteja aberto e receptivo, e que você se preocupe em ser um pouco melhor a cada dia, seja qual for sua atividade profissional. E, se não surgir, outro trabalho, certamente sua vida será mais feliz, gostando do que você faz e sem perder, nunca, a dimensão de que é preciso sempre continuar melhorando, aprendendo, experimentando novas soluções, criando novas formas de exercer as atividades, aberto a mudanças, nem que seja mudar, às vezes, pequenos detalhes, mas que podem fazer uma grande diferença na sua realização profissional e pessoal. Isto tudo pode acontecer com a reflexão incorporada a seu viver. E isto é parte do que se chama empregabilidade: a capacidade que você pode ter de ser um profissional que qualquer patrão desejaria ter entre seus empregados, um colaborador. Isto é ser um profissional eticamente bom. Ética Profissional e relações sociais: O varredor de rua que se preocupa em limpar o canal de escoamento de água da chuva, o auxiliar de almoxarifado que verifica se não há umidade no local destinado para colocar caixas de alimentos, o médico cirurgião que confere as suturas nos tecidos internos antes de completar a cirurgia, a atendente do asilo que se preocupa com a limpeza de uma senhora idosa após ir ao banheiro, o contador que impede uma fraude ou desfalque, ou que não maquia o balanço de uma empresa, o engenheiro que utiliza o material mais indicado para a construção de uma ponte, todos estão agindo de forma eticamente correta em suas profissões, ao fazerem o que não é visto, ao fazerem aquilo que, alguém descobrindo, não saberá quem fez, mas que estão preocupados, mais do que com os deveres profissionais, com as PESSOAS. As leis de cada profissão são elaboradas com o objetivo de proteger os profissionais, a categoria como um todo e as pessoas que dependem daquele profissional, mas há muitos aspectos não previstos especificamente e que fazem parte do comprometimento do profissional em ser eticamente correto, aquele que, independente de receber elogios, faz A COISA CERTA. Ética Profissional: Pontos para sua reflexão: É imprescindível estar sempre bem informado, acompanhando não apenas as mudanças nos conhecimentos técnicos da sua área profissional, mas também nos aspectos legais e normativos. Vá e busque o conhecimento. Muitos processos ético-disciplinares nos conselhos profissionais acontecem por desconhecimento, negligência. Competência técnica, aprimoramento constante, respeito às pessoas, confidencialidade, privacidade, tolerância, flexibilidade, fidelidade, envolvimento, afetividade, correção de conduta, boas maneiras, relações genuínas com as pessoas, responsabilidade, corresponder à confiança que é depositada em você... Comportamento eticamente adequado e sucesso continuado são indissociáveis! Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–6 2. Deontologia A Deontologia, atualmente, é muito estudada nas carreiras policiais militares. Ela é abordada, inclusive, em virtude do aumento da sensação de insegurança e a constante discussão da necessidade de uma polícia militar preventiva com formação militar, sua eficácia e eficiência no meio social. Esta discussão que hoje ocorre em várias PMs brasileiras já vem sendo incentivada há anos na Brigada Militar, conforme evidencia a abordagem conceitual do tenente-coronel da reserva remunerada Pedro Joel Silva da Silva: O termo “deontologia, foi criado pelo Filósofo inglês Jeremy Bentham, em 1834. Deriva do grego deon [o que é obrigatório] e de logos [teoria, ciência], conforme Japiassu e Marcondes. Tanto pela época em que foi criado – um momento histórico de exacerbação do liberalismo político e econômico, quanto pelo objetivo de seu autor, o termo refletia o que Bentham compreendia como o obrigar-se [ato moral] utilitarista. Era, portanto, uma concepção coerente com a prática política e econômica inglesa e, mais tarde, norte-americana. Deontologia (do grego δέον, dever + λόγος, tratado) refere-se ao ramo da ética cujo objeto de estudo são os fundamentos do dever e as normas morais. É conhecida também sob o nome de "Teoria do Dever". É um dos dois ramos principais da Ética Normativa, juntamente com a axiologia. Pode-se falar, também, de uma deontologia aplicada, caso em que já não se está diante de uma ética normativa, mas sim descritiva e inclusive prescritiva. Tal é o caso da chamada "Deontologia Profissional". A deontologia em Kant fundamenta-se em dois conceitos que lhe dão sustentação: a razão prática e a liberdade. Agir por dever é o modo de conferir à ação