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Brasília-DF. A LinguAgem JurídicA Elaboração Marcelo Whately Paiva Produção Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração Sumário APRESENTAÇÃO ................................................................................................................................. 4 ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA .................................................................... 5 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 7 UNIDADE I A LINGUAGEM JURÍDICA ....................................................................................................................... 9 CAPÍTULO 1 A IMPORTÂNCIA DO TEXTO NA ATIVIDADE JURÍDICA .................................................................. 9 UNIDADE II TIPOS DE TEXTOS ................................................................................................................................. 57 CAPÍTULO 1 A NARRAÇÃO E A ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA ....................................................................... 57 CAPÍTULO 2 A PEÇA JURÍDICA ................................................................................................................... 71 PARA (NÃO) FINALIZAR ..................................................................................................................... 83 REFERÊNCIAS ................................................................................................................................. 84 4 Apresentação Caro aluno A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD. Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo. Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira. Conselho Editorial 5 Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa. Provocação Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor conteudista. Para refletir Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso. Praticando Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer o processo de aprendizagem do aluno. Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. 6 Saiba mais Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões sobre o assunto abordado. Sintetizando Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos. Exercício de fixação Atividades que buscam reforçar a assimilação e fixação dos períodos que o autor/ conteudista achar mais relevante em relação a aprendizagem de seu módulo (não há registro de menção). Avaliação Final Questionário com 10 questões objetivas, baseadas nos objetivos do curso, que visam verificar a aprendizagem do curso (há registro de menção). É a única atividade do curso que vale nota, ou seja, é a atividade que o aluno fará para saber se pode ou não receber a certificação. Para (não) finalizar Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado. 7 Introdução Este talvez seja um dos Cadernos de Estudos e Pesquisa mais importantes para o nosso curso de pós- graduação. Percebo que há uma dificuldade imensa em escrever textos jurídicos com a linguagem que lhe é peculiar. Observo que muitas vezes a incapacidade linguística de expressar o entendimento compromete o próprio pensamento do autor do texto. É muito comum o documento ficar aquém da profundidade que o redator desejou expressar. A linguagem jurídica é técnica. Ela se orienta pelas regras ortográficas, sintáticas e semânticas de nosso idioma. No entanto, possui características únicas. Se no dia a dia usamos vocábulos inadequados, que são compreendidos por nosso ouvinte ou leitor, isso não pode ocorrer no universo jurídico. Os termos possuem sentido exato. As frases devem seguir uma construção objetiva e clara. As normalizações devem ser extremamente respeitadas. Esta disciplina, assim, desenvolverá em você a capacidade de aprofundar seus conhecimentos em nosso idioma sob o aspecto prático da linguagem empregada em tribunais, escritórios e demais órgãos relacionados ao Direito. Marcelo Paiva Objetivos » Desenvolver a capacidade de escrever textos com clareza, objetividade e correção no universo jurídico. » Demonstrar a diferença de estrutura entre o texto narrativo e o argumentativo. » Estudar a estrutura da peça jurídica. » Debater sobre a linguagem jurídica. 9 UNIDADE IA LINGUAGEM JURÍDICA CAPÍTULO 1 A Importância do Texto na Atividade Jurídica O desenvolvimento da técnica jurídica fez com que surgissem termos não usuais para os leigos. A linguagem jurídica, no entanto, não é mais hermética para o leigo que qualquer outra linguagem científica ou técnica. Aí estão, apenas para exemplificar, a Medicina, a Matemática e a Informática com seus termos tão peculiares e tão esotéricos quanto os do Direito. Ocorre que o desenvolvimento da ciência jurídica se cristalizou em instrumentos e instituições cujo uso reiterado e cuja precisão exigiam termos próprios. Servidão, novação, sub-rogação, enfiteuse, fideicomisso, retrovenda, evicção, distrato, curatela, concussão, litispendência, aquestros (esta a forma oficial) etc. são termos sintéticos que traduzem um amplo conteúdo jurídico, de emprego forçado para um entendimento rápido e uniforme. O que se critica, e com razão, é o rebuscamento gratuito, oco, balofo, expediente muitas vezes providencial para disfarçar a pobreza das ideias e a inconsistência dos argumentos. O Direito deve sempre ser expresso num idioma bem-feito, conceitualmente preciso, formalmente elegante, discreto e funcional. A arte do jurista é declarar cristalinamente o Direito. Adalberto Kaspary Direito deriva do latim clássico directus, particípio passado de dirigere, formado de regere, com a ideia de dirigir, conduzir, guiar. Como adjetivo, significa justo, correto; como substantivo, justiça, razão.O profissional ou quem atua na área jurídica deve ter conhecimento do Direito. Assim, deve estudar, entre outras coisas, o funcionamento do ordenamento jurídico: leis, jurisprudência, doutrina etc. Esse conhecimento é parte mais que relevante do instrumental intelectual a que o profissional é obrigado a recorrer em suas atividades. A teoria jurídica, da mais simples à mais complexa, tem valor prático inequívoco, porquanto virá a contribuir, direta ou indiretamente, no seu trabalho. No entanto, não deve se limitar a tais aprendizados. O ato de escrever e de organizar ideias é técnica essencial para o profissional demonstrar o domínio de sua capacidade. Não se trata de arte ou 10 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA dom. É estudo, prática, técnica. Sem dúvida alguma, a inadequação na linguagem compromete o pensamento jurídico. O Superior Tribunal Militar recebeu, certa vez, um recurso assim redigido: O alcândor Conselho Especial de Justiça, na sua apostura irrepreensível, foi correto e acendrado no seu decisório. É certo que o Ministério Público tem o seu lambel largo no exercício do poder de denunciar. Mas nenhum lambel o levaria a pouso cinéreo, se houvesse acolitado o pronunciamento absolutório dos nobres alvarizes de primeira instância. Presume-se que um advogado, um juiz ou um desembargador conheça palavras complexas, apuradas e, então, o léxico mais vasto será tanto símbolo de maior erudição quanto forma de contribuição para uma expressão mais específica, com linguagem técnica característica do Direito. Em toda a atividade forense, é evidente que se deve preferir a linguagem formal e culta. Palavras técnicas e precisas inibem falhas de compreensão. Não se pode, no entanto, exagerar nos termos, como ocorreu no recurso citado. Observe, a seguir, trecho de circular redigida por servidor de um órgão público: Os parentes consanguíneos de um dos cônjuges são parentes por afinidade do outro; os parentes por afinidade de um dos cônjuges não são parentes do outro cônjuge; são, também, parentes por afinidade da pessoa, além dos parentes consanguíneos de seu cônjuge, os cônjuges de seus próprios parentes consanguíneos. Inúmeras são as vezes em que a má redação compromete o entendimento. O texto seguinte foi escrito por um magistrado. Tratava-se de um pedido de habeas corpus. O delegado, ao receber, entendeu exatamente o contrário do que desejava o magistrado. Por determinação da egrégia segunda vice-presidência, comunico que a colenda primeira Câmara Criminal, julgando habeas corpus 454.823-3/3 Proc. Crime 253/03, dessa Vara, em que é impetrante os bacharéis Roberto Delmanto Júnior e paciente Gleison Lopes de Oliveira e corréus Michel Alves de Souza, Edevaldo Pires e outros, proferiu a seguinte decisão: CONHECIDA EM PARTE, NA PARTE CONHECIDA CONCEDERAM PARCIALMENTE A ORDEM IMPETRADA, TÃO SOMENTE, PARA ANULAR O DEPOIMENTO DAS TESTEMUNHAS PROTEGIDAS PELO PROVIMENTO CG 32/2000, COM REINQUIRIÇÃO DAS MESMAS, APÓS AS PROVIDÊNCIAS CONSTANTES DO V. ACÓRDÃO, FICANDO DENEGADA A PRETENSÃO FORMULADA NA SUSTENTAÇÃO ORA DE CONCESSÃO DE ORDEM DE HABEAS CORPUS, DE OFÍCIO, DEFERINDO LIBERDADE PROVISÓRIA AO PACIENTE, RETIFICADA A TIRA DE JULGAMENTO ANTERIOR, NOS TERMOS DO PEDIDO HOJE OFERTADO. V.U. O delegado libertou o preso por não interpretar corretamente o texto. 