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Aula introdutória- Nutrição no Cuidado do Idoso

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Nutrição no Cuidado do Idoso
Aula Introdutória
Prof.Stéfany Datovo Prado
Processo de envelhecimento
Existem diferenças entre envelhecimento individual e envelhecimento populacional. Estamos vivendo um processo de envelhecimento populacional devido ao aumento da faixa etária dos indivíduos e diminuição da taxa de fecundidade.
Os efeitos do envelhecimento do indivíduo podem ser positivos ou negativos e são observados nas diversas dimensões do indivíduo: organismo (envelhecimento biológico) e psiquismo (envelhecimento psíquico). Todas as dimensões são igualmente importantes, na medida em que são coadjuvantes para a manutenção da autonomia e independência do indivíduo.
O envelhecimento biológico é inexorável, dinâmico e irreversível, caracterizado pela maior vulnerabilidade às agressões do meio interno e externo e, portanto, maior suscetibilidade nos níveis celular, tecidual e de órgãos/aparelhos/sistemas. Entretanto, não significa adoecer. Senilidade não é diagnóstico. Em condições basais, o idoso funciona tão bem quanto o jovem. A diferença se manifesta nas situações em que se torna necessária a utilização das reservas homeostáticas (de equilíbrio) que, no idoso, são mais frágeis. Além disso, cada órgão ou sistema envelhece de forma diferenciada. A variabilidade é, portanto, cada vez maior à medida em que envelhecemos. 
Processo de envelhecimento
O envelhecimento biológico pode ser fisiológico (senescência) ou patológico (senilidade). O envelhecimento fisiológico pode ser subdividido em dois tipos: bem-sucedido e usual. No envelhecimento bem-sucedido, o organismo mantém todas as funções fisiológicas de forma robusta, semelhante à idade adulta. No envelhecimento usual, observa-se uma perda funcional lentamente progressiva, que não provoca incapacidade, mas que traz alguma limitação à pessoa.
A hereditariedade, os hábitos de vida e as doenças são os principais determinantes das alterações moleculares causadoras da desregulação dos sistemas homeostáticos, capazes de comprometer o funcionamento harmonioso do organismo, gerando perda da autonomia e independência, hospitalização, institucionalização e óbito.
O envelhecimento é o principal fator de risco para determinadas doenças e incapacidades. A passagem do tempo expõe o indivíduo a uma série de injúrias, cujas conseqüências são percebidas na velhice, após décadas de exposição. As injúrias ambientais (hábitos de vida) interagem continuamente com a “bagagem genética” e as conseqüências biológicas são extremamente variáveis de indivíduo a indivíduo. Além disso, não há marcadores específicos capazes de diferenciar as alterações da senescência e da senilidade. Daí a associação entre velhice e doença. Não quer dizer que todas as doenças aumentam em função da idade. Basicamente, podemos afirmar que existem dois grupos de doenças:
Processo de envelhecimento
 Doenças que se relacionam com a idade, as quais se associam com mais freqüência ao envelhecimento. São chamadas doenças crônico-degenerativas, que podem ser agrupadas em neurodegenerativas (doença de Alzheimer e doença de Parkinson), cardiodegenerativas (doença arterial coronariana, insuficiência cardíaca, acidente vascular cerebral), osteodegenerativas (osteoporose, osteoartrose), entre outras;
Doenças que dependem da idade, as quais aumentam sua incidência de forma exponencial à medida que a idade aumenta: polimialgia reumática, arterite temporal, entre outras.
Para a Organização Mundial de Saúde, saúde representa o mais completo estado de bem-estar físico, psíquico e social e não meramente ausência de doença ou enfermidade. 
Bem-estar e funcionalidade são equivalentes. Representam a presença de autonomia (capacidade individual de decisão e comando sobre as ações, estabelecendo e seguindo as próprias regras) e independência (refere-se à capacidade de realizar algo com os próprios meios), permitindo que o indivíduo cuide de si (AVD básicas) e de sua vida (AVD instrumentais).
