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UNIVERSIDADE SANTA CECÍLIA FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO ARIELLE SANTOS DE ABREU REVITALIZAÇÃO DO EDIFÍCIO CASTRO HABITAÇÃO POR LOCAÇÃO SOCIAL NO CENTRO DE CUBATÃO/SP Santos – SP Dezembro/2018 13 UNIVERSIDADE SANTA CECÍLIA FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO ARIELLE SANTOS DE ABREU REVITALIZAÇÃO DO EDIFÍCIO CASTRO HABITAÇÃO POR LOCAÇÃO SOCIAL NO CENTRO DE CUBATÃO/SP Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como exigência parcial para obtenção do título de Graduação à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Santa Cecília, sob a orientação do Professor Ms. Pierre França Corrêa. Santos – SP Dezembro/2018 14 DEDICATÓRIA A, Meus pais, que sempre me apoiaram a seguir meus sonhos. 15 RESUMO Após mais de um século de intervenções estatais na questão habitacional, o Brasil ainda enfrenta um grande déficit habitacional. O ponto principal desse trabalho é que podemos observar uma grande quantidade de imóveis localizados nos centros urbanos, providos de infraestrutura mas sem cumprir a sua função social da propriedade, sem uso. Do outro lado, temos uma grande parcela da população que não pode custear uma moradia digna no atual mercado imobiliário ou até mesmo através dos programas governamentais. Esse trabalho propõe a revitalização do Edifício Castro, localizado no centro de Cubatão/SP, e seu uso convertido em unidades habitacionais para voltadas à população de baixa renda, por locação social. Palavras-chave: Arquitetura; habitação; locação social; centros urbanos; função social da propriedade. 16 LISTA DE FIGURAS Figura 1: Vila Operária do Brás, em São Paulo/SP. ....................................................... 44 Figura 2: Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes - Pedregulho, em Rio de Janeiro/RJ .......................................................................................................................... 44 Figura 3: Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes – Pedregulho em 2015 após obras de revitalização. (Fonte: aU, http://au17.pini.com.br/arquitetura- urbanismo/residencial/segunda-etapa-das-obras-de-reforma-do-conjunto-habitacional- pedregulho-344929-1.aspx, acesso em 15 de abril de 2018.) ........................................ 45 Figura 4: Conjunto Habitacional Mal. Humberto de Alencar Castelo Branco, produzido pelo BNH em Santos/SP. (Fonte: A TRIBUNA, http://alt.atribuna.com.br/santos470/aniversario/, acesso em 09 de maio de 2018....... 45 Figura 5: Valor médio dos aluguéis por Locação Social em São Paulo/SP. Fonte: CENTRO GASPAR GARCIA DE DIREITOS HUMANOS. 2012. ............................ 60 Figura 6: Diagrama: Modelo de Locação Social proposta pela Resolução Recomendada 75/2009. Balbim, 2015. ............................................................................ 60 Figura 7: Vila dos Idosos. Fonte: Fundação Gaspar Garcia de Direitos Humanos, 2012. ............................................................................................................................................ 62 Figura 8: Vila dos Idosos: Vista Aérea. Disponível em www.maps.google.com. Data de acesso: 26 de abril de 2018. ........................................................................................ 63 Figura 9: Vila dos Idosos: acesso principal, Av. Carlos de Campos. Disponível em www.maps.google.com. Data de acesso: 26 de abril de 2018. ...................................... 63 Figura 10: Vila dos Idosos – Implantação. Fonte: Vigliecca&Associados. Disponível em http://www.vigliecca.com.br/pt-BR/projects/elderly-housing. Data de acesso: 27 de abril de 2018. Editada pela autora. .................................................................................. 64 Figura 11: Vila dos Idosos - corredor de circulação. Disponível em http://www.vigliecca.com.br/pt-BR/projects/elderly-housing. Data de acesso: ........... 64 Figura 12: Vila dos Idosos: espelho d'água e equipamentos de ginástica ao ar livre. Disponível em http://www.vigliecca.com.br/pt-BR/projects/elderly-housing. Data de acesso: 27 de abril de 2018. ............................................................................................. 65 Figura 13: Vila dos Idosos: vista principal. Disponível em http://www.vigliecca.com.br/pt-BR/projects/elderly-housing. Data de acesso: 27 de abril de 2018. ..................................................................................................................... 65 17 Figura 14: Vila dos Idosos: horta comunitária. Disponível em http://www.vigliecca.com.br/pt-BR/projects/elderly-housing. Data de acesso: 27 de abril de 2018. ..................................................................................................................... 66 Figura 15: Vila dos Idosos: Unidade habitacional - Tipologia 1: quitinete. Disponível em http://www.vigliecca.com.br/pt-BR/projects/elderly-housing. Data de acesso: 27 de abril de 2018. ..................................................................................................................... 66 Figura 16: Vila dos Idosos: Unidade habitacional - Tipologia 2: unidade com 1 dormitório. Disponível em http://www.vigliecca.com.br/pt-BR/projects/elderly- housing. Data de acesso: 27 de abril de 2018. ................................................................ 67 Figura 17: Vila dos Idosos: Cortes. Disponível em http://www.vigliecca.com.br/pt- BR/projects/elderly-housing. Data de acesso: 27 de abril de 2018. .............................. 67 Figura 18: Residencial Parque do Gato. Foto por: Jurandir Lima. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/jurandir_lima/12232025085/in/photostream/. Data do acesso: 10 de maio de 2018. ............................................................................................. 68 Figura 19: Residencial Parque do Gato – Implantação e Acessos. Fonte: Peabiru. Disponível em http://www.peabirutca.org.br/?painel_projetos=parque-do-gato. Data do acesso: 27 de abril de 2018. ........................................................................................ 69 Figura 20: Residencial Parque do Gato - Vista do Google. Disponível em www.maps.google.com. Data do acesso: 27 de abril de 2018. ...................................... 70 Figura 21: Residencial Parque do Gato, fachada – Foto por: Arielle Abreu. Data: 13 de maio de 2018. .................................................................................................................... 70 Figura 22: Residencial Parque do Gato, fachada – Foto por: Arielle Abreu. Data: 13 de maio de 2018. .................................................................................................................... 71 Figura 23: Residencial Parque do Gato, escadarias – Foto por: Arielle Abreu. Data: 13 de maio de 2018. ............................................................................................................... 71 Figura 24: Residencial Parque do Gato, rampa de acesso – Foto por: Arielle Abreu. Data: 13 de maio de 2018. ................................................................................................ 72 Figura 25: Residencial Parque do Gato, corredor – Foto por: Arielle Abreu. Data: 13 de maio de 2018. ............................................................................................................... 72 Figura 26: Residencial Parque do Gato, térreo – Foto por: Arielle Abreu. Data: 13 de maio de 2018. .................................................................................................................... 73 Figura 27: Residencial Parque do Gato, praça – Foto por: Arielle Abreu. Data: 13 de maio de 2018..................................................................................................................... 73 18 Figura 28: Residencial Parque do Gato, fachada – Foto por: Arielle Abreu. Data: 13 de maio de 2018. .................................................................................................................... 74 Figura 29: Residencial Parque do Gato – Pavimento Tipo. Fonte: Peabiru. Disponível em http://www.peabirutca.org.br/?painel_projetos=parque-do-gato. Data do acesso: 27 de abril de 2018. ................................................................................................................ 74 Figura 30: Residencial Parque do Gato – Tipologias. Fonte: Peabiru. Disponível em http://www.peabirutca.org.br/?painel_projetos=parque-do-gato. Data do acesso: 27 de abril de 2018. ..................................................................................................................... 75 Figura 31: Residencial Parque do Gato – Elevações. Fonte: Peabiru. Disponível em http://www.peabirutca.org.br/?painel_projetos=parque-do-gato. Data do acesso: 27 de abril de 2018. ..................................................................................................................... 75 Figura 32: 48 Habitações – Vista Principal. Fonte: Atelier Tarabusi. Disponível em https://www.tarabusi.net/. Data do acesso: 04 de maio de 2018. .................................. 77 Figura 33: 48 habitações: Vista Frontal. Fonte: Google. Disponível em maps.google.com. Data do acesso: 04 de maio de 2018. ............................................... 78 Figura 34: 48 habitações: Vista das varandas nos fundos. Fonte: Google. Disponível em maps.google.com. Data do acesso: 04 de maio de 2018. ......................................... 78 Figura 35: 48 Habitações – Vista Principal. Fonte: Atelier Tarabusi. Disponível em https://www.tarabusi.net/. Data do acesso: 04 de maio de 2018. .................................. 