11 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Vocabulário jurídico O servidor de órgãos ou departamentos de atividade jurídica tem linguagem própria, peculiar à atividade. Algumas palavras de nosso idioma, apesar de serem, em princípio, acessíveis a qualquer leitor, são utilizadas no universo jurídico com sentido próprio. A linguagem forense é, por excelência, uma linguagem técnica. Isso significa que muitos termos utilizados em textos jurídicos, apesar de parecerem complexos e mesmo estranhos, têm função de definir conceitos do Direito de que aquele que redige não se pode afastar. Observe o exemplo. O advogado mostrou que o homicídio simples não constitui crime hediondo e defendeu, em excelente tese, que mesmo o homicídio qualificado, por vezes, não deve ser visto como tal. É possível, sem conhecimento jurídico, entender o texto acima, mas, provavelmente, grande parte do conteúdo da mensagem será perdida. Quando o advogado cita o termo hediondo, refere-se à enumeração taxativa de lei específica e remete a todos os efeitos que ela determina. Um leitor comum, mesmo com muita cultura geral, certamente não compreenderia o termo em sua amplitude jurídica. A essas expressões de sentido técnico, crítica alguma merece ser feita. Esse vocabulário busca expor com precisão os conceitos do Direito, cuja complexidade é inevitável. Essa linguagem não pode, entretanto, ficar prisioneira de expressões arcaicas e rebuscadas, que apenas prejudicam a boa comunicação. Respeita-se o aspecto técnico, mas condena-se veementemente a prolixidade e o rebuscamento de muitos profissionais da área. Linguagem confusa e arcaica contribui para a morosidade da justiça. Lembre-se de que existe um leitor interessado em entender o que está escrito o mais rápido possível e de forma precisa para dar sequência ao trabalho. Dessa forma, evite textos com vocabulário inadequado como os enumerados a seguir. » Estribado no escólio do saudoso mestre baiano, o pedido contido na exordial não logrou agasalho. » Os adjetivos podem vir, mas que se separem os adjetivos e os advérbios de modo, para que fiquemos com o substantivo. E o Tribunal quer decidir substantivos, não propriamente adjetivos, nem advérbios de modo. Vamos reduzir, digamos, a liturgia da adverbiação para caminharmos para o compromisso da substantivação. » Ementa de Tribunal: Adultério. Para o flagrante de adultério, não é indispensável à prova de seminatio in vas, nem o encontro dos infratores nudo cum nudo in eodem cubículo. Basta que, pelas circunstâncias presenciadas, se possa inferir como quebrada materialmente a fidelidade conjugal. » V. Ex.a, data máxima vênia, não adentrou as entranhas meritórias doutrinárias e jurisprudenciais acopladas na inicial, que caracterizam, hialinamente, o dano sofrido. 12 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA » Procura o réu escoimar-se da Jurisdição Penal, por suas pueris alegações. » E vem ora o querelante vestir-se com o cretone da primariedade, como se isso o eximisse de responsabilidade. » A acusação enjambra-se em seus próprios argumentos. Níveis de linguagem A língua apresenta uma diversidade de expressão imensa. A maneira de expressar-se está relacionada a inúmeras variáveis. Assim, usamos um tipo de linguagem em família, outra com amigos, outra, ainda, no trabalho. Ao conversarmos com uma criança, falaremos de uma forma. Já ao proferirmos uma palestra, falaremos de outra. Essa capacidade de expressão possui diversos níveis. A linguagem empregada no ambiente jurídico e no serviço público deve ser formal e culta. No entanto, isso não significa linguagem rebuscada, incompreensível. É comum encontrar textos jurídicos com verdadeiras acrobacias linguísticas com desprezível conteúdo, em que se veem verdadeiras acrobacias linguísticas. Exemplo de linguagem rebuscada: O vetusto vernáculo manejado no âmbito dos Excelsos Pretórios, inaugurado a partir da peça ab ovo, contaminando as súplicas do petitório, não repercute na cognoscência dos frequentadores do átrio forense. Ad excepcionem o instrumento do Remédio Heróico e o Jus Laboralis, onde o jus postulandi sobeja em beneplácito do paciente e do obreiro. Hodiernamente, no mesmo diapasão, elencam-se os empreendimentos in Judicium Specialis, curiosamente primando pelo rebuscamento, ao revés do perseguido em sua prima gênese (...). (Fragmento do artigo “Entendeu?”, de Rodrigo Collaço, presidente da AMB. Disponível em: <www.amb.com.br>). Também não deve ser coloquial, com gírias, regionalismos etc. Exemplo de linguagem coloquial: E aí, doutor, vou ou não vou ganhar minha indenização?” – perguntou por e-mail o cliente. Oadvogado prontamente respondeu: “O egrégio tribunal acolheu o supedâneo de nosso arrazoado e reformou a sentença prolatada dando a lide como transitada em julgado em prol do deprecante”. O cliente, perplexo, ficou na mesma. Só entendeu o que o advogado quisera dizer quando, no final da mensagem, viu um “parabéns”. Ou seja: vai ganhar, sim, a indenização (...). (Fragmento do artigo “Falar difícil”, de Joaquim Falcão, diretor da Escola de Direito da FGV. Disponível em: <www.amb.com.br>). 13 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Elementos normativos Artigo O artigo é a unidade básica para apresentação, divisão ou agrupamento de assuntos num texto legal. Pode desdobrar-se “em parágrafos ou em incisos; os parágrafos em incisos; os incisos em alíneas e as alíneas em itens”. (Lei Complementar no 95, de 26 de fevereiro de 1998, art. 10, II.). Emprego da palavra artigo. » Na forma abreviada (art.), seguida do ordinal até o art. 9o, dispensando-se o ponto entre o numeral e o texto. A partir do art. 10, emprega-se o cardinal, seguido de ponto: » Art. 5o Nas eleições proporcionais (...). » Art. 10. Cada partido poderá registrar (...). » Por extenso, se vier empregada em sentido genérico ou desacompanhada do numeral: » Fez referência ao artigo anterior da lei. O texto de um artigo inicia-se por maiúscula e encerra-se por ponto-final. Quando se subdivide em incisos, a disposição principal, chamada caput (do latim, cabeça), encerra-se por dois-pontos e as subdivisões encerram-se por ponto e vírgula, exceto a última, que termina por ponto-final. Parágrafos Os parágrafos são divisões imediatas do artigo e podem conter explicações ou modificações da proposição anterior. São representados pelo sinal gráfico §, forma entrelaçada dos esses iniciais da expressão latina signum sectionis (sinal de seção, corte). Uso do sinal gráfico §. » Antes do texto do parágrafo, quando seguido de número, emprega-se o ordinal até o nono, dispensando-se o ponto entre o numeral e o texto. A partir do § 10, emprega- se a numeração cardinal, seguida de ponto: § 1o Qualquer cidadão no gozo de seus direitos políticos poderá (...). § 11. A violação do disposto neste artigo sujeita (...). » Nas citações e nas referências bibliográficas: Agiu nos termos do art. 37, § 4o, da Constituição Federal. 14 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA Emprega-se o sinal gráfico duplo §§, quando seguido de número, indicando mais de um parágrafo: O art. 32 e seus §§ 4o e 5o esclarecem o assunto. Uso da palavra parágrafo por extenso. » Quando o parágrafo for único: Art. 43. É permitida (...). Parágrafo único. A inobservância dos limites estabelecidos (...). A forma p. único somente será usada nas referências, entre parênteses: (art. 32, p. único, do Código Eleitoral). » Quando o sentido for vago, indeterminado, e estiver desacompanhado do número: Isso se refere ao parágrafo anterior. O texto de um parágrafo inicia-se por maiúscula e encerra-se por ponto-final. Quando se subdivide em incisos, empregam-se dois-pontos antes das subdivisões, que se separam por ponto e vírgula, exceto a última, terminada por ponto-final. Incisos Os incisos são usados como elementos discriminativos do caput de um artigo ou de um parágrafo. Eles vêm após dois-pontos, são indicados por algarismos romanos, seguidos de travessão e separados por ponto e vírgula, exceto o último, que se encerra por ponto-final. As iniciais dos textos dos incisos são minúsculas. “Art. 118. São órgãos da Justiça Eleitoral: I. o Tribunal Superior Eleitoral; II. os tribunais regionais eleitorais; III. os juízes eleitorais; IV. as juntas eleitorais” (Constituição Federal).” Alíneas As alíneas são desdobramentos dos incisos e vêm indicadas por letras minúsculas seguidas de parênteses. Quanto às iniciais e à pontuação dos textos das alíneas, empregam-se as mesmas regras dos incisos. 15 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I “Art. 14. (...) § Io O alistamento eleitoral e o voto são: I obrigatórios para os maiores de dezoito anos; II facultativos para: a) os analfabetos; b) os maiores de setenta anos; c) os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos” (Constituição Federal). Itens Os itens são desdobramentos das alíneas e vêm indicados por algarismos arábicos. As letras iniciais e a pontuação dos textos dos itens seguem o padrão dos incisos. “Art. 1o São inelegíveis: (...) II para presidente e vice-presidente da República: a) até 6 (seis) meses depois de afastados definitivamente de seus cargos e funções: 1– os ministros de Estado; 2– os chefes dos órgãos (...)” (Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990). Pontuação com elementos normativos Ao citar referências de elementos articulados, geralmente surgem dúvidas em relação ao uso de vírgulas. » Sequência em ordem direta crescente, ligada pela preposição “de”, não recebe vírgula. O processo está baseado nos incisos I e II do art. 226 do Código Penal. O advogado recorreu com base na alínea “d” do inciso III do art. 593 do Código de Processo Penal. A autorização está fundamentada corretamente com base na al. “b” do inc. II do art. 10 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993. Observe que, no último exemplo, a vírgula aparece somente por causa da data. » Sequência em ordem indireta, mesmo com a preposição “de”, é separada por vírgula Tal situação é regulada no art. 302, inc. III, do Código de Processo Penal. 