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Processos patológicos gerais | Larissa Primo. NEOPLASIAS Características fundamentais e compartilhadas do câncer: ● O câncer é uma desordem genética causada por mutações do DNA que (em sua maior parte) são adquiridas espontaneamente ou induzidas por agressões do ambiente. Alterações genéticas e epigenéticas alteram a expressão ou função de genes-chave que regulam os processos celulares fundamentais, como crescimento, sobrevida e senescência. ● Essas alterações genéticas são hereditárias e passadas para as células-filhas na divisão celular. Como resultado, as células que ancoram essas alterações estão sujeitas à seleção darwiniana (sobrevivência da mais ajustada, discutivelmente o conceito científico mais importante já concebido), em que as células que sofrem mutações proporcionam as vantagens de crescimento ou sobrevivência, passando para trás suas vizinhanças e chegando desse modo a dominar a população. Como as vantagens seletivas são conferidas a uma única célula que acaba dando origem ao tumor, todos os tumores são clonais (isto é, é a progênie de uma célula). ● O acúmulo de mutações dá origem a uma série de propriedades chamadas características do câncer. Estas incluem (1) autossuficiência nos sinais de crescimento, pelos quais o crescimento dos cânceres se torna autônomo e não é regulado por indícios fisiológicos; (2) ausência de resposta aos sinais inibidores de crescimento que controlam as proliferações celulares não neoplásicas, como a hiperplasia; (3) evasão da morte celular, permitindo que as células cancerosas sobrevivam sob condições que induzem apoptose em células normais; (4) potencial replicativo ilimitado tornando, portanto, as células cancerosas imortais; (5) desenvolvimento da angiogênese para sustentar o crescimento das células cancerosas; (6) capacidade de invadir tecidos locais e disseminar-se para locais distantes; (7) reprogramação das vias metabólicas — especificamente, uma alteração para a glicólise aeróbica, mesmo quando há abundante oxigênio; e (8) capacidade de escapar do sistema imune. Nomeclatura Neoplasia literalmente significa “novo crescimento”. Diz-se que células neoplásicas são transformadas porque continuam a se replicar, aparentemente “desatentas” às influências regulatórias que controlam o crescimento celular normal. As neoplasias, portanto, desfrutam de certo grau de autonomia e tendem a aumentar de tamanho independentemente de seu ambiente local. Sua autonomia, porém, não é absolutamente completa. Todas as neoplasias dependem do hospedeiro para sua nutrição e suprimento sanguíneo. No uso médico comum, geralmente uma neoplasia é referida como tumor. Entre os tumores, a divisão de neoplasias em categorias benigna e maligna baseia-se no julgamento do comportamento clínico potencial de um tumor. Diz-se que um tumor é benigno quando suas características micro e macroscópicas são consideradas relativamente inocentes, indicando que permanecerá localizado, e é tratável com a remoção cirúrgica; geralmente o paciente sobrevive. Os tumores malignos são coletivamente referidos como cânceres, termo derivado da palavra em latim “caranguejo” — ou seja, eles aderem a qualquer parte onde se agarram e de maneira obstinada, semelhante ao comportamento do caranguejo. O termo maligno aplica-se a uma neoplasia indicando que a lesão pode invadir e destruir estruturas adjacentes e disseminar-se para locais distantes (metástases) para causar morte. Nem todos os cânceres prosseguem em um curso tão mortal. O que vemos no micro? Todos os tumores, benignos e malignos, têm dois componentes básicos: (1) o parênquima, constituído por células neoplásicas ou transformadas, e (2) o estroma, constituído por tecido conectivo, vasos sanguíneos e células inflamatórias derivadas do hospedeiro. O parênquima da neoplasia determina principalmente o seu comportamento biológico. O estroma é crucial para o crescimento da neoplasia, uma vez que contém o suprimento