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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL
MESTRADO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL
METODOLOGIA E PRÁTICA ANTROPOLÓGICA
PROFª. DRª MONICA FRANCH GUTIERREZ
PROFª. DRª SILVIA GARCIA NOGUEIRA
LUIZ CARLOS DE LIMA DO NASCIMENTO
SOCIABILIDADE, CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE E RESISTÊNCIA: UMA ETNOGRAFIA SOBRE DISPARIDADE DE GÊNERO EM UMA COMPETIÇÃO DE BREAKDANCE
LINHA DE PESQUISA: ETNOGRAFIAS E SOCIABILIDADES URBANAS
Pesquisa antropológica (juntei as informações referentes aos três exercícios em um mesmo arquivo e no final anexei o pré-projeto que defendi na última seleção de mestrado do PPGA, da UFPB:
Antes mesmo de ingressar no mestrado do PPGA pensei em modificar o foco da minha pesquisa fazendo um recorte de gênero e sexualidade, além de abordar questões sobre o breakdance já exploradas no PIBIC e no TCC do curso de antropologia com habilitação em antropologia visual, da UFPB/Campus IV. Expus a questão para meu orientador (a colaboração com Marco Aurélio Paz Tella continua) e para meus/minhas interlocutores/as e uma das ações seguintes fora me matricular na disciplina “Metodologias de investigações em gênero”, no PPGS/UFPB justamente pra me encontrar nessa nova empreitada.
Uma questão que me persegue depois que fiz esse recorte diz respeito ao lugar de fala. Mesmo percebendo/acreditando que todas as pessoas teriam esse espaço, com tanto que considerem seus privilégios e se comprometam com seus/suas colaborador/as, estou vez ou outra sendo confrontado por algumas garotas no campo pelo fato de eu ser homem. Essa questão abordarei melhor mais adiante. De forma provisória faço uma adaptação do título (“Sociabilidade, construção de identidade e resistência: uma etnografia sobre a disparidade de gênero em uma competição de breakdance) e começo a escrever o que me estimulou para fazer as mudanças que vem ocorrendo na minha pesquisa.
No dia 3 de agosto de 2019, no município de Rio Tinto/PB, fora sediada a 4ª edição do ‘We Are Hip Hop Potiguara” (nas instalações do Campus IV da UFPB), competição de breakdance promovida pelos integrantes da Crew Clan Potiguara. Na época eu captava imagens para compor meu TCC (uma etnografia audiovisual que fazia um recorte da vida de um bboy da Crew Clan Potigura) e acabei sendo surpreendido após o resultado final da competição em questão; pela primeira vez uma dupla composta por garotas conquista a principal categoria do evento (2 vs. 2). Reforço que tal surpresa não diz respeito a capacidade das bgirls Jack e Pekena, da Soul Brazil Crew (grupo de João Pessoa composto apenas por garotas), mas por elas terem levantado uma discussão sobre a participação das mulheres nos “cambês” de breaking – no fim do projeto exponho a transcrição da discussão que aconteceu após o anúncio do resultado. É importante salientar que o comportamento das garotas foram uma reação a forma que os garotos (os bboys) se expressavam ao competirem contra elas durante o evento (com gestos obscenos e posturas que enfatizavam virilidade).
Praticamente todas as praticantes de breaking, inevitavelmente, abraçam e lutam por uma maior visibilidade feminina dentro de um ambiente majoritariamente masculino. O que busco com essa pesquisa é perceber como se dão as negociações para uma maior aceitação das garotas e como acontece os agenciamentos em relação as questões de gênero no movimento hip hop e nas práticas sociais desses grupos. O projeto foca na experiência e na relação de jovens com um estilo de dança moldado em torno de um estilo de vida juvenil e masculino, como descrito por pesquisadores/as do tema, e que de certa forma afetam a vida e a carreira dessas mulheres.
O breaking, executado por bboys e bgirls (dançarino e dançarina de breakdance, respectivamente), no entendimento de muitos jovens, é uma prática que envolve a construção de identidade e gera um sentimento de pertencimento e para os/as pesquisadores/as das manifestações urbanas é considerada uma das culturas juvenis mais importantes na atualidade. No entanto, mesmo com todo seu alcance global, para a população em geral, os/as integrantes das diferentes crews (grupos) são estigmatizados/as e vistos/as de formas deturpadas. Antes de continuar uma discussão sobre as interlocutoras, é relevante apresentar um breve panorama sobre o tema.
Acredita-se que o movimento hip hop, oriunda das periferias de Nova York (no Bronx), nos Estados Unidos, surge no ano de 1968, com o termo criado pelo Dj Afrika Bambaataa (que se apropriou de passos de uma dança popular na época que consistia em saltos/hop e movimentos de quadril/hip), e serviu como fonte de construção de identidade e status sociais entre jovens de origens latino-americanos e afro-americanos, resultando em uma potente cultura criativa e de relevância social. O hip hop se caracteriza pela junção da dança (o breaking), o graffiti (pintura com spray), o DJ (o disc-jóquei) e o rapper/MC (pessoa que canta sob a base de músicas) e as manifestações de criatividade, originalidade, resistência e protesto que são percebidas em diferentes letras, muros e expressões corporais.
Nas décadas seguintes, o rap e o breaking passaram a ser difundidos também entre jovens da classe média e por pessoas localizadas longe dos grandes centros urbanos, através de um estilo que segue um "mercado de consumo cultural de massa" com músicas e roupas que agregam reconhecimento e pertencimento a um grupo. A música (no caso, o rap) evoluiu de um contexto de marginalização e estigmatização para um cenário mainstream (de alcance global) através do interesse de grandes gravadoras.
A dança (o breaking), por sua vez, ganha uma maior visibilidade a partir de filmes lançados no início da década de 1980', como “Beat Street” (1984) ou “A Loucura do Ritmo" (título recebido no Brasil) que, além de popularizar a dança, por contar com atores profissionais e conhecidos pelo público, gerou uma distinção entre as pessoas de fora (que adotaram o termo dance de rua) e de dentro da cultura do breaking; os de fora passaram a perceber a prática como algo simplesmente ligado o mundo da rua (e toda a sua problemática) enquanto os jovens dançarinos criavam uma imagem positiva, ligada a autoestima.
Pode-se afirmar que o breaking é aprendido através da interação e tal mediação (seja pela mídia ou do contato direto com outras pessoas) gera uma estética, possível através de uma negociação entre uma identidade pessoal e coletiva. As associações/filiações de jovens com uma determinada crew (e dessa com outros grupos) resultam em estilos com bases em vivências comuns. Para a antropologia, as práticas culturais dos jovens são vistas como um importante instrumento de socialização, capaz de possibilitar um ambiente de criação, reflexão e fortalecimento de vínculos, gerando uma identidade entre os/as participantes de um dado grupo que transmitem valores que passam a ser herdados pela cultura.