79 Figura 36: 48 Habitações – Brises. Fonte: Atelier Tarabusi. Disponível em https://www.tarabusi.net/. Data do acesso: 04 de maio de 2018. ...................................... Figura 37: 48 Habitações – Varandas. Fonte: Atelier Tarabusi. Disponível em https://www.tarabusi.net/. Data do acesso: 04 de maio de 2018. ...................................... Figura 38: 48 Habitações – Vista varandas. Fonte: Atelier Tarabusi. Disponível em https://www.tarabusi.net/. Data do acesso: 04 de maio de 2018. .................................. 80 Figura 39: 48 Habitações – Pavimento Tipo 1. Fonte: Atelier Tarabusi. Disponível em https://www.tarabusi.net/. Data do acesso: 04 de maio de 2018. .................................. 81 Figura 40: 48 Habitações – Pavimento Tipo 2. Fonte: Atelier Tarabusi. Disponível em https://www.tarabusi.net/. Data do acesso: 04 de maio de 2018. .................................. 81 Figura 41: Vista de dentro de uma unidade. Fonte: Atelier Tarabusi. Disponível em https://www.tarabusi.net/. Data do acesso: 04 de maio de 2018. .................................. 82 Figura 42: Localização de Cubatão no estado de São Paulo. Fonte: maps.google.com. Acesso em 20 de maio de 2015. ........................................................................................... 19 Figura 43: Localização no estado de São Paulo. Fonte: maps.google.com. Acesso em 20 de maio de 2015. .......................................................................................................... 84 Figura 44: Pólo industrial de Cubatão/SP. Foto por: Walter Mello, disponível em http://www.atribuna.com.br/noticias/noticias-detalhe/cidades/justica-condena-24- empresas-de-cubatao-por-danos-ao-meio- ambiente/?cHash=93c8f7942a2ffc1d69fcc648eb09955d. Data de acesso: 20 de maio de 2018. ............................................................................................................................. 84 Figura 45: Cubatão. Disponível em http://colunas.revistaepoca.globo.com/planeta/20 ............................................................................................................................................ 85 Figura 46: Vila Esperança. Disponível em maps.google.com. Aceso em 20 de maio de 2018. .................................................................................................................................. 86 Figura 47: Conjunto Habitacional Rubens Lara. Disponível em http://www.cobrape.com.br/det_noticia.php?id=145. Data do acesso: 20 de maio de 2018. .................................................................................................................................. 86 Figura 48: União transfere área da Vila Esperança para a Prefeitura Municipal de Cubatão. Disponível em http://www.cubatao.sp.gov.br/noticia/13513-uniao-transfere- areas-da-vila-esperanca-para-a-prefeitura-na-quinta-feira-22/. Data do acesso: 20 de maio de 2018. .................................................................................................................... 87 Figura 49: Av. Nove de Abril. Foto por Arielle Abreu. Data 18 de maio de 2018. ..... 88 Figura 50: Av. Nove de Abril, calçada. Foto por Arielle Abreu. Data 18 de maio de 2018. .................................................................................................................................. 89 Figura 51: Anúncio de venda na década de 1970 – Edifício Castro. Disponível em Novo Milênio http://www.novomilenio.inf.br/cubatao/ch136f.htm, Data de acesso: 20 de maio de 2018. ............................................................................................................... 89 Figura 52: Rua da Cidadania. Foto por Arielle Abreu em 18 de maio de 2018. .......... 90 Figura 53: Justiça manda interditar por completo o Edifício Castro. Disponível em http://www.atribuna.com.br/noticias/noticias-detalhe/cubatao/justica-manda-interditar- por-completo-o-edificio-castro/?cHash=62eaf72f8f94cc4da3d8f2ac3d7f6aa4, Acesso em 20 de maio de 2018. .................................................................................................... 91 Figura 54: Edifício Castro, frente – Foto por Arielle Abreu em 18 de maio de 2018. . 92 Figura 55: Edifício Castro, rua da cidadania – Foto por Arielle Abreu em 18 de maio de 2018. ............................................................................................................................. 92 Figura 56: Edifício Castro, fundos – Foto por Arielle Abreu em 18 de maio de 2018. 93 20 Figura 57: Edifício Castro, frente para a praça Princesa Isabel – Foto por Arielle Abreu em 18 de maio de 2018. ........................................................................................ 93 Figura 58: Edifício Castro, vista de satélite – Foto por Arielle Abreu em 18 de maio de 2018. .................................................................................................................................. 94 Figura 59: Edifício Castro, calçada em frente – Foto por Arielle Abreu em 18 de maio de 2018. ............................................................................................................................. 95 Figura 60: Edifício Castro, vista de dentro do Centro Esportivo – Foto por Arielle Abreu em 18 de maio de 2018. ........................................................................................ 96 Figura 61: Praça Princesa Isabel – Foto por Arielle Abreu em 18 de maio de 2018.... 96 Figura 62: Av. 9 de abril – Foto por Arielle Abreu em 18 de maio de 2018. ............... 97 Figura 63: Centro Esportivo Ayrton Romero da Nóbrega, quadras – Foto por Arielle Abreu em 18 de maio de 2018. ........................................................................................ 98 Figura 64: Hospital Municipal de Cubatão – Foto por Arielle Abreu em 18 de maio de 2018. ..................................................................................................................................99 Figura 65: Parque Anilinas. Foto por Arielle Abreu em 25 de maio de 2018. ............. 99 Figura 66 - Projeto: Circulação Vertical. Imagem elaborada pela autora. .................. 108 Figura 67 - Projeto: Pavimento Tipo Torres 1 e 2. Imagem elaborada pela autora. ... 108 Figura 68 - Projeto: Apartamento tipo torres 1 e 2. Imagem elaborada pela autora... 109 Figura 69 - Projeto: 3º Pavimento. Imagem elaborada pela autora. ............................ 109 Figura 70 - Projeto: Torre 3. Imagem elaborada pela autora. ...................................... 110 Figura 71 - Projeto: Futura Creche Condominial. Imagem elaborada pela autora. .... 110 Figura 72 - Projeto: Centro Social. Imagem elaborada pela autora. ............................ 111 Figura 73 - Projeto: Lojas e calçada coberta. Imagem elaborada pela autora............. 111 Figura 74 - Projeto: Futura Unidade de Saúde. Imagem elaborada pela autora. ........ 112 21 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1: Evolução e tendências dos recursos não onerosos para a produção habitacional e urbanização de assentamentos precários – Recursos do OGU e do FGTS entre 2002-2008 (BONDUKI, 2009) ................................................................................... Gráfico 2: Déficit Habitacional no Brasil. Dados: Fundação João Pinheiro. Elaboração pela autora. 2018. .............................................................................................................. 61 Gráfico 3: Déficit Habitacional no Brasil. Dados: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Elaboração pela autora. 2018. ....................................................................... 61 22 LISTA DE MAPAS Mapa 1: Área de influência: classificação de vias, pontos de ônibus e áreas verdes. Elaboração por Arielle Abreu. 18 de maio de 2018. ...................................................... 95 Mapa 2: Área de influência: equipamentos importantes. Elaboração por Arielle Abreu. 18 de maio de 2018. .......................................................................................................... 98 Mapa 3: Área de Influência: Uso e Ocupação do Solo, por predominância. Elaboração pela autora. 18 de maio de 2018. ................................................................................... 101 Mapa 4: Área de Influência: Gabarito das Edificações, por predominância. Elaboração pela autora. 18 de maio de 2018. ................................................................................... 101 Mapa 5: Cubatão - Densidade Demográfica. Fonte: https://censo2010.ibge.gov.br/sinopseporsetores/?nivel=st Acesso em 22 de maio de 2018. ................................................................................................................................ 102 Mapa 6: Área de Intervenção - Densidade Demográfica. Fonte: https://censo2010.ibge.gov.br/sinopseporsetores/?nivel=st Acesso em 22 de maio de 2018. ................................................................................................................................ 103 23 LISTA DE TABELAS Tabela 1: Evolução da Taxa de Inadimplência do SFH: 1980/1984 (em porcentagem dos financiamentos) (SANTOS, 1999) ............................................................................ 46 Tabela 2: Déficit acumulado e as metas na fase 1 do programa Minha Casa Minha Vida. (BONDUKI, 2009) ................................................................................................. 46 Tabela 3: Índices Urbanísticos para a Zona de Comércio Central. Lei Complementar 2513/1998: Lei de Uso e Ocupação de Solo de Cubatão. Fonte: <http://consulta.siscam.com.br/camaracubatao/Normas/Exibir/10130> . Acesso em 03 de Junho de 2018. ........................................................................................................... 