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1 PACOTE ANTICRIME NA PRÁTICA As novas práticas da advocacia criminal a partir do Pacote Anticrime MÓDULO 1 – As alterações no Código de Processo Penal Parte 1 – O Juiz das Garantias e o sistema acusatório Parte 2 – A obrigatoriedade de defesa ao Investigado Policial Parte 3 – O novo arquivamento do Inquérito Policial Parte 4 – O Acordo de não persecução penal Parte 5 – Nulidade por ausência de fundamentação das decisões MÓDULO 2 – As alterações no Código de Processo Penal Parte 1 – As novas regras Medidas Assecuratórias Parte 2 – O impedimento do juiz que conheceu a prova ilícita Parte 3 – A Cadeia de Custódia da Prova Penal Parte 4 – O novo sistema de medidas cautelares e prisão preventiva Parte 5 – Execução imediata das condenações no Júri Parte 6 – A aplicação do CPC/2015 ao recurso especial e extraordinário em matéria criminal MÓDULO 3 – As alterações no Código Penal 2 Parte 1 – Legítima Defesa do agente de segurança pública Parte 2 – Execução da pena de multa Parte 3 – O novo prazo máximo da pena privativa de liberdade Parte 4 – Aumento dos requisitos para o livramento condicional Parte 5 – Novos efeitos da condenação Parte 6 – Novas causas impeditivas da prescrição Parte 7 – Alterações na parte especial: novas majorantes no roubo; mudança na ação penal do estelionato e aumento da pena de concussão MÓDULO 4 – As alterações na Lei de Execução Penal Parte 1 – Identificação criminal e de perfil genético Parte 2 – Mudanças na regulamentação do RDD Parte 3 – O Novo sistema de progressão de regime Parte 4 – Limites a saída temporária Parte 5 – Endurecimento das regras nos Presídios Federais Parte 6 – Execução Penal nos crimes de Organização criminosa MÓDULO 5 – As alterações na Legislação Penal Extravagante Parte 1 – Novos crimes hediondos Parte 2 - Novo crime na Lei de Drogas 3 Parte 3 – Regulamentação da captação ambiental como meio de prova Parte 4 – Ação controlada e Infiltração de agentes na Lavagem de dinheiro Parte 5 – Tipificações, penas e medidas diversas no Estatuto do Desarmamento Parte 6 – As Varas Criminais Colegiadas Parte 7 – As Novas regras da Colaboração premiada Parte 8 – A Cyber Infiltração como meio de prova Parte 9 – Proteção do informante BÔNUS – A Nova Lei de Abuso de Autoridade na Prática 4 PACOTE ANTICRIME NA PRÁTICA As novas práticas da advocacia criminal a partir do Pacote Anticrime Introdução ao conteúdo Inicialmente advertimos que este material tem como objetivo fornecer um conteúdo prático a respeito do Pacote Anticrime, apresentando e explicando as necessárias mudanças na atuação da advocacia criminal a partir da reforma promovida pela Lei 13.964/2019. Com isso, não é o objetivo deste trabalho se alongar em discussões teóricas ou acadêmicas, demasiadamente relevantes, mas que não são o objetivo primeiro deste curso. Além disso, é importante salientar que vacatio legis prevista no Art. 20 da Lei 13.964/2019 (publicada em 24/12/2019) prevê sua entrada em vigência 30 (trinta) dias após sua publicação, portanto todas as alterações que aqui explicaremos se tornarão obrigatórias a partir de 23/01/2020. Por fim, ressaltamos que ações ajuizadas no STF discutindo a constitucionalidade de institutos da presente Lei, bem como decisões do STF, STJ e do CNJ podem afetar a entrada em vigência e ou ainda o conteúdo, parcial ou total, da Lei 13.964/2019. Bons estudos! 5 MÓDULO 1 As alterações no Código de Processo Penal I Parte 1 – O Juiz das Garantias e o sistema acusatório 1) Sistema Acusatório e suas consequências no processo penal Art. 3º-A. O processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação. A primeira alteração a ser analisada mexe com toda a estrutura do processo penal brasileiro. Ainda que parte da doutrina apontasse nosso processo como acusatório ou ainda misto (parte acusatória e parte inquisitória), o processo penal brasileiro vigente até então era claramente um sistema inquisitório.1 São várias as características necessárias para que se atribua a um sistema processual a natureza acusatória, mas existe um elemento 1 Exemplificando isso, nossa investigação era administrativa e inquisitiva com a possibilidade de ingressar integralmente no processo contaminando o julgador; era permitido a figura de um juiz inquisidor que investigava e proferia decisões de ofício tomando lugar do acusador, pois poderia decretar a prisão preventiva de ofício e poderia condenar mesmo quando houvesse pedido absolutório da acusação ou ainda reconhecer qualificadora e causa de aumento não requerida pelo acusador. (MENDES, Tiago Bunning. Direito ao Recurso no Processo Penal. O duplo grau de jurisdição como garantia exclusiva do imputado. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019, p. 54/55) 6 nuclear que distingue claramente o sistema acusatório do inquisitório e consequentemente impede que se pense na possibilidade de um sistema misto (pois, o sistema só pode tem único núcleo), conforme explica Aury Lopes Jr. “a posição do juiz é fundante na estrutura processual. Quando o sistema aplicado mantém o juiz afastado da iniciativa probatória (da busca de ofício) da prova, fortalece-se a estrutura dialética e, acima de tudo, assegura-se a imparcialidade do julgador.”2 Portanto, o que define um sistema como acusatório é a separação das funções de acusar e julgar e, principalmente a carga da prova (carga e não ônus), de modo que a obrigação de provar deve ser atribuída exclusivamente a acusação não podendo o juiz produzir prova ou praticar qualquer ato atribuição do acusador. Por isso, o Art. 3o-A ao dizer que: “O processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação.”, pode se dizer que caminhamos para implementação de um processo acusatório e que este núcleo afetará toda estrutura de nosso processo penal na prática. 2 LOPES JR. Aury. Direito Processual Penal. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019, p. 46. 7 Na PRÁTICA essa estrutura afetará alguns outros dispositivos da nossa legislação processual penal. O primeiro dispositivo que será afetado é o Art. 5o, inciso II do CPP: Art. 5o Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: (...) II - mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo. Ora, se é vedada a atuação do juiz na fase de investigação, claramente não será mais permitido que o magistrado requisite (determine) a instauração do inquérito policial. Do mesmo modo, ainda que a Lei 13.964/2019 tenha alterado dispositivos relacionados as medidas assecuratórias sem alterar a redação do Art. 127 do CPP3, é possível defender que o juiz ficará impossibilitado de decretar o sequestro de bens de ofício no curso da investigação, considerando que lhe é vedada a iniciativa nesta fase, permitindo apenas a decretação de ofício se no curso do processo, pois não se trata de ato probatório e desta forma o juiz não estaria 3 Art. 127. O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou do ofendido, ou mediante representação da autoridade policial, poderá ordenar o sequestro, em qualquer fase do processo ou ainda antes de oferecida a denúncia ou queixa. 8 substituindo a atuação probatória do órgão de acusação que também lhe é vedado. No que tange a produção probatória, a vedação a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória encontra- se revogado tacitamente o Art. 156 do CPP (bem como, o Art. 13, II na parte em que dava aplicabilidade ao Art. 156, I do CPP), vejamos: Art. 156. A prova da alegação incumbiráa quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício: (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008) I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008) II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008) Ou seja, não será mais permitido que o juiz atue de ofício ordenando a produção de prova antecipada ou determinando a realização de qualquer diligência, ainda que para sanar dúvida sobre ponto relevante, pois no caso de dúvida, em qualquer fase da investigação ou do processo, se faz necessário decidir em favor do investigado-acusado em face do in dubio pro reo que decorre da presunção de inocência. 9 Neste ponto, também sofrerá revogação tácita o parágrafo único do Art. 212 do CPP, vejam: Art. 212. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de outra já respondida. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008) Parágrafo único. Sobre os pontos não esclarecidos, o juiz poderá complementar a inquirição. Isso porque, ao vedar a iniciativa ao juiz e a substituição probatória busca-se um juiz inerte que tampouco pergunte ou pratique qualquer ato probatório destinado as partes em todo curso da persecução penal, obviamente se o juiz pergunta estará substituindo atuação das partes4. Por isso, o Art. 3o-A garante o cross-examination de forma pura não mais permitindo que o juiz elabore perguntas as testemunhas antes ou depois das partes, ainda que se argumente a necessidade de esclarecimento de algum ponto. Aliás nesse ponto, existe importante decisão do STF, ainda que isolada, reconhecendo a nulidade por insubsistência na oitiva das 4 LOPES, Aury Jr. ROSA, Alexandre Morais da. A “estrutura acusatória” atacada pelo MSI – Movimento Sabotagem Inquisitória. Coluna Limite Penal. Consultor Jurídico (Conjur) em 03 de janeiro de 2020. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-jan-03/limite-penal- estrutura-acusatoria-atacada-msi-movimento-sabotagem-inquisitoria. Consulta em: 09/01/2020. 