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André Carlos Martins Menck Stella Naomi Moriguchi MarketingMarketing Copyright © 2008. Todos os direitos desta edição reservados ao Sistema Universidade Aberta do Brasil. Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, do autores. PRESIDENTE DA REPÚBLICA Luiz Inácio Lula da Silva MINISTRO DA EDUCAÇÃO Fernando Haddad SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Carlos Eduardo Bielschowsky DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE POLÍTICAS EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA – DPEAD Hélio Chaves Filho SISTEMA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL Celso Costa COMISSÃO EDITORIAL DO PROJETO PILOTO UAB/MEC Marina Isabel Mateus de Almeida (UFPR) Teresa Cristina Janes Carneiro (UFES) AUTORES André Carlos Martins Menck Stella Naomi Moriguchi PROJETO GRÁFICO Annye Cristiny Tessaro Mariana Lorenzetti DIAGRAMAÇÃO Annye Cristiny Tessaro Victor Emmanuel Carlson REVISÃO DE PORTUGUÊS Patrícia Regina da Costa Sérgio Meira (Soma) Sumário A p r e s e n t a ç ã o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 0 9 UNIDADE 1 – O Que é Marketing e Conceitos Centrais em Marketing O Que é Marketing e Conceitos Centrais em Marketing............................13 Bem-vindo ao Fascinante Mundo do Marketing!.................................13 O que é Marketing..........................................................15 Marketing, What is this?..................................................................16 Marketing como filosofia de negócios................................................18 Evolução até chegar ao conceito de Marketing....................................22 Marketing e Vendas..........................................................27 Novos conceitos superam o Conceito de Marketing?..........................31 Será que Marketing é “bonzinho” ou “mauzinho”?..............................38 Necessidades e Desejos............................................................42 A Hierarquia de Necessidades de Maslow........................................46 Mercado. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .50 Demanda. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .52 A Curva “S” do Marketing..................................................................53 Resumo.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .57 UNIDADE 2 – Criando Valor Para o Consumidor e a Organização de Marketing Criando Valor Para o Consumidor e a Organização de Marketing.................61 Fazendo Marketing.............................................................61 Marketing de Relacionamento..........................................................62 Satisfação do consumidor..................................................................69 Valor para o consumidor......................................................................72 Encantar o cliente...........................................................83 A organização de marketing..........................................................87 Implantando o marketing integrado...................................................93 Resumo.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .96 UNIDADE 3 – Ambiente de Marketing e Sistema de Informação de Marketing Ambiente de Marketing e Sistema de Informação de Marketing.................99 Ambiente de Marketing, onde tudo acontece.................................99 Forças que agem no microambiente da empresa..............................103 Forças que agem no macroambiente da empresa..............................108 Sistema de Informação de Marketing................................................120 Atividades de aprendizagem......................................................................137 Resumo.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .139 UNIDADE 4 – Comportamento do Consumidor Comportamento do Consumidor................................................................143 Por que estudar comportamento do consumidor?...............................143 Motivação do consumidor...............................................................145 Processamento da Informação pelo Consumidor.............................156 Percepção . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .165 Aprendizagem.... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .175 At i tudes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 179 Influências externas no comportamento do consumidor....................184 Processos pré-compra.............................................................188 Processos de compra.............................................................191 Processos pós-compra.............................................................194 Resumo.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .197 UNIDADE 5 – Segmentação de Mercado Segmentação de Mercado................................................................201 Fundamentos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .201 Definindo segmentação de mercado.................................................204 Critérios para a segmentação eficaz....................................................208 O processo de segmentar o mercado..........................................211 Nichos e Segmentos.....................................................................228 Escolhendo segmentos-alvo.............................................................230 Marketing customizado.....................................................................236 Resumo.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .239 UNIDADE 6 – Estratégia de Marketing Estratégia de Marketing................................................................243 Este é um mundo competitivo......................................................243 Estratégia e importância da estratégia de marketing.........................244 Estratégia de marketing..........................................................246 A Cadeia Objetivo-Estratégia..........................................................249 Formulando o Plano Estratégico de Marketing..................................254 Declaração da Missão.............................................................255 Análise Ambiental.................................................................261 Objetivos de Marketing.............................................................267 Estratégia de Marketing.............................................................269 Escolha do mercado-alvo.............................................................277 Desenvolvimento da oferta de valor...................................................280 Vantagens competitivas.............................................................284 Resumo.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .296UNIDADE 7 – Gerenciamento de Produtos e Preços Gerenciamento de Produtos e Preços.........................................................301 Composto de marketing....................................................................301 Pensar em um produto não é tão simples quanto parece......................307 Classificação de produtos..........................................................312 Novos produtos................................................................................320 Ciclo de Vida do Produto – CVP....................................................321 Decisões sobre o produto...............................................................323 Estratégias de branding....................................................................325 Determinando preços....................................................................329 Ajustes no preço....................................................................336 Resumo.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .339 UNIDADE 8 – Gerenciamento de Distribuição e Comunicação Gerenciamento de Distribuição e Comunicação........................................343 Por que utilizar intermediários?........................................................343 Canais de marketing................................................................345 Estratégias de gerenciamento de intermediários.................................351 Como projetar um canal de marketing ..............................................352 Como gerenciar um canal de marketing............................................355 Integração de canal e sistemas.....................................................358 As relações entre os membros do canal...........................................363 Gerenciamento da comunicação de Marketing...............................365 Comunicação de marketing e o valor da marca................................366 Modelos do processo de comunicação........................................368 Desenvolvendo um programa de comunicação eficaz.......................370 Gerenciamento do processo de comunicação integrada de marketing....379 Atividades de aprendizagem......................................................................381 Resumo.