o valor moral, por sua vez a perfeição moral só pode ser atingida por uma vontade livre. O imperativo categórico no domínio da moralidade é a forma racional do dever-ser, determinando a vontade submetida à obrigação. O predicado "obrigatório" da perspectiva deontológica, designa na visão moral o "respeito de si". Nas palavras de Japiassu e Marcondes (2007), deontologia é “o código moral das regras e procedimentos próprios a determinada categoria profissional” (p. 67). SIGNIFICADOS PRÁTICOS Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–7 Deontologia é, portanto, o elenco de determinações objetivas, instruções operacionais e de cunho prático, que os membros de um grupo profissional devem seguir, no exercício de suas atividades, para garantir a uniformidade, em todos os seus aspectos e lugar, do trabalho e ação do grupo, como se fosse a ação de um único indivíduo. Isso, geralmente, se traduz num código que detalha minuciosamente o modo de proceder e o comportamento pessoal, em cada momento, em cada relação de trabalho do profissional com o comprador, seu patrão final na sociedade. Assim, o código deontológico, por derivar da razão utilitarista tida por Bentham como característica do homem, precisa partir da definição das habilidades, atividades e modos de execução do trabalho que devem ser empregados pelos profissionais nos mais diferentes momentos de sua atuação. O RECORTE PROFISSIONALISTA SOBRE O SER E O AGIR HUMANOS No sentido de “ser humano” mais próximo do cotidiano, o homem se distinguena natureza por fazer a existência de modo calculado: pensa para agir e pensa sobre o agir para aperfeiçoar este mesmo agir. Isto, historicamente, transforma-se em trabalho. Especialmente, nas sociedades atuais o pensar [teorizar] é trabalhar assim como o agir diretamente sobre a natureza [realizar a prática] também o é. São duas faces de uma mesma moeda que se constitui como parte do processo de hominização crescente. Esse trabalho que, no seu início histórico, era curiosidade experimentadora, mais tarde forjará ocupações que tendem à permanência, especializando indivíduos e grupos em suas comunidades e, progressivamente, gerando profissões. Como ocupação, uma atividade de trabalho geralmente é concebida e é também feita, em nível prático, por um mesmo indivíduo. Mais tarde, quando muitas das ocupações se transformam em profissões essa relação pensar-fazer vai se alterar e verifica-se que tanto o teórico quanto o prático também são especializados – um só concebe e o outro só executa e, entre eles, a função cerebral conectora passa a ser exercida por um terceiro indivíduo que coordena e busca a adequação entre o concebido e o processamento da matéria-prima para chegar ao produto final. Com isso, ainda que tratado rapidamente, pode-se perceber que o recorte profissionalista é um fenômeno recente, estabelecendo-se com o capitalismo econômico e exigindo uma produção cada vez mais qualificada de “idealizadores de produtos” o que exigia um espaço próprio para prepará-los dentro de uma certa perspectiva concebedora. É nesse momento, que as profissões escolarizadas nas universidades, voltadas principalmente para a engenharia, vão ser sistematizadas e, no seu rastro, todas as modernas ciências sociais aplicadas, como a Administração, Economia, Serviço Social, Biblioteconomia, etc., surgindo especialmente na Inglaterra e nos Estados Unidos as primeiras e ainda hoje mais importantes associações profissionais. Aliás, no processo de transformação de certas ocupações em profissões modernas – ocorrido, inicialmente, em parte para defender-se economicamente do capitalismo liberal e em parte emulando o modelo, ou modernizando as antigas corporações de ofício – se viu que a força dessas associações foi que levou à criação nas universidades de espaço acadêmico para vários currículos. Esse ingresso no interior da universidade, instituição de mais de 800 anos de existência no ocidente, viria a funcionar como um Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–8 elemento importante para o credenciamento social dessas novíssimas profissões. É nesse conjunto de atos modernizadores e pragmáticos, provocados por um liberalismo utilitarista que produz, a partir da expressão econômica, a urbanização da cidade e a criação do processamento industrial da riqueza, que se vê o surgimento da noção de dever profissional. MODERNIDADE E ATRIBUIÇÃO DE DEVER O mundo moderno – saído ou brotando junto a uma renovação profunda da arquitetura do estado europeu, em que tanto