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FILÔ RENASCENÇA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO 
 FILOSOFIA 
 
 
 
 
 
DIEGO BUENO SANTOS 
 
 
 
 
 
 
FILOSOFIA DA RENASCENÇA 
 
RECORTE HISTÓRICO DO PENSAMENTO LÓGICO-CIENTÍFICO: A INVESTIGAÇÃO 
DA NATUREZA EM ARISTÓTELES E A CISÃO DE SEUS PARADIGMAS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
GUARULHOS – SP 
2020 
 
 
 
 
 
 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO 
 FILOSOFIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
DIEGO BUENO SANTOS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 GUARULHOS – SP 
 2020 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
‘’ Daí se houver uma ciência que abarca tudo – como alguns dizem – aquele que a 
estuda não poderá, de modo algum, ter conhecimento prévio. Mas todo aprendizado procede, 
total ou parcialmente, do que já é conhecido, quer seja através de demonstração, quer através 
de definição, posto que as partes da definição tenham que ser já conhecidas e familiares. ’’ 
 
 (Aristóteles em Metafísica) 
 
 RESUMO 
 
Este trabalho tem como intuito articular a tese de uma possível interdependência entre 
ciência e história. Visa-se, assim, desvelar o problema tão enraizado entre cientistas naturais e 
cientistas sociais. A soberania da ciência é algo inquebrantável, no entanto, para não 
categorizá-la a meros acúmulos de experiências e testes, tornando-a caricatural, é preciso 
buscar as causas exteriores que influenciaram nas revoluções dos antigos paradigmas. Para 
tal, partir-se-á das investigações cosmológicas, tão sustentadas pelo sistema de mundo 
aristotélico, e que teve seu declínio do século XV em diante. Dessa forma, será discutida a 
perspectiva histórica da mudança do paradigma do sistema geocêntrico para o heliocêntrico, 
bem como as implicações no contexto em que estavam situados seus principais personagens. 
 
Palavras-chaves: Ciência, história, filosofia, cosmos, metodologia, paradigma, 
revolução. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1.1 INTRODUÇÃO E SITUAÇÃO GERAL: A COSMOLOGIA E OS 
PRIMEIROS PRINCÍPIOS DA NATUREZA. 
 
Os gregos foram os grandes responsáveis pelo desenvolvimento do pensamento 
racional do ocidente. Sua emergência se deu à medida que o homem necessitava atribuir 
explicações para a ordem, a natureza e os elementos contidos na estrutura do cosmos. Suas 
abordagens, apesar de terem sido um grande passo à evolução do pensamento lógico-racional 
(ainda não havia o conceito de ciência como entendemos hoje), quase sempre vinham 
carregadas de concepções mágicas. Assim, tratar de pensamento racional e misticismo, não 
significava separá-los, no mundo antigo. É notório salientar também, que ainda nos séculos 
XVI e XVII, mesmo os mais engenhosos artífices das artes mecânicas e os físicos-
matemáticos responsáveis pela revolução científica moderna não excluíam uma causalidade 
divina que articulava a natureza, considerar a crença religiosa e, por consequência, a fé em 
Deus, mesmo nos modernos, é algo ainda evidentemente importante. ‘’ Ora, só existem duas 
maneiras nas quais a ciência pode ser divina. Uma ciência é divina se for caracteristicamente 
posse da divindade, ou se disser respeito a assuntos divinos’’ (ARISTÓTELES, 2012) 
Tales de Mileto foi, no século VI a.C., um dos responsáveis pelo desenvolvimento da 
investigação racional. Mileto foi um técnico da construção, sendo ele o responsável pela 
elaboração de um modelo engenhoso para desviar às águas do rio Hilas para que o rei Creso 
atravessasse-o. Foi ele também que previu precisamente um eclipse solar, ainda no século VI 
a.C.. 
 A ânsia humana pela investigação da natureza, dos pré-socráticos em diante, estava 
calcada na minuciosa observação dos dados naturais. Foi dessa forma que os filósofos, 
anteriores a Aristóteles, chegaram à conclusão de que o mundo era constituído de um único 
elemento; a água, e que toda a matéria era redutível a alguma espécie de energia. A partir da 
observação das temperaturas, ora altas, ora baixas, Tales notava que algo ocorria com os 
elementos afetados, por exemplo; sempre que chovia, plantas emergiam do solo, os seres 
vivos, necessitavam de uma ingestão suficiente de água para sobreviverem, e, assim, Tales 
chegara à conclusão de que o elemento fundamental da vida, era a água, bem como base de 
sustento para o mundo. 
 
Nem todos concordam, entretanto, quanto ao número e caráter desses 
princípios. Tales, fundador dessa escola de filosofia, afirma que esse princípio 
permanente é a água (razão pela qual ele igualmente propôs que a terra flutua na 
água). É presumível que tenha chegado a essa hipótese a partir da observação de que 
o nutriente de tudo é úmido, e que o próprio calor é gerado da umidade, sua 
existência dependendo dela (e aquilo de que uma coisa é gerada é sempre seu 
primeiro princípio). Extraía sua hipótese, portanto, disso e também do fato de as 
sementes de tudo apresentarem uma natureza úmida, e a água é o primeiro princípio 
da natureza de coisas úmidas. (ARISTÓTELES, 2012, p. 48) 
 