100 24 LISTA DE SIGLAS ANAH.......................................... Agência Nacional para a Melhoria da Habitação ATC............................................................................ Agência Territorial pela Casa BB ................................................................................................... Banco do Brasil BNH .......................................................................... Banco Nacional de Habitação CDC..................................................................Caixa de Depósitos e Consignações CDHU...............................Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano CLT .................................................................. Consolidação das Leis do Trabalho COHAB ........................................................................... Companhia de Habitação ESH................................................................... Empresas Sociais para a Habitação FCP ................................................................................ Fundação da Casa Popular FEDERCASA ......................................... Federazione Italiana per le Case Popolari FGTS ....................................................... Fundo de Garantia do Tempo de Serviço HBM................................................................................ Habitation à Bom Marché H&E.................................................................................. Habitat e Environnement HLM.............................................................................. Habitation à Loyer Modéré IAP ............................................................. Institutos de Aposentadorias e Pensões IDORT ........................................... Instituto de Organização Racional do Trabalho IBGE ................................................ Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IPTU .............................................................. Imposto Predial e Territorial Urbano OGU .............................................................................. Orçamento Geral da União ONG..................................................................... Organização Não Governamental OPH ..............................................................................Offices Publics de l’Habitat PAC ........................................................ Programa de Aceleração do Crescimento 25 PlanHab ..................................................................... Plano Nacional de Habitação PMCMV ........................................................... Programa Minha Casa Minha Vida PPP..................................................................................... Parceria Público Privada PRAUC.................................Programa de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais SEM ....................................................................... Sociedades de Economia Mista SFH ...................................................................... Sistema Financeiro de Habitação STU.............................................................. Sociedades de Transformação Urbana ZEIS ................................................................ Zonas Especiais de Interesse Social 26 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 28 CAPÍTULO I - HISTÓRIA DA INTERVENÇÃO ESTATAL NO PROBLEMA HABITACIONAL NO BRASIL ............................................................................ 29 1.1 A QUESTÃO HABITACIONAL E A IMIGRAÇÃO: EXPANSÃO POPULACIONAL, PRODUÇÃO RENTISTA DE MORADIA, HIGIENISMO E SEGREGAÇÃO (1880-1930) ..................................................................................... 29 1.2 A POLÍTICA HABITACIONAL NO GOVERNO VARGAS: LEI DO INQUILINATO, IAPS E FCP (1930-1963) .............................................................. 321.3 A PRODUÇÃO HABITACIONAL NO REGIME MILITAR: BANCO NACIONAL DE HABITAÇÃO - BNH – DA CRIAÇÃO À DECADÊNCIA (1964 – 1985) .......................................................................................................................... 35 1.5 FIGURAS, GRÁFICOS E TABELAS ................................................................. 44 CAPÍTULO II - A LOCAÇÃO SOCIAL COMO ALTERNATIVA PARA HABITAR NOS CENTROS................................................................................... 47 2.1 O QUE É LOCAÇÃO SOCIAL: DEFINIÇÕES................................................. 47 2.2 A LOCAÇÃO SOCIAL NO MUNDO ................................................................ 48 2.2.1 França ............................................................................................................. 48 2.2.2 Itália ................................................................................................................ 51 2.2.3 Holanda .......................................................................................................... 53 2.3 A LOCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL ................................................................. 55 2.4 FIGURAS, GRÁFICOS E TABELAS ................................................................. 60 CAPÍTULO III – REFERÊNCIAS PROJETUAIS .............................................. 62 3.1 RESIDENCIAL VILA DOS IDOSOS ................................................................. 62 3.2 RESIDENCIAL PARQUE DO GATO ................................................................ 68 3.3 48 HABITAÇÕES ................................................................................................. 77 CAPÍTULO IV – ANÁLISES URBANAS ............................................................. 83 4.1 SOBRE A CIDADE DE CUBATÃO/SP: EXPANSÃO URBANA E QUESTÃO HABITACIONAL ................................................................................... 83 4.2 ÁREA DE INTERVENÇÃO E ÁREA DE INFLUÊNCIA ............................... 88 4.3 HISTÓRICO .......................................................................................................... 88 27 4.4 LOCALIZAÇÃO, ACESSIBILIDADE E INSERÇÃO URBANA ................... 94 4.5 INFRAESTRUTURA............................................................................................ 97 4.6 EQUIPAMENTOS PÚBLICOS E PRIVADOS SIGNIFICATIVOS EXISTENTES .............................................................................................................. 98 4.7 LEGISLAÇÃO PERTINENTE .......................................................................... 100 4.8 ATIVIDADES EXERCIDAS – USO E OCUPAÇÃO DO SOLO .................. 101 4.9 ATORES SOCIAIS E DEMOGRAFIA ............................................................. 102 4.10 DEMOGRAFIA ................................................................................................. 102 4.10 CARACTERÍSTICAS ESPECÍFICAS DA ÁREA DE INTERVENÇÃO ... 103 4.11 DIAGNÓSTICO ................................................................................................ 104 4.11.1 Problemas ................................................................................................... 104 4.11.2 Potencialidades .......................................................................................... 104 CAPÍTULO V – PROJETO ................................................................................. 106 5.1 CRIAÇÃO DE ZEIS ........................................................................................... 106 5.2 GESTÃO .............................................................................................................. 106 5.3 PROJETO ARQUITETÔNICO .......................................................................... 107 5.3.1 Totais ............................................................................................................ 114 5.3.2 Índices Urbanísticos .................................................................................... 114 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 115 REFERÊNCIAS ................................................................................................... 116 ANEXOS ............................................................................................................... 120 28 INTRODUÇÃO Diante do déficit habitacional brasileiro, este trabalho propõe a revitalização de um edifício atualmente sem uso, o Edifício Castro, e sua transformação em um edifício voltado à unidades habitacionais destinadas à população de baixa renda utilizando o sistema de locação social. O edifício está localizado em Cubatão/SP. É preciso diferenciar o sistema de locação social do aluguel social. O aluguel social se trata de uma quantia em dinheiro disponibilizada à famílias carentes para que possam alugar um imóvel no mercado imobiliário, já na locação social, as unidades habitacionais são de propriedade do Estado e oferecidas por um valor que costuma ser abaixo do valor comum de aluguel de mercado. Trata-se da moradia sendo tratada como um serviço público essencial, e não como uma mercadoria. Tal sistema é amplamente utilizado em países como França, Itália e Holanda, tendo seu início no período pós-Segunda-Guerra. No Brasil, a cidade de São Paulo é pioneira à oferecer moradias utilizando a locação social. Vale ressaltar que o edifício a ser revitalizado se encontra na área central de Cubatão, próximo de diversos equipamentos e provido de ampla infraestrutura urbana. A temática proposta se justifica pois no atual programa Minha Casa Minha Vida, principal intervenção governamental na questão habitacional brasileira, as moradias dificilmente atende à famílias abaixo de 3 salários mínimos e quando atende, faz através de conjuntos habitacionais construídos nas periferias, longe dos centros urbanos, piorando ainda mais os problemas de mobilidade urbana que a população brasileira enfrenta todos os dias nas suas atividades diárias como trabalho, estudo e lazer. Além disso, temos diversos imóveis sem uso nos centros, sem cumprir sua função social da propriedade que inclusive é prevista na Constituição Federal da República. Primeiramente busca-se entender a crise habitacional brasileira estudando seu histórico, tema esse aprofundado por Bonduki em seu livro Origens da Habitação Social no Brasil, no qual foi baseado grande parte do Capítulo I desse trabalho. Ao levantar um histórico da questão habitacional no país, podemos estudar a raiz do problema. Conhecer as intervenções realizadas pelo Estado até então, seus prós e contras, e entender o que surtiu efeito e o que não funcionou até então. 