o trabalhador que concebe o produto, quanto aquele que o faz e, igualmente, quem coordena e, além de tudo isso, a convivência com a noção iluminista e revolucionária de cidadania – vem a exigir uma noção mediadora entre a produção e o seu consumo. A ideia, ainda hoje em desenvolvimento, que então passa a se constituir, é que o patrão não é outro senão aquele que compra o que foi produzido. Serviço ou produto só valem a pena – como bens econômicos – ser realizados se houver quem queira comprá-los seja tanto pelas suas qualidades intrínsecas quanto por outros fatores complementares como embalagem, durabilidade, atendimento ao comprador, prazos respeitados, etc. Nesse sentido, pela conjugação política e econômica, a auto- atribuição de dever [obrigar-se] foi uma consequência inescapável, não apenas à sobrevivência dos produtores de quaisquer bens mas também dos produtores de quaisquer serviços. Essa visão de realidade alcança também todas as categorias profissionais cuja ação é a da venda de trabalho intelectual, voltado à solução de problemas não apenas para os setores de indústria e comércio, mas também para a sociedade, como o é o trabalho de advogados, médicos, bibliotecários, engenheiros, etc. Essa atribuição de dever é, no caso das profissões universitárias, uma auto-atribuição que assimila inteiramente o significado que o termo que Bentham – deontologia – veio a ter. 3. Ética profissional A ética profissional é um ramo da ética prática, a qual, de forma geral envolve todas as profissões, algumas havendo códigos de ética ou deontológicos específicos, como no caso da Psicologia e da Medicina, por exemplo. A Brigada Militar, como se nota no capítulo anterior, não possui um código específico para o comportamento ético. Existem regras na Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–9 legislação constitucional, além de um regulamento disciplinar, que trazem preceitos éticos, mas não há um estatuto ético específico. Quanto à ética profissional cabe citar o conceito, dentro de um estudo jurídico, segundo Bittar (2002): Por sua vez, a ética profissional se destaca de dentro da ética aplicada como um ramo específico relacionado aos mandamentos basilares das relações laborais. É como especialização de conhecimentos aplicados que a ética profissional se vincula às ideias de utilidade, prestatividade, lucratividade, categoria laboral, engajamento em modos de produção ou prestação de serviços, exercício de atividades regularmente desenvolvidas de acordo com finalidades sociais. (BITTAR, 2002, p. 363) O mesmo autor prossegue analisando o objetivo da ética profissional, principalmente no concernente a diferença que existe entre regramentos legais, imposições de leis e preceitos éticos: Isso porque, na atualidade, a ética tem-se reduzido e simplificado de modo extremado a uma tecnologia ética. Talvez, na esperança de imediatizar o dever ético na consciência do profissional, talvez, dentro de uma onda positivista, tenha-se partido para uma tentativa de tornar concretos os princípios e deveres éticos, produzindo-se os códigos de ética ou códigos de dever, específicos para cada profissão. Ora, a consequência direta desse tipo de raciocínio é: a) a transformação das prescrições éticas em mandamentos legais; b) a retificação excessiva dos campos conceituais da ética; c) a compartimentação da ética em tantas partes quantas profissões existentes; d) a juridicização dos mandamentos éticos (BITTAR, 2002, p. 367). Torna-se necessário explorar este entendimento nas aulas introdutórias de ética para policiais militares, após conhecerem os preceitos éticos, valores e compromisso de sua instituição, pois muito mais que imposições, deveres devem ultrapassar o externo e serem internalizados, pois estes vão além de uma prestação de serviço social, mas sim de uma vida diferenciada na defesa da ordem social. Dentro da ética profissional pode-se também refletir o papel social das atividades laborativas, a fim de se enquadrar em bons resultados e comportamentos relevantes para o desempenho profissional. Diante disso, tem-se a liberdade de exaltar recente trabalho realizado pelos Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–10 pesquisadores Rosana Soibelmann Glock e José Roberto Goldim, na PUC/RS, abaixo transcrito: Conceituação: O que é Ética Profissional? É extremamente importante saber diferenciar a ética da moral e do Direito. Estas três áreas de conhecimento se distinguem, porém têmgrandes vínculos e até mesmo sobreposições. Tanto a moral como