Ora, por mais que pareça extremamente simples e didático esse princípio elaborado 
por Tales, e que suas considerações tenham caído em erro, suas formulações serviram de 
sustento para sondagens posteriores, mesmo passíveis de misticismo. Foi o caso de 
Empédocles, famoso por ser um demagogo ( pois dizia possuir poderes mágicos), acreditava 
tudo que existia na terra era oriundo dos quatro elementos da natureza; o fogo, o ar, a água e a 
terra, sendo o fogo pertencente ao sol e a luz das estrelas. Observa-se, nesse contexto, a 
importância da investigação cosmológica em todo o mundo antigo. 
Dessa forma, temos Anaximandro, posterior a Tales, que também fora um dos grandes 
observadores do mecanismo da natureza, foi o responsável pela pioneira elaboração de um 
mapa do mundo, que afirmava ser a terra, uma substância solta ao espaço, sob o efeito da 
crença em uma terra plana. 
Nesse contexto, cabe agora se lembrar de um nome que ocupa lugar fundamental no 
mundo antigo; Pitágoras. Sua precisão matemática (tema determinante aqui) foi categórica os 
desenvolvimentos lógicos posteriores, mesmo dois mil anos após sua passagem pela terra, 
ainda estudamos nas escolas contemporâneas, o famoso teorema de Pitágoras. A ideia de 
quadrado, cubo e a palavra ‘’teoria’’, se devem a esse exímio espírito grego. Além do mais, o 
conceito de ‘’cosmos’’, também se atribui a ele. A filosofia e a matemática, com Pitágoras, 
andavam de mãos dadas. E Aristóteles, com magnífica autoridade, consolidou a divisão da 
filosofia em sua Metafísica, vigorando como legitimidade acadêmica por séculos, algo só 
viria a mudar com a ciência moderna de Galileu no século XVII. A abordagem do universo, 
os caminhos do homem em direção ao até então insondável mundo cosmológico, jamais seria 
possível sem uma linguagem lógico-matemática surgida em seio grego. Sua influência, assim 
como a de Aristóteles, tornou-se atemporal, ao menos até o século XVI, pois ainda no 
Renascimento, Pitágoras e Aristóteles eram pintados pelos grandes artífices como autoridades 
inexoráveis das artes liberais. 
 
Contemporaneamente, contudo, e mesmo antes, os chamados pitagóricos 
dedicaram-se às matemáticas e foram os primeiros a desenvolver essas ciências; 
estudando-as passaram a crer que os princípios delas são os princípios de tudo. E 
uma vez que os números são naturalmente os primeiros entre esses princípios, e eles 
imaginavam que poderiam detectar nos números, num grau maior do que no fogo, 
na terra e na água, muitas analogias cm o que é e vema ser (...) (ARISTÓTELES, 
2012, p. 53) 
 
Dito isto, cabe lembrar que meu intuito neste trabalho, é abordar as concepções 
cosmológicas, suas metodologias e seus desdobramentos no pensamento racional-científico ao 
logo da história, e não meramente tratar das abordagens éticas centradas num sujeito isolado, 
como fizera Platão por meio de Sócrates, ou temas éticos formulados pelos céticos, epicuristas 
ou estoicos. Embora cada qual tenha uma doutrina física e lógica bem formulada, como é o 
caso dos estoicos e Epicuro. Infelizmente não haverá tempo o suficiente no calendário para 
tratar de todas. Além, é claro, do importantíssimo atomismo trabalhado por Demócrito, outro 
pensador preponderante para a concepção de Physis dos gregos. Sua concepção de realidade é 
aquela calcada nos átomos, isto é, etimologicamente, algo que não pode ser dividido. Tudo 
que existe, dizia ele, são compostos de micropartículas ocupantes do espaço. Os átomos são 
incriáveis e indestrutíveis e toda mudança que há no universo, são devidas a alterações 
atômicas. Vemos, assim, quão autênticas foram os caminhos trilhados pelos antigos em 
matéria de raciocínio. Caminho esse, por vezes, retomado por F.Bacon em sua empreitada 
metodológica que afrontou veementemente às autoridades peripatéticas da Igreja. ‘’Assim, 
evidencia-se, inclusive com base nas afirmações dos filósofos mais antigos, que toda 
investigação aparentemente é dirigida para as causas descritas na Física e que não podemos 
sugerir qualquer outra causa além dessas.’’ (ARISTÓTELES, 2012) 
Portanto, visarei tratar especificamente de Aristóteles e sua influência colossal no 
mundo escolástico-medieval devido a seu sistema físico de mundo e suas categorias de 
hierarquia das ciências, bem como os primórdios da ciência moderna, que outrora fora 
revolucionária e destronou a enraizada e obsoleta concepção de mundo criada por Aristóteles, 
que veremos mais adiante. Atentarei-me, fundamentalmente, no período da Grécia antiga 
entre a época de Aristóteles e os séculos XV a XVII, período no qual emerge o Renascimento 
cultural na Europa e com profundas consequências para o campo das artes mecânicas. Assim, 
passarei por Galileu, Bacon, Copérnico e seus contemporâneos responsáveis pelo conceito de 
engenharia e método, que proporcionou avanços inimagináveis nas investigações celestes. 
Ademais, ressalto da imprescindível necessidade de resgatar, dentro das ciências naturais, a 
perspectiva histórica, tal como aquela defendida por Thomas Kuhn, em Estrutura das 
revoluções científicas. 
2.1 A FUNÇÃO CRUCIAL DA HISTÓRIA PARA A CIÊNCIA. 
 