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .382 Referências.....................................................................................383 Minicurrículo.....................................................................................389 Apresentação O objetivo da disciplina Marketing é internalizar a filosofia de marketing no estudante. O estudante passará a ver a organização de fora para dentro, colocando-se no papel do consumidor que busca na empresa o fornecedor de uma oferta de valor para a satisfação de suas necessidades e desejos. Menos do que criar gestores de marketing, o objetivo é desenvolver no estudante a postura da prática do marketing integrado. Nele, todos os membros da empresa exercem suas funções buscando atingir o objetivo de lucro através da geração de valor para o mercado. Seguindo esta linha, o estudante aprenderá qual é a função do marketing na organização e como a empresa se coloca estrategica- mente para atingir seus objetivos. Passará a fazer isto adotando o pon- to de vista do consumidor. Professores André Carlos Martins Menck e Stella Naomi Moriguchi O Que é Marketing e Conceitos Centrais em Marketing O Que é Marketing e Conceitos Centrais em Marketing UNIDADE 1 André Carlos Martins Menck 12 Curso de Graduação em Administração a Distância Objetivo Ao final desta Unidade você verá marketing como um processo que se inicia no consumidor para chegar ao que a organização deve realizar. Módulo 6 13 O Que é Marketing e Conceitos Centrais em Marketing Olá Estudante! Nesta Unidade você será apresentado ao conceito de marketing e entenderá o marketing como uma maneira de pensar uma empresa. Você desenvolverá uma visão crítica do marketing e entenderá muito bem o papel do trabalho de venda dentro do marketing. Aqui, você aprenderá, com precisão, alguns conceitos centrais em marketing, como necessidade, desejo, mercado, demanda e o efeito dos es- forços de marketing. Bem-vindo ao Fascinante Mundo do Marketing! Esta primeira Unidade destina-se a introduzir você no fascinan- te mundo do marketing. Para uma organização, a importância do marketing reside no fato de que ele é seu principal elo com o mundo exterior. Sem esse elo, a organização vira um fim em si mesmo, um sistema fechado, e não se justifica. Sem estar ligada ao mundo externo, a organização provavel- mente não conseguirá recursos para a continuidade de suas operações. No entanto, o fascínio do mundo do marketing decorre menos de sua importância para a organização (imensa, conforme você verá adiante) do que do desafio que o marketing enfrenta. Marketing é desafiador porque a sua unidade de análise – o ele- mento com que ele trabalha – é complexa e se apresenta, geralmente, em uma imensa quantidade. Cada uma dessas unidades – que são o 14 Curso de Graduação em Administração a Distância objeto da ação do marketing – responde de modo diferente aos estí- mulos de marketing. Essa unidade chama-se “consumidor”. Gostaríamos de conhecer bem o consumidor. De compreendê- lo. De sermos capazes de prever seu comportamento. Se possível, até de controlar suas respostas às nossas ações. Entretanto, a complexidade e o grande número de consumidores com os quais usualmente tratamos tornam essa nossa vontade praticamente inatingível. Provavelmente, nos daremos por satisfeitos se conseguirmos conhecer e compreender, ainda que parcialmente, o consumidor. Esse é o nosso desafio. Nesta Unidade e na próxima você notará que o marketing pare- ce fácil. Por que será, então, que você ficou tantas vezes contrariado enquanto consumidor? Se marketing é tão simples em seus princípios e se muitos profissionais tiveram a oportunidade de estudar marketing, por que ele não é sempre bem feito? Por que muitas vezes ficamos insatisfeitos? Fazer marketing bem feito requer mais do que o aprender. Re- quer que seja internalizado. Nosso objetivo nesta disciplina é que você internalize a noção de marketing. Esta Unidade e a próxima darão o embasamento para as Unidades que se seguem. Se formos bem sucedidos, você será um profissional melhor, atu- ando na área de marketing ou não. Você não aprenderá receitas pron- tas, mas estará mais capacitado a enfrentar o fascinante desafio do marketing! Nesta Unidade, os quatro primeiros tópicos destinam-se a, pau- latinamente, construir a noção de marketing; aos poucos, chegaremos até uma definição do conceito de marketing. A seguir, veremos a evolução dos conceitos que antecederam o conceito de marketing. Conforme você perceberá, eles ainda persis- tem em muitas organizações atuais. O tópico “Marketing e Vendas” aprofunda a questão da evolução, levando você a uma conscientização ainda maior sobre o conceito de marketing. Os tópicos seguintes abordam conceitos alternativos ao concei- to de marketing. Visam prover uma visão crítica que deve sedimentar ainda mais a noção de marketing em você. Módulo 6 15 A primeira parte desta Unidade encerra-se com uma discussão sobre o uso do marketing, com o tópico “Será que marketing é bonzi- nho ou mauzinho?”. A seguir se inicia a segunda parte desta Unidade, que traz con- ceitos-chave do marketing. Discutiremos como se definem conceitos como necessidades e desejos apresentaremos a hierarquia de necessi- dades de Maslow. Veremos então as definições de mercado, potencial de mercado e demanda de mercado. Por fim, abordaremos os efeitosdos esforços de marketing sobre a demanda. Pronto para encarar o desafio de conhecer o mundo do marketing? O que é Marketing? Atividade 1 Pare! Antes de começar a ler o texto, você tem uma breve tarefa. Primeiro, escreva, em no máximo trinta palavras, o que é marketing, para você. Não se preocupe em acertar, mas em colocar no papel a idéia que você faz do marketing. Em seguida, faça um rápido le- vantamento, pedindo para dez pessoas adultas (familiares, colegas, amigos e vizinhos) escreverem em duas linhas o que é marketing, no entendimento delas. Leia cada uma dessas “definições” e subli- nhe a palavra-chave (ou palavras-chave) que melhor expresse o que foi escrito, ou que seja mais central na colocação feita. Faça o mes- mo com a sua “definição”, sublinhando a palavra-chave. Realizou a atividade? Pronto? Agora pode continuar sua leitura. É muito provável que todas as pessoas com quem você falou já tenham ouvido falar desse tal de marketing. Todas certamente têm uma noção do significado dessa palavra, mesmo que uma noção primitiva, 16 Curso de Graduação em Administração a Distância básica. Reveja as palavras ou expressões-chave do que disseram. É provável que contenham palavras como propaganda, publicidade, promoção, venda, comercialização, pesquisa, estudo, mercado e produto. Menos freqüentes, mas também usuais, são palavras como valor, preço, varejo, distribuição e consumidor. Muito bem. Será que essas diferentes “definições” que você co- letou estão erradas? Provavelmente nenhuma delas está. No entanto, também é provável que a maioria das formulações usualmente feitas por pessoas que não estudaram formalmente marketing não tenha cap- turado a essência do seu conceito. Da mesma forma, possivelmente, muitas pessoas que já estudaram formalmente marketing, ou que tra- balham na área, também não saibam bem descrever a essência do con- ceito. Diversos são os sintomas disto – como ficará claro em exem- plos, mais à frente. Isto decorre da falta de uma internalização adequada da noção de marketing. Esperamos que você, após estudar esta primeira Unida- de deste módulo de marketing, passe a fazer parte do time dos que absorveram completamente a sua essência. Assim, com uma visão apro- priada de marketing, você poderá contribuir para o sucesso de sua organização – e de sua carreira! Marketing, what is this? Antes de apresentarmos esse tal conceito de marketing, porém, vamos examinar o vocábulo que estamos tentando compreender. Pegue a palavra “marketing”. Qual seria uma boa tradução des- ta palavra de origem inglesa para o português? Atividade 2 Faça o seguinte: antes de continuar sua leitura, escreva uma palavra da língua portuguesa que você julga ser uma boa tradução para a Módulo 6 17 palavra inglesa marketing (Você poderá compará-la logo mais com nossas sugestões!). Na língua inglesa, marketing é um vocábulo composto de market, ou “mercado”, mais o sufixo -ing. Isto configura um gerúndio. No português, o gerúndio é formado com o sufixo -ndo. Assim, podería- mos nos sentir tentados a fazer uma tradução literal para um vocábulo do tipo “mercadando”. Certamente, esta palavra não soa lá muito bem! Mesmo assim, vale a pena explorar o sentido do gerúndio “marketing” na língua inglesa, para podermos chegar a uma tradução plausível. O gerúndio empresta à raiz da palavra (mercado) uma idéia de ação. O gerúndio vem do latim gerundivus, ligada ao verbo gerere, que quer dizer fazer, produzir, executar. Ou seja, a palavra “marketing” tem um sentido etimológico de fazer, ou produzir, um mercado. De fato, o Webster’s New World Dictionary apresenta “marketing” como a “ação de comprar ou vender em um mercado”. Nessa linha, uma candidata para servir de tradução da palavra “marketing” ao português seria “mercadizar”, no sentido de “fazer acontecer” um mercado. Na mesma linha, outra candidata, não-literal, poderia ser “comercializar”. Sabemos que “mercadando” e “mercadizar” não são palavras utilizadas em português. “Comercializar” expressa bem uma idéia de ação de comprar e vender. Portanto, parece ser uma boa tradução. Entretanto, “comercializar” geralmente é utilizada em um contexto um pouco mais específico, ligado à venda ou revenda de produtos. Neste ponto, talvez seja interessante você comparar essas pala- vras com a tradução que você escreveu para o vocábulo “marketing”. Você chegou a algo parecido? É possível que você tenha utilizado a tradução usualmente em- pregada, “mercadologia”. Essa “tradução” foi defendida nas décadas de 50 e 60 pelos pioneiros da introdução do marketing entre nós, os professores da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas. Ela é bastante aceita, mas deve ser olha- da com cuidado, pois sua etimologia empresta um significado de “es- tudo do mercado”. 