Processo de envelhecimento
Composição Corporal do Idoso
A água é o principal componente da composição corporal na criança, correspondendo a 70% do seu peso. Com o envelhecimento, há redução de 20% a 30% da água corporal total e 8% a 10% do volume plasmático. A redução é maior no conteúdo intracelular. Esta “desidratação crônica” é agravada pela menor sensação de sede, tornando o idoso mais vulnerável à desidratação aguda e às reações adversas das drogas, pela alteração do volume de distribuição das drogas hidrossolúveis. Além da redução da água corporal, o envelhecimento provoca redução de 20% a 30% da massa muscular (sarcopenia) e da massa óssea (osteopenia/ osteoporose), causada pelas alterações neuroendócrinas – menor responsividade renal ao hormônio antidiurético, redução dos níveis basais de aldosterona, redução do hormônio de crescimento e dos hormônios sexuais, aumento do paratormônio, redução da função renal, vitamina D – e inatividade física. 
Composição Corporal do Idoso
A sarcopenia contribui para as seguintes alterações presentes no idoso:
maior tendência à redução do peso corporal da maioria dos órgãos; 
redução na força muscular, na mobilidade, no equilíbrio e na tolerância ao exercício, predispondo a quedas e imobilidade; 
redução dos tecidos metabolicamente ativos, levando a uma diminuição do metabolismo basal (100 kcal/década) que, por sua vez, causa anorexia e conseqüente redução da ingestão alimentar, agravando ainda mais o quadro, podendo causar subnutrição proteico-calórica e deficiência de micronutrientes, como vitamina D, magnésio, cálcio e zinco; 
diminuição da sensibilidade à insulina: intolerância à glicose; 
comprometimento da resposta imunológica.
Ocorre aumento de 20% a 30% na gordura corporal total (2% a 5% por década, após os 40 anos) e modificação da sua distribuição, tendendo à localização mais central, abdominal e visceral. No sexo feminino, a gordura deposita-se mais na região das nádegas e coxas (aparência de “pêra”) e nos homens localiza-se mais na região abdominal (aparência de “maçã”). 
Nutrição e Antropometria
As alterações fisiológicas do envelhecimento que comprometem as necessidades nutricionais ou ingestão alimentar são:
 redução de olfato e do paladar: redução nos botões e papilas gustativas sobre a língua, diminuição nas terminações nervosas gustativas e olfatórias, ambos comprometendo a palatabilidade dos alimentos. Alterações nas papilas gustativas e na condução neurossensorial ocorrem progressivamente com a idade, com tendência à elevação do limiar de percepção dos sabores doce e salgado, levando à sensação de que os alimentos estão amargos e azedos; 
aumento da necessidade protéica: diminuição da síntese e ingestão; 
redução da biodisponibilidade da vitamina D, levando à redução da absorção intestinal de cálcio; 
deficiência da utilização da vitamina B6; 
redução da acidez gástrica, levando a menor absorção de vitamina B12, ferro, cálcio, ácido fólico e zinco; 
insuficiência dos mecanismos reguladores de sede, fome e saciedade; 
aumento da toxicidade de vitaminas lipossolúveis (vitaminas A, D, E, K); 
maior dificuldade na obtenção, preparo e ingestão de alimentos; 
xerostomia (boca seca).
Nutrição e Antropometria
O índice de massa corporal (Índice de Quetelet = peso em quilogramas dividido pela estatura em metros elevada ao quadrado) tende a se elevar com o envelhecimento, provavelmente pelo aumento progressivo da massa de gordura corporal, redução da atividade física, mudanças dos hábitos alimentares e alterações endócrinas. Utilizam-se os seguintes pontos de corte:
A prevalência de obesidade e/ou sobrepeso em idosos brasileiros, medidos pelo IMC, varia de 30% a 50%. A obesidade representa importante fator de risco para hipertensão arterial, vasculopatia periférica, AVC, câncer de mama e de endométrio, insuficiência venosa, intolerância ao exercício, redução da mobilidade, osteoartrite, lombalgia, apnéia do sono, diabetes mellitus, entre outros. Os únicos benefícios são a redução do risco de fratura de fragilidade e do risco de hipotermia. 