sanguíneo e dá suporte ao crescimento das células parenquimatosas. Tumores benignos Processos patológicos gerais | Larissa Primo. Em geral, a designação dos tumores benignos é feita acrescentando-se o sufixo -oma ao tipo celular do qual eles surgem. Um tumor benigno que surge em tecido fibroso é um fibroma; um tumor benigno cartilaginoso é um condroma. Adenoma é aplicado geralmente a neoplasias benignas epiteliais, que produzem padrões glandulares, e a neoplasias derivadas de glândulas, mas que não mostram necessariamente padrões glandulares. Uma neoplasia epitelial benigna que surge das células tubulares renais e cresce em padrões do tipo glandular é denominada adenoma. Os papilomas são neoplasias epiteliais benignas, que crescem em qualquer superfície, produzem frondes micro ou macroscópicas semelhantes a dedos. Cistadenomas são massas císticas ocas que surgem tipicamente no ovário. Tumores malignos Neoplasias malignas que surgem em tecidos mesenquimais “sólidos” ou seus derivados são chamadas de sarcomas, enquanto aquelas surgidas de células mesenquimais sanguíneas são chamadas de leucemias ou linfomas. Os sarcomas são designados pelo tipo celular de que são compostos, que é presumivelmente sua célula de origem. Assim, um câncer com origem no tecido fibroso é um fibrossarcoma, enquanto uma neoplasia maligna composta por condrócitos é um condrossarcoma. Embora os epitélios do corpo derivem das três camadas germinativas, as neoplasias malignas das células epiteliais são chamadas de carcinomas, independentemente do tecido de origem. Além disso, o mesoderma pode dar origem a carcinomas (epiteliais), sarcomas (mesenquimais) e tumores hematolinfoides (leucemias e linfomas). Os carcinomas são ainda mais subdivididos. Os carcinomas que crescem em padrão glandular são chamados de adenocarcinomas, enquanto aqueles que produzem células escamosas são chamados de carcinomas de células escamosas. Algumas vezes, pode-se identificar o tecido ou órgão de origem, como na designação adenocarcinoma de células renais. Outras vezes, o tumor mostra pouca ou nenhuma diferenciação e deve ser chamado de carcinoma mal diferenciado ou indiferenciado. Obs: As células transformadas em uma neoplasia, seja benigna ou maligna, quase sempre são assemelhadas, como se todas tivessem derivado de uma única progenitora, compatível com a origem monoclonal dos tumores. Em alguns casos incomuns, porém, as células tumorais sofrem diferenciação divergente, criando os chamados tumores mistos. O melhor exemplo é o tumor misto de glândula salivar. Teratoma é um tipo especial de tumor misto que contém células maduras ou imaturas reconhecíveis ou tecidos representativos de mais de uma camada de células germinativas e, algumas vezes, de três. Os teratomas originam-se de células germinativas totipotentes. As células germinativas têm capacidade de se diferenciar em quaisquer tipos celulares no corpo adulto. Processos patológicos gerais | Larissa Primo. Características das neoplasias benignas e malignas Em geral, os tumores benignos parecem ser geneticamente “simples”, abrigando menos mutações que os cânceres, e geneticamente estáveis, com poucas alterações no genótipo com o tempo. Há quatro características fundamentais pelas quais se podem distinguir tumores benignos e malignos: diferenciação e anaplasia, velocidade de crescimento, invasão local e metástase. Diferenciação e anaplasia A diferenciação e a anaplasia são características observadas apenas em células parenquimatosas que constituem os elementos transformados das neoplasias. Neoplasias benignas são compostas por células bem diferenciadas que se assemelham estreitamente a suas contrapartes normais. Um lipoma é constituído por células adiposas maduras carregadas com vacúolos lipídicos, e um condroma é constituído por células de cartilagemmaduras que sintetizam sua matriz cartilaginosa — evidência de diferenciação funcional e morfológica. Em tumores benignos bem diferenciados, normalmente as mitoses