10 testemunhas por violação ao Art. 212 do CPP especificadamente pelo fato de que no caso o Juiz formulou inicialmente as perguntas, e neste caso inclusive revogando a prisão preventiva do acusado da prática de homicídio.5 Se a vedação da atuação probatória impede que o juiz pergunte as testemunhas das partes, obviamente também impede aquilo que costumeiramente atribuíamos o nome de “testemunha do juízo”, e por isso também encontra-se revogado tacitamente o Art. 209 e § 1o do CPP: Art. 209. O juiz, quando julgar necessário, poderá ouvir outras testemunhas, além das indicadas pelas partes. § 1o Se ao juiz parecer conveniente, serão ouvidas as pessoas a que as testemunhas se referirem. Fica vedada ao juiz a atuação probatória e, portanto, proíbe-se de fazer pergunta as testemunhas e consequentemente também fica proibido de arrolar testemunhas (assim como de determinar que se proceda novo interrogatório de ofício, tal como era permitido pelo Art. 196 do CPP), ainda que julgar necessário para sanar alguma dúvida ou 5 “HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE HOMICÍDIO. ARTIGO 121 DO CÓDIGO PENAL. PLEITO PELA REVOGAÇÃO DA CUSTÓDIA PREVENTIVA. ALEGAÇÃO DE NULIDADES. ORDEM DEFERIDA PARCIALMENTE PARA DECLARAR INSUBSISTENTE A OITIVA DAS TESTEMUNHAS.” (STF, HC 111.815/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Luiz Fux, Dje 14/02/2018). 11 por que a pessoa foi referida por uma das testemunhas arroladas pelas partes. Advertimos novamente, se forem necessários esclarecimentos é por que há dúvida e em caso de dúvida, decide-se em favor do acusado (in dubio pro reo). Por sua vez, no que diz respeito ao interrogatório em que pese ainda seja um dever do juiz interrogar o acusado, este interrogatório deve seguir uma postura acusatória, ou seja, sabendo que o juiz não pode substituir a atuação probatória do órgão acusador e, portanto, o magistrado não pode buscar induzir o acusado ou ainda buscar contradições ao questioná-lo, limitando-se a atuar na forma estritamente determinada pelo Art. 187, parágrafo 1o e 2o do CPP. Neste ponto, a Nova Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019) em seu Art. 15, parágrafo único, inciso I tornou crime, sujeito a pena de 1 (um) a 4 (quatro) anos, a conduta de prosseguir com o interrogatório de acusado que tenha decidido exercer seu direito ao silêncio, o que rotineiramente ainda ocorre (ou ao menos ocorria) em muitos interrogatórios e além de não anteder a estrutura acusatória atualmente tornou-se crime. 12 Também fica revogado de forma tácita o Art. 234 do CPP que permitia que o juiz, independentemente de requerimento das partes, determinasse a juntada de documento relativo a ponto relevante da acusação ou da defesa, ao menos em parte já que a vedação diz respeito a substituição da atuação probatória do órgão de acusação, cabendo exclusivamente ao MP, querelante ou assistente de acusação a juntada de documentos favoráveis a prova da acusação. Por esta mesma lógica, revoga-se tacitamente o Art. 242 do CPP e o Art. 3o da Lei 9.296/96 na parte em permitiam que se decretasse de ofício a busca e apreensão e a interceptação telefônica respectivamente, já que ambas têm natureza de meio para obtenção de prova. Resumidamente, no que diz respeito aos citados artigos 156, 187, 196, 209, 212, 234 e 242 do CPP, bem como Art. 3o da Lei 9.296/96, ficará vedada ao juiz qualquer iniciativa ou atividade destinada a produção de provas, o juiz é o destinatário da prova e por isso não pode produzi-la, nas palavras de Geraldo Prado: “Quem procura sabe ao certo o que pretende encontrar e isso, em termos de processo penal condenatório, 13 representa uma inclinação ou tendência perigosamente comprometedora da imparcialidade do julgador.”6 Também defendemos a revogação tácita do Art. 385 do CPP que dispunha o seguinte: Art. 385. Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada. É demasiadamente lógico que condenar sem pedido e reconhecer agravantes que não tenham sido alegadas é substituir a atuação do órgão de acusação. Para aqueles que aleguem que o Art. 3o-A veda apenas a substituição da atuação probatória do órgão de acusação e ao condenar sem pedido do acusado o juiz não estaria produzindo ou colhendo prova, lembre-se que o mesmo dispositivo legal garante uma estrutura acusatória ao processo penal e como visto é característica fundante do sistema acusatória a separação das funções de acusar e julgar. Notadamente, juiz que condena quando a acusação pede absolvição ou reconhece agravante não alegada está acusando e 6 PRADO, Geraldo. Sistema acusatório. A conformidade Constitucional das Leis Processuais Penais. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 137. 14 julgando simultaneamente e isso é vedado pelo Art. 3o-A, seja por substituir a atuação do órgão de acusação seja por romper com a estrutura acusatória de processo.7 Por fim, o que mais nos importa na PRÁTICA são as consequências caso sejam violadas essas disposições. Antes disso é necessário advertir que caberá ao advogado criminalista diligente e atualizado com as reformas legislativas fiscalizar a atuação do juiz, sobretudo na audiência de instrução (durante o interrogatório e oitiva de testemunhas), garantindo o cumprimento da estrutura acusatória de processo. A Lei13.964/2019 não prevê consequência especifica, com isso é preciso se socorrer a análise jurisprudencial sobre o tema para concluir que ocorrerá nulidade – que acreditamos ser absoluta por desrespeitar o Art. 129, I da CF8 – pela violação da estrutura acusatória, pois assim já decidiu o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: 7 LOPES, Aury Jr. ROSA, Alexandre Morais da. A “estrutura acusatória” atacada pelo MSI – Movimento Sabotagem Inquisitória. Coluna Limite Penal. Consultor Jurídico (Conjur) em 03 de janeiro de 2020. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-jan-03/limite-penal- estrutura-acusatoria-atacada-msi-movimento-sabotagem-inquisitoria. Consulta em: 09/01/2020. 8 2. "A Constituição de 1988 fez uma opção inequívoca pelo sistema penal acusatório. Disso decorre uma separação rígida entre, de um lado, as tarefas de investigar e acusar e, de outro, a função propriamente jurisdicional. Além de preservar a imparcialidade do Judiciário, essa separação promove a paridade de armas entre acusação e defesa, em harmonia com os princípios 15 AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM TODA A INSTRUÇÃO CRIMINAL. JUIZ QUE SUBSTITUIU O ÓRGÃO ACUSATÓRIO, INQUIRIU A VÍTIMA, TESTEMUNHAS E INTERROGOU O RÉU. NULIDADE DA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO CRIMINAL. VIOLAÇÃO DA ESTRUTURA ACUSATÓRIA DO PROCESSO PENAL. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Deve ser mantida a decisão agravada, que reconheceu a nulidade do processo desde a audiência de instrução e julgamento, porquanto a par de realizada sem a presença do Ministério Público, do início ao fim, o Juiz de Direito substituiu o órgão acusatório ao conduzir e colher todas as provas, em atividade probatória principal e não supletiva. 2. Cuidando-se de ação penal condenatória, na qual sobrelevam não apenas os interesses indisponíveis em disputa, mas valores afirmativos de um devido processo legal (tanto em sua ótica procedimental quanto sob o seu viés substancial), é de suma importância que se perceba, na condução da causa, a clara divisão desses papeis: um órgão que promove a acusação, mas que ao mesmo tempo fiscaliza o regular desenvolvimento da relação processual; um órgão ou profissional que defende o imputado e o acompanha durante os atos processuais; e um órgão, imparcial, que presta a jurisdição e que zela para que os direitos das partes sejam observados. 3. Não há ilegalidade no ponto em que o Tribunal Estadual, no exame de apelação da defesa, reconheceu, ex officio, a invalidade do ato. 4. O aresto recorrido, embora tenha deixado de conferir eficácia jurídica às provas produzidas em desacordo com o modelo legal, não determinou a renovação da instrução criminal, optando por da isonomia e do devido processo legal. Precedentes." (...) (ADI 5104 MC, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 21/05/2014) 16 absolver o réu, o que violou o art. 573 do CPP, segundo o qual os atos cuja nulidade não tiver sido sanada serão renovados ou retificados. 5. O reconhecimento do vício na apelação não favorece a acusação, o Juiz ou o réu; apenas tem o fim de restabelecer o válido desenvolvimento da relação processual, que se desenvolveu apenas entre juiz e uma das partes. 6. Agravo regimental não provido.’ (AgRg nos EDcl no AREsp 528.020/RS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 15/09/2015, Dje 05/10/2015, grifou-se) Desta forma, caso seja violada a estrutura acusatória atuando o juiz de ofício na fase de investigação ou substituindo a atuação probatória do órgão acusador é necessário requerer a nulidade absoluta9 do ato com fundamento no Art. 564, IV c.c Art. 3o-A do CPP. 9 “Não se verificou, no caso concreto, a indispensável separação entre o papel incumbido ao órgão acusador e ao julgador, principal característica do sistema acusatório, pois a fundamentação exposta na sentença condenatória permite concluir que os elementos do convencimento judicial decorreram, exclusivamente, de provas colhidas pelo julgador na audiência de instrução, hipótese de nulidade insanável, não sujeita, portanto, à preclusão.” (REsp 1.259.482/RS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE QUINTA TURMA Data do Julgamento 04/10/2011 DJe 27/10/2011, grifou-se). 