18 Curso de Graduação em Administração a Distância Como você observará à medida que avançar neste texto, marketing tem seguramente um sentido de ação, indo muito além do estudo do mercado. Marketing como filosofia de negócios Voltemos agora à definição de marketing. Para entender marketing temos que pensar que marketing é, antes de mais nada, uma maneira de ver o mundo dos mercados e dos negócios. Como você verá, marketing é uma filosofia, um modo de encarar as trocas. Pense um pouco e tente responder à seguinte questão: quando alguém inicia um negócio ou uma organização qualquer, qual é o pon- to de partida? Como se inicia um empreendimento? Provavelmente, você deve estar pensando que tudo começa quan- do alguém tem uma idéia. Essa idéia gera um produto – pode ser um bem físico ou um serviço. Essa pessoa monta uma fábrica ou uma organização capaz de oferecer esse bem ou serviço. E passa a vendê- lo nos mercados. Essa é a noção mais comum de como se inicia um negócio: te- nho um produto e vou tentar vendê-lo. Pensamos sempre que as em- presas e demais organizações começaram com um bem ou serviço. Passam a oferecê-lo ao mercado e esperam, com isto, extrair algum ganho, que normalmente chamamos de lucro. Geralmente, quanto mais eu conseguir vender daquele meu bem ou serviço, mais lucro terei. Isto pode funcionar – e algumas vezes funciona! Outras vezes não é assim tão fácil! Suponha, por exemplo, que ninguém queira comprar. Pois bem, o marketing inverte essa lógica! E o faz para tornar a vida das empresas menos arriscada. Para fazer isto, marketing muda radicalmente essa maneira de enxergar os negócios e os mercados. A sua abordagem percorre exata- mente o caminho inverso. Ao invés de partir de um produto e levá-lo ao mercado, o marketing advoga que devo olhar primeiro para o mercado. Módulo 6 19 Mais precisamente, o centro da atenção e início de todo o pro- cesso de marketing principia na figura do consumidor. Você somente será um bom praticante do marketing no momento em que conseguir se inserir na pele do consumidor e olhar para a empresa com os olhos deste. Isto é fundamental. Antes de qualquer coisa, coloque-se no pa- pel do consumidor. E o que tem o consumidor? O consumidor tem problemas para resolver, tem vontades! Todos nós temos, enquanto consumidores, não é verdade? É por isto que consumimos – para resolver nossos proble- mas e aplacar nossas vontades! Pois bem, o marketing parte do consumidor e percebe que ele tem necessidades e desejos. Apenas após reconhecermos que essa fi- gura - o consumidor - existe e tem necessidades e desejos é que o marketing parte para o passo seguinte, que é buscar satisfazer, atender essas necessidades e desejos! E como isto é feito? É feito com a utilização de um processo ou série de atividades, as ferramentas do marketing. Conforme você verá nas Unidades posteriores, esse processo pode ser organizado em qua- tro grandes etapas ou categorias: criar algo de valor para o consumidor, isto é, algo em que o consumidor perceba valor para ajudá-loa resolver seu pro- blema ou aliviar sua vontade; definir o quanto cobrar por essa fonte de valor para o consu- midor; mostrar ao consumidor que a empresa tem algo que pode lhe servir; e disponibilizar esse valor que você deseja oferecer quando, onde e na quantidade que o consumidor precisa. A essas quatro grandes categorias, podemos acrescentar mais uma, que envolve estudar o consumidor, para saber, em um primeiro momento, do que ele necessita e, em um segundo momento, o quão bem você conseguiu atendê-lo com a sua oferta. 20 Curso de Graduação em Administração a Distância Resumindo, marketing inverte a maneira usual de pensarmos os negócios e organizações em geral. Ao invés de partir da criação do produto para só então levá-lo ao mercado, passamos a percorrer o se- guinte caminho: Consumidor ¼ necessidades e desejos ¼ satisfazê-las ¼ atividades de marketing Ao propor essa inversão, o marketing deixa de iniciar o proces- so com um bem ou serviço. Só chega a esse bem ou serviço apenas em uma fase posterior do processo, na forma de uma oferta. Essa aborda- gem significa uma verdadeira filosofia de negócios cujo coração é a satisfação de necessidades e desejos. O produto, que na visão anteri- or representava o início do processo, passa a ser uma conseqüência! Que tal lhe parece? Pensando nessa forma “invertida”, não fica mais fácil fazer fluir o mercado? A probabilidade de “fazer acontecer” o mercado não lhe parece maior? Uma coisa que o marketing não muda é o objetivo final do pro- cesso. Grande parte das organizações se estabelece com o objetivo de gerar lucros (claro que em algumas delas o lucro desejado não é finan- ceiro, mas assume outras formas). Assim, é recomendável que uma definição de marketing deixe explícito esse objetivo de lucro (aqui, usamos a palavra lucro, lembrando que ela contempla também outras formas de lucro, que não o financeiro). Além disso, um aspecto que deve estar claro em uma definição do marketing é que ele sempre pressupõe que alguma coisa esteja sen- do trocada. Geralmente, o que se troca é um bem ou serviço por di- nheiro. Entretanto, a noção de marketing não requer necessariamente que a troca envolva a presença de dinheiro. O importante, sim, é que o marketing apenas ocorre quando há uma troca entre as partes, e que aquilo que se esteja trocando tenha valor para cada uma delas, seja um bem físico ou um serviço. Ou seja, normalmente, tudo começa com um consumidor que busca algo que tenha valor para ele (para resolver seu problema, ou Módulo 6 21 atender sua necessidade!). E há uma empresa que possui ou cria esse algo pelo qual o consumidor está disposto a dar algo seu em troca. Geralmente, esse “algo” é dinheiro, que vai ajudar a cobrir os custos e contribuir para o lucro, motivando a empresa a colocar sua oferta no mercado! Certamente, a empresa não atua em um vácuo e seus resultados são em grande parte afetados pelas decisões dos concorrentes e por ou- tras forças ambientais (conforme você verá na Unidade 3, sobre o ambi- ente de marketing). Entretanto, a essência da filosofia de marketing é que o lucro tem origem na satisfação das necessidades do consumidor. Isso tudo considerado nos leva a propor a seguinte definição para marketing*. Marketing é um conjunto de atividades que visa satisfazer as necessidades e desejos do consumidor, através de processos de troca, com a finalidade de lucro. O conceito de marketing não é antigo. Ele tornou-se prática re- lativamente comum na década de 1960. Foi quando muitas empresas, sobretudo nos EUA, passaram a adotar a política de “estar no negócio de satisfazer desejos e necessidades dos consumidores”. Embora o conceito de marketing tenha surgido como uma postura que aos pou- cos foi sendo adotada em muitas empresas, muitos autores assumem que o conceito foi lançado pela General Electric em 1952, quando colocou explicitamente em seu relatório aos acionistas que “O concei- to introduz... marketing... no início ao invés do final do ciclo de pro- dução e integra marketing dentro de cada fase do negócio” (BERKOWITZ et al., 2003). A seguir, veremos outras abordagens ou conceitos. De certa for- ma, esses outros conceitos concorrem com o conceito de marketing (ao qual nos referiremos, algumas vezes, como o conceito “tradicio- nal” de marketing). Vamos primeiramente olhar para conceitos que pre- cederam o conceito de marketing acima apresentados e, em seguida, discutiremos outros surgidos após esse conceito tradicional de marketing. GLOSSÁRIO *Marketing – é um conjunto de ativida- des que visa satisfa- zer as necessidades e desejos do consu- midor, através de processos de troca, com a finalidade de lucro. Fonte: Elabo- rado pelo autor. 22 Curso de Graduação em Administração a Distância Evolução até chegar ao conceito de Marketing Será que as empresas sempre seguiram o conceito de marketing? Mais importante ainda, será que em nossos dias todas as empresas seguem a filosofia empresarial preconizada pelo conceito de marketing? Há três orientações ou posturas que concorrem com o conceito de marketing, às quais podemos atribuir uma visão histórica. É bom darmos uma olhada nelas, pois assim entenderemos melhor o que di- ferencia o conceito de marketing. Embora essas outras orientações possam ser ligadas a um período histórico, você poderá pensar em casos concretos de empresas que as empregam em nossa economia atual. Vejamos essas orientações. Conceito de Produção Imagine-se em uma economia onde os bens são escassos. Tal- vez você esteja na Idade Média e queira obter uma roupa para se ves- tir. A produção de tecidos é feita em teares manuais e demora muito tempo para alguém produzir uma roupa. Ou então pense que há uma guerra ou situação econômica e faltem produtos, como no Brasil na Segunda Guerra Mundial ou em Cuba após o declínio soviético. Ou imagine que haja uma lei que proíba a importação, como na década de 1980, quando a SEI (Secretaria Especial da Informática) praticamente proibia o acesso a equipamentos de informática importados, pretensamente visando proteger os interesses nacionais. Nessas situações, se houver disponibilidade do produto, através de um tipo de produção – se possível eficiente para permitir um preço que se possa pagar –, os compradores irão adquirir os produtos tão logo estiverem disponíveis. Assim, basta conseguir produzir com efi- ciência que se obterá lucro ao disponibilizar o produto ao preço ade- quado à capacidade do mercado. O foco na produção foi importante no tempo em que se desen- volveram métodos e técnicas industriais que viabilizaram a oferta de Módulo 6 23 bens em larga escala, a