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Caderno: ECONOMIA Criada em: 17/01/2021 18:09 Atualizada … 22/01/2021 17:27 Autor: raf.brunoo@gmail.com DAVID RICARDO CAPÍTULO I SOBRE O VALOR SEÇÃO I ONDE O AUTOR INVESTIGA O QUE DETERMINA O VALOR DE TROCA DAS MERCADORIAS E SE HÁ UMA MEDIDA-PADRÃO INVARIÁVEL DE VALOR MERCADORIA: Valor de uso + valor de troca VALOR DE USO: Utilidade da mercadoria | necessidade humana satisfeita por ela | toda mercadoria deve ter utilidade VALOR DE TROCA: Medida em que determinada quantidade de mercadorias é trocada por outra mercadoria em dada quantidade *Valor de uso(utilidade) não determina o valor de troca | a água é muito útil, porém possui baixo valor de troca. Por outro lado, diamantes são pouco úteis, mas possuem elevado valor de troca Existem dois tipos de mercadoria, a saber: I - Aquelas que não podem ser multiplicadas pelo esforço humano ( vinhos que dependem de certa terra limitada, jóias raras e obras de arte de artistas excepcionalmente talentosos) II - Aquelas que podem ser multiplicadas pela ação humana (alimentos e manufaturados em geral) As mercadorias do primeiro tipo são excepcionais As mercadorias do segundo tipo correspondem a grande maioria das mercadorias lançadas ao mercado. De modo que a Economia Política deve concentrar sua atenção no estudo do segundo tipo de mercadorias. Sendo o foco da Economia Política aquelas mercadorias que podem ser multiplicadas pela atividade humana, resta saber qual é o fator determinante do valor dessas mercadorias. VALOR = TRABALHO A quantidade de trabalho despendido na produção de uma mercadoria determina seu valor de troca relativo, isto é, em que proporção tal mercadoria será trocada por outra. Se uma mercadoria A é produzida em quantidade x em 1 hora de trabalho e uma mercadoria B é produzida em quantidade 2x em 1 hora, então A B ------------------------------------------------------------------------------------ X = 2X Assim, uma unidade de A pode ser trocada por duas unidades de B A vale mais que B, pois se demanda mais trabalho para produzir A em igual quantidade que B(2h de trabalho produzem 2x, enquanto 2x de B podem ser produzidos em 1h) Quanto mais trabalho for despendido na produção de um bem, mais valioso ele é Se a quantidade de trabalho contida nas mercadorias determina o seu valor de troca, todo acréscimo nessa quantidade de trabalho deve aumentar o valor da mercadoria sobre a qual ela foi aplicada, assim como toda diminuição deve reduzi-lo. De modo que se fossem necessárias duas horas para produzir X de A, então uma hora produziria X/2 que por sua vez seria trocado por 2X de B Por outro lado, se em uma hora se pudesse produzir 2X de A, então A e B possuiriam o mesmo valor. Fica evidente que o aumento da produtividade do trabalho, isto é, produção de mais mercadorias em menos tempo, não implica que esse trabalho será trocado por uma quantidade aumentada de mercadorias em igual proporção. Disso decorre o contrário: quanto menos trabalho for necessário para a produção de uma mercadoria, menor será o valor da mesma. Cabe agora determinar se existe uma medida-padrão que seja invariável, através da qual se possa medir a variação de valor de todas as mercadorias Como demonstrou Adam Smith, a moeda (ouro e prata) não servem para tal fim, pois também é uma mercadoria - mercadoria peculiar, escolhida por convenção social para servir de meio de troca equivalente a fim de evitar os inconvenientes do processo de troca. Do mesmo modo que as outras mercadorias, o valor do ouro e da prata varia de acordo com a maior ou menor quantidade de trabalho necessário para sua obtenção; A medida-padrão de Adam Smith é o trabalho comandado - quantidade de trabalho que uma mercadoria pode comprar no mercado. Como se sabe, para Adam Smith, o critério de troca baseado na quantidade de trabalho incorporado à mercadoria está restrito ao estágio primitivo da sociedade, onde o produto do trabalho pertence inteiramente ao trabalhador. Com o desenvolvimento da sociedade, algumas pessoas acumulam capital e a terra passa a mãos privadas. Assim, o produto do trabalho não pertence mais inteiramente ao trabalhador, mas é dividido entre ele e o capitalista. Desse modo trabalho incorporado =/= trabalho comandado. É nesse sentido que a teoria do valor-trabalho smithiana toma como medida invariável