17 2) O Juiz de Garantias e suas funções Art. 3º-B. O juiz das garantias é responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário, competindo-lhe especialmente: I - receber a comunicação imediata da prisão, nos termos do inciso LXII do caput do art. 5º da Constituição Federal; II - receber o auto da prisão em flagrante para o controle da legalidade da prisão, observado o disposto no art. 310 deste Código; III - zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determinar que este seja conduzido à sua presença, a qualquer tempo; IV - ser informado sobre a instauração de qualquer investigação criminal; V - decidir sobre o requerimento de prisão provisória ou outra medida cautelar, observado o disposto no § 1º deste artigo; VI - prorrogar a prisão provisória ou outra medida cautelar, bem como substituí-las ou revogá-las, assegurado, no primeiro caso, o exercício do contraditório em audiência pública e oral, na forma do disposto neste Código ou em legislação especial pertinente; VII - decidir sobre o requerimento de produção antecipada de provas consideradas urgentes e não repetíveis, assegurados o contraditório e a ampla defesa em audiência pública e oral; VIII - prorrogar o prazo de duração do inquérito, estando o investigado preso, em vista das razões apresentadas pela autoridade policial e observado o disposto no § 2º deste artigo; IX - determinar o trancamento do inquérito policial quando não houver fundamento razoável para sua instauração ou prosseguimento; 18 X - requisitar documentos, laudos e informações ao delegado de polícia sobre o andamento da investigação; XI - decidir sobre os requerimentos de: a) interceptação telefônica, do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática ou de outras formas de comunicação; b) afastamento dos sigilos fiscal, bancário, de dados e telefônico; c) busca e apreensão domiciliar; d) acesso a informações sigilosas; e) outros meios de obtenção da prova que restrinjam direitos fundamentais do investigado; XII - julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da denúncia; XIII - determinar a instauração de incidente de insanidade mental; XIV - decidir sobre o recebimento da denúncia ou queixa, nos termos do art. 399 deste Código; XV - assegurar prontamente, quando se fizer necessário, o direito outorgado ao investigado e ao seu defensor de acesso a todos os elementos informativos e provas produzidos no âmbito da investigação criminal, salvo no que concerne, estritamente, às diligências em andamento; XVI - deferir pedido de admissão de assistente técnico para acompanhar a produção da perícia; XVII - decidir sobre a homologação de acordo de não persecução penal ou os de colaboração premiada, quando formalizados durante a investigação; XVIII - outras matérias inerentes às atribuições definidas no caput deste artigo. § 1º (VETADO). § 2º Se o investigado estiver preso, o juiz das garantias poderá, mediante representação da autoridade policial e ouvido o Ministério Público, prorrogar, uma única vez, a duração do inquérito por até 15 (quinze) dias, após o que, se ainda assim a investigação não for concluída, a prisão será imediatamente relaxada. 19 Primeiramente, é preciso advertir que em decisão liminar proferida pelo Min. Luiz Fux em 20/01/2020 na ADI 6.299 e 6.305, suspendeu o Art. 3o-B ao Art. 3o-F que implantavam o Juiz de Garantias. Percebe-se que, além das demais funções elencadas nos 18 (dezoito) incisos do Art. 3o-B, a finalidade principal do Juizde Garantias é controlar a legalidade da investigação criminal e proteger os direitos individuais (do investigado) nos atos sujeitos a reserva de jurisdição. Lembre-se que o STF no julgamento do RExt 593.727 decidiu que o Ministério Público tem poderes para investigar”10. Portanto, todas as disposições previstas nos artigos 3o-B a 3o-F relativas ao Juiz de Garantias e outros institutos também se aplicam a todas as espécies de investigação criminal realizadas por órgãos do Estado, que em nosso ordenamento jurídico terá as seguintes funções: I) Receber a comunicação imediata da prisão, nos termos do inciso LXII do Art. 5o da CF e Art. 306, caput do CPP; 10 Disponível em: http://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=307671331&ext=.pdf. Acesso em: 10/01/2020. 20 Neste momento o Juiz de Garantias atua como responsável pelo controle da legalidade do ato, verificando se não existem vícios formais ou materiais da prisão em flagrante, fato que lhe permitiriam relaxar a prisão de flagrante de ofício ou ainda propiciando que a defesa peticione requerendo o relaxamento da prisão em flagrante (Art. 5o, LXV da CF). II) Receber o Auto de Prisão em flagrante para o controle da legalidade da prisão, observando o disposto no Art. 310 do CPP; Neste ponto, acreditamos que o “controle de legalidade da prisão” a que se refere o legislador diz respeito exclusivamente a análise das providências do Art. 310 do CPP ou de alguma ilegalidade ocorrida após a comunicação da prisão em flagrante de forma superveniente a análise realizada no inciso LXII do Art. 5o da CF e Art. 306, caput do CPP. Resumidamente, o Art. 3o-B, inciso II esclarece que a realização da Audiência de Custódia é de competência do Juiz de Garantias, atualmente prevista expressamente no CPP em seu Art. 310 com a nova redação dada pela Lei 13.964/2019 e que será comentada em momento oportuno. 21 Ressalta-se que também cabe ao advogado criminalista fiscalizar a ocorrência de crimes previstos na Nova Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019), praticado pela autoridade que deixou de realizar a comunicação imediata da prisão em flagrante (Art. 12) ou deixou de encaminhar o preso a Audiência de Custódia (Art. 12, parágrafo único, inciso III), bem como do magistrado que não relaxou a prisão manifestamente ilegal (Art. 9o, parágrafo único, inciso I). III) Zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determina que este seja conduzido à sua presença a qualquer tempo; Neste momento, o Juiz de Garantias atua na função de resguardar os direitos individuais do sujeito que se encontra preso em flagrante ou cautelarmente em decorrência de prisão preventiva ou temporária. A Constituição Federal em seu Art. 5o, incisos XLIX, LXI, LXII, LXIII, LXIV, LXVI prevê direitos relacionados aos sujeitos presos nesta condição e caberá ao Juiz de Garantias zelar pela observância desses. A violação desses direitos pode acarretar um vício formal tornando a prisão ilegal cabendo ao advogado requerer o relaxamento (Art. 5o, LXV da CF). 22 Além disso, a Nova Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019) em seus artigos 13 ao 21 prevê diversos crimes praticados em desfavor do preso, cuja observância também deve ficar sobre a atribuição do Juiz de Garantias durante o curso da investigação. IV) Ser informado sobre a instauração de qualquer investigação criminal O Juiz de Garantias deverá ser comunicado acerca da instauração de qualquer investigação criminal, o que é necessário para propiciar toda sua atuação descrita nos incisos do Art. 3o-B. Aliás, este inciso está intimamente relacionado com a função prevista no inciso IX que dá poderes ao Juiz de Garantias para arquivar o inquérito policial carente de justa causa. Perceba-se que o inciso IV diz que o juiz será informado de sua instauração, assim percebendo a ausência de motivos razoáveis para o prosseguimento da investigação o Juiz de Garantias deverá, desde logo, ou seja, de ofício determinar o trancamento da investigação (competência que lhe é atribuída pelo inciso IX independentemente de provocação). 23 Além disso, o Art. 27 da Nova Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019) torna crime a conduta dolosa de requisitar ou instaurar investigação quando não houver qualquer indício da prática de crime. V) Decidir sobre o requerimento de prisão provisória ou outra medida cautelar; A partir de agora, o magistrado responsável pela análise de requisitos que permitem a decretação de qualquer medida cautelar contra o investigado será o Juiz de Garantias, um magistrado diferente daquele que conduzirá a instrução processual e será responsável por decidir o caso ao proferir a sentença. Pela leitura do Art. 3o-B, caput a finalidade precípua do Juiz de Garantias não é prender ou decretar medidas cautelares, e sim o contrário, ou seja, evitar que prisões e outras medidas cautelares sejam decretadas ao arrepio da lei ou violando direitos fundamentais. Ressalta-se ainda que o texto aprovado da Lei 13.964/2019 em seu Art. 3o-B, inciso V prevê que será observado o disposto no parágrafo 1o, contudo esse foi objeto de veto presidencial. No PL 6341/2019 o parágrafo 1o dispunha que “O preso em flagrante ou por força de mandado de prisão provisória será 24 encaminhado à presença do juiz de garantias no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, momento em que se realizará audiência com a presença do Ministério Público e da Defensoria Pública ou de advogado constituído, vedado o emprego de videoconferência.”