O trabalho de abarcar historicamente o percurso da ciência é o de tratar conceitos e 
linguagens relativos ao período em específico, ou seja, termos utilizados por determinados 
autores para se referir a seu devido tempo. Para isso, autores que tratam de novas formas 
metodológicas precisam atentar-se minuciosamente, às estruturas de pensamento mais antigas, 
que sustentam o paradigma a ser quebrado. Autores como Copérnico ou Galileu foram 
homens preocupados em se comprometer com a tradição para então refutá-las. Daí a 
importância de se fazer uma história da ciência, analisar os conhecimento e técnicas 
acumulados ao longo do desenvolvimento científico. Tomas Kuhn (1998) denomina essas 
condições de ‘’emergência’’ de uma descoberta nova. 
Não obstante, uma objeção apresenta-se prática e teoricamente, uma vez que há 
dissonâncias entre cientistas naturais e cientistas sociais para comprovar quem possui a 
resposta mais legítima acerca da natureza dos métodos e dos problemas científicos. (KUHN, 
1998). Interessante o ponto de vista elaborado por Kuhn, dado que ao reivindicar para si a 
importância da perspectiva histórica, rebate-se a autoridade inexorável que os cientistas 
naturais têm em muitos aspectos. A acusação aos cientistas naturais, é àquela que na Física, 
na Química ou na Biologia., é inexistente o interesse pelas questões psicológicas ou sociais. 
Dessa forma, a ciência trabalha - como bem posto por Kuhn - com ‘’paradigmas’’, pois se 
constitui de valores universais, isto é, por realizações já consagradas. 
A ciência proposta por Kuhn é a que visa analisar os processos que emancipam uma 
crise no paradigma tradicional, gerando novas emergências de descobertas. A abordagem de 
períodos pós e pré-revolucionários são determinantes para compreender as mudanças da 
comunidade, que atesta e experimenta as recém-chegadas descobertas. Os meios onde tudo 
acontece são por publicações científico-acadêmicas, relatórios, toda uma literatura vem à 
tona, à medida que novas formas ou questionamentos metodológicos surgem. 
 
Contudo, não é preciso ir além de Copérnico e do calendário para descobrir que as 
condições externas podem ajudar a transformar uma simples anomalia numa fonte 
de crise aguda. O mesmo exemplo ilustra a maneira pela quais condições exteriores 
às ciências podem influenciar o quadro de alternativas disponíveis àqueles que 
procuram acabar com uma crise propondo uma ou outra reforma revolucionária. 
(KUHN, 1998, p.15) 
 
 
Observa-se, assim, a preponderância dos fatores externos ao inicio de toda e qualquer 
fagulha responsável pela explosão de uma nova crise no paradigma vigente. Ainda segundo as 
abordagens de Kuhn, o problema do espaço é ponto determinante nas pesquisas filosóficas 
que atravessam a história da ciência. O historiador deve, portanto, questionar, quando e por 
quem foi feita tal descoberta. 
Usualmente os livros didáticos de ciência tratam das transformações paradigmáticas 
como meros conglomerados de práticas laboratoriais. Todavia, é preciso dar lugar a uma 
concepção mais sólida, que sirva para fortificar as descobertas da ciência. Tomar a história da 
ciência como partida é dar importância aos momentos em que se registraram mudanças no 
paradigma científico, tanto para descrever os fatos que os impulsionaram, quanto para fatos os 
obstruíram. T. Kuhn descreve perfeitamente essa ideia: 
 
Preocupado com o desenvolvimento científico. O historiador parece então 
ter duas tarefas principais. De um lado deve determinar quando e por quem cada 
fato, teria ou lei científica contemporânea foi descoberta ou inventada. De outro 
lado, deve descrever e explicar os amontoados de erros, mitos e superstições que 
inibiram a acumulação mais rápida dos elementos constituintes do moderno texto 
científico. (KUHN, 1998, p.20) 
 
Dessa forma, Kuhn demonstra que mesmo as teorias tidas como mitos, por exemplo, a 
dinâmica física de Aristóteles, não deve ser excluída do percurso científico, pois em algum 
momento foi sustentáculo para o acumulo do progresso. ‘’Portanto, a história da ciência 
reclama por uma nova imagem da ciência. ‘’ (KUHN, 1998). 
Portanto, para adentrar nessa tarefa de abordar as perspectiva histórica da investigação 
cosmológica e científica, se faz categórico analisar os pressupostos da filosofia aristotélica, 
que vigorou como hegemonia acadêmica por mais de mil anos nas universidades europeias. 
Assim, será evidenciado que toda a autoridade que a ciência detém, está fundamentada em 
acúmulos históricos de renovações de paradigmas tradicionais. 
 
 
 
 
 
 
3.1 A DIVISÃO DA FILOSOFIA E AS CAUSAS NOBRES: A 
SUPERIORIDADE DA TÉCHNE OU DAS CIÊNCIAS ESPECULATIVAS. 
 
 Uma das frases mais brilhantes da história da filosofia é àquela primeira linha que 
inicia o livro um, de a Metafísica: ‘’Todos os seres humanos naturalmente desejam o 
conhecimento ‘’ (ARISTÓTELES, 2012). Assim, adentrando em uma investigação de fôlego, 
Aristóteles inicia estabelecendo uma hierarquia dos saberes humanos, que iria vigorar por 
quase um milênio nas academias da Europa. 
 A forma que o homem obtém conhecimento necessita fundamentalmente da percepção 
dos sentidos somado à sua memória. A experiência está calcada em lembranças de atividades 
já praticadas, o saber prático,portanto, é de suma importância para compreender os conceitos 
de Arte e Ciência, em Aristóteles. A experiência, diz Aristóteles, é muito semelhante à ciência 
e a arte, pois é por meio dela que os homens as possuem. ‘’ A experiência produz arte, mas a 
inexperiência, acaso’’ (ARISTÓTELES, 2012). 
 O que é, exatamente, fazer arte para Aristóteles? É formar um juízo universal após 
muitas noções da experiência. A experiência é o que possibilita conhecimento das coisas 
particulares, enquanto a arte é o que conhece os universais. 
 