do valor o valor do trabalho, isto é, a remuneração do trabalhador, argumentando que esta sempre representa o mesmo grau de esforço e sacrifício feito pelo trabalhador, de modo que o que varia é o valor dos bens pelos quais o salário é trocado, mas nunca o valor do trabalho; David Ricardo critica esse aspecto da teoria de Adam Smith da seguinte forma: I - O valor do trabalho é igualmente variável. II - Se o valor dos bens pelos quais o salário é trocado varia na medida em que é aplicado mais ou menos trabalho em sua produção, então o valor dos bens produzidos pelo trabalhador também deve sofrer os mesmos efeitos. III - Se num dado período, se produz X mercadorias com determinada quantidade de trabalho e, num segundo período, com a mesma quantidade de trabalho se produz mais ou menos mercadorias, consequentemente haverá variação no valor do trabalho. IV - Assim, nas palavras de Ricardo, "a quantidade comparativa de mercadorias que o trabalho produzirá é que determina o valor relativo delas, presente ou passado, e não as quantidades comparativas de mercadorias que são entregues ao trabalhador em troca de seu trabalho." Para Ricardo não interessa o valor absoluto das mercadorias SEÇÃO II SE A COMPARAÇÃO DE TRABALHOS DE DIFERENTES QUALIDADES TEM RELAÇÃO COM O VALOR RELATIVO Ricardo admite que existem trabalhos qualitativamente diferentes. Por exemplo, 1 hora de trabalho numa atividade vale mais que 1 hora de trabalho em outra. Segundo o autor, essa diferença qualitativa não influi na determinação do valor relativo das mercadorias. Qualquer que tenha sido a diferença entre o valor de 1 hora de um trabalho e 1 hora de outro, essa diferença diz respeito ao valor absoluto das mercadorias e foi fixada há muito tempo e, uma vez constituída, está pouco sujeita a variações. Como a investigação de Ricardo é a cerca do valor relativo das mercadorias, pouca importância tem avaliar o grau de diferença absoluta entre a qualidade de um trabalho com outro. "Se uma peça de lã valer hoje duas peças de linho, e se, dentro de dez anos, o valor de uma peça de lã alcançar quatro peças de linho, poderemos com certeza concluir que será necessário mais trabalho para fabricar o pano, ou menos para fabricar as peças de linho, ou ainda que ambas as causas influíram." SEÇÃO III COMO O CAPITAL ENTRA NA EQUAÇÃO DO VALOR RELATIVO DE UMA MERCADORIA Dificilmente se pode realizar qualquer trabalho sem o auxílio de ferramentas. Mesmo no estágio mais primitivo da sociedade, considerando a mais primitiva das atividades humanas, a caça, não é possível imaginar a atividade de apanhar e matar um castor ou um cervo em que o trabalhador o faça apenas com a força das próprias mãos. Assim, é evidente que mesmo na etapa primitiva da sociedade já havia algum capital, visto que dele dependem as atividades humanas, embora seu possuidor fosse o próprio caçador (trabalhador). Assim, o valor dessas caças deve ser regulado não apenas pelo trabalho empregado na atividade de caça em si, mas também pelo trabalho empregado em fabricar as ferramentas que auxiliam essa atividade. "Suponhamos que a arma necessária para matar o castor fosse produzida com muito mais trabalho que a arma necessária para matar o cervo, por causa da maior dificuldade de se aproximar do primeiro animal, e da conseqüente necessidade de uma arma mais precisa. Um castor valeria naturalmente mais do que dois cervos, justamente porque, no total, mais trabalho seria exigido para matá-lo. Ou imaginemos que a mesma quantidade de trabalho fosse requerida para fabricar as duas armas, que teriam,no entanto, durabilidade muito diferente. Somente uma pequena parcela do valor do instrumento mais durável seria transferida para a mercadoria, enquanto uma porção muito maior do valor do instrumento menos durável seria adicionada à mercadoria produzida com seu auxílio." Pensando em uma sociedade primitiva, onde o caçador realiza a atividade de caça e fabrica as ferramentas necessárias para essa atividade ele próprio, o valor total da mercadoria, isto é, capital+trabalho, pertence a ele. Agora, se considerarmos uma sociedade onde uns detém o capital e outros detém a força de trabalho, sendo o valor relativo de uma mercadoria determinado pela quantidade de trabalho incorporada no capital e a quantidade de trabalho incorporada a atividade produtiva em si de modo