29 CAPÍTULO I - HISTÓRIA DA INTERVENÇÃO ESTATAL NO PROBLEMA HABITACIONAL NO BRASIL 1.1 A QUESTÃO HABITACIONAL E A IMIGRAÇÃO: EXPANSÃO POPULACIONAL, PRODUÇÃO RENTISTA DE MORADIA, HIGIENISMO E SEGREGAÇÃO (1880-1930) Com uma população hoje estimada em 12 milhões de habitantes (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE, 2017), a cidade de São Paulo foi a primeira cidade brasileira a lidar com uma crise habitacional de grande magnitude. Pode-se dizer que em meados dos anos 1880 já haviam habitações insalubres na cidade de São Paulo mas somente nos últimos 15 anos do século IX que o fato passa a ser considerado um problema pelas autoridades. É nesse período de 1886 à 1900 que São Paulo explode (ROLNIK, 1981), desencadeando-se sua primeira crise habitacional (BONDUKI, 1998). Estima-se que a cidade passou de 44.030 habitantes em 1886 para 130.775 no ano de 1893 (Fonte: MORSE, 1970), quase triplicando sua população residente em 7 anos. Outro fator importante foi o aumento das atividades econômicas urbanas ligadas ao café. Esses imigrantes que vinham para o Brasil em busca de oportunidade de trabalho nas fazendas de café no interiorpaulista, ao ver o aumento de oportunidades de trabalho no meio urbano acabavam por se estabelecerem ali mesmo. Segundo a sociedade Promotora de Imigração (Morse: 1970:18), apenas dois quintos dos imigrantes que desembarcavam no Estado seguiam para a agricultura. Já Pestana (1918) informa que, dos 104 mil imigrantes que passavam pela Hospedaria dos Imigrantes em 1895, quase 40% (39 mil) permaneceram na capital. (BONDUKI, 1998, p. 18) São Paulo se expandiu horizontalmente para todos os lados. A demanda por habitação barata e a falta de uma legislação restritiva na época fez com que o mercado de imóveis, diante da oportunidade de obter lucros, produzisse e remodelasse antigas casas em cortiços para aluguel: se tratavam de moradias coletivas insalubres, sem a devida ventilação ou infraestrutura. Era tratava a um mercado lucrativo pois havia a demanda e com pouco investimento, os donos desses imóveis faziam as modificações mínimas necessárias para oferecer esses imóveis de aluguel e passavam a ter uma renda fixa. Esse é o mercado rentista. Com o aumento populacional, houveram também problemas nas redes de infraestrutura como esgoto sendo despejado à céu aberto, falta de água potável, etc. Com a 30 expansão horizontal da cidade, os transportes, na época bondes, passaram a não comportar a demanda de passageiros que se iniciara: por o trajeto passar a ser muito longo e demorar muito ou por não haver expansão das linhas para os loteamentos recém criados. Nesse momento podemos observar os primeiros indícios de segregação espacial, já que a burguesa se mantinha em imóveis melhores, longe do caos que se instaurou. Bonduki (1998) diz: O problema da habitação popular no final do século XIX é concomitante aos primeiros indícios de segregação espacial. Se a expansão da cidade e a concentração de trabalhadores ocasionou inúmeros problemas, a segregação social do espaço impedia que os diferentes estratos sociais sofressem da mesma maneira os efeitos da crise urbana, garantindo à elite áreas de uso exclusivo, livres da deterioração, além de uma apropriação diferenciada dos investimentos públicos. (BONDUKI, 1998, p. 20). O Estado, até então de posturas liberais, após sofrer pressão por parte das elites com receio de serem atingidas pelas epidemias que se alastravam pela cidade de São Paulo com tamanho problema de ordem sanitária e de perder a mão de obra que trouxera de fora do país, viu-se obrigado a intervir. Atacou o problema em três frentes: criação do Código de Posturas em 1886 que buscava regulamentar a habitação produzida; gerenciamento das redes de infraestrutura que até então eram providas pelo setor privado e controle sanitário das habitações, sendo esse último muitas vezes violento e de visão preconceituosa quanto aos operários e à moradia operária. Com o uso de força policial, entrava-se na moradia, apreendiam-se pertences potencialmente contaminados, fazia a desinfecção e isolava o doente. Algumas vezes casas eram incendiadas por serem dadas como contaminadas. Embora as ações da polícia sanitária tenha ajudado a conter as epidemias, o que mais contribuiu foi a expansão da rede de coleta de esgoto e de fornecimento de água potável. Segundo Bonduki (1998), a falta de rede de água foi a causa da epidemia de febre amarela em Santa Ifigênia, em 1983, pois os esgotos contaminaram a água dos poços. Com o investimento na ampliação da rede água e esgoto, em 1920 cerca de 85% dos prédios da cidade haviam sido atendidos. Mais completo que o Código de Posturas de 1886, foi criado em 1894 o Código Sanitário do Estado de São Paulo, que proibia terminantemente a construção de cortiços e que os existentes deveriam ser fechados. 31 Como demolir a grande quantidade de cortiços existentes deixaria grande parte de trabalhadores nas ruas, já que o Estado liberal se negava a produzir habitação – sendo a habitação vista como mercadoria no capitalismo e não um serviço a ser oferecido pelo Estado – não foi possível seguir a medida estritamente. Ao se chocar com as condições econômicas estruturais, baseadas nos baixos salários e em regras mercantis de produção de moradias de aluguel, o higienismo perde sua arrogância (BONDUKI, 1998). Agia-se no problema que era a moradia insalubre, e não na sua causa que eram os baixos salários e falta de planejamento urbano. Por volta de 1927, por exemplo, começando pela cidade do Rio de Janeiro e depois por todo o país, foram criados incentivos ao setor privado para quem construísse o modelo de moradia determinada como higiênica pelo Estado, moradia essa de aluguel. Foi então que surgiram diversas vilas operárias pelo país sendo divididas em vilas construídas por particulares ou por empresas. Na Figura 1, fotografia de uma das vilas operárias construídas na época. As vilas operarias também não foram eficazes para resolver o problema dos cortiços, já que poucas eram as famílias que conseguiam arcar com o valor do aluguel. Até mesmo as vilas construídas por empresas cobravam aluguel, embora mais baixo que o valor de mercado e normalmente descontado do salário do funcionário. Na classe pobre, especialmente na classe operária, o aluguel da casa absorve uma boa parte dos limitados ganhos do chefe da família. A exiguidade do salário, comum às grandes industrias [...] põe o operário entre as portas de um angustioso problema: ou comer pouco e mal ou morar em um cortiço. Em nove casos sobre dez, ele opta pela segunda solução. Obedece o estomago.” (BOLETIM DO DEPARTAMENTO ESTADUAL DO TRABALHO apud BONDUKI, 1998, p. 53) Até o período Vargas, essas foram as intervenções do governo na questão habitacional - se negando à produzir moradias e deixando para que o setor privado o faça-, esse em busca de lucro já que era um investimento rentável a produção de moradias para aluguel e essas moradias não eram acessíveis à todas as pessoas: pelos baixos salários oferecidos aos trabalhadores e por os preços serem regulados pelo mercado imobiliário. 32 1.2 A POLÍTICA HABITACIONAL NO GOVERNO VARGAS: LEI DO INQUILINATO, IAPS E FCP (1930-1963) No governo Vargas, a questão habitacional passa a ser tratada pelo Estado de uma forma diferente: buscando a industrialização do país, a preocupação com as condições sanitárias da moradia passa para segundo plano e então a moradia passa a ser enxergada como crucial para a reprodução da força de trabalho. Novas entidades públicas e privadas recém surgidas organizam congressos para debater os caminhos da habitação, como o I Congresso de Habitação, promovido em 1931 pelo Instituto de Engenharia e as Jornadas de Habitação Econômica, realizadas em 1941 e promovidas pelo Instituto de Organização Racional do Trabalho - IDORT. O IDORT por exemplo, possuía vínculo com empresários que visavam o desenvolvimento da indústria. Juntando-se a outros fatores a classe média da época que vivia em sua grande parte em moradias de aluguel – sendo também afetada pelo problema dos alugueis cada vez mais caros – e sendo grande formadora de opinião, fez com que surgisse na sociedade um grande debate acerca dos rumos da moradia e abrindo portas para uma intervenção estatal. Segundo opinião generalizada, o setor privado – que até então era o principal produtor de moradia, recebendo inclusive incentivos do Estado – era incapaz de enfrentar o problema, tornando inevitável a intervenção do Estado (BONDUKI, 1998), assim como o mesmo interviu nas questões sanitárias e de infraestrutura urbana que também eram problemas de grande magnitude e que interferiam drasticamente no ambiente urbano, na cidade. Diante de todo esse debate, de que o fato da maioria da população viver de aluguel na época e de a partir de 1930 criou-se um clima favorável à aceitação da intervenção estatal na economia devido a ascensão do fascismo e do socialismo. Tal fato levou Vargas a promulgar aLei do Inquilinato em 1942, que congelava o valor dos alugueis e que foi “renovada” ano após ano até 1964 com o argumento de ser provisória até que se resolvesse ou minimizasse o problema habitacional. A unidade da moradia passa a ser tida pelas elites como “formadora da moral cristã” e essencial para manutenção da ordem econômica. Passa a ser promovida a ideia de que a casa própria era melhor que o cortiço. 