. Atualmente, o STF no julgamento da Reclamação 29.303/RJ o Relator Min. Edson Fachin negou seguimento ao pedido por entender que o STF no julgamento da Medida Cautelar na ADPF 347 somente fixou a obrigatoriedade da audiência de custódia para os casos de prisão em flagrante. Enquanto o Agravo Regimental não for apreciado pelo Pleno do STF, permanece a orientação no sentido da não obrigatoriedade a Audiência de Custódia no caso de prisões cautelares. VI) Prorrogar a prisão provisória ou outra medida cautelar, bem como substituí-las ou revogá-las, assegurado, no primeiro caso, o exercício do contraditório em audiência pública e oral, na forma do disposto neste Código ou em legislação especial pertinente; Existe ainda neste ponto uma importante mudança prática, qual seja, o surgimento de uma nova audiência realizada ainda na fase de 25 investigação com a finalidade propiciar um contraditório antes da prorrogação da medida cautelar. Portanto, na PRÁTICA passa a existir uma nova audiência, além Audiência de Custódia, para a atuação do advogado criminalista. Notadamente, será necessário apresentar-se nessa audiência munido de documentos (exemplo: Certidão da Antecedentes, comprovantes de residência, ocupação lícita, família constituída, declarações/testemunhos favoráveis) e com um roteiro de argumentos preparados para a defender a revogação da prisão ou de outra medida cautelar provando sua desnecessidade (exemplo: oitiva de todas as testemunhas nos casos de prisão para conveniência da instrução criminal), evitando sua prorrogação. A jurisprudência precisará decidir o que se entende por “prorrogação da prisão provisória ou outra medida cautelar”. No que se refere a prisão temporária isso fica claro pela previsão expressa de prazo de duração e possibilidade de prorrogação no Art. 2o da Lei 7.906/89 (cinco dias prorrogáveis por igual período) e Art. 2o, parágrafo 4o da Lei 8.072/90 (trinta dias prorrogáveis por igual período). Contudo quanto a prisão preventiva (e outras medidas cautelares) presumimos que o legislador esteja se referindo ao novo prazo instituído 26 pelo parágrafo único do Art. 316 do CPP que passa a exigir a revisão da prisão preventiva a cada 90 (noventa) dias. Não fosse assim, ao em vezde usar o gênero “prisão provisória” teria se referido apenas a espécie “prisão temporária” excluindo a prisão preventiva. VII) Decidir sobre o requerimento de produção antecipada de provas consideradas urgentes e não repetíveis, assegurados o contraditório e a ampla defesa em audiência pública e oral; Novamente destacamos o surgimento de uma nova audiência que irá requerer a atuação de um advogado criminalista. A priorização da oralidade é característica na Lei 13.964/2019, ao instituir: (a) Audiência de Custódia (agora prevista no CPP); (b) Audiência de Prorrogação de Medidas Cautelares; (c) Audiência de Produção da Prova Antecipada ou Não repetíveis. Para a atuação nesta nova estrutura será necessário o domínio de técnicas de oratória. Ressaltamos aquilo que já foi advertido anteriormente para lembrar que o Art. 3o-A revoga tacitamente o Art. 156 do CPP na parte em que permitia que o juiz determinasse de ofício a realização de provas urgentes. Perceba que caberá ao Juiz de Garantias decidir sobre o requerimento de provas urgentes e não repetíveis apresentado pelas 27 partes, mas não requerer ou produzir de ofício tais provas, sob pena de violar a estrutura acusatória. Outrossim, perceba que surge uma nova possibilidade de atuação do advogado, ao requerer desde a fase de investigação a produção de uma prova considerada urgente ou não repetível (exemplo: oitiva em juízo de uma testemunha senil ou portadora de doença grave). VIII) Prorrogar o prazo de duração do inquérito, estando o investigado preso, em vista das razões apresentadas pela autoridade policial e observado o disposto no § 2º deste artigo; Caberá ao Juiz de Garantias decidir sobre o pedido de prorrogação do inquérito policial, ressaltando que ao determinar que a prorrogação ocorrerá “em vista das razões apresentadas” fica claro que a Autoridade Policial deverá fundamentar o requerimento de prorrogação da investigação. A ausência de fundamentação pode possibilitar a impetração de habeas corpus requerendo o trancamento da investigação. Além disso, o Art. 31 da Nova Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019) torna crime a conduta dolosa de estender injustificadamente a investigação, 28 garantindo o respeito da garantia da razoável duração do processo (Art. 5o, LXXVIII da CF). É importante verificar que o parágrafo 3o do Art. 10 do CPP sempre permitiu a prorrogação do inquérito policial se o investigado estiver solto (cujo prazo é de 30 dias podendo ser prorrogado por igual período), o que na prática ocorre reiteradas vezes. A novidade do parágrafo 2o do Art. 3o-B é permitir a prorrogação do inquérito policial, uma única vez, se o investigado estiver preso (cujo prazo é de 10 dias), permitindo-se a prorrogação por até 15 (quinze dias).11 O próprio parágrafo 2o do Art. 3o-B esclarece que nos casos de investigado preso após a prorrogação do inquérito policial se não for concluída a investigação a prisão será imediatamente relaxada, e caso isso não ocorra será possível requerer o relaxamento diretamente ao Juiz de Garantias ou ainda impetrar habeas corpus. 11 Antes da Lei 13.964/2019 a única previsão legal para prorrogação de inquérito policial estando preso o investigado se dava nos casos dos crimes previstos na Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), tal como permitido em seu Art. 51, parágrafo único da Lei. A jurisprudência precisará decidir se o previsto no Art. 3o-B, parágrafo 2o será aplicado aos casos de competência da Justiça Federal cuja prorrogação do inquérito de investigado preso resultava em sua soltura, tal como previsto no Art. 66, parágrafo único da Lei 5.010/66. 29 IX) Determinar o trancamento do inquérito policial quando não houver fundamento razoável para sua instauração ou prosseguimento; Já foi alertado nos comentários ao inciso IV que o Juiz de Garantias como controlador da legalidade da investigação criminal tem a competência de determinar o trancamento do inquérito policial, quando não houver justa causa para sua instauração ou para o seu prosseguimento. Lembre-se que a Autoridade Policial não pode arquivar o inquérito policial (Art. 17 do CPP) e com a nova redação do Art. 28 o arquivamento do inquérito será realizado diretamente pelo Ministério Público (ressaltando que o Art. 28 foi suspenso em decisão liminar do Min. Luiz Fux nas ADI’s 6.299 e 6.300). Desta forma, a única forma do Juiz de Garantias findar a investigação criminal é determinando seu trancamento. Trata-se de decisão irrecorrível, mas que em regra não faz coisa julgada material, permitindo a instauração de nova investigação se surgirem provas substancialmente novas (Art. 18 do CPP e Súmula 524 30 do STF), salvo nos casos de trancamento do inquérito policial por atipicidade12. Na PRÁTICA se o juiz não atuar de ofício caberá ao advogado impetrar habeas corpus requerendo o trancamento da investigação por ausência de justa causa, que será apreciado pelo próprio Juiz de Garantias (Art. 3o-B, inciso XII). X) Requisitar documentos, laudos e informações ao delegado de polícia sobre o andamento da investigação; A compreensão deste inciso depende de sua análise sob a égide do Art. 3o-A que tal como visto, implementa uma estrutura acusatória, veda a iniciativa do juiz da fase de investigação e o proíbe de substituir a atuação probatória da acusação. 12 Neste caso a decisão judicial de trancamento do inquérito fará coisa julgada material, assim como faria a decisão judicial de arquivamento por atipicidade antes da Lei 13.964/2019, sobre o tema o STF já decidiu que: Suprema Corte: “não se revela cabível a reabertura das investigações penais, quando o arquivamento do respectivo inquérito policial tenha sido determinado por magistrado competente, a pedido do Ministério Público, em virtude da atipicidade penal do fato sob apuração, hipótese em que a decisão judicial – porque definitiva – revestir-se-á de eficácia preclusiva e obstativa de ulterior instauração da ‘persecutio criminis’, mesmo que a peça acusatória busque apoiar-se em novos elementos probatórios. Inaplicabilidade, em tal situação, do art. 18 do CPP e da Súmula 524/STF” (HC nº 84.156/MT, Segunda Turma, Relator o Ministro Celso de Mello, DJ de 11/2/05). 