O projeto, nesse ponto, se justifica também na tentativa de levantar uma discussão no que concerne as questões urbanas dando um maior protagonismo a esses/as jovens que são capazes de ressignificarem os espaços por onde circulam, longe de um entendimento sobre a cidade como algo estritamente pensada na circulação e interesses econômicos. Tendo o break como uma prática relacionada a cultura juvenil e oriunda dos grandes centros urbanos, tal atividade e seus atores adquirem relevância fundamental quanto as dimensões socializadoras do mundo da rua.
O hip hop por seu caráter contestador e lugar de (re)afirmamento de minorias (pobres, e negros, principalmente) promove uma intervenção que parte de uma tomada de consciência dos jovens como agentes transformadores e atuantes na cidade. A importância dos encontros (seja em apresentações públicas, cyphers/rodas e batalhas/competições com crews diferentes) promove e fortalece valores comuns de grupos de diferentes localidades com interesse comum, gerando trocas de conhecimentos, levantando discussões quanto à inclusão cultural, cidadania, além de expor para todaa população outras possibilidades criativas, democratizando e dando sentido aos espaços públicos e possibilitando também discussões sobre gênero.
Com a pandemia surge um dilema para muitos/as pesquisadores/as que seria pensar no seu campo e extrair algo durante o período de isolamento social. No meu caso: como investigar um fenômeno das ruas através da internet? As redes sociais sempre se mostraram como um espaço de coletas de informações relevantes para a minha pesquisa. Os/as meus/minhas interlocutores/as sempre as usaram para divulgação dos eventos, compartilhamento de vídeos de treinos e apresentações e até mesmo como espaço de reivindicações de não reconhecimento e apoio dos políticos locais, porém quase sempre não me atentava em destacá-las na metodologia. Nos últimos meses venho pensando o quanto a internet não se limita a um espaço de consumo, mas de produção e partilha.
As etnografias virtuais (virtual não no sentido de descolada do real, mas simultâneo e interdependente da vida das pessoas) revelam as redes sociais como um território propício ao anonimato (assim como percebido nas grandes cidades), mas também de disputas entre grupos, como espaços de expressão, entretenimento, circulações, encontros e relações. Diante desse contexto, penso em abordar os atravessamentos da pandemia na minha pesquisa, refletindo sobre os trânsitos que essas jovens constroem/circulam nas redes sociais. Com isso:
2. OBJETIVOS
Através de uma reflexão em torno do breaking como ferramenta de intervenção social e resistência entre os jovens e, nesse caso, com foco na disparidade de gênero e considerando o contexto de isolamento social, o projeto visa:
2.1. OBEJTIVO GERAL
· Analisar a desigualdade de gênero em um campeonato de breakdance (a partir da análise das imagens captadas do último evento sediado pelo Clan Potiguara e possivelmente em uma competição que ocorra nas redes sociais) e como acontece o processo de socialização entre as mulheres nesse contexto.
2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS
· Observar como se dão as tensões a respeito de questões sociais predominantes e de gênero;
· Analisar, a partir do acompanhamento dos treinos e eventos (virtuais), as estratégias de apropriação e ressignificação dos espaços públicos pelas garotas;
· Documentar as ações dessas mulheres para tornar essa prática mais inclusiva, se atentando as especificidades locais; e
· Colaborar para uma leitura sobre a juventude e gênero tendo como base o entendimento que as interlocutoras fazem dos temas.
METODOLOGIA
A metodologia está baseada na pesquisa de campo e no método clássico da observação participante. Geertz (1989), reconhece nessa metodologia, uma relação fundamental entre o apreender e o analisar estilos de vida, comportamentos, crenças, hábitos, práticas e regularidades de um dado grupo. Para explorar esta multiplicidade de acontecimentos sociais, a etnografia é o instrumento principal de pesquisa na cidade, nesse caso, ao observar os espaços por onde circulam minhas interlocutoras, pude perceber “onde estão seus pontos de encontro e ocasiões de conflito, e os parceiros com quem estabelecem relações de troca” (Magnani, 2002, p. 177). Desta forma, é preciso também analisar os contextos sociais, econômicos, políticos, culturais em que estas jovens estão inseridas.
Paralelamente ao trabalho de “estar lá”, observando suas experiências sociais, o de “estar aqui” fora guiado por uma pesquisa bibliográfica sobre os temas abordados. Além de um levantamento bibliográfico a respeito de categorias que percorrem a pesquisa: comunidade, sociedade, cidade, sociabilidade, juventude, etnicidade, identidade gênero e alteridade, entre outras possíveis questões apontadas pelas interlocutoras. O trabalho de campo acontecerá paralelamente ao levantamento bibliográfico de pesquisas realizadas sobre culturas juvenis, gênero e antropologia urbana. Assim, se reconhecendo os caminhos percorridos por etnografias anteriores será possível elaborar novos percursos a serem trilhados.
A partir do material audiovisual produzidos anteriormente e das anotações no diário de campo, por meio do levantamento e mapeamento das pessoas envolvidas e suas práticas sociais e culturais, serão feitas interpretações teóricas sobre o trabalho de campo, permitindo, assim, realizar diálogos entre a prática e a teoria e posteriormente apresentar uma abordagem teórica que auxilie na compreensão das dinâmicas de sociabilidade e as demarcações das diferenças de gênero. Dito isto, faço uma ressalva da íntima relação da teoria e trabalho de campo, pois é por meio dessa última que “a teoria antropológica se desenvolve e se sofistica, quando desafia os conceitos estabelecidos pelo confronto que se dá entre i) a teoria e o senso comum que o pesquisador leva a campo e ii) a observação” dos atores sociais que se estuda (Peirano, 1992, p. 8).
Diferente de outras disciplinas, não se espera uma consistência metodológica previamente estabelecida e o método passa também a ser apreendida no decorrer do campo. No contexto de isolamento social, as observações nas redes socais das interlocutoras e entrevistas semiestruturadas farão parte da pesquisa. Por fim, será utilizado como metodologia a abordagem situacional, da qual é possível destacar e observar uma dada situação vivenciada na cidade durante seu processo. No caso especifico dessa pesquisa, destaco a batalha de break organizada pelos integrantes do Clan Potigura (e possivelmente virutal), intitulado “We are hip hop potigura” (além de treinos e cyphers), levando em conta as possibilidades disponíveis por conta da pandemia (destaco o surgimento de eventos que ocorrem inteiramente pela internet e também a análise de materiais audiovisuais captados anteriormente por mim. Tal metodologia “consiste em isolar intelectualmente um acontecimento ou um conjunto de acontecimentos a fim de facilitar uma análise coerente" (AGIEL, 2011, p. 74).