são raras e sua configuração é normal. Neoplasias malignas caracterizam-se por ampla gama de diferenciações celulares parenquimatosas, desde as bem diferenciadas até as completamente indiferenciadas. O estroma que contém o suprimento sanguíneo é crucial para o crescimento de tumores, mas não ajuda na separação dos tumores benignos dos malignos. A quantidade de tecido conjuntivo estromal determina, porém, a consistência da neoplasia. Diz-se que as neoplasias malignas compostas por células indiferenciadas são anaplásicas. A falta de diferenciação, ou anaplasia, é considerada uma característica de malignidade. As células anaplásicas mostram acentuado pleomorfismo (isto é, variação de tamanho e forma). Muitas vezes, os núcleos são extremamente hipercromáticos (coloração escura) e grandes, resultando em aumento da proporção nuclear para a citoplasmática. Células gigantes que são consideravelmente maiores que suas vizinhas podem se formar e têm um núcleo enorme ou vários núcleos. Os núcleos anaplásicos são variáveis e têm tamanho e forma bizarros. Quanto mais diferenciada é a célula tumoral, mais ela retém de forma completa as capacidades funcionais de suas contrapartes normais. Quanto mais depressa crescer e mais anaplásico for um tumor, menos probabilidade haverá de que tenha atividade funcional especializada. O termo displasia não é sinônimo de câncer; displasias leves a moderadas que não envolvem toda a espessura do epitélio algumas vezes regridem completamente, em especial se as causas incitantes forem removidas. Taxa de crescimento Muitos tumores benignos crescem lentamente, e a maioria dos cânceres cresce muito mais depressa, eventualmente disseminando-se localmente e para sítios distantes (por metástase) e causando morte. Mas há muitas exceções a essa generalização, e alguns tumores benignos crescem com mais facilidade do que alguns cânceres. Processos patológicos gerais | Larissa Primo. Outras influências, como a adequação de suprimento sanguíneo ou restrições de pressão, também podem afetar a taxa de crescimento dos tumores benignos. A taxa de crescimento dos tumores malignos normalmente correlaciona-se inversamente com o seu nível de diferenciação. Em outras palavras, tumores mal diferenciados tendem a crescer mais rapidamente do que os tumores bem diferenciados. Entretanto, há ampla variação na taxa de crescimento. Alguns crescem lentamente durante anos e então entram em fase de crescimento rápido, significando a emergência de um subclone agressivo de células transformadas. Outros crescem de forma relativamente lenta e uniforme; Os tumores malignos de crescimento rápido geralmente contêm áreas centrais de necrose isquêmica, porque o suprimento sanguíneo tumoral, derivado do hospedeiro, falha em manter o mesmo ritmo para atender às necessidades de oxigênio da massa celular em expansão. Os cânceres são imortais e têm ilimitada capacidade proliferativa, indicando que, como os tecidos normais, eles também devem conter células com propriedades do “tipo tronco”. Invasão local Uma neoplasia benigna permanece localizada em seu sítio de origem. Não tem capacidade de se infiltrar, invadir ou metastatizar-se para locais distantes, como as neoplasias malignas. Por exemplo, como os adenomas apresentam lenta expansão, a maioria desenvolve uma cápsula fibrosa envoltória que os separa do tecido hospedeiro. Essa cápsula provavelmente deriva do estroma do tecido hospedeiro, uma vez que as células parenquimatosas se atrofiam sob a pressão do tumor em expansão. O estroma do próprio tumor também pode contribuir para a cápsula. Note-se, porém, que nem todas as neoplasias são encapsuladas. Os cânceres crescem por meio de infiltração, invasão, destruição e penetração do tecido circundante. Não desenvolvem cápsulas bem definidas. O modo infiltrativo de crescimento torna necessária a remoção de ampla margem de tecido normal circunjacente, quando se tenta a excisão cirúrgica de um tumor maligno. Além do desenvolvimento de