o Direito baseiam-se em regras que visam estabelecer uma certa previsibilidade para as ações humanas. Ambas, porém, se diferenciam. A moral estabelece regras que são assumidas pela pessoa, como uma forma de garantir o seu bem-viver. A moral independe das fronteiras geográficas e garante uma identidade entre pessoas que sequer se conhecem, mas utilizam este mesmo referencial moral comum. O Direito busca estabelecer o regramento de uma sociedade delimitada pelas fronteiras do Estado. As leis têm uma base territorial, elas valem apenas para aquela área geográfica onde uma determinada população ou seus delegados vivem. Alguns autores afirmam que o Direito é um subconjunto da moral. Esta perspectiva pode gerar a conclusão de que toda a lei é moralmente aceitável. Inúmeras situações demonstram a existência de conflitos entre a moral e o Direito. A desobediência civil ocorre quando argumentos morais impedem que uma pessoa acate uma determinada lei. Este é um exemplo de que a moral e o Direito, apesar de referirem-se a uma mesma sociedade, podem ter perspectivas discordantes. A Ética é o estudo geral do que é bom ou mau, correto ou incorreto, justo ou injusto, adequado ou inadequado. Um dos objetivos da Ética é a busca de justificativas para as regras propostas pela moral e pelo Direito. Ela é diferente de ambos - moral e Direito - pois não estabelece regras. Esta reflexão sobre a ação humana é que caracteriza a Ética. Ética Profissional: Quando se inicia esta reflexão? Esta reflexão sobre as ações realizadas no exercício de uma profissão deve iniciar bem antes da prática profissional. A fase da escolha profissional, ainda durante a adolescência muitas vezes, já deve ser permeada por esta reflexão. A escolha por uma profissão é optativa, mas ao escolhê-la, o conjunto de deveres profissionais passa a ser obrigatório. Geralmente, quando você é jovem, escolhe sua carreira sem conhecer o conjunto de deveres que está prestes ao assumir tornando-se parte daquela categoria que escolheu. Toda a fase de formação profissional, o aprendizado das competências e habilidades referentes à prática específica numa determinada área, deve incluir a reflexão, desde antes do início dos estágios práticos. Ao completar a formação em nível superior, a pessoa faz um juramento, que significa sua adesão e comprometimento com a categoria profissional onde formalmente ingressa. Isto caracteriza o aspecto moral da chamada Ética Profissional, esta adesão voluntária a um conjunto de regras estabelecidas como sendo as mais adequadas para o seu exercício. Mas pode ser que você precise começar a trabalhar antes de estudar ou paralelamente aos estudos, e inicia uma atividade profissional sem completar os estudos ou em área que nunca estudou, aprendendo na prática. Isto não exime você da Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–11 responsabilidade assumida ao iniciar esta atividade! O fato de uma pessoa trabalhar numa área que não escolheu livremente, o fato de “pegar o que apareceu” como emprego por precisar trabalhar, o fato de exercer atividade remunerada onde não pretende seguir carreira, não isenta da responsabilidade de pertencer, mesmo que temporariamente, a uma classe, e há deveres a cumprir. Um jovem que, por exemplo, exerce a atividade de auxiliar de almoxarifado durante o dia e, à noite, faz curso de programador de computadores, certamente estará pensando sobre seu futuro em outra profissão, mas deve sempre refletir sobre sua prática atual. Ética Profissional: Como é esta reflexão? Algumas perguntas podem guiar a reflexão, até ela tornar-se um hábito incorporado ao dia-a-dia. Tomando-se o exemplo anterior, esta pessoa pode se perguntar sobre os deveres assumidos ao aceitar o trabalho como auxiliar de almoxarifado, como está cumprindo suas responsabilidades, o que esperam dela na atividade, o que ela deve fazer, e como deve fazer, mesmo quando não há outra pessoa olhando ou conferindo. Pode perguntar a si mesmo: Estou sendo bom profissional? Estou agindo adequadamente? Realizo corretamente minha atividade? É fundamental ter sempre em mente que há uma série de atitudes que não estão descritas nos códigos de todas as profissões, mas que são comuns a todas as atividades que uma pessoa pode exercer. Atitudes de generosidade e cooperação no trabalho em equipe, mesmo quando a atividade é exercida solitariamente em uma sala, ela faz parte de um conjunto maior de atividades que dependem do bom desempenho desta. Uma postura pró-ativa, ou seja, não ficar