que uma parcela do valor da mercadoria vá para o capitalista e outra para o trabalhador, o valor de troca das mercadorias continuaria sendo determinado pela quantidade de trabalho incorporado tanto pelo capital, quanto pelo trabalho. A redução na utilização de trabalho na produção de qualquer mercadoria sempre afeta seu valor relativo, embora de modo distinto: a redução na quantidade empregada na produção da mercadoria afeta integralmente o valor relativo dessa; a redução na quantidade empregada na produção do capital afeta parcialmente o valor dessa, correspondendo o benefício restante às demais mercadorias onde fossem empregado o capital; SEÇÃO IV SOBRE A NATUREZA HETEROGÊNEA DO CAPITAL E SUA RELAÇÃO COM A VARIAÇÃO DE VALOR DAS MERCADORIAS Vamos supor duas atividades: caça e pesca. Se num dado período fossem empregues a mesma quantidade de trabalho na produção de ferramentas necessárias à caça de 10 castores que na pesca de 20 salmões e que este capital tivesse a mesma duração, e a mesma quantidade de trabalho para a produção da mesma quantia em ambas atividades, então: CAÇA PESCA PERÍODO 1 dia 1 dia CAPITAL x x DURAÇÃO y y PRODUÇÃO 10 20 TROCA 10 CASTORES POR 20 SALMÕES Nesse caso, onde idêntico é o volume, idêntica é a duração e idêntica é a natureza do capital empregado em ambas as atividades, mantendo-se essa identidade, o único fator que pode provocar mudança na proporção em que castores são trocados por salmões é a quantidade de trabalho empregado na atividade. Vamos supor que a quantidade de trabalho necessário para a produção de uma mercadoria permaneça inalterada em dois períodos. Entretanto, se com a mesma quantidade de trabalho empregado na produção de x mercadorias em ambos os períodos, o seu valor relativo varia, isso se da devido a proporção em que dois tipos de capital se combinam nessa atividade produtiva. Assim, natureza do capital não é heterogênea: CAPITAL FIXO: Durável, não tem retorno imediato CAPITAL CIRCULANTE: Perecível, seu retorno é imediato. O trigo pode ser usado, por exemplo, ora como capital fixo pelo agricultor, ora como capital circulante pelo padeiro. O salário que o empregador entrega ao trabalhador pelo seu trabalho é um capital circulante. Duas atividades podem utilizar o mesmo montante de capital, mas este pode estar dividido de modo diferente entre parte fixa e parte circulante. As diferentes proporções em que capital fixo e circulante se combinam afetam diferentemente o valor relativo das mercadorias. I - MERCADORIAS PRODUZIDAS SEM CAPITAL - QUANTIDADE DE TRABALHO AFETA VALOR VARIÁVEL II - MERCADORIAS PRODUZIDAS COM CAPITAL IDÊNTICO - QUANTIDADE DE TRABALHO AFETA VALOR VARIÁVEL III - MERCADORIAS PRODUZIDAS COM CAPITAL IDÊNTICO, PORÉM DIVIDIDOS DIFERENTEMENTE ENTRE CAPITAL FIXO E CIRCULANTE - VALOR DO TRABALHO AFETA VALOR VARIÁVEL Vamos supor três mercadorias: tecidos de lã. artigos de algodão e trigo. Cada uma delas é produzida com a mesma quantidade de trabalho. Empregam, cada uma delas, 100 trabalhadores, sendo que cada um deles recebe 50 libras por ano Assim, cada atividade emprega 5000 libras por ano como capital circulante. Os tecidos de lã e os artigos de algodão empregam uma máquina como capital fixo. Essa máquina é produzida num período de um ano, com 100 trabalhadores, cada qual recebendo 50 libras por ano. Isto é, a máquina é produzida nas mesmas condições que o trigo. Na produção da máquina, tanto quanto na produção do trigo, utiliza-se apenas capital circulante O capitalista espera auferir lucros de 10% do capital circulante empregado. Assim temos que: capital fixo capital circulante lucro cf lucro cc valor Máquina 0 5000 0 500 5500 Trigo 0 5000 0 500 5500 A máquina possui o mesmo valor de troca que o trigo. No ano seguinte a máquina é usada como capital fixo na produção de artigos de algodão e tecidos de lã, gerando lucros de 10% sobre o capital fixo. Temos: capital fixo capital circulante lucro cf lucro cc valor tecido de lã 5500 5000 550 500 6050 artigo de algodão 5500 5000 550 500 6050 trigo 0 5000 0 500 5500 "Nesse caso, portanto, os capitalistas empregaram exatamente a mesma quantidade anual de trabalho na produção de suas mercadorias, mas os bens produzidos diferem em valor por causa das diferentes quantidades de capital fixo, ou trabalho acumulado, empregadas respectivamente por cada um. O tecido de