preços acessíveis, para consumidores que an- tes não podiam consumi-los. Conceito de Produto À medida que o ser humano aprendeu a produzir com certa efi- ciência, a disponibilidade deixou de ser o maior problema. Isto ocor- reu intensamente na Revolução Industrial, com o uso da energia do carvão. Com mais produtos disponíveis, pessoas passaram a escolher aqueles que oferecessem melhor qualidade, mais desempenho ou ca- racterísticas inovadoras. Aqui, se dará melhor na obtenção de lucros quem conseguir di- ferenciar mais seu produto, agregando a ele mais e melhores caracte- rísticas e focando suas energias na oferta de um produto melhor. Os Conceitos de Produção e de Produto, apesar de terem tido seus dias e de até se justificarem em algumas situações, carregam em si um grave perigo. Trata-se da possibilidade de miopia em marketing, descrita por Theodore Levitt em seu clássico artigo. Saiba mais... � Leia o artigo Miopia em Marketing Publicado originalmente em 1960, o artigo Miopia em Marketing, de Theodore Levitt, é um dos mais reproduzidos e bem sucedidos artigos já publicados pela Harvard Business Review e por toda a literatura de marketing. Apesar do tempo, a maioria dos leitores atentosvai achar sua leitura atual e interes- sante. Em particular, ler esse artigo em todas suas entrelinhas nos ajuda a compreender a força do conceito de marketing. Al- gumas idéias encontradas, mais ou menos explicitamente, no artigo, são: As ferrovias dos EUA, que pareciam representar a certeza de lucros eternos para seus acionistas e descendentes, pensa- vam estar no negócio de ferrovias - e não de transportes - fazen- 24 Curso de Graduação em Administração a Distância do com que viessem a perder praticamente toda sua importân- cia para outros meios de transporte de passageiros. O mesmo aconteceu com a indústria cinematográfica de Hollywood, que focou nos filmes para cinema e não no entrete- nimento buscado pelos consumidores. O entretenimento passou a ser provido com mais conveniência pela televisão – afinal, em casa, você pode entreter-se com a televisão sem ter que tirar o pijama! Apenas quando passou a produzir para a televisão, Hollywood voltou a lucrar. O setor do petróleo se acha o máximo, mantendo-se como o setor de negócios mais lucrativo do século XX. No entanto, Levitt mostra que o mérito foi de alguém de fora do setor, que popularizou o motor a combustão interna. Isto salvou o setor petroleiro da derrocada quando viu seu principal uso (lampiões para iluminação) ser substituído pela lâmpada elétrica. Levitt vaticina que o carro elétrico poderia matar o negócio do petró- leo pelo simples fato de não se ter de colocar a mão no bolso para pagar a cada reabastecimento. Isto Levitt pensou já em 1960, antes de qualquer preocupação ambiental. Bastaria ao carro elétrico evoluir tecnologicamente a ponto de competir em condições de igualdade (digamos, igualdade em termos de po- tência, custo por quilômetro, autonomia, etc.). Nem precisaria ser melhor, tecnicamente! O pagamento mais conveniente da eletricidade já teria o poder de destronar o motor de combustão e destruir o setor do petróleo. Dentre outros exemplos, Levitt cita Henry Ford. Diz que ele agiu sem miopia ao inventar a linha de produção. Ford teria inventado a linha de produção como um meio para conseguir produzir carros vendáveis pelo preço de quinhentos dólares - valor que seus funcionários poderiam pagar. Por isto, antes de ser um gênio da produção, Ford teria sido um gênio do marketing. Levitt deve ter razão, pois o esforço para produzir carros por um preço viável aos consumidores requereu outros expedientes. Além de inventar a linha de produção, Ford che- gou a exigir que fornecedores entregassem peças em caixas de Módulo 6 25 madeira com dimensões tais que as tábuas pudessem ser utili- zadas... como assoalho de seus carros! E deu certo: em 1918, os EUA tinham mais carros per capita que o Brasil de hoje... em sua quase totalidade, da marca Ford! A grande mensagem trazida pelo artigo Miopia em Marketing* é que as empresas ficam necessariamente vulnerá- veis ao surgimento de outras tecnologias ao definirem seus ne- gócios com foco no produto e, portanto, em uma dada tecnologia. As novas tecnologias podem vir a atender às mesmas necessida- des de uma forma melhor. Portanto, faz mais sentido definir o negócio com base nas necessidades do consumidor. Atividade 3 Pense em nosso mundo de negócios (talvez na própria empresa em que você trabalha!) e apresente um caso de miopia em marketing! Poste esse caso na internet para seus colegas de classe para que todos discutam os casos mais notórios de miopia em marketing. Conceito de Vendas Com o tempo, mais empresas passaram a produzir com eficiên- cia bons produtos. Isto levou a uma situação de produzir mais do que os consumidores podiam comprar, aumentando a concorrência. Nesta situação, com o produto na mão, o meio que as empresas passaram a empregar foi aumentar o esforço de vendas e o esforço promocional. A comunicação de massa surgiu daí. Passou a lucrar mais quem con- seguisse obter o maior volume de vendas. O importante passou a ser “empurrar” o produto para as mãos do comprador. É interessante que essa é a idéia que muitas empresas fazem da área comercial, ainda em nossos dias. Veja o caso do tradicional ven- dedor de livros e coleções, aquele que bate à sua porta. Ele tira uma porção de coleções das caixas ou mostra prospectos lindíssimos. Fala que está vendendo por um preço promocional que só ele tem. Insiste muito e não descansa enquanto você não comprar, “nem que seja para GLOSSÁRIO *Miopia em Marketing – consis- te em definir o ne- gócio em que se está com base na tecnologia e não com base na neces- sidade. Fonte: Ela- borado pelo autor. 26 Curso de Graduação em Administração a Distância me ajudar”! Pois bem, aí está um caso típico de uso do conceito de vendas. Agora, pense um pouco: será que essa mesma postura não pre- valece em muitos negócios vistos como mais modernos? É muito dife- rente do que faz um funcionário de um banco quando oferece a você um título de capitalização, com a ajuda de um prospecto promocional enfatizando que você pode “ganhar” tantos prêmios por mês? Ou quan- do o vendedor pelo telefone insiste para falar com você? Conceito de Marketing e Marketing Integrado A Figura 1 ilustra os três conceitos já citados. Também apresen- ta, em termos de foco, meios e fins, o conceito de marketing, que con- centra-se nas necessidades do consumidor, visando obter lucro à me- dida que satisfizer essas necessidades. Para tanto, o conceito de marketing utiliza o marketing inte- grado*, que nada mais é do que ter toda a empresa, todas suas áreas funcionais, atuando com o objetivo de satisfazer as necessidades do consumidor. Uma organização que adota o marketing integrado deixa de ver o departamento de marketing como o único responsável por esta atividade. Com o marketing integrado, todos na empresa enten- dem que exercem funções que visam satisfazer às necessidades e de- sejos do consumidor. Ao fazer isso bem feito, a compra do produto pelo consumidor se torna uma coisa natural (ele vai comprar porque o produto vai ser bom para ele, vai ajudá-lo a resolver um problema, uma necessidade). Da mesma forma, ao se sentir satisfeito, aumenta também a pro- babilidade do consumidor voltar a comprar o produto da empresa. Com isto, a empresa vende algo de valor para o consumidor e realiza lucro ao entregar esse valor. O consumidor se transforma no verdadeiro "pa- trão" de todos os membros de uma organização. GLOSSÁRIO *Marketing integra- do – ocorre quando todas as área funci- onais de uma em- presa atuam com vistas ao atendimen- to das necessidades do consumidor. Fonte: Elaborado pelo autor. Módulo 6 27 Atividade 4 Neste momento, é apropriada a reflexão sobre qual conceito tem sido mais praticado nos mercados que o cercam, por empresas que você conhece. Uma boa questão para discutir é: Qual o conceito que sua empresa segue? Responda a essa questão e discuta com seus colegas na Internet. Marketing e Vendas Você deve estar se perguntando, até um pouco desconfiado: Se essa idéia de marketing é tão forte e interessante, então por que a área de vendas é tão necessária no mundo dos negócios? Afinal, o marketing não faz com que os negócios fluam mais naturalmente quando atende a uma necessidade? Por que as empresas não prescindem de suas for- ças de vendas? Será que o Conceito de Vendas não teria uma razão para se sobrepor ao Conceito de Marketing? Para responder a essas questões, convidamos você a avaliar a seguinte frase, muito provocativa quando se comparam os conceitos de marketing e de vendas: Figura 1: Evolução até o Conceito de Marketing Fonte: Adaptada e expandida de Kotler (2000) 28 Curso de Graduação em Administração a Distância “O objetivo do marketing é tornar a venda supérflua.” Parece muita pretensão do marketing apresentar-se como uma filosofia de negócios que chega ao ponto de dizer que a venda é des- necessária quando se praticao marketing! O aparente exagero fica ainda mais evidente quando se constata que a quase totalidade das empresas utiliza e qualifica como fundamental a atividade de vendas. E aí estão incluídas mesmo as empresas que se dizem orientadas para o marketing! A frase acima cresce em importância quando lembramos que ela se deve a Peter Drucker, um dos mais respeitados mestres da Adminis- tração. Ele ainda a complementou, afirmando que “o objetivo do marketing é conhecer e entender o consumidor tão bem que o bem ou serviço se adequará a ele e venderá por si só” (DRUCKER, 1973). Por que tal autoridade em Administração