restrito apenas às tarefas que foram dadas a você, mas contribuir para o engrandecimento do trabalho, mesmo que ele seja temporário. Se sua tarefa é varrer ruas, você pode se contentar em varrer ruas e juntar o lixo, mas você pode também tirar o lixo que você vê que está prestes a cair na rua, podendo futuramente entupir uma saída de escoamento e causando uma acumulação de água quando chover. Você pode atender num balcão de informações respondendo estritamente o que lhe foi perguntado, de forma fria, e estará cumprindo seu dever, mas se você mostrar-se mais disponível, talvez sorrir, ser agradável, a maioria das pessoas que você atende também serão assim com você, e seu dia será muito melhor. Muitas oportunidades de trabalho surgem onde menos se espera, desde que você esteja aberto e receptivo, e que você se preocupe em ser um pouco melhor a cada dia, seja qual for sua atividade profissional. E, se não surgir, outro trabalho, certamente sua vida será mais feliz, gostando do que você faz e sem perder, nunca, a dimensão de que é preciso sempre continuar melhorando, aprendendo, experimentando novas soluções, criando novas formas de exercer as atividades, aberto a mudanças, nem que seja mudar, às vezes, pequenos detalhes, mas que podem fazer uma grande diferença na sua realização profissional e pessoal. Isto tudo pode acontecer com a reflexão incorporada a seu viver. E isto é parte do que se chama empregabilidade: a Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–12 capacidade que você pode ter de ser um profissional que qualquer patrão desejaria ter entre seus empregados, um colaborador. Isto é ser um profissional eticamente bom. Ética Profissional e relações sociais: O varredor de rua que se preocupa em limpar o canal de escoamento de água da chuva, o auxiliar de almoxarifado que verifica se não há umidade no local destinado para colocar caixas de alimentos, o médico cirurgião que confere as suturas nos tecidos internos antes de completar a cirurgia, a atendente do asilo que se preocupa com a limpeza de uma senhora idosa após ir ao banheiro, o contador que impede uma fraude ou desfalque, ou que não maquia o balanço de uma empresa, o engenheiro que utiliza o material mais indicado para a construção de uma ponte, todos estão agindo de forma eticamente correta em suas profissões, ao fazerem o que não é visto, ao fazerem aquilo que, alguém descobrindo, não saberá quem fez, mas que estão preocupados, mais do que com os deveres profissionais, com as PESSOAS. As leis de cada profissão são elaboradas com o objetivo de proteger os profissionais, a categoria como um todo e as pessoas que dependem daquele profissional, mas há muitos aspectos não previstos especificamente e que fazem parte do comprometimento do profissional em ser eticamente correto, aquele que, independente de receber elogios, faz A COISA CERTA. Ética Profissional: Pontos para sua reflexão: É imprescindível estar sempre bem informado, acompanhando não apenas asmudanças nos conhecimentos técnicos da sua área profissional, mas também nos aspectos legais e normativos. Vá e busque o conhecimento. Muitos processos ético-disciplinares nos conselhos profissionais acontecem por desconhecimento, negligência. Competência técnica, aprimoramento constante, respeito às pessoas, confidencialidade, privacidade, tolerância, flexibilidade, fidelidade, envolvimento, afetividade, correção de conduta, boas maneiras, relações genuínas com as pessoas, responsabilidade, corresponder à confiança que é depositada em você... Comportamento eticamente adequado e sucesso continuado são indissociáveis! 4. Deontologia policial A atividade policial, como diferenciada em seu poder exercido perante os demais órgãos estatais e a comunidade em geral, exige um regramento ético diferenciado, valores e virtudes inerentes a estes seres que são os guardiões da sociedade. Diante dessa diferenciação cabe citar o recente trabalho realizado pelos sociólogos Arthur Trindade e Maria Stela Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–13 Grossi Porto, coordenadores do Núcleo de Pesquisa Violência e Segurança da Universidade de Brasília, onde comparam o Código Deontológico da Polícia Militar de Brasília e Polícia do Canadá, evidenciando a conceituação de uma deontologia policial: O conceito de deontologia refere-se à ideia de controlar as atividades de determinados profissionais através da autoimposição de deveres. Toda profissão impõe deveres e responsabilidades a quem a exerce. A deontologia é, etimologicamente, a