33 A estratégia, portanto, era fazer com que os trabalhadores passassem a desejar, através da educação e da doutrinação, o modelo de habitação que as elites queriam implantar. [...] O problema não era situado, portanto, no âmbito do nível salarial dos trabalhadores, e sim no de uma mudança de mentalidade. (BONDUKI, 1998, p. 87) Como as pessoas de baixa renda não tinham condições financeiras de comprar a casa própria, só lhe restava a moradia auto empreendida na periferia, sem a infraestrutura necessária. Tal pensamento contribuiu também para o aumento da segregação espacial e expulsão da classe operária dos centros, fazendo essas buscarem áreas nas periferias. Paralelamente a esses acontecimentos, ocorriam também debates em busca do barateamento da construção e assim a produção da moradia em série, por meio de diversos congressos mundo afora como no 2º Congresso Internacional dos Arquitetos Modernos, realizado em Frankfurt em 1929. Essa moradia em série foi extensivamente produzida pelos Institutos de Aposentadorias e Pensões - IAPs, que foram criados a partir da década de 1930 para cada categoria profissional. Mesmo a produção de moradia não sendo o foco dos IAPs, o investimento se tornou rentável a fim de multiplicar o capital pago pelos seus associados, buscando acompanhar a inflação. Tiveram a sua produção habitacional mais expressiva quantitativamente entre os anos de 1945 à 1954. Haviam 3 modalidades de serviços oferecidos pelos IAPs: tipo A – locação ou venda, tipo B – financiamento e tipo C – empréstimos hipotecários feitos inclusive à pessoas jurídicas. As habitações produzidas pelos IAPs buscavam a construção em série, o barateamento da construção buscando manter a qualidade e seguiam o modelo modernista. Na Figura 2, Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes ou Conjunto Pedregulho que foi construído em 1947 e conta com 328 unidades. Visto que apenas os pertencentes a categoriais profissionais abrangidas pelos IAPs, que contribuíam compulsoriamente, poderiam pleitear essas moradias. Traçou-se, com isso, uma linha divisória entre os cidadãos com direitos sociais, entre os quais os trabalhadores assalariados e os subcidadãos, que não tinham lugar na nova ordem social Bonduki (1998), 34 levando essa população que não podia adquirir uma unidade dos IAPs seguirem para a periferia. No caso do Plano A, os aluguéis eram muito altos a fim de tentar acompanhar a inflação e compensar a lei do inquilinato em vigor, o que se tornava mais um empecilho para a população de baixa renda conseguir usufruir dessas moradias e, além disso, haviam indícios de fraudes e apadrinhamento político na aquisição desses imóveis. Paralelo aos IAPs, existiu também a Fundação da Casa popular – FCP, que foi o primeiro órgão federal com exclusividade em solucionar o problema habitacional. Em seu projeto inicial, a FCP seria a unificação dos IAPs, centralizando os rendimentos e a gestão. Após grande oposição a proposta por parte de alguns setores como alguns IAPs com rendimentos maiores como o dos bancários, o Partido Comunista que tinha grande poder de mobilização popular na época e o Instituto dos Arquitetos do Brasil que a encarava como mera construção de casas, a FCP teve que se contentar com recursos apenas da União, perdendo assim a chance de usufruir dos recursos arrecadados pelos IAPs. Por isso, embora fosse um órgão federal, a sua produção habitacional foi muito menor em comparação aos IAPs. 35 1.3 A PRODUÇÃO HABITACIONAL NO REGIME MILITAR: BANCO NACIONAL DE HABITAÇÃO - BNH – DA CRIAÇÃO À DECADÊNCIA (1964 – 1985) Os IAPs e a FCP seguiram na produção habitacional enfrentando problemas como a inadimplência até o seu encerramento em 1964, na ditadura militar, com a criação do Instituto Nacional de Previdência Social - INPS que ficou responsável pela previdência social antes oferecida pelos IAPs. Já a habitação ficou por parte do BNH, que surgiu a partir do primeiro Plano Nacional de Habitação, Lei 4.380/64 e tinha o intuito de gerenciar recursos a serem destinados à produção habitacional em nível nacional. Os IAPs e a FCP, nesse momento, foram obrigados a venderem seus conjuntos e repassar o valor ao BNH. Segundo Cariello Filho (2011): A Fundação da Casa Popular (FCP) e os demais programas federais, inclusive as carteiras habitacionais dos institutos de aposentadoria e pensões (IAPs) foram extintos, receberam determinação para vender imediatamente seus conjuntos e unidades residenciais e aplicar os valores obtido letras imobiliárias do BNH por pelo menos dez anos. (CARIELLO FILHO, 2011, p. 100) Inicialmente contou com o investimento de 1 bilhão de cruzeiros da União mas foi em 1967, com a criação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS e a autorização para gerenciar os recursos das Cadernetas de Poupança que o BNH passou a financiar maior número de habitações no país, já que agora obtinha mais fundos disponíveis. A criação do BNH aconteceu no meio de uma crise no setor imobiliário, descrita por Valladares como: [...] que se traduzia numa crescente baixa de investimentos do setor, resultando no aumento do déficit habitacional. No centro desta crise estava a inflação, que desestimulava os investimentos e provocava um surto especulativo nos grandes centros, bem como a desarticulação do setor imobiliário. A essa época a indústria de material de construção reduziu as suas atividades a um mínimo indispensável e a construção de novas unidades habitacionais viu-se também reduzida. (VALLADARES, 1982, p. 38) O FGTS é uma contribuição compulsória onde as empresas ficam encarregadas de repassar ao Estado uma percentagem em cima da folha de pagamento de seus funcionários, Na época, esse valor era de 8%. Tinha a intenção de substituir o direito recém retirado da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT de 1943, onde os trabalhadores adquiriam estabilidade no trabalho após 10 anos de serviço e de em caso de demissão sem justificativa, o valor indenizatório era 1 salário para cada ano trabalhado na empresa. 36 O BNH direcionava suas ações de acordo com três segmentos de renda: habitação popular, econômico e médio. Não produzia moradias, destinava essa responsabilidade para o setor privado ou empresas de economia mista como as Companhias de Habitação - COHABs, que foram criadas no Plano Nacional de Habitação de 1964 e ficaram encarregadas de construir moradias no segmento habitação popular, destinado a famílias de até 3 salários mínimos. As COHABs eram empresas de economia mista, onde os estados e os municípios entravam como acionistas. Faziam o projeto do empreendimento, pediam o financiamento ao BNH, compravam os terrenos, construíam os Conjuntos Habitacionais e com o recebimento das prestações dos seus mutuários pagavam as dívidas com o BNH. Já o segmento econômico era destinado à famílias de 3 a 6 salários mínimos e as unidades eram construídas por cooperativas que eram dissolvidas após a entrega das unidades. O saldo devedor do financiamento era pago pelos mutuários diretamente ao BNH. Segundo Cariello Filho (2011), o segmento médio era destinado à famílias acima de 6 salários mínimos e era atendido pelos agentes vinculados ao Sistema Financeiro de Habitação – Como as Associações de Crédito Habitacional ou as Caixas Econômicas – utilizando recursos das cadernetas de poupança. [...] Esses programas para a “classe média” eram iniciados por empreendedores que aprovavamseus empreendimentos junto ao BNH, credenciavam-se assim a levantar os recursos junto aos agentes financeiros e a comercializar as habitações, podendo o comprador final contrair, sob hipoteca, um crédito de até 80 por cento Após a venda, as hipotecas eram transferidas ao BNH [...]. (CARIELLO FILHO, 2011, p. 131) A política habitacional dessa época promovia a aquisição da casa própria. Fazia com que os mutuários, principalmente os da primeira faixa de renda (até 3 salários mínimos) adquirissem uma dívida em meio a baixos salários e diminuição de direitos trabalhistas, fazendo o Banco a lidar com casos de inadimplência. Um outro agravante é o fato de que nas outras faixas de renda o BNH assumia os riscos do investimento do setor privado, já que os mutuários contraiam a dívida diretamente do Banco. Diante desse cenário, o BNH acabou se distanciando do segmento de renda da habitação popular e priorizando os segmentos de renda mais altos e obras de infraestrutura e já que o risco de inadimplência era menor. 