 Assim, se alguém dispõe de teoria sem experiência, e conhece o universal, mas 
não conhece o particular nele contido, com frequência falhará em seu tratamento, 
uma vez que é o particular que tem que ser tratado, Entretanto, consideramos que o 
conhecimento e a competência pertencem antes á arte que a experiência, e supomos 
que artistas sejam mais sábios que homens de mera experiência, (o que significa 
que, em todos os casos, a sabedoria depende mais propriamente do conhecimento), e 
isto porque os primeiros conhecem a causa, ao passo que os segundos não a 
conhecem, uma vez que os homens de experiência conhecem o fato, mas não o 
porquê: os artistas, contudo, conhecem o porquê e a causa. Pela mesma razão, 
consideramos que os mestres, em todo ofício, merecem maiores apreços, conhecem 
mais e são mais sábios que os artesãos, porque conhecem as razões das coisas que 
são feitas; pensamos que os artesãos - como certos objetos inanimados – realizam 
coisas, mas sem saber o que realizam (como por exemplo, o fogo queima);somente 
que, enquanto os objetos inanimados executam todas suas ações devido uma certa 
qualidade natural, os artesãos executam as suas através do hábito. Assim os mestres 
dispõem de maior sabedoria, não devido à sua capacidade de fazer as coisas, mas 
porque possuem uma teoria e conhecem as causas. (ARISTÓTELES, 2012, p. 42-
43) 
Dessa forma, mesmo dando primazia à experiência, os sentidos não fornecem qualquer 
forma de sabedoria, como por exemplo, a razão do porquê o fogo é quente. O conhecimento 
científico, portanto, é a habilidade de saber fazer, a arte do homem sábio. Assim, temos a 
ciência contemplativa como suprassumo do saberes para Aristóteles. A causa mais nobre para 
se investigar é àquelas relacionadas ao ser, ou da metafísica e as especulações matemáticas. 
Tal discussão se refere às matérias puras, reais. 
A outra discussão que se segue nessa hierarquia, são as das causas materiais, ou seja, 
das coisas imperfeitas. Essas estão relacionadas às ciências práticas, como a ética, a política, 
ou a economia. Nesse contexto, para se chegar às discussões sublimes da metafísica, é preciso 
iniciar nos menores degraus da escala dos saberes, é preciso, portanto, iniciar-se nas ciências 
matemáticas, passando pela Aritmética, Música, Geometria e Astrologia, para então dedicar-
se as ciências do ser. Categorias essas que fundamentaram toda a ciência medieval-
escolástica, os famosos Trivium e Quadrivium. 
O sábio, então, é aquele capaz de tratar de coisas que ultrapassam o limite do homem 
comum, bem como é ávido nas ciências contemplativas, afastando-se por completo das 
ciências práticas. O homem elevado ao grau superior da ciência possui o conhecimento 
universal, algo que abarca a totalidade dos particulares. 
. 
(...) a razão da presente discussão deve-se ao fato de supor-se em 
geralmente que aquilo que é chamado de sabedoria diz respeito às causas primeiras e 
aos primeiros princípios, de maneira que, conforme já foi indicado, julga-se o 
homem da experiência mais sábio do que os meros detentores de qualquer faculdade 
sensorial, o artista mais do que o homem da experiência, o mestre mais do que o 
artesão; e as ciências especulativas mais ligadas ao saber do que as produtivas. 
Assim, fica claro que a sabedoria é conhecimento de certos princípios e causas. 
(ARISTÓTELES, 2012, p 43-44) 
 
A divisão aristotélica do saber, após o Renascimento, presenciará o seu completo 
declínio devido às novas artes mecânicas que emergirão após as descobertas de engenharia e 
observação cosmológicas de Copérnico, Galileu, Kepler, Brahe, dentre outros matemáticos e 
físicos que irão reverter o quadro de saberes estabelecido por Aristóteles, e consolidará os 
gérmens da ciência moderna. Veremos isso mais adiante após tratar da Física de Aristóteles. 
 
 
 3.2 ARISTÓTELES E SUA COSMOVISÃO; O ADVENTO DA AUTORIDADE 
FÍSICA E COSMO-LÓGICA. 
 
Posto a importância da história para o estudo da ciência, cabe agora demonstrar a 
ciência que vigorou por dezoito séculos. A física de Aristóteles visou explicar uma ontologia 
do ser, por meio dos conceitos de suas sólidas categorias. O ser é algo que se efetiva da 
potencia ao ato, sua natureza, portanto, é dinâmica. No entanto, a condição de substância não 
abarca completamente o ser. O ser possui, intrinsecamente, uma característica mutável, como 
tudo que se encontra no orbe terrestre, é passível de corrupção. 
No que diz respeito a sua cosmologia, Aristóteles acreditou que as matérias celestes 
eram incorruptíveis, pois seriam plenamente perfeita em sua essência. Muito disso se deve a 
sua divisão do mundo. Há, em Aristóteles, uma diferença entre mundo terrestre (sublunar) e o 
mundo celestial (supralunar). A física aristotélica trata especialmente do problema do 
movimento. As características do que está em potencia para ato são; a geração, corrupção, 
alteração e mudanças de tamanho, isto é, movimentos locais. Além disso, o cosmos de 
Aristóteles é algo finito, esférico e limitado em sua extensão, condição a qual era um 
paradigma entre os gregos, formulação cujo responsável fora Eudoxo. 
 