16 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA O art. 5o, inc. XXXVI, da Constituição de 1988 repete a regra do art. 153, § 3o, da Constituição de 1967. Erros comuns: O art. 14, “b” do Código de Processo Penal (faltou a vírgula após a alínea). O art. 14, do Código de Processo Penal (não existe a vírgula após o número do artigo, pois está na ordem crescente). Pontuação com ideia explicativa ou restritiva A regra de pontuação obriga o uso de vírgula com ideia explicativa (oração explicativa ou aposto explicativo). No caso de a ideia ser restritiva, a construção não aceita vírgula. Observe. » O Ministro do STF Gilmar Mendes votou a favor. Sem vírgula, pois existe mais de um ministro no STF. A ideia é restritiva. » O Presidente do STF, Gilmar Mendes, votou a favor. Com vírgula, pois existe apenas um presidente no STF. » A jurisprudência do STF, que, ao julgar o caso, (...). A jurisprudência do STF que foi publicada no dia 16 de maio de 2008 (...). No primeiro caso, o pronome relativo “que” se refere ao “STF”, pois só existe um STF e é ele quem julga no exemplo. A vírgula é obrigatória. No segundo caso, o “que” se refere à “jurisprudência” e promove uma restrição. A vírgula não pode ocorrer. Outros exemplos. » O parecer no 123, que trata do assunto, foi claro. O parecer que trata do assunto foi claro. » A Lei no 8.666/2000, que prevê o crime, aborda o assunto de maneira contraditória. A lei que prevê o crime aborda o assunto de maneira contraditória. » Os Ministros, que concordaram com o Relator, confirmaram o voto (todos concordaram). Os Ministros que concordaram com o Relator confirmaram o voto (alguns concordaram). 17 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Pontuação com parênteses O competente sinal de pontuação fica contido pelos parênteses quando eles abrangerem a proposição inteira: » Geralmente ele sai para almoçar somente quando termina seu trabalho. (Há semanas em que ele simplesmente não almoça). » As pessoas obsessivas fazem qualquer coisa para obter o que desejam. (Elas não sabem perder). Fica fora quando a expressão encerrada entre parênteses for apenas uma parte da proposição: » Três países estão com dificuldades nas exportações (Brasil, Argentina e Chile). » Estão ameaçando o abastecimento de água da cidade os loteamentos próximos à barragem (muitos deles irregulares). Pontuação no fim da frase, após abreviatura Se a última palavra da frase for uma abreviatura, que, por natureza, tem ponto, não se usa outro ponto para indicar o fim do período. Vale o ponto da abreviatura: » Vi os móveis nas LojasCarmel Ltda. » Na feira, comprei laranjas, bananas, peras, abacaxis etc. Remissão a texto legal A primeira remissão a texto legal deve ser feita por extenso: » Lei no 8.177, de 1o de março de 1991. Nas seguintes, pode-se empregar a forma reduzida: » Lei no 8.177, de 1991 ou Lei no 8.177/ 91. » Portaria no 10, de 20 de março de 2004. Nas seguintes: Portaria no 10/2004. Expressões Inadequadas As expressões vez que, de vez que, eis que, posto que, haja visto quase sempre são empregadas de forma inadequada na linguagem jurídica. » Vez que, de vez que e haja visto não devem ser empregadas nunca. Estão inadequadas. 18 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA Eis que indica surpresa ou tempo. Raramente, será empregada nesse sentido. Posto que não possui valor de causa. O sentido correto da expressão é de concessão: » O Tribunal solicitou a cópia, vez que não a possuía. (inadequado). » O Tribunal solicitou a cópia, de vez que não a possuía. (inadequado). » O Tribunal solicitou a cópia, eis que não a possuía. (inadequado). » O Tribunal solicitou a cópia, posto que não a possuía. (inadequado). » O Tribunal solicitou a cópia, haja visto não a possuir. (inadequado). » O Tribunal solicitou a cópia, haja vista não a possuir. (adequado). Data As datas dos documentos oficiais devem ser grafadas com as seguintes normas. » A localidade não pode sofrer abreviatura. » A unidade da federação não é obrigatória. » O primeiro dia é sempre ordinal. » Não existe zero antes do número 2 ao 9. » O mês é minúsculo e por extenso. » Não existe ponto no meio de 2008. » Se a data não estiver centralizada, indica-se o uso de ponto-final: Brasília, 1o de junho de 2008. Brasília, 2 de junho de 2008. Brasília-DF, 27 de junho de 2008. » No interior do texto, as datas e os anos devem ser escritos de forma plena. O primeiro dia do mês é designado com ordinal também: O Brasil proclamou a independência em 7 de setembro de 1822. Entre 1986 e 1988, o Congresso elaborou a atual Constituição brasileira, assinada em 8 de outubro de 1988. O Brasil foi campeão mundial de futebol em 1958, 1962, 1970, 1994 e 2002. O documento foi assinado em 1o de abril de 2004. 19 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Observações: São admitidas certas grafias sintéticas consagradas, como: Opala 84/85, Safra 97, Lei 10.675/03, Portaria 102/98. Também nos textos correntes em que for cabível o uso abreviado da data, não se deve pôr zero à esquerda do número salvo quando referente ao ano. Assim, o correto é 5/6/08, 8-10-2007 e não: 05/06/08, 08-10-2007. Datas que se tornaram efemérides são escritas por extenso: » O Sete de Setembro, o Quinze de Novembro, o Dois de Julho. Mas (dia 1o): o 1o de Janeiro, o 1o de Maio. As décadas devem ser mencionadas sem a referência ao século, salvo quando houver possibilidade de confusão. » O milagre econômico da década de 70. Os anos 20 foram fortemente influenciados pela Semana de Arte Moderna de 1922. Na década de 1850. Referência de documentos jurídicos Legislação (leis, medidas provisórias, decretos etc.) BRASIL. Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997. Estabelece normas para as eleições. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, no 189, p. 21.801, 1o de out. 1997. Seção 1. BRASIL. Medida Provisória no 1.953-25, de 16 de novembro de 2000. Institui o auxílio- transporte aos militares, servidores e empregados públicos da administração federal direta, autárquica e fundacional da União e revoga o § 1o do art. 1o da Lei no 7.418, de 16 de dezembro de 1985. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 17 nov. 2000. Seção 1, p. 9. Jurisprudência (decisões judiciais: súmulas, acórdãos, resoluções etc). BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Resolução no 20.263, de 1998. Disciplina os procedimentos referentes às reclamações e representações de que cuidam os arts. 58 e 96 da Lei no 9.504/97. Jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, Brasília, DF, v. 10, p. 304-307, jul./set. 1999. BRASIL. Tribunal de Contas da União. Súmula no 235. Importância recebida indevidamente por servidor. Ressarcimento ao Erário. In: ____. Súmulas. 4. ed. Brasília: TCU, 1998. p. 231. 20 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA Referência jurídica em meio eletrônico BRASIL. TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Súmula no 7. É inelegível para o cargo de prefeito a irmã da concubina do atual titular do mandato. Disponível em: <http://intranet2.tse.gov.br/serviços/processos/index.htlm>. Acesso em 22 nov. 2000. Expressões latinas empregadas em referências bibliográficas e citações Apud: citado por, conforme, segundo. Emprega-se para indicar a fonte de citação indireta (reprodução de texto de fonte intermediária). Et alli ou et al.: e outros. Ibidem: no mesmo lugar, na mesma obra. Emprega-se para citar a mesma obra referenciada imediatamente antes. Idem: o mesmo, a mesma coisa, o mesmo autor, igual à anterior. Emprega-se quando o autor é o mesmo da citação anterior. Idem ibidem: o mesmo, no mesmo lugar. Emprega-se para citar o mesmo autor e sua obra imediata e anteriormente referida. Idem per idem: o mesmo pelo mesmo. In: em, na obra de. Usa-se em citações extraídas de obras coletivas, seguida por dois-pontos e com inicial maiúscula. In fine: no fim. Expressão usada sobretudo em citações. In verbis: nestas palavras, textualmente. Ipsis litteris: textualmente, pelas mesmas letras. Ipsis verbis: pelas mesmas palavras. Loco citato ou loc. cit.: no lugar citado. Emprega-se para mencionar a mesma página de uma obra já citada, havendo intercalação de outras referências bibliográficas. Nota bene: note bem, observe bem. Serve para chamar a atenção para o que se segue. Opus citatum ou op. cit.: obra citada. Emprega-se para mencionar uma obra já citada, quando há intercalação de diferentes referências bibliográficas ou quando o autor é mencionado no texto. Passim: aqui e ali. Emprega-se quando é impossível mencionar todas as páginas de onde foram retiradas as ideias do autor. Neste caso, são indicadas as páginas inicial e final que contêm as opiniões e os conceitos utilizados. 21 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Sequentia: seguinte ou que se segue. Emprega-se quando não se deseja mencionar todas as páginas da obra referenciada. Neste caso, indica-se a primeira página, seguida da expressão et seq. Sic: assim, como impresso. Usa-se entre parênteses ou colchetes, ao final de uma citação ou inserida nela, e significa dizer que o original é assim mesmo, por mais errado que esteja. Sine loco: sem lugar. Sine nomine: sem nome, sem editor. Abrev.: s. n. Emprego correto de palavras ou expressões Mesmo Erro generalizado é o uso de mesmo como pronome pessoal. Observe os exemplos abaixo. » O desembargador recebeu o processo e analisará o mesmo rapidamente. (inadequado). O desembargador recebeu o processo e o analisará rapidamente. (adequado). » O relatório já chegou e o mesmo apresenta erros de conteúdo. (inadequado). O relatório já chegou e apresenta erros de conteúdo. (adequado). » Receba de volta seu título e verifique se o mesmo está rubricado pelo diretor. (inadequado). Receba de volta seu título e verifique se está rubricado. (adequado). » (...) poderá fazer por escrito o seu protesto, em petição dirigida ao juiz, e requerer que do mesmo se intime a quem de direito. (inadequado). (...) poderá fazer por escrito o seu protesto, em petição dirigida ao juiz, e requerer que dele se intime a quem de direito. (adequado). O pronome pode ser utilizado adequadamente em várias situações. » Como pronome adjetivo O juiz teve a mesma opinião. Elas mesmas discutiram o assunto. » Como advérbio Este julgamento é mesmo necessário. 