Além das entrevistas e da análise das competições, com a pandemia uma importante estratégia utilizada como método para a coleta de dados na pesquisa consiste na observação do cotidiano (PAIS, 2003), através das redes sociais (mais especificamente o instagram), como alavanca para o conhecimento da realidade. Acredito que através de coisas aparentemente banais podemos ter acesso a explicações sobre algo mais global.
Outros pontos a serem considerados
Mantenho contato com a única crew ativa do município de Rio Tinto (litoral norte da PB), desde fevereiro de 2016, quando, quando ainda era graduando de antropologia da UFPB/Campus IV. Fui convidado por uma integrante (Sís) para fotografar uma cypher que também contou, além do pessoal do Clan Potiguara, com a participação de alguns b-boys da cidade de Mamanguape. Atualmente, o grupo não conta mais com uma rotina de ensaios/treinos e os encontros que acontecem entre todos os integrantes acabam se dando em contextos não restritos ao universo do break. Até então o meu foco de pesquisa se concentrava nos seis integrantes (entre eles, apenas uma garota) da crew. 
Minha inserção no campo foi fácil por eu ter contado com o apoio de uma das integrantes do grupo e os demais terem me reconhecido como um fotógrafo; condição que era do interesse deles já que eu poderia repassar posteriormente pra eles as imagens captadas. No dia seguinte ao primeiro contato, por exemplo, a maioria dos bboys presentes naquela noite me procuraram através das redes sociais para pedirem fotos e vídeos deles. Em todas as edições do We Are Hip Hop Potigura eu fui o fotógrafo oficial do evento, além de ter produzido alguns vídeos clipes de um dos bboys que se tornou cantor de rap.
A antropologia (assim como outras áreas de conhecimento acadêmico) é pautada por demandas políticas e tendências morais que ignorando, muitas vezes, a ideia de que as pessoas são atores ativos da própria história. E também sabemos que a distinção de gênero a partir da comparação do sexo é usado como manobra política de afirmação do poder em inúmeros contextos sociais. No breaking a disparidade é percebida pela poucaparticipação de garotas nos grupos e normalmente sua presença é vista sem tanto protagonismo (durante os quatro anos que acompanhei a Crew Clan Potigura apenas uma garota fez parte do grupo, a Bgirl Sís, que por conta da maternidade parou de treinar com os demais integrantes). Além disso, sua inclusão depende, quase sempre, de um aporte masculino, como através de um namora bboy, por exemplo. Uma exceção notável são as crews que surgem em contextos universitários (algumas das minhas interlocutoras são graduadas em dança, pele UFPB) e voltados para garotas ou de alguma rede social voltada para as questões das mulheres.
Essa afirmação do poder do macho também é percebida e relatada por bgirls em relação aos gestos com significados sexuais explícitos que alguns bboys reproduzem durante as batalhas de breaking. Para os praticantes esses movimentos são simplesmente uma forma de provocação lançada contra seus adversários, independente do gênero, e que se limita apenas ao momento da competição. Para alguns, é visto como “fundamento” como qualquer outro passo específico da dança (assim como relatado na discussão que ocorreu na competição que eu cobri em 2019). Porém as garotas são enfáticas ao afirmarem que se adotassem a mesma postura que os garotos resultariam numa possível condenação social pelo público presente.
Nesse mesmo contexto, alguns bboys afirmaram, simplesmente, que desde o surgimento do breaking que as coisas são assim. A partir disso as garotas presentes levantaram uma questão quanto as transformações sociais que ocorreram nesses cinquenta anos de história do movimento hip hop e que de certa forma tornaram essa prática mais inclusiva. No que concerne a história, sempre houve um discurso de que nada pode ser alterado no passado. Mas essa defesa reforça o quanto a história da humanidade seria uma construção social que acaba privilegiando certos grupos em detrimento de outro. 
Entre as minhas interlocutoras residentes em Rio Tinto (a Bgirl Sís, única integrante da crew; Michelly, que é namorada do Bboys Aleff; e Ninha, esposa do do Bboy e Rapper Junior Roc) a colaboração para a pesquisa vem acontecendo sem nenhuma resistência. Já entre as bgirls da Soul Brazil Crew, através da Bgirl Jack e Bgirl Pekena as coisas tão sendo mais difíceis. Observo os compartilhamentos das atividades delas no instagram, já interagi em algumas lives que elas participaram e venho mandando mensagens para as duas, mas apenas Pekena, vez ou outra, me responde. Na última conversa que tivemos ela me passou o número do whatsapp e já ciente que Marco Aurélio (conhecido como pesquisador do hip hop na cidade de João Pessoa) era meu orientador e das minhas intenções (que é saber delas sobre a participação das garotas nas competições e no que consiste as dinâmicas nos grupos compostos estritamente por mulheres) ela me respode:
Vou precisar falar com Jack pra vê o que ela acha de tudo mais. Mas fico refletindo, pq vcs são homens e vão falar de nossa visão, acho potente mas ao mesmo tempo fico um pouco pensativa... pq acho que os caras (bboys) tbm precisam ser ouvidos, mas no sentido para colocar eles pra refletirem, saca? pq são muitas vezes passivos em situações como aquela. Ano passado foi bem foda, pq aconteceu mais de uma vez situações como aquelas. Uma coisa é apoio depois do acontecido, outra coisa é quando acontece o babado rs. Só pra refletir.
Logo após essa resposta eu pensei que teria que abandonar a ideia de escrever uma dissertação sobre mulheres e imediatamente mandei mensagem para meu orientador. Enquanto ele não me respondia fiquei refletindo que tudo aquilo que ela me escreveu e todas as situações que eu vivi/vivo por conta da pesquisa já são fontes de informações que o campo me traz. Mas a partir desses questionamentos venho refletindo sobre o lugar de fala nas pesquisas sociais, como também sobre questões de classe e escolaridade. As garotas do grupo Soul Brazil Crew, moradoras de João Pessoa, graduadas em dança, pesquisadoras, arte educadoras, feministas etc, nos trazem essas questões enquanto pessoas em outros campos nunca me questionaram.
Paralelo a isso, alguns bboys do Clan Potiguara, em relação a questão levantada pelas bgirls, apresentam uma postura parecida com a maioria dos garotos presentes na última competição e de alguma forma me cobram um engajamento conforme o que eles pensam sobre o caso. Recentemente o Bboy Aleff me mandou uma mensagem pelo whatsapp:
Tu viu o lance que tá rolando na net? Uma polêmica com o breaking. Rolou até racismo no meio. Queria até trocar essa ideia com tu, mas era melhor pessoalmente. É uma parada parecida com aquela que teve no evento aqui. Com as meninas. Igual no caso (...) mas foi em uma batalha que rolou há 7 anos atrás, ai foi exposto essa semana. Foi uma bgirl de Portugal que fez essa parada com um bboy brasileiro. Mas foi ela que praticou o racismo e quis expor aquele lance dos barnnes que houve o lance aqui no evento, dos gestos que os boys fazem. Tanto pra bboys ou bgirls. Ela expos isso e ainda praticou o racismo. 2 coisas errada ela fez. Quer ser vítima e quis difamar a carreira do bboy luan. Se ela quis criticar os barners pq ela não expos isso a 7 anos atras que foi quando aconteceu. Mas esse lance desses gestos ai pow é uma parada da cultura rocking e tds bgirls fazem. Ela mesmo faz. É uma parada complicada de se discutir. Ela acabou se prejudicando com essa exposição que fez. No rocking e no breaking sempre teve isso, é uma forma de atacar o adversário sem haver contato. Aí vai da postura de cada um. Quem ataca será atacado. Ai a bgirl natya foi lá expos o gesto do luan fazendo os barners e ainda disse que ele tava parecendo um macaco enjaulado. Foi foda isso. Ela se prejudicou dms. A comunidade td do hip hop, breaking em si, criticou ela. Ela bloqueou geral do insta pra n marcarem ela nas postagens. Mas esses lances de elas quererem mudar os fundamentos de uma cultura é errado pow. E o mais foda é vc lutar por uma parada e vc mesmo praticar (...) só quem ficou do lado dela foi a crew. E olhe lá.
Li todo o comentário e perguntei qual era a opinião dele:
Sobre a minha opinião nisso. Vc pode até pensar que sou machista. Mas tipo. Há um lance de feminismo nisso. Mas em minha opinião, pelo conhecimento que tenho, eu acho errado elas quererem mudar isso fazendo a pratica tb. Queria ter um conhecimento mais aprofundado nisso ai, mas aqui falta muita informação tb. Como eu falei, eu teria que entrar em um papo com pioneiros.
Esses pontos com certeza ganharão destaques em minha pesquisa, mas pensando em questões éticas não sei ainda como irei expor. Penso em modificar os nomes, mas isso se eu não conseguir a autorização. De certa forma os trechos destacados aconteceram em conversas e talvez não encaradas como contextos de pesquisa pelos/as interlocutores/as. De qualquer forma, penso em realizar uma etnografia que discuta sobre questões de gênero e acredito que esse campo me oferece essa possibilidade.
REFERÊNCIAS (referentes a metodologia)
AGIER, Michel. Antropologia da cidade: lugares, situações, movimentos. São Paulo, Editora Terceiro Nome, 2011.
GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas. - Rio de Janeiro: Ed. Guanabara, 1989.
MAGNANI, José Guilherme Cantor. De Perto e de Dentro: notas para uma etnografia urbana. - São Paulo: Revista Brasileira de Ciências Sociais. v. 17, n. 49. - São Paulo, 2002.
PAIS, José Machado. Vida Cotidiana: enigmas e revelações. São Paulo: Cortez Editora, 2003.
PEIRANO, Mariza G. S. Uma Antropologia no Plural: Três Experiências Contemporâneas. - Brasília, Editora da Universidade de Brasília, 1992.
Transcrição das falas e elato da discussão que ocorreu após a vitória da dupla composta pela Bgirl Jack e Bgirl Pekena, na 4ª edição do We Are Hip Hop Potiguara (Rio Tinto, agosto de 2019):
Termina a batalha e mesmo antes do anuncio da dupla ganhadora pelos jurados a Bgirl Jack pede para falar algo.
Escuta-se um bboy (em tons de deboche): “com a palavra...” e “no toch, no toch...”; silenciada pelo garoto, eladesiste de falar.
Aleff (um dos integrantes da Crew Clan Potiguara e mestre de cerimônia na ocasião) pede para os jurados revelarem os votos e, por unanimidade, os três deram a vitória para a dupla da Soul Brazil Crew.
Visivelmente, assim que os jurados anunciaram a dupla vencedora da batalha, alguns bboys não aplaudiram (e alguns demoraram a aplaudir)
Elas são abraçadas por alguns colegas (um deles chega a carrega-las nos braços), mas visivelmente, embora com riso, estavam revoltadas. Alguns bboys se solidariam com a dupla que ficou com a segunda colocação no campeonato... e as meninas pedem, mais uma vez, para passar um recado. Munida com o microfone, a Bgirl Jack diz:
“teve uma vez que eu perguntei a um bboy por que que ele fazia tantos gestos obscenos quando as mulheres, principalmente, iam dançar. Esse bboy olhou pra mim e falou: ‘porque é fundamento’. E aí eu deixo uma questão pra todo mundo aqui que for pra casa: é fundamento? eu ‘mostrar o meu instrumento fálico’. Como todo mundo tem um ego de mostrar sua ‘virtude’ nisso! Então eu deixo essa questão pra todo mundo. Certeza que vocês não iriam fazer esse movimento pra mãe de vocês, pra irmã de vocês, pra tia de vocês, então...”
Nesse momento sua voz fica inaudível já que parte do público aplaude, assobia e gritam em apoio e outra parte contesta o que fora dito: “faz parte da dança", diz um boy.
Enquanto ela e Bboy Artista (integrante de uma crew de João Pessoa e que no ano anterior havia conquistado dois prêmios na competição) discutem, um outro bboy toma o microfone dela e diz: “oh, escuta um pouquinho, isso todos bboy faz isso (esticando o braço e repetindo o gesto que fora contestado), eu faço, todos, todos, só isso" Bboy Artista pega o microfone e diz: "a dança original que o hip hop, não o breaking, não nada, o hip hop como cultura se originou se chama rock (???) ela é uma dança... grita das ruas... “Posso falar?” pede Bgirl Pequena. Enquanto isso a Bgirl Jack o aplaude de forma irônica. Bboy Artista questiona: “Jack eu bati palma pra tu quando tu tava falando?”, ela diz: “vá, fale, fale! Você é o rei" e alguma garota diz: “respeite o cara” ele diz mais algumas coisas e sai revoltado. Pequena pega o microfone e diz:
“Pessoa, eu quero dizer pra gente pensar mesmo; há vários anos atrás quem era podre, quem era preto, e quem era o que for, não tinha oportunidade! (alguém tenta sobrepor a sua voz e ela pede com a mão um tempo para a pessoa parar pra ela continuar o raciocínio e diz mais alto) E isso aqui o que é? A gente mudou, com muita gente mudou, muita gente sofreu pra mudar, então isso é uma questão, certo? Eu não tou dizendo o que é certo o que é errado, mas isso é pra pensar como ela falou, é pra pensar, é só isso, é só isso, é só isso”.
Um dos integrantes da dupla que ficou em segundo lugar pega o microfone: “pessoal, pessoal, eu não quero desrespeitar ninguém com isso, mas...” começa um tumulto e dessa vez Bboy Artista questiona o fato da dupla de bgirls também terem feito gestos que se referiam a uma vagina: “tu fizesse assim, ó!” (diz ele fazendo o gesto) e ela, bem enfática: "a buceta é minha, minha!”, ele, empurrado por uma garota e também afastado por um colega, se sai afirmando: “tu errou”.