teria escrito essa frase? Não soa paradoxal que a venda seja uma atividade tão prevalente e importante nos negócios de hoje? Atividade 5 Antes de prosseguir com a leitura, escreva se você concorda com a frase de Drucker, indicando suas razões. Se possível em um chat proposto pelo seu orientador, poste e discuta com seus colegas sua opinião. Marketing deve tentar acabar mesmo com os vendedores? Por que sim ou por que não? Para resolvermos esse aparente paradoxo – a que chamaremos de Paradoxo de Drucker – vejamos primeiramente se ele faz sentido e por quê. Ora, se o marketing identifica as necessidades dos consumido- res e desenvolve produtos com o objetivo de atendê-las, então é natu- ral que os consumidores sejam compelidos a comprar o produto. Afi- nal, eles são os maiores interessados em resolver seus problemas, bus- cando ter suas necessidades atendidas. Ou seja, se o trabalho de Módulo 6 29 marketing é bem feito, é o consumidor que compra, não o vendedor que vende! Se isto lhe parece ter uma lógica, então Drucker parece ter razão, não é mesmo? Se o cliente compra, então a venda é supérflua! Como é que fica, então, a paradoxal existência e importância da atividade de vendas? A resposta está no papel, na função do vendedor. O bom vende- dor não é aquele que simplesmente chega e apresenta o produto e co- meça a falar sem descanso enquanto não fechar a venda. O bom vendedor – aquele que tem mais chance de sucesso – é aquele que se porta como um instrumento do marketing! O bom vendedor principia por conhecer e identificar as necessi- dades de seu cliente em potencial. Essa primeira atividade é uma ativi- dade de pesquisa, de prospecção. Exige, mais do que falar, que se ouça bastante. Conhecendo a necessidade do cliente, o bom vendedor irá avaliar em que instância seu produto (ou seus produtos) serve para atender às necessidades identificadas na primeira fase de seu trabalho. A partir daí, basta mostrar ao consumidor que seu produto é capaz de atender às necessidades desse consumidor. Ou seja, o bom vendedor é um agente de marketing, que mostra ao consumidor as razões pelas quais o produto tem valor para ele. Essa é a atividade de marketing da promoção, uma das ferramentas do marketing, que visa mostrar ao consumidor que a empresa tem algo que pode lhe servir. Ficou claro? O Paradoxo de Drucker se resolve facilmente quan- do entendemos a atividade de vendas como o exercício do marketing, como a prática do marketing – identificando necessidades e comuni- cando que os produtos são capazes de satisfazer essas necessidades. Ou seja, o vendedor nada vende, apenas mostra o valor do produto para o cliente em potencial, que então o compra para satisfazer sua necessidade! O caso do bom vendedor... (paródia) Deixando de lado pudores politicamente corretos, vale a pena ler esta paródia humorística que circula na Internet. Ela 30 Curso de Graduação em Administração a Distância mostra como um vendedor que pratica o marketing pode ser bem sucedido: Um sujeito acaba de conseguir um cargo de vendedor em uma loja que vendia de tudo. Terminado o primeiro dia, o ge- rente de RH pergunta: – Como foi seu primeiro dia? Quantas vendas você fez? – Fiz apenas uma venda – responde o vendedor. – Uma só? – espanta-se o gerente – Mas todos os outros vendedores fazem de 20 a 30 vendas por dia... E de quanto foi esta venda? – R$ 345.350,00 – responde o vendedor. O gerente arregala os olhos. Uma venda daquele valor era realmente inusitada. – Como é que você conseguiu isso? – pergunta o gerente, intrigado. – Bem – responde o vendedor – vendi a esse cliente um anzol pequeno, um médio e um grande. Vendi os três tipos de linhas para cada tipo de anzol e também todos os apetrechos para pesca. Ao perguntar-lhe onde ele iria pescar e obtendo a resposta de que pretendia ir ao litoral, informei-lhe de que seria necessário um barco. Ele então comprou o de 22 pés, cabinado, com dois motores. Como o carro dele não seria capaz de rebocá- lo, vendi-lhe uma caminhonete Blazer... O gerente o interrompe: – Você fez essa venda para um sujeito que entrou pedindo um anzol? – Bem – responde o vendedor – na realidade, o sujeito veio me perguntar onde havia uma farmácia. Perguntei-lhe o que ele iria comprar lá, e soube que seria um OB para sua esposa. Aproveitei e comentei: “Já que seu fim-de-semana foi pro espaço mesmo, que tal uma pescaria?”. Módulo 6 31 Atividade 6 Todos os dias, em nossa vida e em nosso trabalho, estamos tentan- do vender alguma coisa a alguém. Descreva uma situação em que você tentou “vender” algo a alguém – pode ser a venda de um bem, de um serviço, ou mesmo de uma idéia. Identifique como poderia ser enfatizada a função de marketing nessa sua venda. Especifique claramente o que você poderia ter feito para: a) identificar a neces- sidade e b) comunicar que aquilo que você estava vendendo seria capaz de atender a necessidade. Como essa “venda enquanto marketing” poderia ter ajudado? Novos conceitos superam o Conceito de Marketing? Agora você já conhece as orientações de negócios ou conceitos que precederam o conceito de marketing. Também já deve estar avali- ando que o conceito de marketing se constitui em uma filosofia de negócios que chega a resultados de forma mais natural do que a abor- dagem de vendas. Também deve estar vendo a orientação para marketing como mais segura do que as abordagens de produção e de produto, dada a vulnerabilidade destas ao advento de novas tecnologias capa- zes de atender melhor as necessidades (miopia em marketing). Em um mundo dinâmico como o nosso, cabe perguntar se não há algum conceito mais recente, capaz de superar o conceito de marketing. A seguir são introduzidas duas abordagens mais recentes, que são apresentadas algumas vezes como candidatas capazes de “substi- tuir” o conceito de marketing. Trata-se do Marketing Societal e do Marketing de Guerra. A apreciação dessas duas abordagens e a avali- ação de seu potencial em substituir o conceito de marketing permitirão 32 Curso de Graduação em Administração a Distância a você compreender melhor e solidificar o conceito de marketing tra- dicional. Marketing Societal Philip Kotler (2000), um dos mais aclamados acadêmicos em marketing, advoga que há um conceito mais novo e mais aprimorado que o conceito tradicional de marketing, o Marketing Societal*. Kotler (2000) alega que o conceito de marketing tradicional, ao simplesmente atender às necessidades que detecta nos consumidores, não necessariamente estará fazendo o que é melhor para os consumi- dores e para a sociedade, no longo prazo. Preconiza, assim, um marketing com postura mais ativa. A nova postura deve identificar as necessidades, desejos e interesses dos mercados-alvo, para oferecer aos clientes algo que os satisfaça, mas deve fazer isto apenas na medi- da em que mantenha ou melhore o bem-estar do consumidor e da sociedade. O Marketing Societal possui um apelo intrínseco bastante forte, particularmente em uma era, segundo Kotler, de “problemas ambientais, insuficiência de recursos, crescimento populacional rápido, problemas econômicos mundiais e serviços sociais negligenciados” (p. 23). Adi- cionem-se a essa lista os problemas da saúde públicae os de qualidade da alimentação. Cuidado, porém, para não confundir marketing societal com marketing social, tão em voga em nossos dias. No âmbito do chama- do marketing social estão as campanhas de patrocínio de causas soci- ais, enquanto o marketing societal trata de incorporar aos negócios correntes da empresa a preocupação com o bem-estar do consumidor e da sociedade, incluindo aí meio ambiente, qualidade de vida, longevidade, etc. A pergunta que se impõe é: Será que o Marketing Societal subs- titui o tradicional Conceito de Marketing? Considere alguns dilemas a seguir. Uma empresa de restaurantes deve oferecer um prato apetitoso, de dar água na boca, desejado por seus clientes, mas que tem um ele- vado teor de gordura e que pode, no longo prazo, comprometer a saú- GLOSSÁRIO *Marketing Societal – é a orientação em que o atendimento da necessidade do consumidor está li- mitado pela preser- vação e melhoria do bem-estar do consu- midor e da socieda- de. Fonte: Elabora- do pelo autor. Módulo 6 33 de do consumidor? Ou deve oferecer um alimento mais saudável, mas que seria preterido pelo consumidor se este pudesse escolher? Um fa- bricante de automóveis deveria oferecer apenas um veículo mais se- guro, com múltiplos airbags, mas a um preço superior? Ou um veícu- lo com limitador de velocidade máxima, reduzindo o perigo de morte em uma colisão? E um supermercado, deveria ter apenas frutas e ver- duras orgânicas, mais saudáveis embora mais caras? Para responder a essas perguntas, uma simples verificação da- quilo que ocorre no mundo dos negócios indica que uma visão de marketing societal não é prevalente, usual. Apesar disso, observamos claramente que há um número cres- cente de empresas comunicando ativamente que procuram gerir seus negócios preservando o meio ambiente, oferecendo alternativas mais saudáveis e atendendo questões socialmente relevantes. Como pode- mos classificar essas iniciativas? Será o surgimento do marketing societal? Considere a questão ambiental. Há menos de 50 anos, a preocu- pação ambiental era praticamente nula. Hoje, com as evidências do aquecimento global, a preocupação está exacerbada. Certos consumi- dores estarão dispostos a pagar 20 a 30% mais por um veículo híbrido que reduz um pouco a emissão de gases do efeito-estufa. Outros esco- lherão um cartão de crédito que promete compensar as emissões de carbono, em detrimento de outro que ofereça benefícios adicionais em programas de milhagem. Pense um pouco: O que está conduzindo esses comportamentos é a determinação das empresas em promover o bem-estar da socieda- de ou a necessidade do consumidor em preservar o meio ambiente? Embora as opiniões possam divergir, não há como negar que o fator determinante é de demanda, ao menos em certa extensão. Hoje, os consumidores demandam produtos que ofendam menos o meio ambiente, ajudem as pessoas a ter uma vida longa e saudável, ou con- tribuam com algum aspecto valioso para a sociedade. O que está por trás disto? Pode-se usar um argumento forte de que as pessoas (ou parte delas) passaram a dar importância a essas questões. Elas passa- ram a ter essas necessidades que preocupam a sociedade. 