22 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA Minha casa fica lá mesmo. Inadequado é o uso de mesmo como pronome pessoal, substituindo um substantivo já expresso: » Para analisar com calma o parecer, solicitou que o mesmo lhe fosse entregue (inadequado). » Para analisar com calmao texto, solicitou que o relatório lhe fosse entregue (adequado). A princípio – Em princípio A princípio tem o sentido de “inicialmente”, “no começo”. Em princípio tem o sentido de “em tese”, “teoricamente”. » A princípio não gostei da cidade, porém, com o tempo, passei a me adaptar muito bem. » Ela a princípio não gostava do namorado. » O campeonato ainda não terminou. Em princípio o São Paulo será campeão novamente. » A princípio, ele agiu sem maldade. = No início, ele agiu sem maldade. » Em princípio, ele agiu sem maldade. = Teoricamente, ele agiu sem maldade. Em que pese a – Em que pese(m) Em que pese a, com o som fechado = pêse, tem o sentido de “ainda que contrarie a opinião de”, “ainda que”. O verbo fica sempre no singular. » Falhou neste ponto, em que pese à sua dedicação. » Em que pese aos argumentos apresentados contra o acusado, ele será absolvido. Em que pese(m), com o som aberto = pése, tem o sentido de “ainda que se leve em consideração”, “embora”. O verbo concordará com o termo seguinte, que será sujeito da construção: » Em que pesem as opiniões do ministro, ninguém aceitou a explicação. Enquanto O vocábulo enquanto não apresenta sentido de condição profissional ou social. Seu uso deve se limitar a tempo: 23 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I » Enquanto chovia, ele escrevia o artigo. (adequado). » Não gostava dele enquanto ministro. (inadequado). Trata-se de » Não é possível, lógica e gramaticalmente, construção com o verbo tratar-se para coisas. Trata-se somente pode ter por sujeito um ente humano, em acepções específicas: O caso trata-se de acusações. (inadequado) Aqui todos se tratam por você. Ele somente se trata com remédios caseiros. » Nos demais casos, trata-se de constrói-se impessoalmente: Trata-se de processos novos. Pertine/no que diz respeito a A forma pertine não existe em nossa língua. Use, em seu lugar, no que diz respeito a, no que respeita a, no tocante a, com relação a etc.: » No tocante a este aspecto legal, meu voto é favorável. Em face de Não existe a expressão face a. O correto é em face de. » Face o relatório apresentar erro... (inadequado). » Em face de o relatório apresentar erro... (adequado). Deve de estar – Deve estar Deve de estar tem o sentido de que há probabilidade: » Ele deve de estar em casa agora. Deve estar indica obrigação, certeza: » Os advogados devem estar preparados para a atividade profissional. O verbo dar funcionando como auxiliar manterá os sentidos acima com outros verbos também. 24 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA Arquive-se ou arquivem-se – Cite-se ou citem-se – Intime-se ou intimem-se O assunto pede atenção. Desde o tempo do vestibular, muitos tropeçam no uso do se. Ora ele funciona como partícula apassivadora, ora como índice de indeterminação do sujeito. Para não cometer erros, vale a pena se lembrar das vozes verbais. Voz ativa: Lucas comprou o livro. Voz passiva analítica: O livro foi comprado por Lucas. Voz passiva sintética: Comprou-se o livro. O último caso é o que nos interessa agora. Observe que a voz passiva pode ser escrita como analítica (foi comprado) ou sintética (com o uso do se). Sempre que se conseguir fazer a substituição de uma pela outra sem alterar o sentido, não existirá objeto direto na construção e a concordância será feita entre os dois termos: » Comprou-se o livro. = O livro foi comprado. » Compraram-se os livros. = Os livros foram comprados. Lembre-se da placas que encontramos em todas as cidades do Brasil: » Joga-se búzios. (inadequado). » Jogam-se búzios. (adequado). » Jogam-se búzios. = Búzios são jogados. A regra vale para o caso citado: » Arquive-se o processo. = O processo seja arquivado. » Arquivem-se os processos. = Os processos sejam arquivados. » Cite-se a testemunha. = A testemunha seja citada. » Citem-se as testemunhas. = As testemunhas sejam citadas. » Intime-se o acusado. = O acusado seja intimado. » Intimem-se os acusados. = Os acusados sejam intimados. Não confundir a regra com o se como índice de indeterminação do sujeito. No caso, a concordância é outra: » Gosta-se de livro. » Gosta-se de livros. Como se percebeu, o verbo ficou no singular, pois não se consegue realizar a voz passiva analítica. Não é possível escrever com correção “De livros são gostados”. 25 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I A posteriori – A priori A posteriori não tem o sentido de “posteriormente” como muitos gostariam. A expressão latina deve ser usada quando o raciocínio empregado está baseado em fatos, na experiência comprovada, em dados concretos para alcançar uma conclusão indutiva. Mesmo não empregando a expressão, a ideia a posteriori é muito empregada quando a argumentação não encontra fundamentos plenamente claros na legislação. A priori não tem o sentido de “principalmente”, “primeiramente” ou “antes de mais nada”. A expressão latina deve ser empregada para demonstrar um pensamento que parte do geral para o particular. Mesmo não empregando a expressão, a ideia a priori é empregada quando a argumentação encontra fundamentos plenamente claros na legislação. Habeas corpus – Hábeas-córpus A expressão latina habeas corpus (sem hífen, sem acento e em itálico) é muito empregada no universo jurídico. No entanto, sua forma aportuguesada “hábeas-córpus” (com hífen, com acento e sem destaque itálico) está correta e é empregada em alguns tribunais. Inobstante O vocabulário ortográfico não registra a palavra inobstante, embora empregada com certa frequência no meio jurídico. Melhor usar “não obstante” ou “nada obstante”. Isso posto – Isto posto O pronome isso retoma ideia já apresentada (termo anafórico), enquanto o pronome isto antecipa ideia a ser apresentada ou retoma apenas a última ideia apresentada. Dessa forma, a expressão adequada para o emprego seria “isso posto”, pois se está retomando ideia já mencionada. Consagrou- se o uso de “isto posto”, no entanto tal uso se faz correto apenas quando o autor sintetiza toda a argumentação antes de concluir a ideia. A partir de – Com base A expressão a partir de deve ser empregada em sentido temporal. Evite empregá-la no sentido de “com base em”: » Ela prometeu iniciar o regime a partir do próximo mês. » O juiz proferiu a sentença a partir dos argumentos apresentados. (inadequado). » O juiz proferiu a sentença com base nos argumentos apresentados. (adequado). 26 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA De cujus – Decujo De cujus é redução de Is de cujus successione agitur, que tem o sentido de “cuja sucessão se trata”. No Brasil, criou-se o neologismo “decujo” com o mesmo sentido. Aresto – Arresto Aresto é substantivo e significa “acórdão”, “decisão de tribunal”: » O aresto do TSE sobre inelegibilidade consta do parecer do ministro. Arresto também é substantivo, mas significa “apreensão judicial”, “embargo”: » O arresto dos bens dos envolvidos no crime deu-se em janeiro. Como sendo Esta expressão é desnecessária e deve ser evitada: » Foi considerado (como sendo) o melhor funcionário do ano. Ante A forma correta é ante, porque não se trata de uma locução; consequentemente, não cabe a preposição ‘a’ depois da também preposição ‘ante’, que se comporta como ‘perante’, com o mesmo significado de “diante de, em presença de alguém ou algo”: » Ela se saiu bem perante o juiz. » Ante a juíza, ele vacilou. » Calou-se ante os argumentos apresentados. Junto a A locução junto a deve ser empregada no sentido de “ao lado de”, “perto de”, “adido a”: » O segurança posicionou-se junto ao réu. » O embaixador brasileiro junto a Portugal será homenageado. Nos demais empregos, usa-se a preposição que o verbo pedir: » O sindicato mantém as negociações com (e não junto a) a diretoria. » Solicitou providências do (e não junto ao) ministério. » Entrou com recurso no (e não junto ao) Tribunal. 