31 Logo os documentos, laudos e informações a que se refere dizem respeito a elementos já produzidos, inclusive os sigilosos (lembre-se: falamos do acesso ao Juiz) no curso da investigação cujo acesso se faz necessário ao Juiz de Garantias para proferir alguma decisão ou apenas para o cumprimento de uma de suas funções como controlador da legalidade da investigação. Ou seja, este inciso não permite que o Juiz de Garantias requisite a produção de qualquer ato probatório no curso da investigação (ou do processo). XI) Decidir sobre os requerimentos de: a) interceptação telefônica, do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática ou de outras formas de comunicação; b) afastamento dos sigilos fiscal, bancário, de dados e telefônico; c) busca e apreensão domiciliar; d) acesso a informações sigilosas; e) outros meios de obtenção da prova que restrinjam direitos fundamentais do investigado; Do mesmo modo que a lei atribuiu ao Juiz de Garantias a competência para decidir sobre o requerimento de prisão ou outra medida cautelar, todas as demais restrições a direitos fundamentais 32 também serão de sua competência, tal como descreve de forma subsidiaria a própria alínea “e” do Art. 3o-B, inciso XI. As alíneas “a”, “b” e “c” tratam-se de meios probatórios, respectivamente interceptação telefônica e de outas formas de comunicação, quebra de sigilos em geral e busca e apreensão, as quais sempre precisarão ser requeridas pela Autoridade Policial ou pelo representante do Ministério Público, não podendo o Juiz de Garantias decretá-las de ofício,em observância ao Art. 3o-A. No que diz respeito a alínea “d” a redação é vaga, podendo concluir que se falam de outras informações sigilosas que possam ser utilizadas como meio de provas – ainda que seja difícil pensar em informações que decorram de outras fontes para além das elencadas nas alíneas “a”, “b” e “c” – já que o acesso a informações sigilosas é direito do advogado com procuração nos autos e independe de autorização judicial (Súmula Vinculante 14 e Art. 7o, XIV e parágrafo 10 e 11 da Lei 8.906/94). A única mudança prática neste sentido está intimamente relacionada ao próximo inciso, ou seja, a forma de combate a decisão do Juiz de Garantias que decidir a respeito de tais provas, seja negando-as ou decretando sua colheita. Neste caso, para impugnar a decisão do Juiz 33 de Garantias será necessário impetrar habeas corpus perante o Tribunal competente. XII) Julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da Denúncia; Caberá ao Juiz de Garantais julgar os habeas corpus, bem como o mandado de segurança criminal em analogia, impetrados antes do oferecimento da Denúncia, desde que o Impetrado seja autoridade cuja competência não extrapole a do Juiz de Garantias. A jurisprudência do STJ e STF há algum tempo entende que é de competência dos Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais o julgamento de habeas corpus impetrado contra representante do Ministério Público13, portanto as hipóteses de habeas corpus julgados pelo Juiz de Garantias resumem-se basicamente ao ataque de atos praticados pela Autoridade Policial. 13 “1. Conforme pacífico entendimento deste Tribunal Superior, compete ao Tribunal de Justiça local processar e julgar habeas corpus contra ato imputado a membro do Ministério Público estadual. (HC 136.370/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 22/02/2011, DJe 14/03/2011).” e “Ambas as Turmas desta Corte (assim, nos RREE 141.209 e 187.725) têm entendido que, em se tratando de "habeas corpus" contra ato de Promotor da Justiça Estadual, a competência para julgá-lo é do Tribunal de Justiça por ser este competente para seu julgamento quando acusado de crime comum ou de responsabilidade. (RE 285569, Relator: Min. MOREIRA ALVES, Primeira Turma, julgado em 18/12/2000, DJ 16-03-2001)”. 34 Convém lembrar que, contra decisão do Juiz de Garantias proferida no julgamento do habeas corpus, negando ou concedendo a ordem de HC, cabe recurso em sentido estrito ao Tribunal, com fundamento no Art. 581, inciso X do CPP. XIII) Determinar a instauração de incidente de insanidade mental; O Art. 149, parágrafo 1o do CPP permite que durante o inquérito policial a Autoridade Policial represente requerendo a instauração de incidente de insanidade mental, neste caso a competência para apreciar o tema (antes do oferecimento da Denúncia) será do Juiz de Garantias. Ainda que não esteja previsto no parágrafo 1o do Art. 149 do CPP, seria impensável, dentro de uma estrutura acusatória de processo (Art. 3o-A), não conceder legitimidade ao advogado do investigado para requerer o incidente, além do que questões formais de legitimidade não podem permitir o prosseguimento da investigação contra pessoa incapaz, sob pena de violar direitos individuais do investigado, o que é vedado pelo Art. 3o-B, caput. Por isso, acreditamos que com fundamento no Art. 3o-A c.c Art. 149, caput do CPP o advogado possa requerer ao Juiz de Garantias a instauração de incidente de insanidade mental. 35 Ressalta-se que a decisão que defere a realização do incidente é irrecorrível, em contrapartida contra decisão que indefere o pedido é cabível Apelação, nos termos do Art. 593, II do CPP. XIV) Decidir sobre o recebimento da denúncia ou queixa, nos termos do Art. 399 deste Código; Para garantir a imparcialidade, o Juiz de Garantias ficará responsável pelo juízo de admissibilidade da Denúncia ou Queixa, evitando a contaminação do juiz que realizará a instrução do processo e proferirá sentença de mérito pelos elementos da investigação, pois como será visto o caderno de investigação não será mais integrado ao processo (Art. 3o-C, parágrafo 3o). Na PRÁTICA é possível defender que ao prever que o Juiz de Garantias receba a Denúncia ou Queixa na forma do Ar. 399 do CPP – que é posterior a resposta à acusação, prevista nos Art. 396 e 396-A – a Lei 13.964/2019 está determinando que somente seja recebida a inicial acusatória após a apresentação da resposta à acusação, assim como já ocorre no Art. 56 da Lei 11.343/2006 e Art. 514 do próprio CPP. Ou seja, existe um contraditório prévio ao recebimento da Denúncia ou Queixa. 36 Por isso, potencializa-se a importância da resposta à acusação, sobretudo no que tange as teses de rejeição da inicial acusatória (Art. 395 do CPP), que agora serão apreciadas pelo magistrado competente (Juiz de Garantias) antes de qualquer contato prévio com a Denúncia. XV) Assegurar prontamente, quando se fizer necessário, o direito outorgado ao investigado e ao seu defensor de acesso a todos os elementos informativos e provas produzidos no âmbito da investigação criminal, salvo no que concerne, estritamente, às diligências em andamento; O direito de acesso a todos elementos já documentados no curso da investigação pelo investigado e seu defensor, ressalvadas as diligências em andamento (exemplo: interceptação telefônica em curso) não dependem de autorização judicial (Súmula Vinculante 14 e Art. 7o, XIV e parágrafo 10 e 11 da Lei 8.906/94). Contudo, se for negado o acesso aos autos, caberá a Juiz de Garantias garantir o acesso de ofício ou mediante provocação do investigado ou de seu defensor que neste caso não precisará impetrar habeas corpus ou mandado de segurança, bastando apresentar simples 37 requerimento ao Juiz de Garantias para ter assegurado seu direito de acesso aos autos. Aliás, a negativa de acesso ao inquérito policial, inclusive sigiloso, ressalvado os casos de diligência em andamento cujo acesso prejudique sua conclusão, foi tipificada como crime pelo Art. 32 da Nova Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019), sendo este mais um artificio importante para garantir o fornecimento de todos os elementos ao investigado e sua defesa. XVI) Deferir pedido de admissão de assistente técnico para acompanhar a produção da perícia; Até então em observância ao parágrafo 3o do Art. 159 do CPP a admissão do assistente técnico somente seria possível no curso do processo, mas não durante a investigação criminal. Contudo, com a nova redação do Art. 3o-B, XVI permite-se que ao investigado, ao Ministério Público, ao ofendido e ao Querelante a indicação de assistente técnico para acompanhar a produção da perícia realizada no curso da investigação criminal, ficando a decisão a este respeito ao encargo do Juiz de Garantias. 38 A jurisprudência precisará decidir acerca da possibilidade de indicação de assistente técnico realizada pelo assistente de acusação, já que este só pode ser admitido no curso do processo, na forma do Art. 268 e seguintes do CPP. Além disso, encontra-se revogado de forma tácita o parágrafo 4o do Art. 159 do CPP que previa a atuação do assistente técnico somente após a conclusão dos exames, pois o Art. 3o-B, XVI prevê expressamente a possibilidade de que o assistente técnico acompanhe a produção da perícia, novamente potencializando o contraditório desde a colheita probatória, tal como já era previsto no Art. 466, parágrafo 2o do CPC/2015 cuja aplicação analógica dificilmente era permitida no processo penal. Não há recurso previsto contra a decisão que indeferir a admissão do assistente técnico, sendo necessário impetrar habeas corpus em razão do cerceamento de defesa. XVII) Decidir sobre a homologação de acordo de não persecução penal ou os decolaboração premiada, quando formalizados durante a investigação; 39 O instituto do acordo de não persecução penal será estudado mais adiante, cabendo neste ponto apenas ressaltar novamente a evolução ao se prever que o acordo de colaboração premiada realizada no curso da investigação será homologado ou não pelo Juiz de Garantias, ressalvado os casos de figurarem entre as pessoas delatadas autoridades com prerrogativa de foro.14 Desta forma, fica mantida a imparcialidade do juiz que posteriormente julgará o processo e não terá acesso ao conteúdo da colaboração que será acautelado juntamente com os autos da investigação (Art. 3o-C, parágrafo 3o). Além disso, com a homologação realizada pelo Juiz de Garantias prevalece aquilo que o STF já tinha entendido ao determinar que “o acordo de colaboração, como meio de obtenção de prova, não constitui critério de determinação, de modificação ou de concentração da competência.”15 Posteriormente serão analisadas as mudanças a Lei 12.850/2013, que em no parágrafo 16o do seu Art. 4-A prevê que as decisões sobre medidas cautelares reais ou pessoais, recebimento da denúncia e 14 STF, Pet. 5.244, Rel. Min. Teoeri Zavascki, j. 19/12/2014. 