O boy com o microfone continua:
“se de alguma forma a minha crew fez um gesto que de fato... é... que de fato insultou, eu peço desculpas (...), mas de antemão eu acho que tem que ter cuidado com as interpretações que a gente faz, certo? Eu acho que pra todo mundo, entendeu? Eu acho que parabéns para as meninas, para o evento... valeu”
Aplausos
Um colega da crew do Bboy Artista abraça a Bgril Piquena.
Com os ânimos mais tranquilo a Bgirl Jack diz: 
“Eu dedico essa conquista à todas as mulheres que estavam aqui presente e não conseguiram entrar na cypher porque estavam com vergonha, estavam tímidas, mas a gente conseguiu abrir uma cypher pra se divertir como todo mundo tava se divertindo! Vocês são incríveis e a gente dedica, eu e Penquena e toda a Soul Brazil Crew, a vocês (apontando os troféus para as garotas presentes), vocês podem.
E sai sob aplausos.
Em seguida, o pré-projeto defendido na última seleção de mestrado do PPGA, da UFPB.
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS APLICADAS E EDUCAÇÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL
SOCIABILIDADE, CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE E RESISTÊNCIA ENTRE JOVENS PRATICANTES DE BREAKING DANCE: UMA ETNOGRAFIA DO CLAN POTIGUARA
LUIZ CARLOS DE LIMA DO NASCIMENTO
LINHA DE PESQUISA: ETNOGRAFIAS E SOCIABILIDADES URBANAS
JOÃO PESSOA
OUTUBRO/2019
SOCIABILIDADE, CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE E RESISTÊNCIA ENTRE JOVENS PRATICANTES DE BREAKING DANCE: UMA ETNOGRAFIA DO CLAN POTIGUARA
Projeto de pesquisa apresentado à Comissão de Seleção do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal da Paraíba – UFPB.
Luiz Carlos de Lima do Nascimento
Etnografias e Sociabilidades Urbanas
JOÃO PESSOA
OUTUBRO/2019
1. INTRODUÇÃO
O breaking, executado por bboys e bgirls, no entendimento de muitos jovens, é uma prática que envolve a construção de identidade e gera um sentimento de pertencimento. Para alguns pesquisadores, o breaking é considerada uma das culturas juvenis mais importantes na atualidade. No entanto, mesmo com todo seu alcance global, para a população em geral, os integrantes de diferentes crews (grupos) são estigmatizados e vistos de formas deturpadas. O objetivo dessa pesquisa (que teve início na graduação em antropologia) é colaborar na construção de um maior conhecimento dessa identidade a partir do acompanhamento dos integrantes do Clan Potigura, moradores da cidade de Rio Tinto, Paraíba.
Antes de continuar uma discussão sobre os interlocutores, é relevante apresentar um breve panorama do contexto histórico e teórico a partir de pesquisas anteriores sobre o tema. O movimento hip-hop, oriunda das periferias de Nova York (no Bronx), nos Estados Unidos, surge na década de 1970 como fonte de construção de identidade e status sociais entre jovens de origens latino-americanos e afro-americanos, que resulta em uma potente cultura criativa e de relevância social. Segundo Zeni (2004), o hip-hop se caracteriza pela junção da dança (o breaking), o graffiti (pintura com spray), o DJ (o disc-jóquei) e o rapper/MC (pessoa que canta sob a base de músicas) e as manifestações de criatividade, originalidade, resistência e protesto são percebidas em diferentes letras, muros e expressões corporais.
Nas décadas seguintes, o rap e o breaking passaram a ser difundidos também entre jovens da classe média e por pessoas localizadas longe dos grandes centros urbanos, através de um estilo que segue um "mercado de consumo cultural de massa" (SPOSITO, 1994, p. 167) com músicas e roupas que agregam reconhecimento e pertencimento a um grupo. A música (no caso, o rap) evoluiu de um contexto de marginalização e estigmatização para um cenário mainstream (de alcance global) através do interesse de grandes gravadoras.
A dança (o breaking), por sua vez, ganha uma maior visibilidade a partir de filmes lançados no início da década de 1980', como “Beat Street” (1984) ou “A Loucura do Ritmo" (título no Brasil), que além de popularizar a dança, por contar com atores profissionais e conhecidos pelo público, gerou uma distinção entre as pessoas de fora (que adotaram o termo dance de rua) e de dentro da cultura do breaking; os de fora passaram a perceber a prática como algo simplesmente ligado o mundo da rua (e toda a sua problemática) e os jovens dançarinos criavam uma imagem positiva, ligada a autoestima. Além disso, apesar da proliferação global dos elementos da cultura hip hop, a pesquisa acadêmica sobre a breaking é bastante limitada.
O Clan Potiguara tem sua origem com o grupo “Street Furry Crew (antes também chamado de “Street Of Power”), que reunia alguns jovens do centro da cidade que ouviam e criavam coreografias para músicas pop dos EUA (sucesso nas rádios FMs da época).Alguns integrantes, nessa época, já introduziam alguns elementos de danças característicos do breaking e, paralelo a essa formação, decidiram montar, juntos com alguns rapazes (moradores de um bairro mais afastado do centro – a Vila Regina – interessados no breaking), o “The Search Perfect Beat Crew” (ou TSPBC - “À Procura da Batida Perfeita”) que buscou fortalecer e difundir o hip hop em Rio Tinto. O Clan Potiguara (segundo os integrantes, o nome se dá pelo fato do grupo se econtrar numa demarca indígena potiguara) se mostra como um campo propício para se discutir questões de raça, geração, classe social e gênero (a crew conta com apenas uma garota como integrante).
Pode-se afirmar que o breaking é aprendido através da interação e tal mediação (seja pela mídia ou do contato direto com o outro) gera uma estética, possível através de uma negociação entre uma identidade pessoal e coletiva. As associações/filiações de jovens com uma determinada crew (e dessa com outros grupos) resultam em estilos com bases em vivências comuns de socialização. Não há como discordar que os estilos de movimentações na dança e as roupas usadas pelos bboys e bgirls tenham influências dos EUA, mas nas diferentes localizações, a cultura hip hop se constitui, para os jovens, como uma forma de encontro (aonde não apenas reconstroem uma imagem a partir da apropriação de roupas e práticas corporais).