Sarcopeniao termo sarcopenia diz respeito à diminuição da massa muscular (massa magra) no corpo. Esse processo faz parte do envelhecimento e é, em parte, responsável pela perda da qualidade de vida na terceira idade. Segundo a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, cerca de 15% dos brasileiros têm sarcopenia a partir dos 60 anos de idade, chegando a 46% após os 80 anos.
A sarcopenia do idoso pode ser causada por alterações hormonais e fisiológicas do próprio envelhecimento, por doenças que ocorrem frequentemente na velhice, mas também está associada ao sedentarismo e à má alimentação.
Em pessoas saudáveis, a diminuição da massa magra geralmente inicia-se após os 30 anos de idade, com perdas em torno de 1% a 2% ao ano. Sem medidas preventivas, idosos com 80 anos de idade podem ter somente 50% de sua massa muscular da juventude.
Sarcopenia
A perda de massa muscular costuma demorar para ser percebida. Alguns dos primeiros sinais, no entanto, são:
Dificuldade em realizar atividades físicas, anteriormente consideradas fáceis, como subir escada, trocar uma lâmpada e carregar malas ou compras.
Desequilíbrio ao andar em terrenos acidentados, como ruas com desníveis e buracos.
Quedas constantes, geralmente, quando a perda muscular já está em estado avançado.
A sarcopenia tem implicações diretas na qualidade de vida e aumenta o risco de lesões e fraturas decorrentes das quedas.
Sarcopenia
Conforme o Grupo Europeu de Trabalho com Pessoas idosas, o diagnóstico é composto por três varáveis que são: massa muscular, força muscular e desempenho físico.
A massa muscular é avaliada através da:
Tomografia computadorizada e ressonância magnética: sendo os métodos mais acurados para avaliação da massa muscular esquelética, determinando a qualidade muscular, a massa de gordura e o gordura infiltrada no músculo;
Absorciometria radiológica de dupla energia: que estima a massa magra, a gordura e a massa óssea. Porém, devido a capacidade reduzida para a diferenciação da massa magra livre, entre a massa óssea e a água, não é possível determinar a qualidade muscular, como na tomografia computadorizada;
Bioimpedância elétrica: sendo um exame não muito efetivo em indivíduos com hidratação excessiva, apresentando limitações na determinação da qualidade muscular;
Antropometria: apesar de ser um método barato e simples, apresenta uma eficácia inferior se comparado aos demais;
Valores de creatinina: é originada quase que exclusivamente pelos músculos, obtidos através da excreção da urina. Porém, para esse diagnóstico é necessário a manutenção de uma dieta livre de carne por vários dias e uma coleta de urina prolongada;
Quantidade total ou parcial de potássio por tecidos moles livres de gordura: pois a musculatura esquelética contém mais de 50% do potássio total do corpo, sendo pouco utilizado na prática, mas considerado seguro e com baixo custo.
Para a avaliação da força muscular o método mais utilizado é a força de preensão manual através da dinamometria manual.
O desempenho físico pode ser avaliado pelo teste de velocidade de marcha de seis metros, por causa da fácil realização e importante característica de preditor de quedas. Também pode ser mensurado através do teste Time Up and Go, onde o indivíduo sai da posição sentada em uma cadeira, levanta-se, anda três metros e retorna até a postura sentada na cadeira.
Outros métodos utilizados para o diagnóstico da sarcopenia são a:
Ultrassonografia;
Densitometria óssea corporal total, que permite a avaliação de vários fatores como massa óssea, massa magra, massa adiposa total, e composição corporal.