37 Embora a maior parte de famílias que necessitasse de crédito habitacional fosse do segmento de até 3 salários mínimos, foi a faixa de renda menos atendida e quando atendida, sendo as moradias destinadas a este segmento de baixa qualidade e na periferia das cidades. O BNH, no final, acabou se desviando da sua função inicialmente social. Segundo Santos: “[...] Somente 33,5% das unidades habitacionais financiadas pelo SFH ao longo da existência do BNH foram destinadas à habitação de interesse social, e, dado que o valor médio dos financiamentos para as classes de renda mais elevada, é licito supor que uma parcela ainda menor dos financiamentos foi direcionada para os primeiros”. (SANTOS, 1999, p. 17) O Banco foi criado na teoria com a intenção de resolver o déficit habitacional, mas no final produziu moradia em série de baixa qualidade, nas periferias onde não tinha a infraestrutura necessária e agravando os problemas de mobilidade urbana e segregação socioespacial. A solução para o problema habitacional foi tratado como mera produção de moradias. A redução de direitos trabalhistas, os baixos salários e a inflação fez com que muitas famílias não tivessem condições de pagar o financiamento adquirido, gerando inadimplência, abandono das moradias e até ações na justiça por parte dessas famílias contra o alto valor das prestações. Na Tabela 1 pode-se observar tal situação entre os anos de 1980 e 1984. Para as classes mais altas, destinou grande parte de seus financiamentos, ficando as classes mais baixas sem oportunidades de uma moradia digna e agravando ainda mais a crise habitacional, o crescimento de loteamentos clandestinos nas periferias. Segundo Bonduki (2008), no período de funcionamento do BNH (1964-86), foram financiadas cerca de 25% das novas moradias construídas no país, porcentagem relevante, mas totalmente insuficiente para enfrentar o desafio da urbanização brasileira. O BNH fez o uso de renda vinda dos trabalhadores no setor privado, grande parte dessa renda que de início deveria ser direcionada às classes mais baixas. Cariello comenta que: [...] o fim real do BNH não era resolver o “problema da habitação”: o Banco era um “funil, por meio do qual os recursos do FGTS — 74 por cento da receita de 1968 — são drenados para o setor privado, para alimentar o mecanismo da acumulação e da concentração da renda. (BOLAFFI, 1976, p. 75) 38 Além disso, umas das principais intenções com a criação do BNH era conter as massas em meio a alta taxa de desemprego, expansão do comunismo no período de Guerra Fria e um regime autoritário recém instaurado através de um golpe militar. 39 1.4 POLÍTICA HABITACIONAL PÓS BNH (1985 - ATUALIDADE) Após o fim da ditadura militar, no governo de José Sarney em 1986, aconteceram diversos debates sobre o futuro do SFH e da produção de moradia. Decidiu-se neste mesmo ano pelo fim do BNH, incorporando-o à Caixa Econômica Federal. A Caixa Econômica Federal, agora encarregada de lidar com a crise habitacional obtinha baixos recursos, devida à baixa arrecadação do FGTS face à alta taxa de desemprego. O fim do regime militar foi marcado pela descentralização progressiva do poder. Devida inércia da Caixa Econômica Federal – órgão federal agora destinado à lidar com a produção habitacional – os estados e municípios foram gradativamente vendo-se obrigados à assumir tal responsabilidade. Surgiram nessa época diversos mutirões de construção de moradias pelo país mas a produção de moradia desses foi pouca face ao déficit habitacional que o pais enfrentava. Os 20 anos pós BNH foi de desemprego, inflação e um “vácuo” nas políticas habitacionais, já que não foi proposto um grande plano de habitação a fim de substituir o Banco e o órgão destinado à essa função não possuía recursos suficientes. Arretche descreve tal momento como: [...] uma progressiva ausência do Governo federal, tanto no que concerne à sua capacidade de manter os níveis anteriores de financiamento à promoção pública de habitações, quanto à formulação e à implementação de uma política capaz de reorganizar a produção habitacional no país. Em síntese, o Governo federal foi progressivamente perdendo sua capacidade de desempenhar as funções que lhe eram afetas no sistema anterior, sob a égide do BNH. (ARRETCHE apud BARROS, Luís Torres, 1996a, p. 112) Em 2002, no início do governo Lula, foi criado o Ministério das Cidades com a intenção de novamente centralizar e organizar as políticas de desenvolvimento urbano, fragmentadas após o encerramento do BNH. Sobre a sua criação, Bonduki comenta: Malgrado a ainda frágil e pequena estrutura organizacional do novo Ministério, sua criação é histórica, já que, por um lado, é o mais importante órgão nacional responsável pela questão urbana e habitacional desde a extinção do BNH e, por outro, sua concepção pressupõe uma ruptura com a tradicional fragmentação que tem sido a regra no trato da questão urbana no âmbito da gestão pública. (BONDUKI, 2008, p. 96) O planejamento acerca da criação do Ministério das Cidades antecede ao governo Lula. A proposta já era estudada desde o governo do ex presidente Fernando Henrique Cardoso que buscava usar como proposta na sua campanha para a reeleição, visto que já era uma reivindicação dos movimentos pró-moradia desde aquela época. 40 A proposta para a criação do Ministério das Cidades veio novamente à tona com o Projeto Moradia. O Projeto Moradia foi um estudo promovido pelo Instituto Moradia entre os anos de 1999 e 2000, coordenado por Lula – na época candidato à presidência – que buscava fazer um panorama do problema habitacional no Brasil e propor soluções. Foram convidados alguns profissionais como André de Souza, Ermínia Maricato, Evaniza Rodrigues, Iara Bernardi, Lúcio Kowarick, Nabil Bonduki e Pedro Paulo Martoni Branco, com a gerência executiva de Tomás Moreira. Maricato descreve o Projeto como: [...] elaborado no ano de 2000, no Instituto Cidadania, que previa também a construção do Ministério das Cidades e a elaboração de uma Política Urbana com as propostas setoriais de saneamento, transporte/trânsito e planejamento territorial além da habitação.” (MARICATO, 2009, p. 1) Uma das propostas do estudo foi a criação do Sistema Nacional de Habitação, que atuaria através do Ministério das Cidades. Segundo Bonduki, O controle social seria exercido pelo Conselho Nacional das Cidades e órgãos semelhantes nos estados e municípios, aos quais caberia gerir fundos de habitação que deviam concentrar recursos orçamentários para subsidiar a moradia para as famílias de baixa renda (até 3 salários mínimos). [...] Tratava-se da necessidade de ampliar o mercado privado, restrito ao segmento de luxo, em direção às classes médias, e concentrar os recursos públicos (orçamentários) e semipúblicos (FGTS) na baixa renda, onde se concentramais de 90% do déficit habitacional do país. (INSTITUTO CIDADANIA apud BARROS, 2013) O Projeto Moradia concluiu também que seria fundamental a aprovação do Estatuto da Cidade, a fim de combater a especulação imobiliária quanto a lotes vazios em áreas dotadas de infraestrutura (principalmente áreas centrais), não cumprindo o papel social da propriedade e fazendo com que os Conjuntos Habitacionais fossem direcionados à periferia, requerendo expansão dos sistemas de infraestrutura urbana. As propostas do Projeto Moradia fizeram parte da campanha eleitoral de Lula, que criou o Ministério das Cidades no seu primeiro dia de governo. Em 10 de julho de 2001 foi sancionada a Lei 10.257/2001, o Estatuto da Cidade que dispõe de instrumentos para ordenar a expansão urbana como Plano Diretor, IPTU Progressivo, Instituição de Zonas Especiais de Interesse Social, dentre outros. Em 2004 foi aprovada a Política Nacional de Habitação. Como uma das partes centrais deste, foi elaborado entre julho de 2007 e janeiro de 2009 o Plano Nacional de Habitação - PlanHab que buscou aderir boa parte das soluções propostas pelo Projeto Moradia. Um Plano http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/lei%2010.257-2001?OpenDocument http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/lei%2010.257-2001?OpenDocument http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/lei%2010.257-2001?OpenDocument 41 de 15 anos, segundo Bonduki (2008), um plano estratégico de longo prazo articulado com propostas operacionais a serem implementadas a curto e médio prazo, tendo como horizonte 2023. Em 2008 a crise econômica iniciada no mercado imobiliário dos Estados Unidos chegou ao Brasil. A fim de direcionar o setor privado à produzir moradia e criar empregos na construção civil, foi criado em 2009 como parte do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC o Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) – pela Lei Federal nº 11.977/2009 – “atropelando o PlanHab”. Buscou seguir boa parte das estratégias propostas pelo PlanHab, mas algumas acabaram por não terem sido adotadas pelo caráter de urgência de movimentar a economia diante da crise. No PMCMV, as habitações são produzidas pelo setor privado que obtém um subsidio da Caixa Econômica Federal para realizar a construção das unidades. O morador ao adquirir a unidade, contrai o financiamento direto com a Caixa. Este banco oferece taxas de juros mais baixas que o mercado, maior prazo para a quitação do financiamento, subsídios e dependendo da faixa de renda oferece isenção em taxas nos Cartórios. Engloba além do financiamento na aquisição de imóvel na área urbana, subsidio para a construção ou reforma da unidade habitacional quando a mesma se localizar em área rural. Nesses quase nove anos de duração, o programa se dividiu em três fases, cada uma com as suas regras e metas: a primeira fase durou entre os anos de 2009 e 2011, a segunda fase ocorreu entre os anos de 2011 e 2016 e a sua terceira fase ocorre entre os anos de 2016 e 2018. Na sua primeira fase, o Programa tinha o objetivo de entregar 1 milhão de unidades. Os benefícios ficaram divididos para três faixas de renda: faixa 1: famílias com renda bruta mensal de até 3 salários mínimos; faixa 2: famílias com renda de 4 a 6 salários mínimos e faixa 3: famílias de 6 a 10 salários mínimos. Já na sua segunda fase as faixas de renda se dividiram da mesma forma mas dessa vez a meta foi a de entregar 2 milhões de unidades. Nessa fase, além da Caixa, se tornou possível realizar o financiamento também com o Banco do Brasil – BB e foi feita a atualizações dos valores máximos a serem financiados. Na sua terceira e atual fase, foi repetida a meta de entregar 2 milhões de unidades, os valores máximos de financiamento para cada faixa de renda foram atualizados e