Para a antropologia, as práticas culturais dos jovens são vistas como um importante instrumento de socialização, capaz de possibilitar um ambiente de criação, reflexão e fortalecimento de vínculos, gerando uma identidade entre os participantes de um dado grupo e transmitindo valores da cultura herdade (Bourdieu, 2006). O projeto, nesse ponto, se justifica também na tentativa de levantar uma discussão no que concerne as questões urbanas dando um maior protagonismo a esses jovens que são capazes de ressignificarem os espaços por onde circulam, longe de um entendimento sobre a cidade como algo “à parte de seus moradores: pensada como resultado de forças econômicas transnacionais, das elites locais, de lobbies políticos, variáveis demográficas, interesse imobiliário e outros fatores de ordem macro (...) desprovido de ações, atividades, pontos de encontro, redes de sociabilidade” (MAGNANI, 2002, p.14). Tendo o break como uma prática relacionada a cultura juvenil e oriunda dos grandes centros urbanos tal atividade e seus atores adquirem relevância fundamental quanto as dimensões socializadoras do mundo da rua.
O hip hop surge na periferia e, chegando nos grandes centros, passa a ser reivindicado por jovens de diferentes localidades e classes sociais, como os integrantes do Clan Potiguara; nome (diferentes das demais grupos que empregam palavras em inglês) que tem relação com a demarcação de terras indígenas potiguara na região. Esse exemplo faz refletir como “os atores sociais com suas especificidades (determinações estruturais, símbolos, sinais de pertencimento, escolhas, valores etc.), assim como o espaço com o qual interagem – mas não na qualidade de mero cenário, e sim como produto da prática social acumulada desses agentes, e também como fator de determinação de suas práticas - , constitui, assim, a garantia (visível, pública) de sua inserção no espaço”. (MAGNANI, 2005, p. 177). Com isso, é relevante criar um entendimento a respeito da cidade, sua apropriação e tensões, a partir das práticas comuns e o compartilhamento de informações geradas entre esses jovens?
O hip hop por seu caráter contestador e lugar de (re)afirmamento de minorias (pobres, e negros, principalmente) promove, com a ocupação dos espaços públicos pelos bboys ou com a presença de um grafite/pixação em uma parede, uma intervenção que parte de uma tomada de consciência dos jovens como agentes transformadores e atuantes na cidade. A importância do encontro desses jovens (seja em apresentações públicas, cyphers/rodas e batalhas/competições com crews diferentes) promove e fortalece valores comuns de grupos de diferentes localidades com interesse comum, gerando trocas de conhecimentos, levantando discussões quanto à inclusão cultural, cidadania, além de expor, para toda a população, outas formas/possibilidades de criatividade/arte, além de democratizar e dar sentido aos espaços públicos.
2. OBJETIVOS
Através de uma reflexão em torno do breaking como ferramenta de intervenção social e resistência entre os jovens da crew Clan Potiguara, o projeto visa, a partir das especificidades do grupo pesquisado:
2.1. GERAL
· Descrever como se dá o processo de socialização entre tais jovens e como, a partir disso, eles criam um entendimento no que concerne aos processos identitários.
2.2. ESPECÍFICOS
· Observar como se dão as tensões com questões sociais predominantes;
· Analisar, a partir do acompanhamento dos treinos e eventos, as estratégias de apropriação e ressignificação dos espaços públicos;
· Construir uma leitura sobre a juventude (que contribua com a antropologia urbana) através de como esses interlocutores ocupam e entendem a cidade; entre outros.
3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Rio Tinto
Os integrantes do Clan Potigura são moradores da cidade de Rio Tinto. A seguir, é exposto um breve resumo com dados demográficos e históricos sobre a localização aonde se dará o campo:
O município está localizado no litoral norte do estado da Paraíba, nas proximidades da região denominada de Vale do Mamanguape (embora pertença a Região Metropolitana de João Pessoa), e sua população, segundo o último levantamento do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) é estimada em aproximadamente 25.000 habitantes, em uma área de 466 km². Sua emancipação se deu em 6 de dezembro de 1956, mas sua construção data do ano de 1917, com a implantação de uma fábrica de tecido em território potiguara. Esses, segundo Cardoso e Guimarães,
fazem parte dos povos da família linguística Tupi. Hoje, falam o português e estão revitalizando o tupi na educação escolar indígena. E como todos os povos que vivem no Nordeste, possuem uma longa história de contato com a sociedade não indígena. Com uma população de aproximadamente 19 mil indígenas entre habitantes das aldeias e das cidades de Baía da Traição, Marcação e Rio Tinto, os Potiguara se concentram numa área do litoral norte paraibano situada entre os rios Camaratuba e Mamanguape (2012, pág. 15).
Por descender de grupos sociais controlados historicamente por diferentes regimes políticos, desde o regime colonial, a organização do povo potiguara (bem como seus sistemas classificatórios e simbólicos) sofreu grandes interferências. Mas, ainda segundo Cardoso e Guimarães,
A bibliografia e os documentos sobre a história do atual Estado da Paraíba evidenciam, desde as notícias mais remotas após o descobrimento do Brasil, à presença dos Potiguara no litoral paraibano (...) As terras dos Potiguara, em sua história mais recente, foram ocupadas por grandes proprietários, dentre eles a poderosa família Lundgren, donos da Companhia de Tecidos Rio Tinto (CTRT), conhecida no Brasil inteiro por meio da cadeia de lojas Casas Pernambucanas, acelerando o processo de invasão do território indígena e de destruição dos ambientes (2012, pág. 15-16).
Somente na década de 1980 é que o processo de demarcação das terras potiguaras ganhou corpo. Nessa época também a CTRT finda suas atividades na região. Mesmo assim, a influência e o poder da família Lundgren ainda é presente na cidade. Reuniões e protestos dos moradores das residências ao redor da antiga fábrica (parentes ou ex-funcionários que se instalaram na cidade por conta do trabalho) acontecem periodicamente por ainda pagarem uma taxa mensal (uma espécie de aluguel) e por não possuírem a posse de suas casas.
As transformações mais recentes na cidade aconteceram, principalmente, após a implantação do campus IV, da UFPB, possível graças aos recursos do Reuni (Programa de apoio a planos de reestruturação e extensão das Universidades Federais) e ao programa institucional Expandir. O novo centro (dividido com a cidadede Mamanguape), inaugurado em 2006, ocupa parte das instalações físicas da antiga CTRT. Desde o início das atividades, a cidade atraiu a vinda de estudantes de diferentes cidades do país, mas sem oferecer uma ampla estrutura de lazer e/ou espaços públicos.
Sociabilidade e cidade