34 Curso de Graduação em Administração a Distância Esse argumento indica que houve o florescimento de necessida- des que antes não estavam latentes nos consumidores. Podemos cha- mar essas necessidades de necessidades societais, uma vez que elas são relacionadas com questões que dizem respeito à sociedade como um todo. Seguindo esta linha, podemos argumentar que o que se obser- va é muito menos um marketing societal, e mais uma resposta das em- presas ao aparecimento dessas necessidades societais. Ou seja, prevale- ce o tradicional conceito de marketing, de resposta a necessidades. Marketing de Guerra Uma orientação que se propôs a superar o conceito tradicional de marketing é o Marketing de Guerra. Foi proposta nos anos 80 por Al Ries e Jack Trout (2007), dois autores de origem profissional, não- acadêmica, que haviam feito fama com a idéia de posicionamento (abordada oportunamente neste texto). O Marketing de Guerra baseia-se em uma abordagem militar do mercado. Ao invés de focar no atendimento das necessidades do con- sumidor, diz que a empresa deve preocupar-se com os concorrentes, na batalha pelo mercado. Propõe que a empresa deva se concentrar em aspectos como ataque, defesa, pontos fortes e fracos, conflito, com- petição pelo cliente, etc. Concentração de forças, marketing de guerrilha, dominação de mercados, guerra de preços e propaganda comparativa são exemplos de ações que permeiam a proposta do marketing de guerra. O Quadro 1 ilustra algumas situações hipotéticas, com reações típicas de uma empresa empregando a abordagem do marketing de guerra e de uma empresa aplicando o conceito de marketing. Módulo 6 35 Embora o marketing de guerra tenha sido um “modismo” surgi- do na década de 80, a reboque do livro homônimo de Ries e Trout (2007), ainda hoje tem adeptos no mercado. Constantemente surgem versões “qualificadas” do marketing. Você deve olhar para elas com uma postura crítica. Neste caso, per- gunte-se até que ponto a orientação para o concorrente é importante? Ela deve existir? Ela deve superar a orientação para a satisfação das necessidades do consumidor? Atividade 7 Descreva uma situação em que um concorrente está incomodando as atividades na sua empresa. Diga o que você propõe que seja feito para reduzir o problema. Sua sugestão encaixa-se mais em uma re- ação centrada no concorrente ou no consumidor? Situação O concorrente A está preparando uma guerra de preços no mercado Alfa O concorrente B vai entrar em nosso mercado Beta O concorrente C vai entrar com uma mídia arrasadora em Gama, com o que construirá uma imagem de superioridade tecnológica Reação de empresa centrada no concorrente Podemos cobrir a oferta de A ou esquecer Alfa, por não lucrarmos se revidarmos Vamos realizar uma forte campanha promocional preventiva no mercado Beta Faremos uma campanha comparativa mostrando que nosso produto é ainda mais superior tecnologicamente Reação de empresa centrada no consumidor Vamos levantar qual é o valor mais importante no mercado Alfa, para que o ofereçamos pelo preço que esse mercado está disposto a pagar Vamos enfatizar a confiança que o consumidor de Beta pode ter em nosso produto após tanto tempo de mercado Faremos uma campanha mostrando o conjunto de benefícios que oferecemos, dos quais a tecnologia pode ser apenas um dos aspectos importantes em Gama Quadro 1: Reações Típicas de Empresas Centradas no Concorrente e no Consumidor Fonte: Elaborado pelo autor. 36 Curso de Graduação em Administração a Distância A Figura 2 mostra as quatro possibilidades de orientação quanto a uma empresa centrar seu foco no consumidor e no concorrente. Se a empresa não se concentra em nenhum dos dois, provavelmente será orientada para o produto. Empresas orientadas para o consumidor pra- ticam o conceito de marketing. Empresas focadas no concorrente são as que exercem o marketing de guerra. Já empresas que focam tanto no consumidor como no concorrente têm a chamada orientação para o mercado. Essa orientação para o mercado tem um forte apelo e se cons- titui na postura assumida por grandes organizações mundiais, como Toyota, Marriot e General Electric (BERKOWITZ et al., 2003). A orientação para o mercado enfatiza a coleta contínua de informação tanto sobre as necessidades do consumidor como sobre as capacida- des dos concorrentes, compartilhando essa informação em toda a em- presa e utilizando-a para criar valor para o consumidor. Atividade 8 Você pode avaliar se a sua empresa é orientada para o mercado. Visite <http://www.wominstituto.com.br/html/modules/ mastop_publish/?tac=Orienta%E7%E3o_para_o_Mercado> e pre- encha o questionário.Figura 2: Foco da Empresa e Tipo de Orientação do Negócio Fonte: Elaborado pelo autor. Módulo 6 37 Mais uma vez, a questão que se impõe é: A abordagem do Marketing de Guerra, e mesmo a Orientação para o Mercado, se so- brepõe e torna ultrapassado o conceito tradicional de marketing? Para resolver essa questão, tente responder à seguinte pergunta: Por que uma empresa deve preocupar-se com o concorrente? O que ela deve atentar no concorrente que pode ser uma ameaça real ao seu negócio? As respostas podem tomar diversas formas. No entanto, qual- quer que tenha sido sua resposta (o concorrente tem melhor tecnologia, menor custo, mais qualidade, etc.), essa resposta tem importância por um motivo: esse concorrente pode ser capaz de atender à necessidade do consumidor melhor que minha empresa. Assim, ao centrar sua aten- ção no concorrente, você terá uma resposta mais útil se responder di- retamente a esta questão: “O que o concorrente faz ou pode fazer para atender melhor a necessidade do que eu?” Se essa visão parece correta para você, então há de concordar que o conceito tradicional de marketing vem antes e fundamenta uma eventual preocupação com o concorrente. Isto porque o que justifica a preocupação com o concorrente é o atendimento da necessidade do consumidor. Ou seja, mesmo uma orientação para o mercado, que pa- rece fazer muito sentido, só se justifica com base no conceito tradicio- nal de marketing! Neste momento, você deve estar pensando que a força do con- ceito de marketing enquanto filosofia de negócios é bem grande. Saiba mais... � A questão da orientação para o mercado advém diretamente do conceito de marketing e inspira muita pesquisa acadêmica em marketing e estratégia. Para saber mais, procure artigos na Revista de Administração Contemporânea e no Journal of Marketing. 38 Curso de Graduação em Administração a Distância Será que Marketing é “bonzinho” ou “mauzinho”? A maior parcela das pessoas atribui grandes poderes ao marketing. De fato, muitos atribuem ao marketing a responsabilidade por aquele que seria um dos grandes males das sociedades modernas, o consumismo. Está fora do propósito deste texto discutir se o consumismo é de todo um mal (ele está na base de coisas que todos prezamos, como um nível de conforto sem precedentes na história das sociedades huma- nas, da desejada criação de empregos e de muito do que qualificamos de progresso, embora também tenha contribuído para problemas séri- os, como a poluição ambiental). A questão que colocamos aqui é se o marketing é capaz de im- por ao consumidor o consumo de algum produto, sem que esse consu- midor o deseje. Pense nas coisas que você possui. Será que ao menos algumas delas você não adquiriu sem necessitar? Será que seu guarda- roupas não tem algumas peças que você nunca usou? E outras que talvez tenha comprado apenas “para aproveitar a oferta”? Quantos pro- dutos não classificamos como “supérfluos”? A questão é entendermos se o marketing tem a capacidade de nos forçar a consumir algo que não necessitamos. A atividade seguin- te ajudará você a formar sua opinião. Atividade 9 Faça um breve exercício. Da lista de palavras abaixo, assinale na primeira coluna (à esquerda das palavras) quais que você julga serem adequadas para completar a seguinte frase: “Marketing é ca- paz de _________ ao/o consumidor.” ( ) impor algo ( ) ( ) lembrar ( ) Módulo 6 39 ( ) convencer ( ) ( ) influenciar ( ) ( ) induzir ( ) ( ) aconselhar ( ) ( ) forçar ( ) ( ) incitar ( ) ( ) estimular ( ) ( ) determinar ( ) ( ) sugerir ( ) ( ) instigar ( ) ( ) obrigar ( ) ( ) compelir ( ) ( ) persuadir ( ) É possível que você tenha assinalado todas as palavras acima! Afi- nal, se você for procurar em um bom dicionário, verá que muitas dessas palavras aparecem umas como significados das outras. Pegue um bom dicionário, como, por exemplo, o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa (Rio de Janeiro, RJ: Nova Frontei- ra, 1986). Procure uma das palavras acima e escreva os significa- dos e sinônimos encontrados para ela. Observe que entre os signifi- cados dessa palavra estarão algumas das outras palavras da lista. A seguir, procure no dicionário cada significado encontrado para a primeira palavra. Refaça o processo com os novos significados