O universo aristotélico é, portanto, eterno, como também são eternos, 
segundo ele, o movimento e o tempo. Na cosmologia aristotélica, o Universo é 
único, contínuo e tem como estrutura básica o universo das duas esferas, composto 
por uma pequena esfera, a Terra, fixada no centro de uma segunda, vasta porém, 
finita esfera em rotação que leva consigo as estrelas fixas, e é dividido em duas 
regiões nitidamente distintas: a celeste e a terrestre, ocupadas por materiais distintos 
e governadas por leis distintas. Cada uma das coisas, sejam aquelas pertencentes à 
região celeste ou à região terrestre, tem, segundo Aristóteles, seu lugar ‘’natural’’ e 
seu ‘’movimento natural’’ para este lugar. (FÁTIMA, 2005, p.129) 
 
Nota-se, assim, de acordo com a tese central deste trabalho, que a Física aristotélica 
possuiu uma estruturação lógica capaz de sustentar as indagações científicas de seu tempo, 
que até a tradução de suas obras, eram vagas ou insuficientes. Dessa forma, suas abordagens 
do cosmos tornaram-se axiomas irrefutáveis, ao menos até a elaboração dos métodos de 
engenharia surgidos no período de Galileu. ‘’O conceito de movimento presente na física 
aristotélica permite sem dúvida entender a máxima medieval: quem não conhece o 
movimento não conhece a natureza’’ (FÁTIMA, 2005). 
Esse, portanto, é o Céu de Aristóteles, esférico e circularmente rotativo, onde a terra 
possui lugar no centro. 
E dado que a primeira figura corresponde ao primeiro corpo, e o primeiro 
corpo é o que se encontra na rotação extrema do mundo, segue que o que se move 
circularmente será necessariamente esférico. Consequentemente, também será 
esférico o que está em continuidade e aderindo a ele: pois o que está aderindo ao que 
é esférico também é esférico. De maneira análoga, também serão esféricas as coisas 
que estão no meio destas, pois aquelas coisas que estão limitadas por um corpo 
esférico e estão em contato com ele necessariamente serão todas esféricas, agora, as 
coisas que estão abaixo da esfera das estrelas errantes (planetas) tocam a esfera 
superior; Assim, portanto, o mesmo universo será esférico, pois todas as coisas estão 
em contato e continuidade com as esferas. (ARISTÓTELESapud FÁTIMA, 2005, 
p.135) 
 
A constituição do mundo celeste aristotélico, é aquele das estrelas, planetas, que são 
formados pela substância éter, uma espécie de quintessência pura, eterna e incorruptível. Por 
outro lado a terra seria composta de terra, fogo e água. Outra característica desse universo 
seria a força de seu movimento, cada círculo desse mundo agiria com potencias diferentes uns 
dos outros. O que se situa nas esferas superior tendia ao movimento para o alto, pois seriam 
substâncias puras e cristalinas, uma vez que os corpos da parte inferior, por serem pesados, 
tendiam a cair. 
 
Todo movimento é ou natural ou contrário à natureza e que o movimento 
que é contranatural para um corpo é natural para o outro, como é o caso do 
movimento para cima e para baixo, que é natural e contranatural para o fogo e para a 
terra, respectivamente; segue-se necessariamente que o movimento circular, sendo 
não natural para estes corpor, é natural para algum outro. E, além disso, se o 
movimento circular é o deslocamento natural para alguma coisa, está claro que 
haverá entre os corpos simples e primários algum que se moverá naturalmente em 
círculo, como faz o fogo para cima e a terra para baixo. (ARISTÓTELES apud 
FÁTIMA, 2005. p. 138) 
 
Dito isto, outro essencial fundamento da cosmologia aristotélica é a que resulta na 
origem da potência que mantém toda essa estrutura dinâmica em funcionamento, para 
Aristóteles, a causa primeira que rege todos esses movimentos, é o Primeiro Motor Imóvel. 
O raciocínio de Aristóteles é o de que, para procurar uma causa é necessário buscar as 
causas possíveis. Pois tudo que é movido, e movido por algo. Essa força primeira seria eterna, 
imutável e não submissa às leis da potencia e ato, dado que ela sua superioridade em 
perfeição, seria sempre atualidade. Se o movimento é eterno, deve haver algo que é 
necessariamente, um ato perpétuo que auto se projeta. Essa seria, portanto, a causa final do 
Universo. De acordo com ele: ‘’ dado que aquilo que é movido e propicia movimento é 
intermediário, há algo que propicia movimento sem ser movido, sendo uma essência e uma 
atividade eterna’’ (ARISTÓTELES). Assim, o Primeiro motor nada deseja e nada falta, mas é 
almejado por todos os seres do Universo. Ele existe à medida que é amado, desejado. 
Conclui-se, que toda essa organização científica que tratou Aristóteles, foi de suma 
importância para o progresso do homem em relação à noção de Cosmos. É claro que 
Aristóteles jamais possuiu instrumentos de observação, mas a potencia de seu pensamento 
sustentou por um milênio as crenças humanas acerca da constituição do mundo e de deus. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4.1 A CORROSÃO DO PARADIGMA ARISTOTÉLICO: O ALVORECER DA 
CIÊNCIA MODERNA 
 