metástases, a invasividade local é a característica mais confiável que distingue os tumores malignos dos benignos. Metástase As metástases são implantes secundários de um tumor, as quais são descontínuas com o tumor primário e localizadas em tecidos remotos. Mais do que qualquer outro atributo, a propriedade da metástase identifica uma neoplasia como maligna. Em geral, quanto mais anaplásica e maior a neoplasia primária, mais provável será a disseminação metastática, mas, como na maioria das regras, há exceções. As neoplasias malignas disseminam-se por uma de três vias: (1) semeadura nas cavidades corporais: Ocorre quando as neoplasias invadem uma cavidade corporal natural. (2) disseminação linfática (3) disseminação hematogênica. A disseminação linfática é mais típica dos carcinomas, enquanto a disseminação hematogênica é favorecida pelos sarcomas. Há numerosas interconexões, contudo, entre os sistemas linfático e vascular; assim, todas as formas de câncer podem se disseminar através de um ou ambos os sistemas. O padrão de envolvimento do linfonodo depende principalmente do local da neoplasia primária e das vias naturais de drenagem linfática local. Note-se que, embora o aumento de tamanho dos linfonodos próximos de uma neoplasia primária deva causar preocupações quanto à disseminação metastática, nem sempre implica envolvimento canceroso. Os produtos necróticos da neoplasia e os antígenos tumorais com frequência evocam respostas imunológicas nos linfonodos, como a hiperplasia dos folículos (linfadenite) e a proliferação de macrófagos nos seios subcapsulares (histiocitose sinusal). A disseminação hematogênica é a via favorecida para os sarcomas, mas os carcinomas também a utilizam. Como seria de esperar, as artérias são penetradas menos prontamente que as veias. Com a invasão venosa, as células sanguíneas seguem o fluxo venoso drenando o local da neoplasia, com as células tumorais frequentemente parando no primeiro leito capilar que encontram. Como a drenagem de toda a área portal flui para o fígado e todos os fluxos sanguíneos cavais fluem para os pulmões, o fígado e os pulmões são os locais secundários envolvidos com mais frequência na disseminação hematogênica. Resuminho: • Os tumores benignos e malignos podem ser distinguidos de outros com base no grau de diferenciação, taxa de crescimento, invasividade e disseminação distante. Processos patológicos gerais | Larissa Primo. Epidemiologia Como o câncer é uma desordem de crescimento e comportamento celular, sua causa final deve ser definida em níveis celular e molecular. A epidemiologia pode contribuir substancialmente para o conhecimento sobre a origem do câncer. ✔ A incidência de câncer varia com idade, raça, fatores geográficos e antecedentes genéticos. Os cânceres são mais comuns nos dois extremos de idade. A variação genética resulta, principalmente, de diferentes exposições ambientais. ✔ A maioria dos cânceres é esporádica, mas alguns são familiares. A predisposição aos cânceres hereditários pode ser autossômica dominante ou autossômica recessiva. A primeira normalmente está ligada à herança de mutação de linhagem germinativa de genes supressores do câncer, enquanto a última está tipicamente associada a defeitos herdados no reparo do DNA. ✔ Os cânceres familiares tendem a ser bilaterais e surgem em fase mais precoce na vida do que suas contrapartes esporádicas. ✔ Sabe-se que algumas doenças adquiridas, conhecidas como desordens pré-neoplásicas, estão associadas a aumento de risco de desenvolvimento de câncer. TUMORES BENIGNOS TUMORES MALIGNOS Assemelham-se ao tecido de origem e são bem diferenciados. São mal ou completamente indiferenciados (anaplásicos). Crescimentolento Geralmente crescem mais depressa Bem circunscritos e têm uma cápsula Mal circunscritos e invadem os tecidos normais circundantes Permanecem localizados no sítio de origem Localmente invasivos e metastatizam-se para locais distantes
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