ciência dos deveres. Portanto, a deontologia coloca-se como uma estratégia de propor e de transmitir uma ética, cujo objetivo é fazer com que os integrantes de uma profissão predisponham-se a aderir a um sistema de valores que associe eficácia e respeito pelas pessoas e pelas liberdades fundamentais, dentro e fora do exercício de sua profissão. Diferencia-se do direito no sentido de que as normas que propõe são internas. Muitas das regras previstas nos Códigos de Deontologia se sobrepõem às normas de conduta profissional e às regras jurídicas, resultando, portanto, num sistema complexo de controle profissional (Bandeira e Costa, 2003). No que diz respeito às polícias, os códigos de deontologia estabelecem as regras e as obrigações essenciais ao trabalho dos policiais, inscrevendo-se num quadro jurídico de referência que define com precisão a natureza das modalidades da ação policial. Em outras palavras: os códigos de deontologia determinam os princípios e valores que devem nortear as atitudes e o comportamento que os policiais devem assumir dentro da corporação e na sua relação com o público. Convém lembrar que, na maioria dos países em que o código de deontologia foi criado, objetivou-se modificar as concepções tradicionais da prática policial, sobretudo em relação à discricionariedade atribuída à prática profissional. Em relação ao código, é interessante fazer um paralelo entre os policiais e os profissionais liberais. Foram estes últimos – médicos, jornalistas e advogados – que sentiram a necessidade de estabelecer regras de deontologia para “delimitar” (circunscrever) suas práticas profissionais. Estes profissionais, embora respeitassem os regulamentos e as regras estabelecidas para o exercício da profissão, ao exercê-la livremente, tinham como respaldo apenas a confiança de seus pacientes e clientes. Não estavam submetidos a nenhum poder ou estrutura hierárquica como os policiais. No entanto, sentiram a necessidade de criar alguns limites suplementares a sua prática profissional. O policial, ao contrário dos profissionais liberais, desempenha suas funções demarcado por uma rígida estrutura hierárquica, embora nem sempre essa estrutura seja considerada, principalmente nas situações de patrulhamento de rua. Apesar das diferenças quanto à estrutura hierárquica, podemos notar algumas semelhanças no exercício de tais profissões. Se compararmos os dois grupos, observa-se, frequentemente, que o cliente de um profissional liberal se encontra numa situação de dependência frente a este; é o caso do paciente com seu Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–14 cirurgião, por exemplo. Este no momento da cirurgia, é o único mestre do ato, da decisão a ser tomada, pois apenas seus conhecimentos técnicos podem conduzi-lo. Em caso de situações extremas, contará apenas com sua ética profissional. Se deslocarmos essa problemática para a função do policial, constataremos que este, na sua prática cotidiana, agirá frequentemente fora da estrutura hierárquica, dispondo de grande autonomia de ação. Nessa prática, os policiais não necessariamente regem suas ações pelo regulamento, leis ou normas de conduta. Guiam-se, no geral, pelo que denominam como „sua própria experiência‟. A existência dessa margem de iniciativa da ação do policial constitui-se exatamente no espaço que deve ser ocupado pela deontologia. Portanto, instituir um código de deontologia significa reconhecer, concomitantemente, a responsabilidade e a autonomia do policial. Entretanto, pouco se sabe sobre as diferentes dinâmicas sociais, políticas institucionais para a implantação dos códigos de deontologia policial. A partir de 1980, constatou-se o crescimento dos estudos sobre as polícias, constituindo-se no que Kant de Lima, Misse e Miranda (2000) denominaram de sociologia da organização policial contemporânea. Apesar dos esforços, pouco se avançou na compreensão dos mecanismos de controle da atividade policial, de seus instrumentos de controle e avaliação, bem como das dificuldades políticas, culturais e institucionais para sua implantação. Sem uma clara diferenciação entre violência policial e uso da força legal não é possível estabelecer mecanismos destinados ao controle e supervisão das atividades policiais. Até que ponto e sob que circunstâncias é legítimo ou admissível o uso da força? Qual é a linha demarcatória entre força legítima e violência policial? Estas questões têm sido debatidas pela literatura especializada (Klockars, 1996; Muniz et alii, 1997; Mesquita