15 STF, Inq. 4.130 QO/PR, Plenário, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 23/09/2016. 40 sentença condenatória, as duas primeiras de atribuição do mesmo Juiz de Garantias que homologará o acordo, não podem ser fundamentadas apenas nas declarações do colaborador. XVIII) Outras matérias inerentes às atribuições definidas no caput deste artigo. Resumidamente, este inciso encerra esclarecendo aquilo que anunciamos na análise inicial do Art. 3o-B, no sentido de que todos os atos que dependerem de decisão judicial no curso da investigação serão de competência do Juiz de Garantias. 3) A Competência material (ratione materiae), o momento de atuação do Juiz de Garantias e a Exclusão física do inquérito policial Art. 3º-C. A competência do juiz das garantias abrange todas as infrações penais, exceto as de menor potencial ofensivo, e cessa com o recebimento da denúncia ou queixa na forma do art. 399 deste Código. § 1º Recebida a denúncia ou queixa, as questões pendentes serão decididas pelo juiz da instrução e julgamento. § 2º As decisões proferidas pelo juiz das garantias não vinculam o juiz da instrução e julgamento, que, após o recebimento da denúncia ou queixa, deverá 41 reexaminar a necessidade das medidas cautelares em curso, no prazo máximo de 10 (dez) dias. § 3º Os autos que compõem as matérias de competência do juiz das garantias ficarão acautelados na secretaria desse juízo, à disposição do Ministério Público e da defesa, e não serão apensados aos autos do processo enviados ao juiz da instrução e julgamento, ressalvados os documentos relativos às provas irrepetíveis, medidas de obtenção de provas ou de antecipação de provas, que deverão ser remetidos para apensamento em apartado. § 4º Fica assegurado às partes o amplo acesso aos autos acautelados na secretaria do juízo das garantias. O Art. 3o-C ao dizer em seu caput que o Juiz de Garantias abrange todas infrações penais está reconhecendo a obrigatoriedade de sua atuação em todos os procedimentos (ordinário e sumário, júri, crimes funcionais, tráfico de drogas e inclusive nos casos de competência originária dos tribunais), excetuando-se o procedimento comum sumaríssimo nos Juizados Especiais Criminais, o que parece correto já que a Lei 9.099/95 não comporta as medidas de restrição a direitos fundamentais que exigem a atuação do Juiz de Garantias (exemplo: prisão preventiva e interceptação telefônica). Contudo, em decisão liminar proferida pelo Min. Dias Toffoli em 15/01/2020 na ADI 6298 afastou (ao menos liminarmente), até o julgamento de mérito das ADI’s 6298, 6299 e 6300, a aplicação do Juiz de 42 Garantias de 04 procedimentos. São eles os casos de: (a) competência Tribunal do Júri; (b) violência doméstica e familiar contra a mulher; (c) crimes de competência originária dos Tribunais; e (d) crimes de competência da Justiça Eleitoral. Lembrando que posteriormente o Min. Luiz Fux proferiu nova decisão liminar no julgamento das ADI’s 6.299 e 6.300 e suspendeu por completo a implementação do Juiz de Garantias até o julgamento de mérito. A atuação do Juiz de Garantais se encerra com o recebimento da Denúncia ou Queixa, ou seja, se for rejeitada a inicial acusatório o recurso em sentido estrito (Art. 581, I do CPP) será interposto perante o Juiz de Garantias, afinal é cabível o juízo de retratação (Art. 589 do CPP) que neste caso consistiria no em receber a acusação que é ato de sua competência (Art. 3o-B, XIV). Recebida a Denúncia todas as questões futuras de competência do juízo de 1a Instância serão decididas pelo Juiz que ficará responsável pela instrução e julgamento do caso (Art. 3o-C, parágrafo 1o). Segundo o parágrafo 2o do Art. 3o-C o recebimento da acusação, o Juiz da Instrução e Julgamento no prazo máximo de 10 (dez) dias 43 precisará reavaliar a necessidade das medidas cautelares em curso que foram decretadas pelo Juiz de Garantias. Neste ponto, é preciso fazer uma interpretação sistemática com o Art. 315, parágrafo 2o, inciso que exige fundamentação da decisão não sendo suficiente fazer referencias aos mesmos argumentos utilizados pela decretação realizada pelo Juiz de Garantias, sob pena de nulidade de acordo com a nova redação do inciso V do Art. 564, cabendo habeas corpus para garantir a liberdade do acusado (Art. 648, VI do CPP) Se não for realizada o reexame da necessidade das medidas cautelares no prazo de 10 (dez) dias a consequência deve ser a mesma prevista no parágrafo único do Art. 316, ou seja, a ilegalidade da prisão sendo necessária a impetração de habeas corpus requerendo seu relaxamento (Art. 648, II do CPP). Por fim, é importante a alteração trazida pelo parágrafo 3o do Art. 3o-C que ao dizer que: “Os autos que compõem as matérias de competência do juiz das garantias ficarão acautelados na secretaria desse juízo, à disposição do Ministério Público e da defesa, e não serão apensados aos autos do processo enviados ao juiz da instrução e julgamento, ressalvados os documentos relativos às provas irrepetíveis, medidas de obtenção de provas ou de antecipação de provas, que 44 deverão ser remetidos para apensamento em apartado” está adotando aquilo que Aury Lopes Jr. defende há anos como a exclusão física do inquérito policial16. Resumidamente, fica vedado que o inquérito policial acompanhe a Denúncia ou a Queixa. Por sua vez, o parágrafo 4o do Art. 3o-C reitera que as partes poderão ter acesso aos autos do inquérito policial, mas não poderão utilizá-los como prova, por exemplo, fazendo a juntada de elementos do inquérito ao processo durante a instrução como se prova documental fossem. Afinal, não seria razoável defender que a lei determina o acautelamento do inquérito policial para continuar permitindo seu ingresso por via transversal, bastaria que o MP, logo após o oferecimento da Denúncia realizasse a juntada do inteiro teor do inquérito policial aos autos do processo. Com isso, é possível defender a revogação tácita de parte do Art. 155 do CPP que elucida: Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as 16 LOPES JR. Aury. Direito Processual Penal. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019, p. 169. 45 provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008) A abertura retórica do Art. 155 do CPP sempre permitiu que se argumentasse que “os elementos colhidos no curso do inquérito policial foram confirmados pelas provas produzidas em contraditóriojudicial”, mesmo que não houvesse prova alguma. Isso se torna impossível na medida que os elementos informativos colhidos na investigação ficam acautelados e não integram mais o processo, logo não poderão ser utilizados para fundamentar sentença ainda que confirmados pela prova produzida no curso da instrução. Acredita-se que essa vedação se estende ao julgamento em Plenário do Tribunal do Júri, não sendo permitido na fase do Art. 479 do CPP realizar a juntada de elementos colhidos na fase de investigação. Entretanto a decisão liminar proferida pelo Min. Dias Toffoli em 15/01/2020 na ADI 6298 afastou (ao menos liminarmente) a aplicação do Juiz de Garantias dos procedimentos de competência do Tribunal do Júri até o julgamento de mérito das ADI’s 6298, 6299 e 6300. 4) O impedimento do Juiz de Garantias: evitando o confirmation bias 46 Art. 3º-D. O juiz que, na fase de investigação, praticar qualquer ato incluído nas competências dos arts. 4º e 5º deste Código ficará impedido de funcionar no processo. Parágrafo único. Nas comarcas em que funcionar apenas um juiz, os tribunais criarão um sistema de rodízio de magistrados, a fim de atender às disposições deste Capítulo. Essa previsão também renova uma das principais regras de determinação da competência, a prevenção prevista no Art. 83 do CPP, já que o Juiz de Garantias ao atuar entre o curso da investigação e o recebimento da acusação não se tornará prevento para a instrução e julgamento. Pelo contrário, o Art. 3o-D expressamente declara o impedimento do Juiz de Garantias para funcionar no curso do processo, tratando-se de nova hipótese de impedimento a ser somada aquelas previstas no Art. 252 do CPP, tornando claro que a função do Juiz de Garantias é garantir a imparcialidade do Juiz de Instrução e Julgamento que não terá contato com os elementos indiciários (Art. 3o-C, parágrafo 3o)17. Existem pesquisas que comprovam a ocorrência de distorções cognitivas que provocam decisões “bloqueadas” ou “cegas” por uma 17 Esse alerta já era feito há muito tempo pela doutrina crítica: MAYA, André Machado. Imparcialidade e processo penal. Da prevenção da competência ao juiz de garantias. 2a Ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 104 em diante, e LOPES JR. Aury; GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. Investigação preliminar no processo penal. 6a ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 405. 47 tendência confirmatória (confirmation bias) que afeta o magistrado que na fase preliminar profere decisões analisando a autoria e materialidade em casos que serão levados a seu julgamento de mérito no futuro.18 A implementação do Juiz de garantias tenta evitar essa ocorrência. Resumidamente, a prevenção decorrente da atuação na fase de investigação deixa de ser critério de fixação da competência e torna o magistrado impedido de atuar no curso do processo. Ao mudar a figura (pessoa) do julgador surgem novas perspectivas, ou seja se até então operava-se uma carga negativa ao investigado diante de determinado Juiz de Garantias a alteração do julgador pode permitir novas perspectivas e com isso novas chances e oportunidades. 