foi criada 42 mais uma faixa de renda: a faixa 1,5, voltada a famílias com renda de mensal de até R$2.3501. Uma faixa de renda intermediária entre a faixa 1 e a faixa 2. De fato, a criação do Ministério das Cidades foi um marco para a questão habitacional no país, que não contava com uma grande movimentação de recursos e de políticas para a habitação desde o fim do BNH. No governo Lula foi movimentada uma grande quantidade de recursos direcionados à habitação. Como defendido por Maricato (2009, p. 2), em 2005 o governo federal dispõe de mais de R$ 10 bi, o maior orçamento desde início dos anos 80, para financiamento habitacional. A ampliação se deu por meio de várias fontes (Orçamento Geral da União, Tesouro Nacional e etc) mas em especial por meio do FGTS que tem apresentava ótimo desempenho na época. Segundo Bonduki (2009), recursos orçamentários inusitados são destinados ao setor habitacional, de modo que entre 2002 e 2008 os recursos não onerosos para produção habitacional (OGU e subsídio do FGTS) multiplicam-se por vinte. Para melhor análise, verificar Gráfico 1. Em contrapartida o programa trouxe alguns problemas no meio urbano. Um deles é a especulação imobiliária em terrenos vazios principalmente em áreas centrais, providas de infraestrutura, já a necessidade de utilização desses terrenos vazios nos novos empreendimentos habitacionais fez com que seus proprietários vissem a oportunidade de obter um lucro maior na venda. A Faixa 1 acaba sendo a mais prejudicada, já que os Conjuntos destinados à mesma foram construídos, ao longo do tempo, em terrenos afastados o que gera problemas de mobilidade por esses serem mais baratos. Os conjuntos da Faixa 1 também contam com problemas quando à implantação, arquitetura e materiais utilizados já que deixando a produção habitacional nas mãos do setor privado e a falta de fiscalização, faz com que esse barateiem o máximo possível essas construções, mesmo que isso signifique perda de qualidade. [...] Mas não serão os organismos metropolitanos, nem os municipais, que, no final contas, irão definir qual a melhor localização das novas moradias, dos novos bairros. Está de novo se pensando em coisas muito grandes, em megaconjuntos - o formato 1 – Em 2016, ano de início da terceira fase do PMCMV, o salário mínimo era de R$850,00 chegando em 2018, último ano dessa fase, à R$954,00. 43 preferido das construtoras e empresas imobiliárias, quando há tanto espaço vazio, mal - aproveitado ou passível de retrofit nas áreas centrais das grandes cidades. É o mercado que vai comprar as terras e definir aonde os conjuntos vão se localizar. É a velha inversão de papéis, o rabo abanando o cachorro. Todos esses investimentos - para lá de bem-vindos - vão ser jogados na nossa cultura patrimonialista de administração do solo, por mais que o programa fale que os empreendimentos devem estar inseridos no tecido urbano. (MARICATO, 2009, p. 63) Embora a primeira faixa de renda de início tenha sido colocada como prioridade, a maioria dos recursos acabaram sendo destinados às faixas de renda mais altas. A Tabela 2 mostra o déficit habitacional no ano de 2009, ano de lançamento da primeira fase do PMCMV e a distribuição das unidades a serem entregues entre as três faixas de renda. Nota-se que embora o déficit habitacional seja maior na primeira faixa de renda e por isso deveria receber uma proporção maior de unidades habitacionais, tem seu déficit atendido em apenas em 9% enquanto a faixa 2 e 3 têm seu déficit atendido em 93% e 95%, respectivamente. O PMCMV mais uma vez trata a questão habitacional como mera construção de casas, deixando de lado uma regulação para evitar os problemas urbanos apontados e tratando a moradia novamente como mercadoria, e não como um serviço, uma assistência. Um dos problemas ocasionados por essa solução adotada é que há casos em que o morador, ao ter uma melhora nas suas condições de vida acaba por vender o imóvel adquirido comoum benefício, lucrando em cima de um benefício que poderia ser direcionado à outras pessoas que não podem arcar com uma moradia nos valores comuns de mercado. Uma solução para isso seria a locação social. 44 1.5 FIGURAS, GRÁFICOS E TABELAS Figura 1: Vila Operária do Brás, em São Paulo/SP. (Fonte: Origens da Habitação Social no Brasil, BONDUKI, 1998, p. 60) Figura 2: Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes - Pedregulho, em Rio de Janeiro/RJ. (Fonte: ARCHDAILY, https://www.archdaily.com.br/br/01-12832/classicos-da-arquitetura-conjunto-residencial- prefeito-mendes-de-moraes-pedregulho-affonso-eduardo-reidy, acesso em 15 de abril de 2018.) https://www.archdaily.com.br/br/01-12832/classicos-da-arquitetura-conjunto-residencial-prefeito-mendes-de-moraes-pedregulho-affonso-eduardo-reidy https://www.archdaily.com.br/br/01-12832/classicos-da-arquitetura-conjunto-residencial-prefeito-mendes-de-moraes-pedregulho-affonso-eduardo-reidy 45 Figura 3: Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes – Pedregulho em 2015 após obras de revitalização. (Fonte: aU, http://au17.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/residencial/segunda-etapa-das-obras-de-reforma-do- conjunto-habitacional-pedregulho-344929-1.aspx, acesso em 15 de abril de 2018.) Figura 4: Conjunto Habitacional Mal. Humberto de Alencar Castelo Branco, produzido pelo BNH em Santos/SP. (Fonte: A TRIBUNA, http://alt.atribuna.com.br/santos470/aniversario/, acesso em 09 de maio de 2018 46 Tabela 1: Evolução da Taxa de Inadimplência do SFH: 1980/1984 (em porcentagem dos financiamentos) (SANTOS, 1999) Tabela 2: Déficit acumulado e as metas na fase 1 do programa Minha Casa Minha Vida. (BONDUKI, 2009) 0 500 1000 1500 2000 2500 3000 3500 4000 2002 2004 2006 2008 OGU Subs.FGTS Gráfico 1: Evolução e tendências dos recursos não onerosos para a produção habitacional e urbanização de assentamentos precários – Recursos do OGU e do FGTS entre 2002-2008 (BONDUKI, 2009) 47 CAPÍTULO II - A LOCAÇÃO SOCIAL COMO ALTERNATIVA PARA HABITAR NOS CENTROS 2.1 O QUE É LOCAÇÃO SOCIAL: DEFINIÇÕES Primeiramente, deve-se entender a diferença entre locação social e aluguel social. O aluguel social costuma ser um benefício do Estado, normalmente oferecido em caso de catástrofes e em caráter emergencial. Trata-se de um valor em dinheiro fornecido mensalmente para que essas famílias prejudicadas possam alugar uma unidade para permanecerem, em caráter temporário. Na locação social o Estado possui moradias próprias para esse fim – normalmente em Conjuntos Habitacionais específicos – e oferece essas unidades para a população de baixa renda. Em troca, o morador paga um valor simbólico de aluguel enquanto utilizar a unidade, sendo que após alguns anos de uso pode haver a possibilidade de utilizar o valor já pago como abatimento em um possível financiamento da unidade pela família residente. Também costuma-se realizar um trabalho de assistência social com essas famílias. Tal sistema foi bastante aplicado na Europa no período pós Segunda Guerra e é usado em vários países como forma de prover moradia. Como o valor do aluguel em unidades de locação social costuma estar abaixo do valor de mercado, acaba por se tornar uma oportunidade para a população de baixa renda poder habitar em uma moradia digna, elevando a qualidade de vida destas pessoas e permitindo que se desenvolvam como cidadãos. 48 2.2 A LOCAÇÃO SOCIAL NO MUNDO 2.2.1 França Um dos países que utiliza a locação social amplamente é a França, tendo início a partir de 1894 com a Lei HBM - Habitation à Bom Marché, que criou as HBMs, descritas por Paolionelli (2017) como empresas privadas de lucro limitado e regulado pelo governo, que receberiam reduções fiscais e empréstimos para a produção de habitação. Após a Primeira Guerra, o Estado passou a oferecer subsidio direto para as HBMs produzirem habitações diante da situação de destruição e de crescimento habitacional das cidades francesas, deixando de ser apenas um regulador dessas empresas e passando a ser um financiador. Segundo Peppercorn e Taffin apud Paolinelli (2009), os investimentos públicos cresceram ainda mais depois da Segunda Guerra, com a demanda habitacional intensificada pela migração e pelo crescimento populacional. Em 1948 enfim foram criados os HLMs - Habitation à Loyer Modéré (Habitação de Aluguel Moderado): conjunto de órgãos destinados à produzir e gerenciar habitações. Compreendem os Offices Publics de l’Habitat – OPHs, Empresas Sociais para a Habitação – ESHs e as Sociedades de Economia Mista – SEMs. O termo “HLM” também é utilizado para descrever o sistema habitacional francês. Os HLMs são órgãos de suma importância na provisão habitacional na França. Conforme descreve Balbim (2015), em 2009, 38% dos domicílios do país eram alugados, sendo que 17% no formato de locação social. Além da criação dos HLMs, outros passos importantes para a provisão de moradia social no país foram: a) A criação em 1953 do 1% moradia: Uma contribuição obrigatória para empresas com mais de 10 funcionários, equivalente a 1% da folha de pagamento. Esse valor é destinado à produção de habitação social. 