Neto, 1999; Costa, 2003; Costa e Medeiros 2002; Porto, 2000; Adorno, 2002). Os estudos destacam que essa linha demarcatória não é fixa. O limite entre força legítima e violência varia em função da forma como cada sociedade interpreta a noção de violência e representa a função policial. No contexto brasileiro, além de insistir na necessidade de incrementar a educação e o treinamento, os depoimentos ressaltam a dificuldade em traduzir para a atividade prática os princípios mais teóricos disponíveis, seja em manuais de procedimentos operacionais, seja através da cultura oral. Em Ottawa, a ênfase repousa, sobretudo, na possibilidade de o policial justificar seus atos, apoiado em leis ou códigos. A ação que pode ser assim justificada não é percebida como violência policial. 5. Deontologia policial-militar Havendo um entendimento básico sobre deontologia e de que existe um dever ser próprio e de grande exigibilidade de condutas altruístas e virtuosas por parte de um policial, resta focar na atividade ostensiva Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–15 preventiva, a qual deve ser o ápice da ética profissional - deontologia e deontologia policial, pois além de englobar todos esses conceitos da ética prática, o policial militar reveste-se da ostensividade e presença constante no meio social, e como já disse Ricardo Balestreri, “um agente fomentador dacidadania, ou seja um exemplo de comportamento individual”. Para exemplificar a atualidade e extraterritorialidade do tema, pode- se usar o compreendido e amplamente estudado pelas Polícias Militares de São Paulo e Paraná, pela das compilações abaixo: Não são necessários muitos estudos para evidenciar que os estilos e posturas, adotados como próprios na execução do policiamento ostensivo de uma organização policial-militar, refletem os valores aí inseridos e estimulados. Uma organização que, independentemente de outros aspectos, admite procedimentos técnicos e táticos agressivos e indiferentes aos direitos do cidadão, naturalmente adota um conjunto de valores muito discordantes daqueles de outra organização, em que a comunidade, além de respeitada, tem suas percepções e demandas priorizadas na administração da ordem pública, ou ainda, daquela outra, em que os esforços de policiamento atendem apenas às prioridades do comando, ou os interesses políticos subalternos, muito mais do que uma ampla dedicação aos princípios básicos que regem as atividades da polícia ostensiva. Assim, a Deontologia vem estabelecer as normas que presidem a atividade profissional sob a égide da retidão moral ou da honestidade, sendo o bem a preponderar e o mal a evitar no exercício da atividade profissional. De tal sorte, a vida profissional não pode conservar-se alheia à norma ética. Decorrente deste conceito geral, a Deontologia Policial-Militar é constituída pelo conjunto de valores e deveres éticos, traduzidos em normas de conduta, que se impõem para que o exercício da profissão policial-militar atinja plenamente os ideais de realização do bem comum, mediante a preservação da ordem pública. Os valores profissionais, determinantes da moral do policial-militar, são os seguintes: patriotismo, civismo, hierarquia, disciplina, profissionalismo, lealdade, constância ou perseverança, espírito de corpo, honra, dignidade, honestidade e coragem. De antemão, os deveres éticos, provindos dos valores e que conduzem a atividade profissional sob o signo da retidão moral, dentre vários, destacam-se: cumprir os deveres de cidadão; atuar com devotamento no interesse público, colocando-o acima dos interesses particulares; dedicar-se integral e exclusivamente ao serviço policial-militar, buscando com todas as energias, o êxito do serviço e o aprimoramento técnico-profissional e moral; proteger a vida, o patrimônio e o meio ambiente com abnegação e desprendimento pessoal, arriscando, se necessário, a própria vida; e assim por diante. Tudo isso, objetivando uma conduta ética elevada, consoante aos padrões de moralidade Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–16 esperados, de sua polícia, pela sociedade. Conduta ética essa, firmada mediante compromissos públicos solenes, traduzidos em obrigações, cuja violação constituirá crime ou transgressão disciplinar, conforme o disposto em legislação específica ou própria. O Cap. PMSP Paulo Marino LOPES, no seu ensaio "Da Deontologia Policial-Militar", realça que a ética prevalecente nas Corporações Milicianas deve ser a do militar de polícia, guardião da ordem