5) O funcionamento e implementação do Juiz de Garantias Art. 3º-E. O juiz das garantias será designado conforme as normas de organização judiciária da União, dos Estados e do Distrito Federal, observando critérios objetivos a serem periodicamente divulgados pelo respectivo tribunal. 18 Nos referimos a pesquisa de Gloeckner que identificou: “Em números brutos, das 90 sentenças e dos 90 acórdãos analisados, chegou-se à conclusão de que de forma direta ou indireta a prisão processual (como regra geral a prisão em flagrante) foi utilizada como elemento formador de convicção judicial em todos os casos.” (GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. Prisões cautelares, confirmation bias e o direito fundamental à devida cognição no processo penal. In: Revista Brasileira de Ciências Criminais. Vol 117, nov-dez, 2015. 48 O Art. 3o-E juntamente com o parágrafo único do Art. 3o-D disciplinam a aplicabilidade do Juiz de Garantias, esclarecendo que “nas comarcas em que funcionar apenas um juiz, os tribunais criarão um sistema de rodízio de magistrados”, da forma que já ocorre em diversos Estados no período de recesso forense. Ou seja, o Juiz de Garantias não aumentará os gastos do Poder Judiciário, salvo se assim escolherem seus dirigentes e o Poder Executivo. Advertimos que em decisão liminar proferida no julgamento das ADI’s 6298, 6299 e 6300 o Min. Dias Toffoli presidente do STF suspendeu até o julgamento de mérito o parágrafo único do Art. 3o-D por entender que o dispositivo “viola o poder de auto-organização dos Tribunais e usurpa sua iniciativa para dispor sobre organização judiciária”19. Entretanto, acreditamos que a opção dada pelo legislador é bastante viável e como dito já adotada por alguns Tribunais durante o recesso forense. 19 Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-jan-15/toffoli-suspende-implementacao- juiz-garantias. Acesso em: 15/01/2020. 49 Ressalta-se que, posteriormente o Min. Luiz Fux em decisão liminar nas ADI’s 6.299 e 6.305 suspendeu por completo a aplicabilidade do Juiz de Garantias. As demais previsões acerca da organização do Juiz de Garantis será prevista nos Regimentos Internos dos Tribunais e normas de organização judiciária da União, dos Estados e do Distrito Federal, observando critérios objetivos a serem periodicamente divulgados pelo respectivo tribunal. 6) A preservação dos direitos dos presos e a relação do Juiz de Garantias com a Nova Lei de Abuso de Autoridade Art. 3º-F. O juiz das garantias deverá assegurar o cumprimento das regras para o tratamento dos presos, impedindo o acordo ou ajuste de qualquer autoridade com órgãos da imprensa para explorar a imagem da pessoa submetida à prisão, sob pena de responsabilidade civil, administrativa e penal. Parágrafo único. Por meio de regulamento, as autoridades deverão disciplinar, em 180 (cento e oitenta) dias, o modo pelo qual as informações sobre a realização da prisão e a identidade do preso serão, de modo padronizado e respeitada a programação normativa aludida no caput deste artigo, transmitidas à imprensa, assegurados a efetividade da persecução penal, o direito à informação e a dignidade da pessoa submetida à prisão. 50 Por fim, o Art. 3o-F prevê como última atribuição do Juiz de Garantias impedir acordo ou ajuste entre autoridades e órgãos de imprensa para explorar a imagem da pessoa submetida à prisão, sob pena de responsabilidade civil, administrativa e penal. Ainda que os indicativos “acordo ou ajuste” sejam termos vagos, o Art. 13, inciso I da Nova Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019 em vigência desde o dia 03/01/2020) traduz com clareza que caracteriza crime “Constranger o preso ou o detento, mediante violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade de resistência, a exibir-se ou ter seu corpo ou parte dele exibido à curiosidade pública.”, independentemente da existência de acordo ou ajuste entre a autoridade e o órgão de empresa que realizar a divulgação. Inobstante, considerando que o direito a informação tem previsão constitucional (art. 5o, XIV da CF) o parágrafo único do Art. 3o-F traz uma norma de transição que concede 180 dias para regulamentação da forma que será realizada a comunicação a imprensa acerca da prisão de determinada pessoa e sua identidade, obviamente dentro dos limites do caput do Art. 3o-F e de forma a não incorrer no crime do Art. 13 da Lei 13.869/2019. 51 Acreditamos que o ponto de equilíbrio será a divulgação do prenome da presa, evitando a divulgação de seu nome completo e vedada de qualquer forma a exposição de sua imagem (corpo) total ou parcial. Parte 2 – A obrigatoriedade de defesa ao Investigado Policial “Art. 14-A. Nos casos em que servidores vinculadosàs instituições dispostas no art. 144 da Constituição Federal figurarem como investigados em inquéritos policiais, inquéritos policiais militares e demais procedimentos extrajudiciais, cujo objeto for a investigação de fatos relacionados ao uso da força letal praticados no exercício profissional, de forma consumada ou tentada, incluindo as situações dispostas no art. 23 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), o indiciado poderá constituir defensor. § 1º Para os casos previstos no caput deste artigo, o investigado deverá ser citado da instauração do procedimento investigatório, podendo constituir defensor no prazo de até 48 (quarenta e oito) horas a contar do recebimento da citação. § 2º Esgotado o prazo disposto no § 1º deste artigo com ausência de nomeação de defensor pelo investigado, a autoridade responsável pela investigação deverá intimar a instituição a que estava vinculado o investigado à época da ocorrência dos fatos, para que essa, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, indique defensor para a representação do investigado. § 3º (VETADO). § 4º (VETADO). § 5º (VETADO). 52 § 6º As disposições constantes deste artigo se aplicam aos servidores militares vinculados às instituições dispostas no art. 142 da Constituição Federal, desde que os fatos investigados digam respeito a missões para a Garantia da Lei e da Ordem.” De forma tardia o Art. 14-A regulamentou expressamente o direito de defesa (Art. 5o LV da CF) aos investigados policiais (Art. 144 da CF) em qualquer investigação, restringido aos casos de investigação de fatos relacionados ao uso da força letal praticados no exercício profissional. Idêntica previsão também foi incluída pela Lei 13.964/2019 no Código de Processo Penal Militar Decreto-Lei 1.002/69) em seu Art. 16-A.20 20 “Art. 16-A. Nos casos em que servidores das polícias militares e dos corpos de bombeiros militares figurarem como investigados em inquéritos policiais militares e demais procedimentos extrajudiciais, cujo objeto for a investigação de fatos relacionados ao uso da força letal praticados no exercício profissional, de forma consumada ou tentada, incluindo as situações dispostas nos arts. 42 a 47 do Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969 (Código Penal Militar), o indiciado poderá constituir defensor. § 1º Para os casos previstos no caput deste artigo, o investigado deverá ser citado da instauração do procedimento investigatório, podendo constituir defensor no prazo de até 48 (quarenta e oito) horas a contar do recebimento da citação. § 2º Esgotado o prazo disposto no § 1º com ausência de nomeação de defensor pelo investigado, a autoridade responsável pela investigação deverá intimar a instituição a que estava vinculado o investigado à época da ocorrência dos fatos, para que esta, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, indique defensor para a representação do investigado. § 3º, 4o e 5o (VETADO). § 6º As disposições constantes deste artigo aplicam-se aos servidores militares vinculados às instituições dispostas no art. 142 da Constituição Federal, desde que os fatos investigados digam respeito a missões para a Garantia da Lei e da Ordem. 53 Não entendemos a necessidade desta nova previsão e da supramencionada restrição, pois desde a reforma promovida pela Lei 13.245/2016 na Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil), foi incluído o inciso XXI ao Art. 7o do Estatuto prevendo a possibilidade do advogado assistir seus clientes no curso de qualquer investigação, sob pena de nulidade. Trata-se de direito público e subjetivo, ou seja, existe a faculdade (possibilidade) de ter um advogado acompanhando a investigação. Desta forma, acreditamos que já era previsto o direito do investigado militar ser acompanhado por um defensor no curso da investigação, inclusive no inquérito policial militar, se assim desejasse, sendo inclusive mais ampla a previsão do Aet. 7o, XXI da Lei 8.906/94 em face a limitação imposta pelo Art. 14-A. A novidade na PRÁTICA é que o investigado será citado acerca da instauração do procedimento investigatório (Art. 14-A, parágrafo 1o) possibilitando de fato que o investigado constitua um defensor. Seria importante que existisse essa previsão para todas as pessoas, incluindo os investigados não militares, mas não foi a opção da Lei 13.964/2019 que restringiu esse direito tornando-o uma prerrogativa exclusiva dos militares. 