ou sinônimos encontrados. Repita a operação algumas vezes. Você acabará encontrando todas as demais palavras da lista! Observe que todas as palavras da lista são, de alguma forma, relacionadas. Apesar de todas as palavras se ligarem de alguma forma, se você observar atentamente, haverá de concordar que existe uma “gradação de força” entre as palavras acima. Certamente, “obrigar” o consu- midor a fazer algo tem uma conotação de força muito maior do que “sugerir” ao consumidor que o faça. 40 Curso de Graduação em Administração a Distância Atividade 10 Agora, ordene as palavras mostradas na atividade anterior, da mais forte ou impositiva para a mais suave. Para isto, utilize a segunda coluna (à direita das palavras) para ordenar as palavras de 1 a 15, da mais impositiva para a menos impositiva. É bastante provável que você tenha colocado entre as mais impositivas palavras como “forçar”, “obrigar”, “determinar” e “im- por”. Entre as menos impositivas talvez estejam “lembrar”, “aconse- lhar”, “sugerir” e “estimular”. No grupo intermediário provavelmente devem se encontrar “instigar”, “incitar”, “convencer” e “persuadir”. Podemos utilizar esse ajuste fino para tentar responder às ques- tões colocadas no início deste tópico. Certamente, marketing tem a capacidade de fazer aquilo que as palavras menos impositivas indi- cam. Na realidade, o marketing busca fazer isto; e provavelmente, tam- bém realiza algumas das coisas descritas pelas palavras do grupo in- termediário. O problema ocorre com aquelas palavras que implicam uma idéia de maior imposição. Será que o marketing é capaz de fazer com que os consumidores comprem produtos independentemente de sua vontade? Será que o marketing tem o poder de nos forçar a fazer coisas que não queiramos? De nos impor ou determinar algo alheio à nossa necessidade? Nosso argumento é que o marketing não tem essa força. E nem é objetivo do marketing fazê-lo. O que nos leva a ter a impressão de que o marketing nos “força” a comprar coisas que não necessitamos é nossa dificuldade de entender qual é a necessidade subjacente, que nos leva a adquirir determinado produto. Veja os exemplos ilustrados no caso a seguir. Pra que serve isto? – os casos da faca elétrica e d’O Boticário Um produto que está presente em muitos lares de classe média é a faca elétrica. Na absoluta maioria das vezes, ela está guardada em um armário, de onde sai apenas muito raramen- Módulo 6 41 te, se é que sai de lá! Você mesmo, ou sua mãe, talvez tenha em casa uma faca elétrica. Se for esse o caso, pergunte a si mesmo ou a sua mãe quando ela foi utilizada pela última vez. [Se não tiver uma faca elétrica, talvez tenha uma pequena máquina de costura manual – que literalmente cabe na palma da mão! A Mini- Singer foi lançada no início da década de 1980. O raciocínio que se segue no texto é válido tanto para a faca elétrica como para a Mini-Singer.] Na maioria das vezes, a faca elétrica está parada há anos! Eventualmente, ela foi utilizada pela última vez em alguma data festiva, para cortar um peito de peru assado em fatias finas e tenras. É isso mesmo. A faca elétrica presta-se muito bem para cortar assados de forma quase profissional. No entanto, ela tem suas inconveniências. Ocupa bastante espaço (à mesa e para guardar), precisa de uma tomada para ligar, requer um proces- so de limpeza mais trabalhoso que as facas usuais. Por que, então, alguém compraria uma faca elétrica? Foi o marketing que forçou as pessoas a comprarem esse produto? O surpreendente é que a faca elétrica foi comprada, na grandemaioria das vezes, não por quem a possui. Geralmente, ela foi ganha como presente! De fato, por diversos anos, a faca elétrica foi um produto campeão de vendas no Dia das Mães e no Natal! Era um pre- sente que agradava, inusitado, de alto valor percebido. Deixa- va feliz quem ganhava e quem presenteava. Tudo para depois ficar relegado a um armário qualquer! [Igualmente, a Mini- Singer gerou um verdadeiro frenesi de compras nos Dias das Mães de 1982 a 1984.] Pergunta-se: qual é a necessidade que a faca elétrica aten- dia? Provavelmente, muito mais a necessidade de presentear do que a necessidade culinária de cortar assados! Esse parece ser um exemplo prosaico. No entanto, a mes- ma necessidade de presentear faz surgir negócios capazes de alcançar importância nacional. Esse é caso d’O Boticário, a maior rede varejista do Brasil em número de lojas. Suas mais 42 Curso de Graduação em Administração a Distância de 2,4 mil lojas em mais de vinte países atestam o sucesso desse varejo de perfumaria e afins. Pois bem, O Boticário vende pro- dutos que são consumidos principalmente por mulheres. No entanto, a maior parte de suas vendas de produtos femininos é feita para compradores masculinos. Contradição? Não neces- sariamente! Os homens muitas vezes têm dificuldades em com- prar presentes para mulheres. O Boticário atende bem essa ne- cessidade. Ele oferece não apenas bens que as mulheres gostam (perfumes). Ele provê os serviços necessários para transformar esses bens em bons presentes, como orientação feminina aos clientes masculinos, sofisticados embrulhos para presente (com o requinte de serem perfumados com a fragrância adquirida), cartão de presente, etc. Atividade 12 Descreva um produto que você tinha convicção que foi “forçado” a adquirir sem necessitar. A seguir, tente identificar qual a necessida- de subjacente que o levou à compra. Poste na internet o seu caso. Se você não conseguir identificar a necessidade que o levou à com- pra, peça aos seus colegas de turma que sugiram necessidades que o teriam levado a obter o produto “desnecessário”. Necessidades e Desejos Você já deve estar pensando em quão importante é identificar a necessidade do consumidor. De fato, identificar a necessidade que se pretende atender é essencial em marketing. Para tanto, precisamos de- finir o que é necessidade. Módulo 6 43 Atividade 13 Antes de prosseguir com a leitura, escreva qual é a sua definição intuitiva de "necessidade" e poste na internet, para acesso de sua turma. Após a leitura que se segue, reavalie sua definição. As necessidades ocorrem na mente do consumidor. Elas podem ser vistas como forças em nossa mente que nos influenciam a perceber e agir de maneiras que transformem situações insatisfatórias em satisfatórias. Também podem ser vistas como estados internos de ten- são causados pelo desequilíbrio em relação a um estado fisiológico ou psicológico ideal ou desejado. Ou seja, uma necessidade é a diferença entre o estado em que nos encontramos e um estado ideal. Se essa diferença for suficientemente grande, o consumidor se sentirá motiva- do a agir para reduzi-la, buscando a satisfação da necessidade. Pode- mos, de forma resumida, dizer que: Necessidade é um estado de privação É importante observar que as necessidades* são inerentes ao ser humano, elas são exigências básicas. Para garantir sua sobrevivên- cia e integridade, o homem tem necessidades básicas físicas, incluin- do as necessidades por alimento, água, abrigo, proteção contra o meio ambiente e segurança. Além disso, o ser humano se desenvolveu como um animal social, desde os bandos de humanóides que se juntavam para procriar e cuidar de suas crias até as complexas estruturas sociais de eras mais recentes. Daí, o homem apresentar necessidades sociais, de pertencimento e afeição. Da mesma forma, a própria composição humana inclui necessidades individuais, como necessidades de conhe- cimento e de auto-expressão. As necessidades sociais e individuais são geralmente de ordem psicológica, em oposição às necessidades físicas. Assim, os seres hu- manos se sentem na obrigação de parecer bem, tanto frente aos demais como consigo mesmo. Tome o exemplo de nossas roupas. Em princí- GLOSSÁRIO *Necessidade – é um estado de privação. Fonte: Armstrong et al. (2004) 44 Curso de Graduação em Administração a Distância pio, elas devem atender à nossa necessidade física de proteção contra os rigores do meio ambiente (frio, vento, insolação). No entanto, as roupas que usamos geralmente são mais importantes por dizer algo sobre nós aos que nos cercam (família, amigos, colegas, vizinhos). Elas carregam a imagem que desejamos transmitir de nós mesmos. Ao fazê-lo, elas satisfazem nossa necessidade de auto-expressão – uma necessidade psicológica. Eventualmente, para satisfazer uma necessidade, desejamos algo que vai além da satisfação da necessidade em si. É o que ocorre, por exemplo, quando queremos comprar uma “roupa de marca”. Nestes casos, sentimos o que se chama de desejo. Embora haja considerável controvérsia sobre a definição de de- sejo*, particularmente quanto ao momento em que se passa de uma necessidade para um desejo, geralmente se adota a definição de que: Desejo é uma necessidade influenciada externamente Assim, enquanto a necessidade é inerente ao ser humano, a for- ma pela qual o consumidor gostaria de ver essa necessidade satisfeita é influenciável pela cultura, pela sociedade, pelo conhecimento de uma pessoa e também pelo marketing. Como conseqüência, embora marketing não crie necessidades, pode gerar desejos, moldando uma necessidade. Um consumidor pode ter a vontade de satisfazer dada necessidade de uma maneira específica que foi sugerida pelo marketing. Por exemplo, o marketing pode promover a idéia de que uma roupa com a marca Hugo Boss satisfaz a necessidade social de status de certa pessoa. É por este motivo que muitas marcas de roupas destacam etiquetas com sua logomarca visível nas peças que comercializam. O caso do cigarro. Marketing cria a “necessidade de fumar”? Um caso que muitas vezes desafia