pública, incumbindo manifestar, particularmente, as seguintes características: a. importância dos vínculos pessoais com a instituição, resultando do alto nível de identificação individual com os objetivos institucionais, bem como a defesa dos costumes, experiências e tradições que lhes são próprias; b. estabilidade dos fatores internos de segurança, obtida pela aproximação permanente entre os líderes e a tropa, permitindo o conhecimento mútuo e compartilhado das agruras; c. senso de identificação comunitária, oriundo do espírito de sacrifício em prol da comunidade e agravado pela perspectiva real de perda da própria vida no cumprimento do dever. Com a devida vênia do ilustre autor citado, pode-se associar estas características acima transcritas que envolvem a ética policial-militar em: MISSÃO, MORAL DE TROPA ELEVADA e PATRIOTISMO. De tal sorte que, pelo nível crescente de engajamento na missão a cumprir é que se elevam, também, os vínculos pessoais com a instituição, traduzidos pelo sentimento do dever. Outrossim, nenhuma organização policial- militar será bem sucedida se estes fatores de estabilidade internos forem baixos, ou seja, resultante de um moral baixo. Portanto, direitos privilegiando os altos escalões da hierarquia, rompimento do escalonamento salarial, afastamento dos oficiais da tropa, injustiça na apreciação dos atos e méritos dos subordinados, falta de atenção pelos comandantes às necessidades básicas dos subordinados, armamento, munição e equipamento insuficientes ou inadequados, insegurança pessoal e familiar diante das ameaças das quadrilhas, incompetência, boatos, falta de informações e treinamento, estímulos ao servilismo ou à adulação e impunidade, são alguns exemplos de rompimento desta estabilidade, atraindo como conseqüência natural, o rebaixamento do moral da tropa. Em relação à adulação de agentes públicos, seja dito de passagem, muito freqüente, José INGENIEROS além de considerá-la sempre desleal e interessada, acrescenta ainda: "Pertence à raça dos „covardes felizes‟, como os batizou Leconte de Lisle. A adulação é uma injustiça. Engano. O bajulador é sempre desprezível, mesmo quando o faz por uma espécie de benevolência vulgar ou pelo desejo de agradar a qualquer preço". Por fim, o patriotismo que é necessário ser alçado na devida proporção em que se elevam os sentimentos de identificação e solidariedade à comunidade que se deve servir, tornando grande aos olhos tudo o que poderia, humanamente, parecer pequeno e insignificante. Além do mais, conclui com peculiar lucidez o aludido miliciano, transportando à tona preceito estabelecido na legislação específica (Art. 16, R/200), o qual desvela a verdadeira pedra angular onde está alicerçada a atividade policial-militar, mas que infelizmente, não é levado com seriedade por muitos: Curso CBFPM 2020 – Ética profissional NOTAS DE AULA Ética e Cidadania - CBFPM MP 19–17 A Polícia Militar, convém lembrar, enquadra-se entre as organizações totais, nas quais os seus integrantes devem dedicar-se integralmente à profissão. Nesse sentido, transcendendo a esfera doutrinária, vem o mandamento legal do Decreto Federal n.º 88.777, de 30 setembro de 1983 (R-200): A carreira policial-militar é caracterizada por atividade continuada e inteiramente devotada às finalidades precípuas das Polícias Militares, denominada Atividade Policial-Militar. Apesar do policial-militar ser considerado como o "homem do dever", que deveria trabalhar pelo prazer profissional, pelo devotamento infatigável, na ânsia de servir, em conformidade com as posturas que são projetadas em ditosos discursos, ao contrário, em verdade o que são projetadas no cotidiano, como performances habituais? Atitudes ambíguas e contraditórias, tendentes a construir uma forma particular de ética segundo a sua própria perspectiva, deixando para trás os valores mais elevados. Fato, aliás, que poderá ser discutido oportunamente. Nesse intervalo de tempo, o Cel. PM José Francisco PROFÍCIO, Ex-Comandante-Geral da Polícia Militar do Estado de São Paulo, ao falar de disciplina e legislação penal militar, assuntos comuns às Forças Armadas, às Polícias Militares e aos Corpos de Bombeiros Militares, insistiu em reafirmar as necessidades da inclusão de novos dispositivos disciplinares, mais adequados aos reclamos sociais e à própria ampliação de funções que o momento histórico mais recente, tem reservado às corporações, devendo, além daqueles já consagrados, regerem-se pelos seguintes
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