27 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Perante o juiz Não se trata de uma expressão com preposição. Dessa maneira, o “a” está inadequadono caso. O correto é “perante o juiz”: » Perante o juiz; perante o tribunal; perante a justiça; ante o juiz; ante o tribunal; ante a justiça. Que esta subscreve O verbo subscrever pode ser transitivo direto no sentido de “aprovar”. Assim, a preposição torna-se inadequada. » O desembargador que esta subscreve. Que nem Que nem é expressão popular, não encontrando espaço na linguagem formal: » Ele corre (que nem) uma lebre. (inadequando). » Ele corre como uma lebre. À custa de – A expensas de – Em via de À custa de tem o sentido de “à força de”: » Obteve o resultado favorável à custa de muito trabalho. » Sem recursos desde o ano passado, vive à custa da família. A expensas de tem o mesmo sentido de “à custa de”. Não aceita o s ao lado do a inicial: » O prédio foi construído a expensas do governo local. Em via de tem o sentido de “a caminho de” ou “prestes a”. Não aceita a palavra “vias” na expressão: » O processo está em via de ser encerrado. Protocolar – Protocolizar Ambas as formas encontram-se registradas no Volp e em outros dicionários, portanto, são corretas, embora se diga que protocolizar seja variante dispensável, pois são consagradas as formas protocolar, protocolado(s), protocolada(s), protocolando etc. 28 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA Quando do (da) A expressão é galicismo, por isso deve ser substituída por “no momento de”, “no tempo de”, “por ocasião de”: » Por ocasião da consulta, o tribunal estava de recesso. (e não “quando da consulta.)” Seja da competência O verbo competir “é pouco usado nas formas em que ao p se segue o i”, conforme o Moderno Dicionário da Língua Portuguesa, de Michaelis. É recomendável empregar uma expressão equivalente: » Ainda que seja de sua competência julgar o recurso, submeta o caso ao colegiado (e não “Ainda que compita julgar”). Apenar – Penalizar Apenar significa “condenar à pena”, “castigar”, “punir”: » O Tribunal apenou o responsável pelo prejuízo. Penalizar quer dizer “causar pena ou desgosto a”, “sentir grande pena ou desgosto”: » Também o penalizavam os resultados da fome em seu país. » Penalizou-se com o sofrimento do amigo. Com vista a – Com vistas a Ambas as expressões significam “a fim de”, “com o objetivo de”. Tanto faz utilizar uma ou outra: » Remeteu o processo ao Ministério Público com vista à (ou: com vistas à) elaboração de parecer. Custas – Custa Para se referir a despesas em processo judicial, usa-se “custas”: » Foram bastante altas as custas do processo. Nos outros casos, usa-se o singular: » As despesas foram feitas à custa (a expensas de) do pai. » O serviço foi feito a minha custa (a expensas de). » Faz concessões à custa (com sacrifício de) da honra. 29 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Dado – Visto – Haja vista Os particípios dado e visto usados como adjetivo concordam em gênero e número com o substantivo a que se referem: » Dados o interesse e o esforço demonstrados, optou-se pela permanência do servidor em sua função. » Dadas as circunstâncias... » Vistas as provas apresentadas, não houve mais hesitação no encaminhamento do inquérito. Já a expressão haja vista, significa “uma vez que”, “seja considerado” ou “veja-se”: » O servidor tem qualidades, haja vista o interesse e o esforço demonstrados. » Na greve, ocorreram alguns imprevistos, haja vista o número de feridos. Observação: “Haja visto” com o sentido de “haja vista” é inovação oral brasileira, evidentemente descabida em redação oficial. De forma que – De forma a De forma (maneira, modo) que usa-se nas orações desenvolvidas: » Fez a viagem de forma que se cansasse menos. » Deu recado de maneira que não deixasse dúvida. » Terminou o trabalho a tempo, de modo que pôde ir ao cinema. De forma (maneira, modo) a usa-se nas orações reduzidas de infinitivo: » Deu amplas explicações, de forma (maneira, modo) a deixar tudo claro. Observação: As locuções “de forma que”, “de maneira que”, “de modo que”, “de sorte que”, “de molde que”, “de jeito que” não possuem plural. 30 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA Em via de – Em vias de A expressão correta é em via de, que significa “no caminho de”, “prestes a”. Usa-se somente no singular: » O senador está em via de (e não em vias de) terminar o segundo mandato. » O mico-leão-dourado está em via de (e não em vias de) extinção. Erário Algumas pessoas falam em erário público. Isso constitui redundância, assim como: habitat natural, manter o mesmo, continuar ainda, conviver junto, encarar de frente, goteira no teto. Não existe erário privado; erário é sempre público. Alguns o chamam de Tesouro; outros de Fazenda (daí Ministério da Fazenda). Engloba os recursos econômicos e financeiros do Estado. No sentido de A expressão não demonstra finalidade: » Tomou tal atitude no sentido de evitar algo pior. (inadequado). O significado correto está relacionado a “apresentar o sentido adequado”. Deve ser usado na linguagem jurídica ao indicar uma interpretação de uma norma, por exemplo. Opor veto O correto é opor veto e não “apor veto”. Vetar é “opor veto”; apor é “acrescentar”; daí aposto (o) que vem junto. O veto, a contrariedade são opostos, nunca apostos. Pedir vista O correto é pedir vista, no singular. Significa solicitar exame do processo: » O ministro pede vista. O presidente lhe concede vista. Há que + infinitivo Expressão típica de textos jurídicos, a expressão “há que + verbo no infinitivo” tem o sentido de “é necessário”, “deve-se fazer”: » Há que examinar com detalhes os argumentos apresentados. 31 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Emprego de iniciais maiúsculas Empregam-se as iniciais maiúsculas nos seguintes casos. » Início de período, de verso ou de citação direta: Diz o Código Eleitoral: “São eleitores os brasileiros maiores de 18 anos (...)”. Observação: Emprega-se a minúscula em citações não coincidentes com início de frase: A lei diz: “(...) a critério do juiz ou do Tribunal”. » Nomes próprios de qualquer espécie: Barroso, Tocantins, Avenida São João, Senado Federal, Júpiter, Centro Educacional Tiradentes... » Pronomes de tratamento ou reverência e nomes de cargos e profissões que os seguem: Excelentíssimo Senhor Presidente, Vossa Excelência, Magnífico Reitor, Senhor Chefe... » Nomes de ciências e disciplinas: Filosofia, História do Brasil, Direito Administrativo... Nomes dos pontos cardeais ou equivalentes, quando empregados absolutamente: » O falar do Nordeste, em lugar de o falar do nordeste do Brasil. » A cultura do Ocidente, em lugar de a cultura do ocidente europeu. Escrevem-se esses nomes com inicial minúscula quando designam direção ou limite geográfico: Ele andou este país de norte a sul e de leste a oeste. » Nomes científicos dos seres vivos (somente a primeira letra do nome): Homo sapiens, Trypanosoma cruzi... » Nomes de datas, épocas, eventos e fatos históricos: Reforma Luterana, Descobrimento do Brasil, Sete de Setembro... » Nomes de publicações seriadas, conforme a designação registrada: Revista de Comunicação, Jornal do Commercio... 32 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA Os títulos de obras artísticas, literárias e científicas, bem como os de artigos de jornais e revistas, escrevem-se com letra minúscula, exceto a inicial da primeira palavra e os substantivos próprios: As melhores crônicas de Fernando Sabino, Dicionário prático de regência nominal, Os retirantes (pintura de Portinari) As crianças e a saúde (artigo do jornal Folha de São Paulo). » Nomes de órgãos públicos, instituições militares, políticas e profissionais, unidades administrativas, comissões oficiais, coligações, empresas privadas e seus departamentos: Ministério Púlbico da União, Superior Tribunal de Justiça, Secretaria de Documentação e Informação, Diretório Municipal do PSDB de Juiz de Fora, Prefeitura Municipal de São Carlos, Juízo Eleitoral da 4a Zona do Estado do Rio Grande do Norte, Comissão de Constituição e Justiça e de Redação, Coligação Trabalho e Moralização,Ministério Público. » Simplificações de nomes de entidades ou instituições consagradas pelo uso: Congresso por Congresso Nacional, Senado por Senado Federal, Câmara por Câmara dos Deputados, Constituinte por Assembleia Nacional Constituinte, Supremo por Supremo Tribunal Federal, Legislativo por Poder Legislativo, Executivo por Poder Executivo, Judiciário por Poder Judiciário, Tribunal Superior por Tribunal Superior Eleitoral, Tribunal Regional por Tribunal Regional Eleitoral, Tribunal de Contas por Tribunal de Contas da União (de estado ou de município). » nomes designativos de cargos antepostos à autoria de atos oficiais e pospostos à assinatura deles: O Diretor-Geral da Secretaria do Supremo Tribunal Federal, no uso de suas atribuições (...). » Elementos dos compostos hifenizados, pois mantêm autonomia: Decreto-Lei no 200, Grã-Bretanha... » Nomes pelos quais as leis se tornam conhecidas: Código Civil, Código Eleitoral, Lei Áurea... » Palavras empregadas em sentido especial. Casa, significando local destinado a reuniões de interesse público: O deputado encontra-se na Casa para votar. 33 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I » Constituição, no sentido de lei fundamental e suprema de um país e demais sinônimos: Constituição de 1988, Carta Magna, Lei Fundamental. » Corte, designando tribunal: Esta Corte tem posição definida sobre o assunto. » Direito, no sentido de ciência das normas obrigatórias que disciplinam as relações dos homens numa sociedade: As regras do Direito; mas, juiz de direito. » Estado, no sentido de nação politicamente organizada: O Estado responsabilizou-se pelo desaparecimento de presos políticos. » Estado e município, no sentido, respectivamente, de unidade da Federação e circunscrição administrativa autônoma de um estado, seguidos dos nomes: O Estado de Minas Gerais, o Município de Luziânia; mas, o município elegeu um deputado. » Federação, no sentido de união política entre as unidades federativas, relativamente autônomas, que se associam sob um governo central: O projeto visa ao fortalecimento da Federação. » Igreja, no sentido de instituição: A Igreja é contra o aborto. » Império, República, Monarquia, no sentido de regime político, período histórico ou quando equivaler à palavra Brasil: No Império houve muitas insurreições. » Justiça, no sentido de Poder Judiciário ou de seus ramos: A Justiça começa a se modernizar. Isso é da competência da Justiça Eleitoral. » Leis, projetos, acórdãos, resoluções etc. acompanhados dos respectivos números: Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997. Mandado de Segurança no 112, Of. no 10. Mesa, no sentido de conjunto do presidente e dos secretários de uma assembleia: A Mesa do Senado posicionou-se a favor das medidas. 