54 Segundo parágrafo 2o do Art. 14-A, não sendo constituído advogado no prazo de 48 horas após a citação da instauração a Autoridade responsável pela investigação deverá comunicara a instituição a que estava vinculado o investigado à época da ocorrência dos fatos, para que esta, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, indique defensor para a representação do investigado. Por fim, esclarece o parágrafo 6o do Art. 14-A que todas as disposições previstas neste dispositivo se estendem aos servidores das forças armadas elencados no Art. 142 da CF. Mas, novamente há uma restrição há uma restrição da prerrogativa desta vez para os investigados digam respeito a missões para a Garantia da Lei e da Ordem. Parte 3 – O novo arquivamento do Inquérito Policial Art. 28. Ordenado o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer elementos informativos da mesma natureza, o órgão do Ministério Público comunicará à vítima, ao investigado e à autoridade policial e encaminhará os autos para a instância de revisão ministerial para fins de homologação, na forma da lei. § 1º Se a vítima, ou seu representante legal, não concordar com o arquivamento do inquérito policial, poderá, no prazo de 30 (trinta) dias do recebimento da comunicação, submeter a matéria à revisão da instância competente do órgão ministerial, conforme dispuser a respectiva lei orgânica. 55 § 2º Nas ações penais relativas a crimes praticados em detrimento da União, Estados e Municípios, a revisão do arquivamento do inquérito policial poderá ser provocada pela chefia do órgão a quem couber a sua representação judicial. (NR) 1) O Arquivamento direto pelo Ministério Público Inicialmente esclarecemos que a decisão liminar proferida pelo Min. Luiz Fux no julgamento das ADI’s 6.299 e 6.305 suspendeu a eficácia do Art. 28 até o julgamento de mérito pelo Plenário, por entender que sua adoção causaria impacto financeiro ao órgão ministerial, além de entender que se trata de norma vaga, por exemplo pelo fato de não definir quem seria a “instância de revisão ministerial”.21 A alteração trazida pela Lei 13.964/2019 modifica de forma significante o procedimento de arquivamento do inquérito policial ou qualquer outra forma de investigação criminal que, anteriormente eram promovidas pelo Ministério Público e determinadas pelo Juiz. A nova redação do Art. 28 passa a prever um arquivamento direto realizado pelo Ministério Público, sem a necessidade de intervenção ou qualquer análise judicial e que ocorrerá em 02 (duas) etapas: (a) o 21 Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15342203609&ext=.pdf. Acesso em 30/01/2020. 56 promotor natural do caso manifesta-se pelo arquivamento da investigação; (b) logo após será realizada a comunicação da vítima, do(s) investigado(s) e da autoridade policial, submetendo o arquivamento para homologação pela instância de revisão ministerial (que já existia no MPF sendo intitulado de Câmara de Coordenação e Revisão22). Lembre-se ainda que a redação original do Art. 28 permitia que o Juiz discordasse do arquivamento, oportunidade em que remeteria os autos ao Procurador-Geral que, por sua vez, poderia decidiria sobre a necessidade de oferecimento de Denúncia (pelo próprio PGJ ou outro Promotor) ou insistiria no arquivamento que somente neste caso vincularia o Juiz. A possibilidade de o Juiz discordar do arquivamento não subsiste no arquivamentorealizado diretamente pelo MP. A lei foi omissa ao não esclarecer qual será a providencia caso a instância de revisão ministerial não concorde com o arquivamento, acredita-se que será adotada a mesma providencia realizada pela redação original do Art. 28 no caso em que o PGJ discordasse do arquivamento, de modo que deve ser indicado outro Promotor para oferecer a Denúncia. 22 Sobre o tema veja: http://www.mpf.mp.br/o-mpf/sobre-o-mpf/atuacao/camaras-de- coordenacao-e-revisao. Acesso em 14/01/2020. 57 2) O Direito de Revisão do arquivamento do inquérito policial Até o surgimento da Lei 13.964/2019 não havia providencias processuais a serem praticadas pela vítima ou seu representante legal caso não concordassem com a promoção do arquivamento do inquérito policial. A partir de agora, o Art. 28 além de prever a obrigação de comunicação da vítima em seu parágrafo 1o cria a possibilidade da vítima ou seu representante legal requerem a revisão do arquivamento da investigação. Podemos dizer que surge com isso uma espécie de Recurso Administrativo contra o Arquivamento do inquérito policial, cujo prazo é de 30 (trinta) dias, contados a partir da comunicação do arquivamento e na forma do Art. 798 do CPP, tendo legitimidade a vítima ou seu representante ilegal. O parágrafo 1o fala que o recurso será apreciado pela “instância competente do órgão ministerial”, o que provavelmente será definido pelo Ministério Público em Resolução, evitando que o pedido de revisão seja apreciado por quem homologou o arquivamento, ou seja, as chamadas Câmaras de Coordenação e Revisão. 58 Por fim, o parágrafo 2o esclarece que nas ações penais relativas a crimes praticados em detrimento da União, Estados e Municípios a legitimidade para promover a revisão do arquivamento fica ao encargo de seu representante legal. 59 Parte 4 – O Acordo de não persecução penal “Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente: I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo; II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada. § 1º Para aferição da pena mínima cominada ao delito a que se refere o caput deste artigo, serão consideradas as causas de aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto. § 2º O disposto no caput deste artigo não se aplica nas seguintes hipóteses: 60 I - se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei; II - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas; III - ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e IV - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor. § 3º O acordo de não persecução penal será formalizado por escrito e será firmado pelo membro do Ministério Público, pelo investigado e por seu defensor. § 4º Para a homologação do acordo de não persecução penal, será realizada audiência na qual o juiz deverá verificar a sua voluntariedade, por meio da oitiva do investigado na presença do seu defensor, e sua legalidade. § 5º Se o juiz considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições dispostas no acordo de não persecução penal, devolverá os autos ao Ministério Público para que seja reformulada a proposta de acordo, com concordância do investigado e seu defensor. § 6º Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para que inicie sua execução perante o juízo de execução penal. § 7º O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais ou quando não for realizada a adequação a que se refere o § 5º deste artigo. § 8º Recusada a homologação, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para a análise da necessidade de complementação das investigações ou o oferecimento da denúncia. 61 § 9º A vítima será intimada da homologação do acordo de não persecução penal e de seu descumprimento. § 10. Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo de não persecução penal, o Ministério Público deverá comunicar ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia. § 11. O descumprimento do acordo de não persecução penal pelo investigado também poderá ser utilizado pelo Ministério Público como justificativa para o eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo. § 12. A celebração e o cumprimento do acordo de não persecução penal não constarão de certidão de antecedentes criminais, exceto para os fins previstos no inciso III do § 2º deste artigo. § 13. Cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente decretará a extinção de punibilidade. § 14. No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo de não persecução penal, o investigado poderá requerer a remessa dos autos a órgão superior, na forma do art. 28 deste Código.” 1) Justiça Negocial: um caminho sem volta para um sistema dominado pela negociação nos processos criminais Dentre todos OS tipos penais previstos no Código Penal (Art. 121 ao 359-H do CP) somente 45 crimes não permitirão o acordo de não- persecução penal (doravante abreviado como ANPP). Ou seja, menos de 20% dos crimes do Código Penal não permitirão a realização do ANPP por não preencherem seus requisitos (objetivos) que serão analisados no tópico seguinte. São eles: 62 → Os crimes contra vida (Art. 121 ao 126 do CP), com exceção do homicídio culposo (Art. 121, parágrafo 3o do CP); → A lesão corporal (Art. 129 do CP), com exceção da lesão culposa (Art. 129, parágrafo 6o do CP); - Abandono de incapaz com resultado morte (Art. 133, parágrafo 2o do CP); → Maus tratos quando ocorrer lesão ou resultado morte (Art. 136, parágrafos 1o e 2o do CP); → Rixa (Art. 137 do CP); → Constrangimento ilegal (Art. 146 do CP), Ameaça (art. 147 do CP) e Sequestro e Cárcere privado qualificado (Art. 148, parágrafo 2o do CP); → Roubo (Art. 157 do CP), Extorsão (Art. 158 do CP) e Extorsão mediante Sequestro (Art. 159 do CP); → Esbulho possessório com violência (Art. 161, parágrafo 2o do CP); → Dano com violência ou grave ameaça (Art. 163, parágrafo único, inciso I do CP) 63 → Os crimes contra a organização do trabalho (Art. 197 ao 207 do CP), com exceção aos artigos 201, 202, 205, 206 e 207 do
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