Dados os princípios do paradigma vigente até o século de Copérnico, a então lei 
universal da natureza começa a esboçar seu fim, que será posta à prova com as descobertas 
dos séculos seguintes. A construção aristotélica de universo era de acordo a astrologia, que 
estabelecia: 
 [...] 1. Que o céu e os corpos celestes eram inalteráveis e imutáveis; 
2. Que o seu movimento era eterno, circular e perfeito; 3. Que existia uma quinta-
essência superior, distinta do mundo inferior da terra e seus elementos; 4. Que neste 
mundo inferior prevaleciam os processos de geração, alteração e decomposição, 
como as mudanças das estações, os movimentos geológicos, o nascimento e a morte 
das plantas e dos animais. (ROSSI, 1992, p. 29) 
 
Dessa forma, a crença estabelecida era a de que o homem era governado pelas leis 
celestes que governam também o mundo superior. A astrologia na época não era meramente 
um sistema de fé cósmica, mas sim uma organização científica que explicava as causalidades 
do mundo. Sua queda foi um processo lento, gradual, dado que sua autoridade era secular, ao 
menos até o século de Newton, que foi um dos principais precursores da ciência moderna com 
sua revolucionária descoberta da gravitação. ‘’ A derrota da astrologia foi repetidamente 
apresentada como devida à substituição do sistema aristotélico pelo sistema copernicano’’. 
(ROSSI, 1992). O advento do livro de Copérnico sobre as revolução dos orbes celestes iria 
colocar toda a tradição escolástica em ruína. Copérnico ainda possuía certas crenças antigas, 
como, por exemplo, a crença em mundo fechado, finito, todavia, sua força revolucionária 
consistiu em colocar o sol no centro do universo, e descolar a terra para sua órbita, assim 
como todos os outros planetas do sistema solar. 
Nesse sentido, mesmo toda a ebulição científico-intelectual que estava por florescer, 
não foi o suficiente para desmoronar o castelo milenar da astrologia. A nova astronomia 
caminhava a passos lentos até sua completa inversão nos valores metodológicos. 
 
O lento processo de substituição do geocentrismo pelo heliocentrismo, a 
substituição da concepção tradicional do ser como uma ‘’grande cadeia’’ pela 
imagem do mundo como ‘’ máquina’’ não podem absolutamente representar uma 
pura e simples substituição de uma ‘’verdade científica’’ por outra ‘’verdade 
científica.’’. [...] A chamada Revolução Científica – que muitos ‘’medievalistas’’ 
procuraram apagar da história do Ocidente – teve realmente caráter ‘’ 
revolucionário’’ que foi tantas vezes sublinhado, porque não consistiu na 
modificação de resultados parciais no âmbito de um sistema aceito, mas no 
questionamento de todo esse sistema, na adoção de princípios contrários à razão e à 
experiência, tal como vinham se configurando dentro da tradição, na construção de 
um novo quadro do mundo no qual se tornam problemáticas ou privadas de sentido 
muitas verdades que tinham sido óbvias por quase dois milênios, enfim, na 
elaboração de um novo conceito de razão de experiência, de natureza, de lei natural. 
(ROSSI, 1992, p. 33-34) 
 
Assim, seguiu-se o caminho de reversão no quadro dos saberes humanos por uma 
concepção efetivamente mais científica do homem e da natureza. A perspectiva tradicional 
estava calcada em uma unificação da revelação bíblica com a filosofia aristotélica que, ainda 
assim, tiveram influência no nascimento da nova ciência, mas a imagem do homem frente ao 
mundo levou rumos incontornáveis. A tradição, como dito, via o mundo como uma fusão 
religiosa e astronômica, já a revolucionária tese que estava germinando, via o universo 
submetido às leis da química, da física e da biologia, problemas, portanto, que ultrapassam os 
limites da fé. As práticas responsáveis pelo sustento dessas metodologias só podiam ser 
representadas pela engenharia e seus instrumentos observacionais, as Escrituras não possuíam 
mais a verdade sobre o mundo. 
A separação entre filosofia e a ciência se deu justamente à medida que Galileu inicia 
suas observações sobre as manchas lunares, seu livro, Siderius Nuncius abre o horizonte para 
o progresso do entendimento humano. As observações da superfície lunar foi um trabalho 
monumental, no sentido de aparatos de engenharia, captou evidencias e comprovou 
experiências jamais antes vista, e graças à luneta. 
 
Há cerca de dez meses chegou aos nossos ouvidos 
o rumor de que um belga havia construído uma 
luneta com o auxílio da qual os objectos visíveis, mesmo 
que estivessem muito afastados da vista do observador, se 
viam distintamente, como se estivessem próximos. Acerca 
deste admirável efeito circularam alguns relatos, uns 
dando-lhe crédito e outros negando-o. Isto mesmo me foi 
confirmado passados poucos dias por uma carta enviada 
de Paris pelo nobre francês Jacques Badovere , o que 
finalmente me fez dedicar-me completamente a descobrir 
as razões e a conceber os meios pelos quais pudesse chegar 
à invenção de um instrumento semelhante, o que 
consegui passado pouco tempo, baseado na teoria das 
refracções. Inicialmente, preparei um tubo de chumbo 
emcujas extremidades ajustei duas lentes de vidro, ambas 
planas numa face, sendo uma delas convexa na outra face, 
e a outra côncava. Aproximando o meu olho da lente 
côncava observei os objetos bastante maiores e mais próximos. 
Na verdade, surgiam três vezes mais próximos e 
nove vezes maiores do que quando vistos a olho nu. 
Construí, depois, um outro [instrumento] mais exato que 
apresentava os objetos sessenta vezes maiores.36 Finalmente, 
sem poupar qualquer trabalho ou dinheiro, foi-me 
possível construir um instrumento tão excelente que as 
coisas com ele vistas apareciam quase mil vezes maiores e 
mais do que trinta vezes mais próximas do que quando 
observadas apenas com as faculdades naturais. (GALILEU, 2010, p. 151) 
 