34 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA Plenário, no sentido de assembleia ou tribunal reunido em sessão: O Plenário da Câmara rejeitou a proposta do governo. » União, no sentido de reunião de estados relativamente autônomos, mas subordinados a um governo central, a um governo federal: Cabe à União tomar medidas para o caso. Emprego de iniciais minúsculas Empregam-se as iniciais minúsculas nos seguintes casos. » Nomes de meses: janeiro, fevereiro... » Nomes de festas populares: carnaval, entrudo... » Nomes não integrados aos substantivos indicativos de acidentes geográficos: rio Amazonas, oceano Atlântico, baía de Guanabara, serra da Mantiqueira. Porém, se vierem integrados aos nomes oficiais dos topônimos, devem ser grafados com a inicial maiúscula: Rio de Janeiro, Costa Rica, Cabo Verde, Monte Alegre, Cabo Frio... » Nomes gentílicos: baiano, inglês, alemão... » Artigos definidos e indefinidos, pronomes relativos, preposições, conjunções e advérbios e suas locuções, bem como em combinações e contrações prepositivas, quando no interior de substantivos próprios: Ministério do Trabalho, Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento (Bird), Imposto sobre Serviços A Vitória que a Bahia Quer (coligação). » Nomes próprios, quando empregados no plural, exceto os nomes e sobrenomes de pessoas: os tribunais regionais eleitorais, os estados da Federação; mas, os Rodrigues, os Josés, os Andradas... 35 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Maiúsculas e minúsculas em textos legais Emprego de inicial maiúscula e minúscula em textos legais que fazem referência a leis, decretos, portarias etc. » Utiliza-se a inicial maiúscula quando o nome dos atos estiver acompanhado do respectivo número: A Lei no 312, de 24-5-95, dispõe (...). O Decreto no 312, de 5 de março de 1993, regulamenta (...). A Portaria no 234, de vinte e cinco de julho de 1997, sofreu várias alterações. Observação: Não há consenso entre os gramáticos quanto ao uso de inicial maiúscula quando determinado ato, após sua primeira citação no texto — no caso, acompanhado do respectivo número — é referenciado em outras partes do texto, sem estar acompanhado do número. Neste curso, adotou-se o uso de inicial maiúscula em tais casos, desde que fique subentendido que os referidos atos estejam individualizados: Art. 5 Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação. Conforme o disposto no art. 30 da citada Lei Complementar (...). » Remissão a artigos, parágrafos e incisos escreve-se com letra minúscula: Refiro-me ao parágrafo único do art. 11 da Portaria no... De acordo com o inciso I do art. 57 da Lei no... » Ganha a inicial maiúscula o nome de leis ou normas políticas e econômicas consagradas pela importância de que se revestem: Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Lei Áurea, Lei Afonso Arinos, Lei Antitruste, Código Civil, Lei de Responsabilidade Fiscal. » Nome de moeda escreve-se com letra minúscula: real, dólar, franco, peso, marco, libra... O real está de cara e coroa novas. Atenção: quando se fala do Plano Real, está-se falando de nome próprio. Nesse caso, usa-se inicial maiúscula: O (Plano) Real estabilizou a economia. 36 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA » Nomes que designam cargos ou postos se escrevem com inicial maiúscula: A Presidente do Tribunal de Contas o DF concedeu a palavra ao Relator. O Diretor-Geral autorizou a publicação do normativo. » Nomes de profissões são escritos com inicial minúscula: advogado, contador, engenheiro, jornalista, médico, professor... Observação: Quando individualizados, emprega-se a inicial maiúscula: o Advogado Rui Barbosa, o Poeta Camões... » Após o parêntese, inicia-se com maiúscula somente quando o texto constitui oração à parte, completa, caso em que vem precedido de ponto. A oração que está entre parênteses tem o ponto dentro, antes de fechar o parêntese, e não fora: Na portaria da fábrica o ambiente era de absoluta calma. (A indústria não trabalha aos sábados.). Formas de referência e de tratamento Substantivo Adjetivo Acórdão Venerado Acórdão Câmara Colenda Câmara Defenso Nobre Defensor Juiz Meritíssimo Juiz Juízo Digníssimo Juízo Julgado Ínclito Julgador Patrono Culto Patrono Promotor Nobre Promotor Relator Culto Relator Sentença Respeitável sentença Grafia de horas » O símbolo de horas é “h”, o de minutos é “min” e o de segundos é “s”, sem ponto nem “s” indicativo de plural, sem espaço entre o número e o símbolo. » Na menção de horas apenas, não se usa o símbolo, mas a palavra hora(s), por extenso: 37 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Encontro você às 14 horas. » Na menção de horas e minutos, usa-se o símbolo de horas, mas não há necessidade de incluir o símbolo de minutos: Encontro você às 14h30. » Na menção de horas, minutos e segundos, usam-se os símbolos de horas e minutos, mas não há necessidade de incluir o símbolo de segundos: Encontro você às 14h30min22. Observações: Quando a referência for a período de tempo e não a hora, não se usa o símbolo, mas as palavras hora(s), minuto(s), segundo(s), por extenso: » A reunião estendeu-se por quatro horas e vinte minutos. » A viagem dura dezoito horas. » As inscrições encerrarão em24 horas. » O terremoto começou às 10h35min22 e durou 43 segundos. » Na linguagem formal, devem-se seguir as instruções anteriores, mesmo que a leitura não corresponda exatamente à grafia: A sessão terminou às 12h30 (na leitura: às doze horas e trinta minutos; às doze e trinta; ao meio dia e meia). As regras não se aplicam quando, em linguagem estritamente técnica, não corresponderem à praxe ou às instruções específicas. Gerúndio O gerúndio é empregado com exagero nos textos jurídicos. Quase sempre de forma inadequada. O emprego adequado está relacionado a ideia adverbial de: » Sendo ainda novo, não quis ir só (causa). » Não quis, sendo sábio, resolver as dúvidas por si mesmo (concessão). » Triunfarás, querendo (condição). » O carneiro defendia-se dizendo que... (meio). 38 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA » Ele fala cantando (modo). » Proferindo o orador estas palavras, a assembleia deu vivas (tempo). É incorreto o uso do gerúndio com sentido pontual, adjetivo ou aditivo: Inadequado Adequado Vou estar fazendo. Farei. Texto contendo erros. Texto que contém erros. O órgão analisou o caso, decidindo (...). O órgão analisou o caso e decidiu (...). Linha pontilhada Em textos legais que modificam outros textos legais, usam-se linhas pontilhadas para indicar a omissão de texto do caput, de parágrafo, de inciso, de alínea ou de item de determinado artigo. Deve- se usar uma linha pontilhada para indicar todo o texto suprimido, além da linha pontilhada que se segue ao número do artigo modificado. Usa-se, ainda, uma linha pontilhada no final da emenda, se o artigo modificado não encerrar no texto emendado. Exemplos: Emenda no caput: Art. 1o O caput do art. 42 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 42. Durante 25 (vinte e cinco) anos, a União aplicará, dos recursos destinados à irrigação: ...................................................................................” (EC 43/04). Emenda alterando partes do artigo: Art. 1o Os arts. 48, 57, 61, 62, 64, 66, 84, 88 e 246 da Constituição Federal passam a vigorar com as seguintes alterações: “Art. 48. ....................................................................... ....................................... ........ X – criação, transformação e extinção de cargos, empregos e funções públicas, observado o que estabelece o art. 84, VI, b; XI – criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública; ...................................................................................” “Art. 57. ................................................................................................................ ... 39 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I § 7o Na sessão legislativa extraordinária, o Congresso Nacional somente deliberará sobre a matéria para a qual foi convocado, ressalvada a hipótese do § 8o, vedado o pagamento de parcela indenizatória em valor superior ao subsídio mensal. Abreviaturas A abreviatura é a escrita reduzida de uma palavra ou locução. É expressamente proibido, na prática forense, o uso de abreviatura nos autos e nos termos do processo (Código de Processo Civil, art. 169, parágrafo único). No entanto, difícil encontrar um texto sem o uso delas. » Possui ponto, diagonal ou parênteses: doc. = documento; S/A = sociedade anônima; (a) assinado, assinada... » Admite flexão de gênero, número e grau: sr. ou sra.; prof. ou profs.; D. ou DD... » Para abreviar, sempre que possível, termine a abreviatura em consoante: ac. (acórdão); rel. (relator) ... » Se a palavra é cortada em um grupo de consoantes, todas elas devem aparecer na abreviatura: inst. (instituição); secr. (secretaria) ... » Independentemente de a abreviatura terminar em vogal ou consoante, coloque sempre o ponto final: ago. (agosto); téc. (técnica) ... » Há palavras cujas abreviaturas podem ser formadas pela combinação de suas consoantes ou de suas iniciais e suas últimas consoante e vogal: dz. (dúzia); vl. (valor); atte. (atenciosamente) ... » Se, na parte constante da abreviatura, aparece o acento gráfico da palavra, deve ele permanecer: pág. (página); déb. (débito) ... » Em palavras compostas ligadas por hífen, deve ele ser mantido na abreviatura. secr.-ger. (secretaria-geral); proc.-ger. (procurador-geral) ... 