Magnani (2005) aponta para um entendimento quanto aos espaços públicos que vai além da convivência de pessoas apenas no seu anonimato, numa relação que não requer comunicação/interação entre elas na circulação. O que interessa ao autor é a sociabilidade, que diz respeito a relação entre indivíduos que compartilham interesses comuns e se entendem enquanto grupo e não, simplesmente, na mera condição de estarem no mesmo ambiente. A passagem desses jovens pelos diferentes espaços, seria chamado de circuito e a ideia de "pedaço" é caracterizado por um determinado local (dentro de um espaço maior - a praça, o bairro, a cidade, etc.) que passa a ganhar um sentido organizador entre os membros de um grupo resultando numa "sociabilidade básica, mais ampla que a fundada nos laços familiares, porém mais densa, significativa e estável que as relações formais e individualizadas impostas pela sociedade” (MAGNANI, 1998, p. 116). 
No processo de socialização esses jovens acabam construindo significados que passam a ser compartilhados e que, de certa forma, transformam suas realidades/relações a partir de negociações do que passa a ser gerado por cada um. Para Barth (2000), os contrastes culturais e o sentimento de pertencimento dizem respeito a como esses indivíduos se diferenciam dos demais grupos, criando fronteiras. A criação da identidade surge num espaço "diacrítico" que corresponde a demarcação das diferenças na comparação com aqueles que estão fora. Ao se sentirem parte de um coletivo, esses jovens aumentam a autoestima e encorajam os demais a contornarem os problemas de seu dia-a-dia. 
A maioria das crews (mesmo em grandes centros urbanos) expõem a precariedade ou a falta de lugares para treinar e, com isso, passam a ocupar espaços sem nem ao menos possuírem autorização. Tal dificuldade provoca eventuais tensões e negociações com grupos hegemônicos e até mesmo reivindicação na prefeitura por espaços de lazer. Segundo Harvey, “o direito à cidade (...) não é apenas um direito condicional de acesso àquilo que já existe, mas sim um direito ativo de fazer a cidade diferente, de (...) definir uma maneira alternativa de simplesmente ser humano. Se nosso mundo urbano foi imaginado e feito, então ele pode ser reimaginado e refeito” (HARVEY, 2013, p. 33).
Num entendimento interacionista simbólico (GOFFMAN, 2009), as pessoas que compartilham ideias (valores, crenças), objetos (roupas) e práticas (linguagens, posturas corporais) se diferenciam de uma cultura maior. Dentro de uma (sub)cultura, ao pertencerem a um grupo, os bboys e bgirls conduzem suas posturas e aparências através de recursos simbólicos e materiais que encontram a sua disposição. A partir das demarcações de diferenças e exclusões delineiam identidades. Para Goffman (2009), a interação é vista como um processo dramático de ordem social. Como drama, é encarado pelo autor como uma encenação/apresentação que gera impressões. Diante disso, os integrantes de um grupo passaram pelo conhecimento sobreas atividades, se juntam a outros indivíduos, adotam e internalizam normas, ideias, objetos, práticas e expectativas (todas compartilhadas), são aceitos pelos demais membros e experimentam experiências.
O uso dos termos “juventude” e “jovem” são usados na tentativa de enquadrar meus interlocutores em relação a questões geracionais. Segundo a UNESCO (2004), a juventude compreende um período de transição de uma pessoa da infância para a fase adulta. Em um entendimento mais diversificado e menos rígido, Pais (2003) nos apresenta a “juventude” como processos (re)inventados cotidianamente e fruto de diferentes formas de ser e estar em sociedade. Ou seja, as “culturas juvenis” correspondem um conjunto de práticas e crenças compartilhado por determinados grupos constituídos por jovens que acabam os diferenciando dos demais.
Esta pesquisa tem como foco a observação de um grupo de bboys e bgirl (praticantes do break dance); controversos, polêmicos e contestadores, como são entendidos pelo senso comum, mas que cada vez mais ocupam espaço e visibilidade nas cidades de todo o mundo. Como comentado anteriormente, esse campo (que começou durante a graduação em antropologia) se mostra propício para refletir, além dos temas de interesses iniciais do projeto, questões de gênero, raça, classe social, entre outros.
4. METODOLOGIA
Primeiramente, é mantido do projeto original sua metodologia que está baseado na pesquisa de campo e no método clássico da observação participante. Geertz (1989), reconhece nessa metodologia, uma relação fundamental entre o apreender e o analisar estilos de vida, comportamentos, crenças, hábitos, práticas e regularidades de um dado grupo. Para explorar esta multiplicidade de acontecimentos sociais, a etnografia é o instrumento principal de pesquisa na cidade, nesse caso, ao observar os espaços por onde circulam os jovens do grupo pesquisado, pude perceber “onde estão seus pontos de encontro e ocasiões de conflito, e os parceiros com quem estabelecem relações de troca” (Magnani, 2005, p. 177). Desta forma, é preciso também analisar os contextos sociais, econômicos, políticos, culturais em que estes jovens estão inseridos.
Paralelamente ao trabalho de “estar lá”, observando as experiências sociais dos sujeitos, o de “estar aqui” fora guiado por uma pesquisa bibliográfica e documental a respeito da cidade de Rio Tinto. Além de um levantamento bibliográfico a respeito de categorias que percorrem a pesquisa: comunidade, sociedade, cidade e campo, sociabilidade, juventude, etnicidade, identidade e alteridade. O trabalho de campo acontecerá paralelamente ao levantamento bibliográfico de pesquisas realizadas sobre culturas juvenis e antropologia urbana. Assim, se reconhecendo os caminhos percorridos por etnografias anteriores será possível elaborar novos percursos a serem trilhados.
A partir do material audiovisual produzido e das anotações no diário de campo, por meio do levantamento e mapeamento dos sujeitos e suas práticas sociais e culturais, serão feitas interpretações teóricas sobre o trabalho de campo, permitindo, assim, realizar diálogos entre a prática e a teoria e posteriormente apresentar uma abordagem teórica que auxilie na compreensão das dinâmicas de sociabilidade. Dito isto, faço uma ressalva da íntima relação da teoria e trabalho de campo, pois é por meio dessa última que “a teoria antropológica se desenvolve e se sofistica, quando desafia os conceitos estabelecidos pelo confronto que se dá entre i) a teoria e o senso comum que o pesquisador leva a campo e ii) a observação” dos atores sociais que estuda (Peirano, 1992, p. 8).
Por fim, será utilizado como metodologia a abordagem situacional, aonde é possível destacar e observar uma dada situação vivenciada na cidade durante seu processo. No caso especifico dessa pesquisa, destaco a batalha de break organizada pelos integrantes do Clan Potigura, intitulado “We are hip hop potigura” (além dos treinos e cyphers). Tal metodologia “consiste em isolar intelectualmente um acontecimento ou um conjunto de acontecimentos a fim de facilitar uma análise coerente" (AGIEL, 2011, p. 74).
5. CRONOGRAMA
	ATIVIDADES
	1º BIMESTRE/2020
	2º
	3º
	4º
	5º
	6º
	1º BIMESTRE/2021
	2º
	3º
	4º
	5º 
	6º 
	ANTES DO SEMESTRE LETIVO
	X
	