49 b) A promulgação, em 2000, da Lei de Solidariedade. Descrita por Balbim (2015) como: [...] ampla concertação promovida pelo governo nacional, que obriga que as cidades com mais de 3.500 habitantes garantam no mínimo que 20% de imóveis locados integrem o parque locatício social. Data também dos anos 2000 a criação da Agência Nacional de Renovação Urbana (ANRU), com vistas a reabilitar os bairros onde se situam empreendimentos de habitação de interesse social. (BALBIM, 2015, p. 18) Dentre os atores no sistema habitacional francês, temos: a) Governo Nacional: regulamenta o programa habitacional a nível nacional, definindo o teto de renda para os auxílios e autorizando os subsídios às HLMs; b) Caixa de Depósitos e Consignações – CDC: banco que presta os subsídios ao programa. Semelhante à Caixa Econômica Federal, aqui no Brasil. c) HLMs: adquirem o subsídio com a CDC, constroem as unidades ou reabilitam edifícios existentes e gerenciam o pagamento dos alugueis. Possuem autonomia para vender as unidades habitacionais aos inquilinos e realizarem Operações Urbanas Consorciadas. Dentre as HLMs temos: d) - OPHs: São empresas públicas criadas e regulamentadas pelos governos locais. e) - ESHs: São empresas privadas, sociedades anônimas sem fins lucrativos. Criadas em sua maioria por entidades e sindicatos que recolhem o 1% moradia: f) - SEMs: Empresas de economia mista criadas pelos governos locais. g) Governo local: regulamenta as OPHs, ESHs, o Uso e Ocupação do Solo, faz a cessão de terrenos para a construção das unidades habitacionais e faz o licenciamento dos projetos. h) Locatário: o futuro inquilino que aluga a unidade habitacional através de uma HLM. Também pode adquirir subsídios diretamente do governo nacional para arcar com o aluguel, 50 através das Agência Nacional para a Melhoria da Habitação – ANAH. i) Proprietário: pode adquirir subsidio da CDC para reabilitação de edifícios antigos desde que em troca disponibilize uma parte das unidades para locação social por um prazo de no mínimo 9 anos. As unidades habitacionais do sistema HLM são divididas em três tipos: “habitação muito social” para a renda mais baixa, produzidas pelas HLMs e destinadas às faixas de renda mais baixas; habitação intermediária, destinada à faixas de rendas mais altas e habitação clássica, uma espécie de cota habitacional instituída a partir da Lei de Solidariedade de 2000 onde em todas as habitações construídas, onde se faz necessário, segundo Balbim (2015) o Estado exige, em cada empreendimento habitacional, 30% de inquilinos com renda 60% abaixo do teto de renda estabelecido, e autorizaa presença de 10% de inquilinos cuja renda ultrapasse o teto em até 20%. Busca-se mesclar as unidades habitacionais à cidade existente ou como no caso da frente de habitação clássica, como uma cota habitacional em edifícios não pertencentes ao sistema HLM, para que se evite o estigma em torno das mesmas. 51 2.2.2 Itália Na Itália, a provisão de habitação social gira em torno da Federazione Italiana per le Case Popolari - FEDERCASA, que representa a união de entidades públicas pelo país voltadas a produção habitacional para locação social. Atualmente, a rede da FEDERCASA é formada por 90 autoridades locais e empresas e possui um patrimônio de: 806 mil moradias geridas, 759 mil moradias de aluguel, 25 mil unidades habitacionais arrendadas, 270 mil outras unidades imobiliárias e um total de 2,2 milhões de habitantes que residem em suas unidades. Podemos descrever, além da FEDERCASA, os seguintes atores: a) Organizações para construção e gerenciamento das unidades - Sociedades de Transformação Urbana - STUs: são criadas para promover a requalificação em uma região ou bairro, inclusive promovendo produção habitacional. De um lado temos as autoridades locais e do outro pode haver outra entidade pública ou uma empresa privada que nesse caso, precisa ser aprovada pelos moradores da área a ser reabilitada. São dissolvidas ao fim da operação, entrando outra empresa após a conclusão da intervenção para fazer o gerenciamento das unidades. Um exemplo de entidade destinada exclusivamente ao gerenciamento de das unidades habitacionais é a Agência Territorial pela Casa - ATC, criada pela prefeitura da cidade de Turim em conjunto com bancos que possuem interesse na requalificação urbana nas áreas de intervenção. - Sociedades de Economia Mista - SEMs2: empresas de economia mistas que buscam produzir as unidades e fazem seu gerenciamento. Como exemplo de atuação das SEMs, tem-se a experiência de ACER Reggio Emilia, no Bairro Compagnoni-Fenulli. Neste caso, a criação da SEM teve como objetivo a elaboração e execução de um plano de reestruturação para o bairro, através da demolição e reconstrução de alguns edifícios e da construção de alguns empreendimentos novos. Para tanto, foi firmado um conjunto de parcerias público-privadas a fim de executar os projetos e as obras de construção e urbanização. A ACER Reggio Emilia é o sócio majoritário da SEM, 2 Segundo Balbim (2015), em 2006 foram criadas, em regiões associadas à Federcasa, 33 SEMs, metade destas com 100% de capital público. 52 detendo 52% do capital da empresa. Os demais 48% pertencem a três empresas privadas independentes, escolhidas mediante uma seleção pública (BALBIM, 2015, p. 25) b) Governo local: seleciona os beneficiários, participam do conselho no processo de implantação do projeto e financia uma parte da intervenção. c) Inquilino: faz o cadastro com o governo local e passa pela seleção de renda para concorrer a uma unidade. Assim como na França, o benefício é dividido em três faixas de renda. Segundo Balbim (2015), na Itália, a locação representa 26% da moradia no país, sendo 6% locação social. 53 2.2.3 Holanda Na Holanda, a produção habitacional de interesse social fica a cargo das Organizações de Habitação Social, essas sem fins lucrativos. Tais organizações sem fins lucrativos surgiram no século XIX por parte da iniciativa privada. A partir de 1901 foram reconhecidas por lei e passam a receber auxilio governo nacional, ficando determinado que esses subsídios deveriam ser devolvidos ao mesmo no futuro. Em 1995, o governo decidiu perdoar as dívidas contraídas pelas Organizações em troca de não fornecer mais subsídios às mesmas. Desde então, o governo apenas oferece benefícios diretamente aos locatários e às Organizações oferece incentivos fiscais. Dentre os atores da intervenção habitacional de interesse social Holandês, temos: a) O governo nacional: encarregado de instituir um teto para os aluguéis e oferecer incentivos fiscais às Organizações. Para receber os incentivos por parte do governo nacional, as unidades produzidas pelas associações precisam obedecer critérios de qualidade. b) Também oferece auxilio direto aos locatários com renda anual inferior à 21.000 euros. c) Organizações: produzem as moradias, gerenciam os pagamentos e a manutenção do condomínio. Possuem autonomia para vender unidades desocupadas (estoque locatário) sendo que se a quantidade de unidades a serem vendidas ultrapassarem 10% do estoque, a venda precisa ser autorizada pelo governo nacional. d) Fundo Central Para a Habitação Social: fiscaliza o trabalho das Organizações e geram relatórios para o Ministério da Habitação quando a saúde financeira destas. Caso necessário, presta ajuda financeira às Organizações tendo como fonte de verbas um valor cobrado de todas as Organizações como forma de taxa. e) Locatário: procura uma associação e se cadastra para se candidatar a alugar uma unidade. Se necessário, pode solicitar auxílio financeiro ao governo nacional para ajudar com o pagamento do aluguel, de acordo com a sua renda. A prioridade das Organizações é de atender famílias de baixa renda, apesar de também oferecerem unidades para famílias de renda mais alta. Para garantir que essas habitações 54 sejam prioritariamente destinadas a famílias de baixa renda, segundo AEDES3(2013), desde 2009 as Organizações são obrigadas a destinarem 90% de suas unidades à famílias de baixa renda (renda inferior à 681 €/mês4). Atualmente, está sendo introduzido um aumento de aluguel relacionado à renda através do qual a ocupação de habitação social por pessoas com uma maior renda será combatida. Isso significa que rendas mais altas (com base no limiar europeu de 34 229 euros) terão um aumento de aluguel maior do que anteriormente era legalmente possível. Isto é uma consequência da política governamental de incentivar essas famílias de renda média à buscar alternativas à habitação social e capturar estes rendimentos extra.5 (AEDES, 2013, p. 3, tradução da autora.) Quanto à famílias com renda mais baixa, busca-se não criar Conjuntos Habitacionais específicos para essa faixa de renda, mas através do auxílio do governo nacional fazer com que essas famílias habitem nos mesmos conjuntos destinados à faixas de rendas mais elevadas, buscando evitar a estigmatização. 3 Organização nacional que promove os interesses de praticamente todas as organizações de habitação social na Holanda, em todas as frentes possíveis (Fonte: https://www.aedes.nl/artikelen/aedes/vereniging/about- aedes.html, acesso em 04/05/2018.) 4O salário mínimo para os Países Baixos, em 2009, era de 1.381,20 euros por mês. 5Texto original: “At present, an income-related rent increase is being introduced through which occupation of social housing by people with a higher income will be tackled. This means that higher incomes (based on the European threshold of € 34,229) will see a higher rent increase than was previously legally possible. This is a consequence of the governmental policy to incentivize the semiddle-income households to move out of social housing and capture these extra incomes through a special ‘social housing tax’.” https://www.aedes.nl/artikelen/aedes/vereniging/about-aedes.html https://www.aedes.nl/artikelen/aedes/vereniging/about-aedes.html 55 2.3 A LOCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL No Brasil, desde que o Estado se propôs a produzir moradia para a população de baixa renda, foi propagada a ideia de que a moradia própria é melhor do que a moradia alugada. Como visto no Capítulo I, tal conceito foi difundido principalmente no governo Vargas que buscando a industrialização do país – já que a moradia passa a ser fator primordial para a reprodução da força de trabalho – e diante da crise habitacional
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