40 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA » A inicial poderá ser maiúscula ou minúscula de acordo com as normas da ortografia oficial em relação à palavra por extenso: R. (Rua) das Laranjeiras; Dr. (Doutor) Albert Einstein; tel. (telefone); fl. (folha) ... » O ponto abreviativo, quando coincide com o ponto-final, acumula a função deste, por isso deve-se evitar a repetição: Foram convidados para o debate: políticos, professores, engenheiros etc. » Os meses são abreviados com as três letras iniciais. Se forem escritos em letras maiúsculas, dispensa-se o ponto. Se forem escritos apenas com a inicial maiúscula ou todo em letras minúsculas, deverá aparecer o ponto abreviativo. Não se abrevia o mês de maio. JAN; Jan. ... » Existem abreviaturas que podem ser reduzidas com variações: a.C. ou A.C. (antes de Cristo); f., fl. ou fol. (folha) ... » Existem abreviaturas que representam mais de uma palavra: p. (página, pé, palmo) ... » A Conferência de Geografia estabeleceu que “não serão usadas abreviaturas nos nomes geográficos”. Portanto, nome algum de cidade pode ser abreviado. Excetuam- se as siglas dos estados. » Por praticidade, as abreviaturas podem ser grafadas sem sobrelevação, seguidas de ponto (Cia., Dra., V. Exma.), desde que não formem palavras inadequadas, como profa. (professora), amo. (amigo), no. (número) ... » Também não se abreviam palavras com menos de cinco letras. Exceções: h (hora), id. (idem), S. (São), t. (tomo), v. (ver, veja, vide), S (Sul), conforme normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Siglas Salvo nos casos em que a sigla é bastante vulgarizada, ou seja, quando a instituição a que ela se refere é mais conhecida pela própria sigla do que pelo nome completo (Petrobras, SBT etc.), o nome da instituição deve ser escrito por extenso, antes da sigla, que deve vir a seguir, entre parênteses, na primeira menção, usando-se apenas a sigla nas menções seguintes. O Mercado Comum e Comunidade do Caribe (Caricom) é um bloco de cooperação econômica e política, criado em 1973, formado por catorze países e quatro territórios da região caribenha. Em 1998, Cuba foi admitida como observadora do Caricom. 41 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Observações: No caso de a sigla não se referir a uma instituição, só se escreverá o seu significado por extenso se o contexto o exigir: A Aids (do inglês Acquired Immunodeficiency Syndrome) é conhecida em Portugal como Sida (de Síndrome de Imunodeficiência Adquirida). Não se usam aspas nem pontos de separação entre as letras que formam a sigla. Com sigla empregada no plural, admite-se o uso de s (minúsculo) de plural, sem apóstrofo: » os TREs (Tribunais Regionais Eleitorais), 300 UPCs, 850 Ufirs (não: TRE’s, Ufir’s) ... Essa regra não se aplica à sigla terminada com a letra s, caso em que o plural é definido pelo artigo: os DVS (Destaques para Votação em Separado). Emprego de maiúscula e minúscula em siglas » Siglas formadas por até três letras são grafadas com maiúsculas: ONU, PIS, OMC... » Siglas formadas por quatro ou mais letras cuja leitura seja feita letra por letra são grafadas com maiúsculas: PMDB, INPC, INSS... » Siglas formadas por quatro ou mais letras que formem palavra pronunciável são grafadas preferencialmente como nomes próprios, ficando apenas a primeira letra maiúscula: Otan, Unesco, Inamps, Petrobras... » Siglas em que haja leitura mista (parte é pronunciada pela letra e parte como palavra) são grafadas com todas as letras em maiúsculas: DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), HRAN (Hospital Regional da Asa Norte) ... » No caso de siglasconsagradas que fogem às regras acima, deve-se obedecer à sua grafia própria: CNPq (Conselho Nacional de Pesquisas); MinC (Ministério da Cultura), UnB (Universidade de Brasília) ... 42 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA » Siglas que não mais correspondam com exatidão ao nome por extenso também devem ser acatadas, se forem as siglas usadas oficialmente: Embratur (Instituto Brasileiro de Turismo); MEC (Ministério da Educação) ... Símbolos Constituem símbolos as abreviaturas fixadas por convenções, quase sempre internacionais, por isso, não se subordinam às regras de abreviatura nem de ortografia. Os símbolos são empregados na indicação de unidades de medida, elementos químicos e pontos cardeais. Não recebem ponto abreviativo, não admitem plural nem são escritos com letra maiúscula: » 200g (200 gramas); 5km (5 quilômetros); 2min (dois minutos) ... Escrevem-se com letras maiúsculas: » os símbolos que se originam de nomes próprios: W (watt), N (newton) ... » os prefixos gregos: M (mega), G (giga), MHz (megahertz) ... » os símbolos dos elementos químicos: O (oxigênio), Au (ouro), Ag (prata) ... » os símbolos dos pontos cardeais: N (norte), S (sul), L (leste), O (oeste) .... Nomenclatura dos feitos Em sentido genérico, as iniciais devem ser minúsculas: » O mandado de segurança é o remédio adequado para (...) Deverão ser usadas iniciais maiúsculas quando se tratar de um julgado específico: » Agravo de Instrumento no 89.01.07582-6/MG. Habeas Corpus 90.01.02123-7/RO. 43 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Numerais Cardinais em algarismos » Quantias, grandezas e medidas: R$10,00, 25kg, 30m... » Horários: 8h35min20s... » Datas, décadas e decênios: A reunião realizou-se no dia 20 de agosto de 1998. Publicado no DJ de 24-5-96. Década de 1960. » Endereços: Rua 15 de Novembro, Casa 7. » Páginas e folhas de publicações: página 23, folha 14... » Porcentuais: 30% dos votantes... » Idade: Ele tem 45 anos. » Artigos e parágrafos de lei a partir do número 10: art. 10, art. 25. Ordinais em algarismos » Zonas, sessões, distritos e regiões: 15ª Zona Eleitoral, 10 Distrito » Pimeiro dia do mês: Hoje é 10-4-98 » Artigos e parágrafos de leis, decretos etc. até o número 9: art. 10, art. 90 44 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA » Numerais antecedendo substantivos: 3 capítulo, 50 andar Observação: Por brevidade, trocam-se os ordinais pelos cardinais: » Trigésima primeira folha por folha trinta e um, primeira casa por casa um. Nesse caso, usam-se os cardinais sem flexão de gênero e de número por ficar subentendida a palavra número: » A prova encontra-se a folhas (n.) 22 do processo. (significando que ela se encontra na 22a folha do processo). Se houver mais de um número de folha, a regra é a mesma: ...a folhas (n.) 22 e 25... Algarismos romanos » Nomes de papas, soberanos: Papa João Paulo II, Luís XV... » Dinastias reais: II Dinastia... » Séculos: Século XX... » Divisões das Forças Armadas: I Comando do Exército, IV Distrito Naval... » Congressos, seminários, simpósios e eventos correlatos: V Bienal do Livro... » Partes de uma obra: Título III; Capítulo II; Seção I... » Incisos de leis: inciso V... Observação: 45 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Quando o algarismo romano vier após o nome, até o X, lê-se como ordinal e, a partir daí, como cardinal: Século III (lê-se século terceiro); século XII (lê-se século doze). Vindo antes do nome, lê-se como ordinal: XII Bienal (lê-se décima segunda bienal). Grafia por extenso Os casos, a seguir, normalmente se escrevem por extenso. » Os cardinais e os ordinais de um a dez, cem e mil: três dias, segundo turno, cem pessoas... » Se houver números acima e abaixo de 11 na mesma frase, prefira os algarismos: Chegaram 3 revistas e 22 questionários. » Os cardinais e os ordinais em início de frases: Trinta e dois votos foram anulados. » Os fracionários, quando os dois elementos estiverem entre um e dez: Três quintos dos votos... » Nos demais casos, empregam-se algarismos: 1/12 dos eleitores... Observação: A Lei Complementar no 95, de 26 de fevereiro de 1998, em seu art. 11, II, f, determina que se deve grafar por extenso quaisquer referências feitas, no texto [legal], a números e porcentuais. Grafia mista » Usa-se grafia mista (algarismos e por extenso) na classe dos milhares, se não houver número na classe inferior: 32 mil votos. Caso contrário, empregue apenas algarismos: 32.420 votos. A partir da classe dos milhões, há dois procedimentos, se não houver número na classe inferior: 15 milhões e 438 mil eleitores; R$4 bilhões... 15,4 milhões de eleitores. (Com aproximação do número fracionário). Observações: » Caso haja número nas classes inferiores, empregam-se apenas algarismos: 15.438.302 eleitores... 46 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA » Emprega-se o ponto para separar as classes dos numerais: 3.004.987... Exceções: ano e CEP: janeiro de 1998; CEP 70833-060. » Nas datas, separam-se o dia, o mês e o ano por ponto separativo, dispensando-se o zero à esquerda: 3.5.98... » O número em algarismo, quando em final de linha, não deve ser dividido. » Na indicação de quantia, grandeza, medida e horário, não se usa espaço entre os numerais e os símbolos ou as abreviaturas: 2h35min15s; 80km... Números cardinais compostos A escrita do cardinal, conforme sua composição, faz-se da seguinte maneira. » Dois algarismos, põe-se a conjunção e entre os algarismos: 86 =oitenta e seis... » Três algarismos, põe-se a conjunção e entre cada um dos três: 654 = seiscentos e cinquenta e quatro... » Quatro algarismos, omite-se a conjunção e entre o primeiro algarismo e os restantes: 4.455 = quatro mil, quatrocentos e cinquenta e cinco. Se o primeiro algarismo da centena final for zero, aparecerá, então, o e: 3.048 = três mil e quarenta e oito... » Aparecerá, ainda, o e quando os dois últimos ou os dois primeiros da centena forem representados por zeros: 1.400 = mil e quatrocentos... 