	
	
	
	
	X
	
	
	
	
	
	DISCIPLINAS
	
	X
	X
	X
	X
	X
	
	
	
	
	
	
	PESQUISA BIBLIOGRÁFICA
	X
	X
	X
	X
	
	
	
	
	
	
	
	
	ORGANIZACAO PESQUISA DE CAMPO
	
	
	X
	X
	X
	
	
	
	
	
	
	
	TRABALHO DE CAMPO
	
	
	
	X
	X
	X
	X
	X
	X
	
	
	
	TABULAÇÃO E DESCRIÇÃO
	
	
	
	
	
	
	X
	X
	X
	
	
	
	ANÁLISE DOS DADOS
	
	
	
	
	
	
	
	X
	X
	
	
	
	PREPARAÇÃO QUALIFICAÇÃO 
	
	
	
	
	
	
	
	X
	X
	
	
	
	REDAÇÃO E CONCLUSÃO
	
	
	
	
	
	
	
	
	X
	X
	
	
	REDAÇÃO FINAL
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	X
	X
	
	DEFESADA DISSERTAÇÃOX
6. REFERÊNCIAS
AGIER, Michel. Antropologia da cidade: lugares, situações, movimentos. São Paulo, Editora Terceiro Nome, 2011.
BARTH, Fredrick. Os Grupos étnicos e suas Fronteiras. In: O Guru, O Iniciador e Outras Variações Antropológicas. - Rio de Janeiro. Contracampo, 2000. (págs. 26-68).
BOURDIEU, Pierre. O camponês e seu corpo. Rev. Sociol. Polit. [online], n. 26. pp.83-92. 2006.
CARDOSO, Thiago Mota; GUIMARÃES, Gabriella Casimiro. (Orgs). Etnomapeamento dos Potiguara da Paraíba. Brasília: FUNAI/CGMT/CGETNO/CGGAM,2012. (Série Experiências Indígenas, n.2)
GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas. - Rio de Janeiro: Ed. Guanabara, 1989.
GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana. Petrópolis: Vozes, 2009.
MAGNANI, José Guilherme Cantor. De Perto e de Dentro: notas para uma etnografia urbana. - São Paulo: Revista Brasileira de Ciências Sociais. v. 17, n. 49. - São Paulo, 2002.
 
PAIS, José Machado. Culturas juvenis. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 2003.
______________________. Vida Cotidiana: enigmas e revelações. São Paulo: Cortez Editora, 2003.
PEIRANO, Mariza G. S. Uma Antropologia no Plural: Três Experiências Contemporâneas. - Brasília, Editora da Universidade de Brasília, 1992.
SPOSITO, Marília Pontes. A Sociedade Juvenil e a Rua: novos conflitos e ação coletiva na cidade. - São Paulo: Tempo Social: Revista de Sociologia da USP, v. 5, n. 1-2. - São Paulo, 1994.
UNESCO. Políticas de/para/com juventudes. Brasília: Unesco, 2004. (PDF).
ZENI, Bruno. O Negro do Rap: entre a lei do cão e a lei da selva. - São Paulo: Estudos Avançados, v. 18, n. 50, 2004.

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