a noção de que o marketing não cria necessidades é o do setor tabagista. A in- GLOSSÁRIO *Desejo – é uma necessidade social e culturalmente influ- enciada. Fonte: Solomon et al. (2005). Módulo 6 45 dústria do cigarro tem relevância econômica em muitas economi- as, mas tem estado sob constante e crescente pressão da sociedade pelos malefícios associados ao consumo de cigarros. Em particu- lar, muitos países têm restringido a propaganda do cigarro. Entretanto, a indústria alega que fumar é uma questão de liberdade individual. O argumento percorre o raciocínio de que se alguém sente a necessidade de fumar, então fumar deve mes- mo ser uma decisão pessoal do consumidor. Se ele estiver cien- te dos malefícios potenciais e julgar que a satisfação obtida su- pera esse “custo” do cigarro, deve-se deixar que o consumidor decida por si próprio. Portanto, deveria ser dada liberdade a uma empresa de cigarros para informar ao consumidor que vende um produto capaz de atender essa necessidade. Ocorre que esse raciocínio enfrenta sérios problemas, de- pendendo de fumar ser uma necessidade ou um desejo. Embora fumar possa ser considerado uma necessidade fisiológica para quem já adquiriu o hábito, face à dependência física causada pela nicotina, o problema ocorre quando se considera o início do hábito de fumar. Com qual idade as pessoas iniciam seu hábito de fumar? A grande maioria dos fumantes iniciou seu hábito durante sua adolescência! Na adolescência sofremos transformações físicas, passando de criança a adulto. Isto gera no adolescente uma grande necessidade social de ser reconhecido como adulto. O que faz a propaganda do cigarro? Influencia o adolescente a ver no cigarro um produto pelo qual ele satisfará essa sua ne- cessidade (possivelmente,uma eventual restrição dos pais ao fumo provoque até um aumento na vontade do jovem em se auto- afirmar como “adulto” através da adoção do cigarro “proibi- do”). Ou seja, a propaganda pode criar o desejo (de fumar) a partir de uma necessidade (social). Portanto, as restrições à propaganda do cigarro são justificáveis, por restringirem a cri- ação desse desejo. 46 Curso de Graduação em Administração a Distância A Hierarquia de Necessidades de Maslow Como identificar a necessidade que leva uma pessoa a buscar um produto para atendê-la? Evidentemente, conforme pode se depreender do exemplo do cigarro, essa não é uma tarefa trivial. Entretanto, podemos lançar mão de um referencial conceitual proposto pelo psicólogo Abraham Maslow, muito utilizado para classificar as necessidades. Maslow propôs que os seres humanos têm necessidades que podem ser classificadas em cinco categorias distintas. Mais ainda, ele propôs que a energia e a importância que dedicamos à satisfação dessas necessidades variam. Desta forma, nos concentraremos em atender pri- meiro às necessidades da categoria mais básica para só então buscar atender às necessidades de categorias de ordem mais elevada. Uma ca- tegoria de ordem mais elevada apenas se torna relevante para o consumi- dor quando a pessoa satisfaz suas necessidades de ordem mais básica. Portanto, as necessidades se ordenam segundo uma hierarquia, a Hierarquia de Necessidades de Maslow. Ela é representada geral- mente por uma pirâmide, como na Figura 3. As cinco categorias de necessidades são as seguintes: Fisiológicas. As necessidades mais básicas são aquelas es- senciais à sobrevivência, como alimento, água, sono e abri- go. O rótulo de um produto alimentício no supermercado, que mostra o alimento preparado e fumegante, chegando a fazer os consumidores salivarem, está despertando uma ne- cessidade fisiológica. Outro exemplo seria uma famosa cam- panha publicitária nos anos 60. Sempre veiculada às 21h, anunciava os Cobertores Parahyba com um desenho anima- do e o jingle “Já é hora de dormir. Não espere mamãe man- dar. Um bom sono pra você e um alegre despertar!” Módulo 6 47 Atividade 14 Converse sobre o jingle com pessoas que foram crianças na década de 60 e assista a esse comercial que marcou época <http:// www.youtube.com/watch?v=5qgAAsxdqwI>. Segurança. As necessidades de segurança incluem proteção, auto-preservação e ausência de dor e desconforto. De modo mais ou menos explícito, o marketing utiliza os medos e an- siedades dos consumidores para despertar necessidades de segurança. Por exemplo, os dentifrícios que prometem pro- teger contra as cáries ou a sensibilidade dental estão apelan- do para as necessidades de segurança. Da mesma forma, um sistema de alarme residencial promete segurança. A seguran- ça, entretanto, pode alcançar ordens mais elevadas do que a segurança física pessoal. Um desodorante pode ser vendido prometendo uma proteção psicológica contra situações desa- gradáveis. Seguradoras e serviços bancários também procu- ram oferecer segurança. Sociais. A natureza social do ser humano leva às necessida- des sociais. Aparecem aqui necessidades de afeto, sensação de pertencimento, amizade e amor (tanto amor fraternal como sexual e romântico). Dada sua importância para o ser huma- no, o marketing muitas vezes desperta necessidades sociais como forma de criar desejos por roupas, cosméticos, viagens e um sem-número de produtos, sugerindo que possam trazer o amor. Da mesma forma, a necessidade que temos de ser- mos aceitos e nos sentirmos pertencentes a um grupo é des- pertada na promoção de produtos e marcas para adolescen- tes. Um fenômeno mundial nessa linha são os jeans. Da mes- ma maneira, uma marca como a Nike conseguiu transformar- se no objeto do desejo de milhões de jovens como uma mar- ca “legal”, abrindo as portas para que pertençam aos seus grupos de amigos e colegas. A própria Coca-Cola enfatiza as necessidades sociais ao colocar seu refrigerante em campa- nhas natalinas anuais. Estima. Também descritas como necessidades pessoais ou do ego, dizem respeito a nossas necessidades de auto-estima, 48 Curso de Graduação em Administração a Distância reconhecimento, prestígio ou status, conquista. As necessi- dades sociais estão ligadas a uma simples aceitação social. Já as necessidades de estima a aceitação são baseadas na contri- buição ao grupo. Os sabonetes Dove perceberam que muitas mulheres estavam mais preocupadas com a auto-estima do que com a beleza socialmente aceita. Assim, lançaram uma campanha enfatizando mulheres comuns ao invés de mode- los maravilhosas. Outro exemplo de despertar uma necessi- dade de estima, prestígio ou status, ocorre quando uma mar- ca de automóveis de luxo afirma que “Quem dirige um, fez por merecer”, como faz o Ford Fusion. Atividade 15 Assista em <http://www.youtube.com/watch?v=uT4dpFpiTgk> ao filme que subsidia a campanha da Dove. Para qual tipo de necessi- dade a campanha apela? Auto-Realização. Nesta categoria estão as mais elevadas ne- cessidades humanas, envolvendo experiências enriquecedoras, desenvolvimento e realização pessoal. Se- gundo Maslow, apenas poucas pessoas alcançariam tal nível, embora muita propaganda foque esse tipo de necessidade. O prazer estético prometido pelas artes plásticas, ou mesmo pela arquitetura, pode ser classificado como a proposição do aten- dimento desse tipo de necessidade. Da mesma forma, muitos loteamentos de chácaras suburbanas tentam despertar esse tipo de necessidade. Mesmo a Microsoft promoveu seu Windows XP com o slogan “Sim, você pode”. Módulo 6 49 Atividade 16 Descreva e poste na internet exemplos de produtos existentes no mercado para cada tipo de necessidade. Faça isso tanto para bens como para serviços. Use exemplos diferentes daqueles apresenta- dos no texto. Embora a representação tradicional da Hierarquia de Necessi- dades de Maslow seja piramidal, ela passa uma idéia de rigidez. Na realidade, há evidência empírica de que o ser humano não tem que necessariamente atender completamente um tipo de necessidade para apenas então se dedicar a atender o seguinte. Apesar de existir um ordenamento hierárquico geral da impor- tância que damos ao atendimento de cada tipo de necessidade, em um dado momento o consumidor pode atribuir algum nível de importân- cia para atender necessidades de outro tipo. Trabalhos realizados por Alderfer (1972) indicam que há uma sobreposição da relevância das necessidades para um consumidor. Com isto, uma representação mais Figura 3: Hierarquia das Necessidades de Maslow e exemplos de aplicações Fonte: adaptado, com exemplos elaborados pelo autor, de Hoyer e Macinnis (2004) 50 Curso de Graduação em Administração a Distância apropriada da Hierarquia de Maslow consiste no modelo de “ondas”, mostrado na Figura 4. Figura 4: Modelo da Importância Relativa das Necessidades de Maslow Fonte: elaborado pelo autor. Mercado Agora que você já tem uma boa compreensão do que sejam ne- cessidades, podemos voltar nossa atenção aos mercados. Atividade 17 Todos nós temos uma noção do que seja um mercado. Falamos em mercado de automóveis (ou mercado de produtos), mercado de tra- balho, mercado nordestino (mercado geográfico), mercado infantil (demográfico) e até em mercado eleitoral. Escreva uma definição sua de mercado, sem receio de errar. Tente colocar nessa definição quais são os elementos que formam um mercado. Pronto? É muito comum definir um mercado como o número de unida- des físicas de um bem que foram vendidas ou como o volume de re- ceitas geradas por um tipo de serviço em determinado período. Entre- tanto, se você lembrar o que diz o texto Miopia em Marketing, anteri- ormente citado, notará que esses significados têm a mesma dificulda- de inerente à definição do negócio com base no produto e não na ne- Módulo
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