1.001 = mil e um; R$ 4.005,28 = quatro mil e cinco reais e vinte e oito centavos... » De vários grupos de três algarismos, omite-se o e entre cada um dos grupos: 3.444.225.528.367 =três trilhões, quatrocentos e quarenta e quatro bilhões, duzentos e vinte e cinco milhões, quinhentos e vinte e oito mil, trezentos e sessenta e sete... 47 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I Assinatura O traço que serve de suporte para a assinatura em documentos não é obrigatório e não deve ser empregado em órgãos públicos. Não há necessidade de destacar o nome e a função com negrito ou todas as letras maiúsculas. Trata-se de palavra de uso antigo e significa “acima”, “anteriormente”, “antes”, “atrás”. » O acórdão suso mencionado traz a posição desta Corte sobre o caso. A linguagem constitui o caminho essencial para a efetividade da comunicação entre os homens. Perquirindo-se a sua essência, é possível se estabelecer uma tipologia das linguagens, classificando-as em naturais (ordinárias) ou científicas (técnicas, formais). A linguagem natural nasce de maneira espontânea no seio da sociedade, fruto da formação cultural e histórica de cada povo. A linguagem técnica, por sua vez, é aquela empregada pelo cientista para a construção de uma linguagem especializada, que rompe com o senso comum e requer precisão e rigor técnico-lógico, com o escopo de escapar dos vícios da linguagem natural: vagueza, ambiguidade e incerteza. A linguagem jurídica é científica, pois instrumentaliza e potencializa os mais diversos institutos da Ciência Dogmática do Direito, permitindo ao operador do Direito, além do seu mais perfeito manuseio, alcançar o verdadeiro sentido das normas jurídicas. Nem por isso, contudo, está isenta a linguagem jurídica da possibilidade da incidência dos vícios da linguagem, próprios da linguagem natural. E para escaparmos dessa armadilha, não basta que os textos normativos sejam formulados com a maior clareza e precisão, sendo necessária,fundamentalmente, a interpretação jurídica elaborada pelo operador do Direito. E assim é que os vícios da linguagem jurídica somente serão sanados a partir da interpretação realizada pelo operador do Direito, tratando-se de elementar atividade de reelaboração do Direito e permitindo diminuir a distância entre o incerto e o certo, o indeterminado e o determinado e, enfim, entre a injustiça e a justiça. Carlos Eduardo Nicoletti Camillo Eis um trecho de sentença, que absolveu um acusado de estupro: “O estupro realiza-se quando o agente age contra a vontade da vítima, usando coação física capaz de neutralizar qualquer reação da infeliz subjugada. No 48 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA presente processo, a vítima alegre e provocante passou a assediar o acusado, que se encontrava nas areias do rio Poty, mostrar-lhe o biquini, que almofadava por trás, o incognoto estimulado. A vítima e o acusado trocaram olhares imantados, convidativos e depois se juntaram numa câmara de ar nas águas do rio Poty, onde se deleitara de prazer, oriundo do namoro, amassando o entendimento do desejo para findar numa relação sexual, sob o calor do sol, mergulhando no império dos sentidos até o cansaço físico, disjunciando-se os dois, o acusado para um lado e a vítima para outro, para depois esta aparentar um simulado do ato do qual participou e queria que acontecesse, numa boa e real, como aconteceu. Não há configuração do crime de estupro. Há, sim, uma relação sexual, sob promessas de namoro fácil para ser duradouro, que se desfaz na primeira investida de um ato sexual desejado entre o acusado e a dissimulada vítima, que com lágrima nos olhos fez fertilizar a mesma terra onde deixou cair uma partícula de sua virgindade, como um pequena pele, que dela não vai mais se lembrar, como também não esquece o seu primeiro homem, que a metamorfoseou mulher.” Dr. Joaquim Bezerra Feitosa, juiz da 2a Vara Criminal e de Execuções Penais de Teresina Contra o anacronismo Linguagem com expressões rebuscadas deve ser repensada. Hélide Maria dos Santos Campos Ainda hoje, muitos operadores do Direito utilizam expressões arcaicas e rebuscadas. A população acaba não entendendo nada. Penso que isso ocorre porque o Direito é uma ciência que ainda mantém, por causa de suas tradições, muitas formalidades. Uma delas está relacionada com a linguagem. Alguns juristas ainda acreditam que falar e escrever difícil demonstra cultura. Diante desse fato, insistem em utilizar termos arcaicos, rebuscados, a meu ver, desnecessários, quando deveria ser o contrário. O falar difícil é resultado de uma postura antiga dos advogados, que assim garantiam seu papel de “doutores” na sociedade. Além disso, o próprio “uniforme” do advogado já lhe garante um certo status; a formalidade de um terno já impõe um certo respeito e um distanciamento maior. É inegável a ideia de que o mundo tem caminhado para uma comunicação rápida e eficaz. A Internet é prova disso. Então, a linguagem jurídica, para muitos, parou no tempo, esqueceram-se de que a língua é um código social, em uso, “vivo”, que está o tempo todo sofrendo alterações. O que tenho questionado é: como, num mundo informatizado, imagético, rápido como este em que estamos vivendo, pode perdurar uma linguagem jurídica que poucos entendem? Muito temos lido sobre o acúmulo de processos existentes e o 49 A LINGUAGEM JURÍDICA │ UNIDADE I volume que muitos deles têm. Ora, se podemos expressar uma ideia com duas ou com cinco palavras, por que não expressamos com duas? Convém salientar que escrever muito não significa escrever bem. A prolixidade é um defeito e não uma qualidade. Ser prolixo no mundo atual é estar desatualizado, é retroceder. Uma das minhas prioridades no Ensino Superior tem sido fazer com que meus alunos sejam capazes de escrever textos claros e objetivos, pois a objetividade é uma das principais características da comunicação eficiente, tanto oral quanto escrita. “Uma grande história não precisa ser uma história grande”. Não estou, com isso, fazendo apologia da vulgaridade ou da banalidade da linguagem jurídica, pois compreendo que, em alguns momentos, os termos técnicos não podem ser dispensados, afinal versamos sobre uma ciência cujas palavras devem expressar conceitos precisos e definidos. Em 1998, comecei a lecionar Linguagem Jurídica no curso de Direito da UNIP de Sorocaba, cidade em que moro. Passei, então, a observar que os livros de redação forense mencionavam, como modelos de texto, peças processuais cujo linguajar estava desatualizado. Exemplo: “O cônjuge varão deixou para a cônjuge varoa...”. Por encontrar dificuldade em trabalhar com esse tipo de material didático, passei a criar o meu próprio conteúdo, utilizando os modelos contidos nos livros, mas refazendo- os do começo ao fim. Além disso, discutia com os alunos em aula. A essência permanecia, mas o conteúdo era modificado, muitas vezes, pelos alunos, sem a minha interferência. Tenho em meu “corpus” textos belíssimos que foram construídos em sala de aula. Nesse ínterim, eu estava cursando o mestrado, numa linha de pesquisa completamente distante desse tema. Ao concluir o mestrado, desenvolvi um projeto de pesquisa para o doutorado sobre o rebuscamento da linguagem jurídica, com base nesse trabalho todo que eu já estava desenvolvendo. Só não passava pela minha cabeça que, ao divulgar minhas ideias, as pessoas manifestariam tanto interesse por elas. Tenho sido procurada, em especial, pelos próprios juristas (promotores, desembargadores, juízes, entre outros). Isso é estimulante, fundamental para que a minha pesquisa dê frutos. Quero salientar o papel do ministro Ruy Rosado Aguiar (ministro aposentado do STJ) como meu maior incentivador, pois, foi a partir de um e-mail que recebi dele, que passei a desenvolver o meu projeto. Como professora de Linguagem Jurídica procuro fazer com que meus alunos de Direito fiquem livres do rebuscamento exagerado, do arcaísmo e da prolixidade, comuns nos textos jurídicos. Para isso, levo-os a ter consciência de que o ponto mais importante num processo comunicacional é se fazer entender. Um dos ruídos existentes nesse processo é não falarmos a mesma língua. Apresento- lhes uma peça processual recheada de arcaísmos, de termos rebuscados e com 50 UNIDADE I │ A LINGUAGEM JURÍDICA abuso do latinismo e vou reconstruindo esse texto, juntamente com eles, trocando por sinônimos, por termos mais acessíveis e próximos da nossa época, sem que essas substituições interfiram no sentido jurídico do texto. Além disso, analiso parágrafo por parágrafo e tudo o que está a mais, que não acrescenta em nada à tese a ser defendida, é eliminado. Enfim, um texto prolixo torna-se um texto exato, conciso, mais enxuto. Essa técnica é simples e pode ser utilizada também pelos juristas, desde que estejam dispostos a repensar o uso da linguagem. Publicações: PAIVA, Marcelo. Português Jurídico – Prática Aplicada. 5. ed. Brasília: Fortium, 2008. DAMIÃO, Regina Toledo; HENRIQUES, Antônio. Curso de Português Jurídico. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1996. NASCIMENTO, Edmundo Dantes. Linguagem forense. São Paulo: Saraiva, 1974. SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 5. ed. Rio de janeiro: Forense, 1978. XAVIER, Ronaldo Caldeira. Português no Direito. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991. Endereços eletrônicos: http://www.portuguesjuridico.org http://www.tj.rs.gov.br/noticias/comsoc/entendendo.pdf http://www.amb.com.br/?secao=campanha_juridiques http://mauricionardini.vilabol.uol.com.br/lgjur.htm http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=dicas_portugues Praticando 1 Com base em um dos textos prospostos, expresse sua opinião a respeito. Praticando 2 Procure ampliar os conhecimentos adquiridos nesta unidade, realizando os exercícios em questão. Nas construções, a seguir, marque certo ou errado em relação ao uso adequado da Língua Portuguesa e da padronização
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