lã e os produtos de algodão têm o mesmo valor por serem produzidos com idênticas quantidades de trabalho e de capital fixo. O trigo, no entanto, não tem o mesmo valor que essas mercadorias, pois é produzido, no que se refere ao capital fixo, em circunstâncias diferentes. (Ricardo, 1982 [1817], p. 55). " O valor de troca das mercadorias produzidas com capital fixo aumenta em relação aquela mercadoria que, embora seja produzida com a mesma quantidade de trabalho, emprega apenas capital circulante. Que tipo de efeito pode ter um aumento dos salários(ou queda dos lucros) sobre esses dois tipos de mercadorias? Se o salário aumenta, a taxa de lucro cai. Vamos supor que com o aumento do salário a taxa de lucro caiu de 10% para 9%. Assim, em vez de acrescentar 550 libras ao preço normal de seus produtos (5 500 libras) a título de lucros de seu capital fixo, os fabricantes adicionariam apenas 9% daquela soma, ou 495 libras, e, conseqüentemente, o preço seria de 5 995 libras, em vez de 6 050 libras. capital fixo capital circulante lucro cf lucro cc valor tecido de lã 5500 5045,87 495 454,13 5995 artigo de algodão 5500 5045,87 495 454,13 5995 trigo 0 5045,87 0 454,13 5500 Temos que a mercadoria que é produzida com capital fixo, em relação aquela que é produzida apenas com capital circulante tem seu valor relativo diminuído em virtude de um aumento de salários. de modo que a queda do valor de troca da mercadoria resulta unicamente da queda do lucro do capital fixo, que não sofre nenhuma compensação SEÇÃO V VARIAÇÕES DE VALOR DECORRENTES DA DURABILIDADE DO CAPITAL OU DA RAPIDEZ DE RETORNO Quanto menos durável for o capital fixo, mais ele se aproximará da natureza do capital circulante. Um capital fixo de natureza não durável, exigirá trabalho para a sua manutenção. Esse trabalho, ou a quantidade de trabalho despendida na atividade de manutenção, deverá ser incorporado ao valor final da mercadoria que é produzida por esse capital. Um aumento de salários, ou uma queda na taxa de lucros, tendem a aumentar o valor relativo das mercadorias produzidas com capital fixo menos durável e diminuir o valor relativo das mercadorias produzidas com capital fixo duradouro. O valor das máquinas não é afetado pelo aumento do valor do trabalho. Uma máquina realiza o trabalho de 100 homens e custa $5000. Os 100 homens devem ganhar no total $5000 por ano. Seria indiferente empregar os homens ou comprar a máquina. Se o salário dos trabalhadores aumentasse para $5500 por ano, seria mais vantajoso empregar a máquina. Mas o valor da máquina não aumentaria com o aumento dos salários? Não. Pois os trabalhadores empregados na construção da máquina deveriam ser menosde 100, senão não haveria como vendê-la a $5000, considerando que no seu valor já estariam incorporados os lucros. SEÇÃO VI SOBRE UMA MEDIDA INVARIÁVEL DE VALOR "Quando o valor relativo das mercadorias varia, seria importante dispor de meios para averiguar com certeza qual delas diminuiu e qual aumentou em seu valor real. Isso só seria possível pela comparação de cada uma delas com algum padrão invariável de medida de valor que não fosse, ele mesmo, sujeito às flutuações às quais estão expostas as demais mercadorias.(Ricardo, 1982 [1817], p. 59). " Tal padrão é impossível. SEÇÃO VII SOBRE O DINHEIRO O dinheiro é uma mercadoria de valor variável. Diminuição do valor do dinheiro = aumento do salário monetário Aumento do salário como resultado da diminuição do valor do dinheiro = elevação do valor das mercadorias Elevação do valor das mercadorias como resultado do aumento do salário não se dá pelo aumento do seu valor "Ao estabelecer os princípios que regulam o valor da troca e o preço, deveríamos distinguir cuidadosamente entre aquelas variações que pertencem à própria mercadoria e aquelas ocasionadas por uma variação na medida utilizada para estimar o valor ou na qual se expressa o preço.(Ricardo, 1982 [1817], p. 62)." Se o aumento dos salários é resultado da diminuição do valor do dinheiro, os lucros são pouco afetados, pois o efeito atinge os preços em sua totalidade. Por outro lado, o aumento de salários resultante de maior dificuldade em se obter os bens de subsistência nos quais são gastos os salários, provoca não o aumento do preço das mercadorias, mas uma redução da taxa de lucro.
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