Desse modo, foi possível a constatação das características da superfície lunar, 
colocando abaixo qualquer tipo de tradição sustentada por palavras de autoridade. Vendo a 
superfície lunar de forma não lisa e repleta de erupções como a superfície terrestre. As 
controvérsias sobre os planetas e a via láctea estavam esboçando sua – mesmo que provisória 
– resolução. As pesquisas de Galileu acerca do cosmos e a nova astronomia custaram caro a 
Galileu, sua liberdade foi posta à prova por tamanha heresia. Isso prova o quanto os valores 
escolásticos, sustentado pela filosofia de Aristóteles, eram inexoráveis nas acadêmias. 
Como dito, por mais evidentes que tenham sido as novas descobertas astronômicas, o 
antigo paradigma ainda demorou a ser dissolvido, somente após as descobertas de Newton 
que o antigo sistema chegou a sua convulsão. Galileu discorre boa parte de seu livro sobre os 
mecanismos usados, as funcionalidades do novo instrumento de teste. Assim, a luneta 
mostrou sua força de precisão com Siderius Nuncius. Depois de colocada as bases da 
concepção escolástica, tomada pelo hibridismo metodológico - pois na junção da fé cristã com 
o conjunto de obras de Aristóteles, tinha-se um mundo completamente limitado, circundado 
por outras esferas sublimes, e causada pelo Primeiro Motor imóvel – nota-se a magnitude dos 
trabalhos realizados por Galileu, e como isso causou profundos abalos em sua época. As 
minuciosas investigações sobre a superfície lunar foi um passo gigantesco para ciência, 
compara-se até ao que o telescópio Hubble representou na contemporaneidade, aquela 
imagem do conglomerado de galáxias captando a ‘’totalidade do universo’’ visível, é tão 
impactante quanto às observações de Galileu para o século XVII. 
Além disso, não parece coisa de somenos ter eliminado 
as controvérsias acerca da Galáxia ou Via Láctea e 
ter revelado a sua natureza aos sentidos, quanto mais 
à inteligência; e será' maravilhoso e sumamente belo. 
demonstrar claramente, como se apontando com um 
dedo, que a substância dessas estrelas, que até ao presente 
todos os astrônomos chamavam nebulosas, é muito diferente 
do que até agora se pensou. 
Mas aquilo que excede imensamente toda a admiração, 
e o que especialmente nos impeliu a dar notícia a 
todos os astrónomos e filósofos, é que descobrimos quatro 
estrelas errantes, nem conhecidas nem observadas por 
ninguém antes de nós, que, tal como Vénus e Mercúrio 
em torno do têm os seus períodos em torno de um 
certo astro insigne entre o número dos conhecidos, ora o 
precedendo, ora o seguindo, e nunca ficando afastadas 
dele para .além de certos limites. Todas estas coisas foram 
descobertas e observadas há alguns dias por meio de 
uma luneta concebida por mim depois de ter sido iluminado 
pela graça divina. (GALILEU, 2010, p. 150) 
 
Dito isto, fica notório a incapacidade do conjunto aristotélico em lidar tamanha 
controvérsia. Assim, o universo não mais era limitado e circundado por outras esferas 
sublimes, não havia elementos etéreos ao redor da terra, o sol não girava em torno da terra, 
pois o homem nunca foi o centro do universo. E a deterioração do sistema medieval tinha uma 
causa ainda mais obscura para solucionar: o Primeiro Motor não era a causa do movimento 
dos seres. As formulações da Potencia ao Ato viram sua derrocada com as leis do cálculo. A 
fabulosa Metafísica aristotélica e suas categorias viram-se agora na parte inferior do quadro 
dos saberes. A dicotomia entre questões especulativas e questões prático-científicas se 
consolidou, Aristóteles portanto, não era a autoridade, a hegemonia escolástica presenciara 
seu fim. 
Galileu foi ainda mais longe, ele ousou associar a nova razão heliocêntrica do 
copernicanismo às Sagradas Escrituras. Como posto acima, Galileu foi um homem de fé, 
apesar de acusado de heresia, para ele, ainda assim a divindade era a causa do universo, e suas 
descobertas seriam iluminações divinas. Nesse sentido é possível perceber que em Galileu 
havia um certo sendo neoplatônico, o que por sinal, não era de surpreender, pois mesmo 
naquele contexto renascentistas repleto de inovações metodológicas e culturais, havia muitos 
aspectos do mundo antigo. ‘’Em relação a um texto seu publicado em 1613, acerca da História 
e demonstrações, Galileu afirma que a divina bondade o tinha levado à difusão de suas 
teorias’’ (ROSSI, 1992). Nesse texto, Galileu afirmava, ao contrário da lei vigente, que o céu 
era tão corruptível quanto os elementos terrenos, isto é, dado suas observações, ele notara que 
os astros e outros elementos eram passíveis de transição. Galileu, por tal afirmação, que 
outrora fora interpretada como inteiramente herege foi obrigado a revisar o texto então redigir 
sob as rédeas da igreja. ‘’ Galileu preparou então um novo texto, que mantinha a referência 
aos textos sagrados, mas acrescentava homenagem à autoridade teológica, além de um alto 
elogio à acuidade e à sublimidade de engenho dos sutis intérpretes da bíblia das Escrituras.’’ 
(ROSSI, 1992). 
Em ouro texto famoso envolvendo Galileu, é sua carta a Castelli. Nela, Galileu afirma 
a necessidade da exclusão das interpretações bíblicas sobre o universo. A ciência deve seguir 
autônoma, guiada somente pelos dados testáveis. As investigações sobre a natureza em nada 
contribuem para sondar a essência divina, os processos físico-químicos não possuem relação 
alguma com as ideias defendidas pelos homens. A obra de Deus é revelada pela verificação 
física e matemática. O mundo para Galileu era um livro de ciências, nele estava contido toda a 
obra divina. As Escrituras devem tratar somente da salvação das almas, portanto, uma questão 
estritamente de fé. Já o papel dos cientistas naturais é o de desvendar as leis do universo. 
Outro passo perigoso, ousado de Galileu, foi afirmar que a Bíblia possuía a verdade 
copernicana. A começar: 
 