Sarcopenia- Nutrição
A nutrição desempenha um papel importante na fisiopatologia da sarcopenia, pelo que constitui também ponto chave no tratamento desta condição. Uma nutrição adequada, em particular a ingestão de proteínas, é essencial para a manutenção da massa muscular. A quantidade de proteína adequada para o idoso é de 1,25 a 1,5 gramas kg de peso ao dia, sendo maior que o valor que é recomendado para um adulto jovem (0,8 a 1 g/kg/dia), sugerindo então que as necessidades proteicas no idoso podem estar aumentadas. Estudos tem sugerido que doses elevadas de proteína acima 3 g/kg/dia não altera a síntese proteica muscular e esta carga diária muito elevada de proteína causa aumento da taxa de filtração glomerular no jovem e redução da função renal em idoso, contudo há uma menor redução da massa muscular apendicular.
Em relação a proteína ingerida, é necessário referir que as proteínas de maior valor biológica tem maior impacto na inibição da proteólise a nível muscular e também foi demonstrado que proteínas rápidas como soro leite comparada a proteínas lentas como caseína são benéficas na estimulação da síntese proteica. Uma mistura de aminoácidos essenciais contendo leucina aumenta mais a síntese proteica que outras formas de proteína, por estimular mTOR que por sua vez estimula síntese proteica. Alimentos que contem leucina são leite, queijo, carne, atum, amendoim e ovos, além de suplementos específicos ricos em leucina.
Outro ponto importante é considerar a distribuição de proteína ao longo do dia. De acordo com a literatura, nos idosos é mais benéfico uma ingestão de cerca de 80% da proteína total no almoço e jantar que ingesta espaçada em pequenas quantidades. Essa estratégia é conhecida como “pulse protein pattern“, causando uma maior retenção de proteínas e balanço nitrogenado mais positivo.
Sarcopenia- Nutrição
Síndrome da Fragilidade do Idoso
A síndrome de fragilidade é o retrato da deterioração na capacidade compensatória do organismo, levando a uma vulnerabilidade importante a diversos estressores. Diante de um insulto agudo ou crônico, os idosos frágeis tendem a responder de maneira insuficiente ou desordenada, na presença da inflamação crônica e alterações imunológicas associadas à fragilidade.
É importante diferenciar a síndrome de fragilidade de idade avançada, multimorbidade (presença de duas ou mais doenças no mesmo indivíduo) e declínio funcional. Um indivíduo pode ter idade avançada e ser robusto (ou seja, não frágil), assim como pode ser frágil na ausência de comorbidades significativas. Independentemente das condições associadas, a síndrome de fragilidade aumenta o risco de eventos adversos em idosos e deve, portanto, serem abordadas de maneira apropriada.
Existem dois modelos mais aceitos na literatura para conceituar a síndrome de fragilidade:
Modelo fenotípico;
Modelo de acúmulo de déficits.
Síndrome da Fragilidade do Idoso
O primeiro modelo foi desenvolvido pela pesquisadora norte-americana Linda Fried e apresenta a fragilidade essencialmente como uma síndrome biológica de repercussão no aspecto físico do indivíduo. Neste modelo fenotípico, um indivíduo é considerado frágil se apresenta 3 ou mais dentre cinco componentes físicos identificados durante a avaliação clínica: perda de peso não-intencional no último ano; fraqueza (baixa performance no hand-grip, ou dinamômetro); exaustão (reportada pelo paciente); diminuição da velocidade de marcha; e baixo nível de atividade física.
Já no modelo de acúmulo de déficits desenvolvido por Rockwood e Mitnitski, a fragilidade é avaliada através da construção de um índice de fragilidade, ou Frailty Index (FI). O índice de fragilidade é composto de 30 ou mais variáveis que correspondem a problemas de saúde acumulados ao longo do envelhecimento. Esses problemas de saúde podem incluir comorbidades, fatores psicológicos, sintomas e incapacidades.
De maneira prática, a síndrome de fragilidade pode ser identificada através do uso de instrumentos desenvolvidos para aplicação em diversos cenários de cuidado. A escolha de um instrumento específico deve considerar a sua validade quanto ao local de aplicação, o tempo disponível do profissional, e a complexidade de administração (ex: a determinação de fragilidade fenotípica pelos critérios de Fried exige a avaliação da força de preensão palmar com uso de um dinamômetro).

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