1. Oferecendo uma interpretação sua da passagem de Josué e dos versículos do 
salmo 18 – que estão entre os textos aparentemente menos conciliáveis com a visão 
copernicana do mundo – Galileu pretende também demonstrar que nesses textos 
estão presentes, numa forma adaptada ‘à incapacidade do vulgo, ’’ algumas verdades 
próprias do sistema copernicano. 
2. Essas estão de certo modo ocultas dentro do texto bíblico e podem ser 
cautelosamente decifradas apenas por aqueles que indicarem os verdadeiros sentidos 
que estão sob as palavras do texto. (ROSSI, 1992, p. 108) 
 
A Escritura possuía o saber acerca da centralidade do sol e da rotação dos planetas em sua 
órbita. É fato, como dito, que Galileu possuía ainda certo neoplatonismo em sua posição 
pessoal, condição na qual não interferiu nos grandes passos que suas abordagens garantiram à 
humanidade. Portanto, mesmo se tratando de uma mirabolante retórica, Galileu não só foi 
defensor do copernicanismo como foi também o responsável pela reversão do paradigma 
científico, sobretudo pelas suas investigações com a luneta, que foi o suficiente para o total 
abalo da cultura de sua época. As evidências expostas no Mensageiro das Estrelas foi o 
desmonte – mesmo que não imediatamente – do mundo antigo.5.1 A GUISA DE CONCLUSÃO 
 
 Conclui-se, assim, que o percurso feito neste trabalho foi o de brevemente abordar a 
problemática envolvida entre a investigação do cosmos, que teve inicio na Grécia antiga, e 
como a filosofia de Aristóteles teve capital importância para o desenvolvimento científico do 
Ocidente, afirmando a tese principal de que é preciso fazer um resgate historiográfico para tal 
abordagem. As ciências naturais e as sociais devem trabalhar lado a lado se quiserem 
emancipar o saber humano, assim, onde uma termina se inicia a outra. Essa é a abordagem 
defendida por Kuhn, que tratamos de expor neste trabalho. Vimos também, que o tratado 
filosófico de Aristóteles, foi matéria irrefutável até o século XIV e XV, e daí em diante a 
autoridade escolástica viu seu declínio. A escala dos saberes estabelecido na Metafísica 
aristotélica, onde os saberes especulativos tinham lugar supremo na hierarquia dos saberes, 
passou por tornar-se obsoleto à medida que o avanço científico, com instrumentos de testes e 
observações, emergia com a engenharia moderna. As ciências práticas passaram a serem as 
principais responsáveis pela autoridade científica, deixando isolada a palavra da Sagrada 
Escritura. Assim, representa-se o rompimento do paradigma, tal como nos mostra Kuhn. Os 
limites da antiga tradição revelados com a insurgência de novas metodologias, não descartam 
sua importância no plano do desenvolvimento humano. Pelo contrário, foram partindo de suas 
teses que outros puderam elaborar novas estruturas. Sendo assim, buscou-se tratar aqui, que a 
ruptura com as ciências especulativas, se consolida à proporção que o quadro dos saberes se 
invertem, e as ciências práticas tomam a dianteira do progresso técnico-científico. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
BIBLIOGRAFIA 
 
 
ARISTÓTELES, Metafísica. Trad: Edson Bini. Ed: São Paulo: Edipro, 2012. 
 
ÉVORA, F. Regina. Natureza e movimento: Um estudo da física e da cosmologia 
aristotélicas. Cad. Hist. Ci., Campinas, Série 3, v. 15,n. 1, p. 127-170, jan.-jun. 2005. 
 
GALILEI, Galileu. Siderius Nuncius: O mensageiro das estrelas. Trad. Henrique 
Leitão, 3 edição. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2010. 
 
KUHN, Thomas. Estrutura das revoluções científicas. São Paulo, Ed: Perspectiva, 
1998. 
 
 MAGEE, Bryan. História da filosofia. São Paulo, ed: Loyola, 2013. 
 
ROSSI, Paolo. A ciência e a filosofia dos modernos: aspectos da revolução científica. 
São Paulo, Ed: UNESP, 1992.

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