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1 NOVAES, Fernando A. História da Vida Privada no Brasil. Vol. 3 São Paulo: Companhia das Letras 1998. FICHAMENTO Larissa Pereira de Oliveira1 O Terceiro volume da História da Vida Privada no Brasil República: da Belle Époque a Era do Rádio, mais precisamente em sua introdução aponta para as mudanças ocorridas tanto no contexto internacional como também no contexto nacional. “Estimuladas sobretudo por um novo dinamismo no contexto da economia internacional, essas mudanças irão afetar desde a ordem e as hierarquias sociais até as noções de tempo e espaço das pessoas.” (p.7) A expansão do capitalismo teve o seu início com a Revolução Industrial datada a partir de 1780. Nessa perspectiva, a economia industrial rompia fronteiras com a introdução de produtos que cada vez mais invadiam os mercados, tornando-se global. “O capitalismo era assim não só internacional na sua prática, mas internacional em sua teoria.” (p.8) O palco dessa Revolução Industrial foi a Inglaterra e os três principais produtos para a promoção das primeiras fábricas foram: carvão, ferro e a máquina a vapor. A Inglaterra tinha como principal produto “tecido manufaturado de algodão e lã, distribuídos em escala mundial pelas novas ferrovias e navios a vapor.” (p.8) É a Segunda Revolução Industrial chamada de Revolução Científico – Tecnológica que proporcionou o desenvolvimento da eletricidade e a descoberta dos derivados de petróleo revolucionando os meios de transportes, comunicação e alimentação (este último no tocante a sua conservação, através da utilização de especiarias). “Uma outra característica marcante da Revolução Científico – Tecnológica é o impulso extraordinário que ela deu para a consolidação de uma unidade global do mercado capitalista.” (p.11). 1 Licenciada em História - UFRB, Educadora nascida na cidade de Salvador - Ba, Especialista em Educação em Direitos Humanos, Diversidade e Questões Étnico-Sociais ou Raciais - UCAM. Graduanda em Serviço Social - UNIFACS. 2 Agora o principal objetivo era atingir novos mercados para absorver os excedentes maciços proporcionados pela tecnologia que aumentava a quantidade e a qualidade dos produtos. “Foi essa ampliação na escala das demandas das exportações que gerou o fenômeno conhecido como neocolonialismo ou imperialismo, que levaram as potências industriais, na segunda metade do século XIX, a disputar e dividir entre si as áreas não colonizadas do globo ou restabelecer vínculos de dependência estreitos com áreas de passado colonial.” (p.12) A busca dos europeus por novos mercados acabou gerando conflitos dos mais variados gêneros (levantes, revoltas e guerras) pelo fato deste avanço tecnológico levar a desestruturação de sociedades arcaicas e conservadoras que tentavam impedir os avanços relacionados a modernidade. “Na América Latina esse processo se concentrou sobretudo na luta pelo controle do eixo econômico e territorial estratégico representado pelo Rio da Prata e sua rede hidrográfica”. (p.13) Neste sentido, a luta da Inglaterra tendo como sócia a elite brasileira contra a resistência de líderes tradicionais do Uruguai, Argentina e Paraguai visava não só a abertura de novos mercados como o controle da principal rede hidrográfica para o escoamento das mercadorias. O envolvimento do Brasil na guerra do Paraguai desestabilizou as bases do Império brasileiro tornando o momento propício para a criação de um Partido Republicano (1870), que visava o fim da monarquia. As ideologias republicanas eram importadas da Europa e fundamentadas nas correntes cientificistas - darwinismo social do inglês Spancer e o positivismo de Comte dentre outros. Diante das influências européias e das instabilidades Imperial, a República foi proclamada por militares, cafeicultores paulistas e políticos republicanos. A partir de então os mercados foram abertos para os ingleses e americanos o que ocasionou a penetração do capital estrangeiro permitindo que bancos privados emitissem papel moeda. O resultado desse desejo desesperado do Brasil em se tornar um país moderno foi o Encilhamento (fraude especulativa no mercado de ações) arruinando os capitalistas mais proeminentes da praça propiciando a ascensão de uma nova camada de arrivista. 3 “A ascensão desses ‘homens novos’, como eram chamados os grupos arrivistas, coincidiu ademais com a Abolição (1888) e a desmobilização de enormes contingentes de ex-escravos no Sudeste, em paralelo com a vultosa da sociedade, na medida mesma em que se consolidavam as práticas de trabalho assalariado e da constituição de um mercado interno mais dinâmico.” (p.16) Essa sede das elites locais por modernizar o país de qualquer maneira não levava em consideração a complexidade e amplitude do território brasileiro, pois esse projeto modernizador não atingia as camadas populares muito menos aqueles que viviam distante dos litorais brasileiros. É nesse contexto que surge os episódios do conflito em Canudos (levante de sertanejos) e da Revolta da Vacina (levante urbano) como fatos que demonstravam a imposição e a legitimação do regime republicano através da violência. No caso de Canudos, o povoado começou a incomodar principalmente os donos de terras devido a diminuição da mão-de-obra, a falta de pagamento de impostos dentre outros fatores. A partir do momento que o Exército foi solicitado, este por sua vez, afirmava levar “luz” e civilidade para o sertanejo que insistia em atrapalhar o lema positivista de ordem e progresso. Era uma briga de um litoral considerado avançado contra o sertão considerado atrasado. “A única maneira de justificar a catástrofe foi atribuir aos revoltosos a imagem de conspiradores monarquistas, decididos a derrubar o novo regime mantidos organizados e fortemente armados a partir do exterior por líderes expatriados do regime imperial.” (p.17) Como pode então os sertanejos resistirem a um regime republicano se eles não tinham noção do que era a República? A intenção talvez fosse outra, a busca por melhores condições de vida. Os acontecimentos em Canudos tinham um caráter muito mais religioso do que político e se ocorreu alguma proposta de retorno a monarquia se deve ao fato do não consentimento dos sertanejos da separação da Igreja do Estado imposta pelos republicanos. No tocante a Revolta da Vacina “no início do século XX a população do Rio de Janeiro era pouco inferior a 1 milhão de habitantes. Desses, a maioria era de negros remanescentes dos escravos, ex-escravos, libertos e seus descendentes, acrescidos dos contingentes que haviam chegado mais recentemente.” (p.20) 4 Essa população que visava o trabalho portuário em busca de melhores condições de vida se concentrava em antigos casarões no centro da cidade vivendo de forma desumana. “Para as autoridades, eles significavam uma ameaça permanente à ordem, à segurança e a moralidade públicas.” (p.21) Como as autoridades visavam transformar o Rio de Janeiro em atração para estrangeiros e a cidade tinha problemas na infra-estrutura “as autoridades conceberam um plano em três dimensões para enfrentar todos esses problemas. Executar simultaneamente a modernização do porto, o saneamento da cidade e a reforma urbana. Um time de três técnicos foi então nomeado pelo presidente Rodrigues Alves: o engenheiro Lauro Muller para a reforma do porto, o médico sanitarista Oswaldo Cruz para o saneamento e o engenheiro urbanista Pereira Passos.” (p.22) “Iniciou-se então o processo de demolição das residências da área central, que a grande imprensa saudou denominando-o com simpatia de a Regeneração. Para os atingidos pelo ato era a ditadura do bota – abaixo”. (p.23) “Foi a gota d’agua para a população pobre, despejada e humilhada. Num surto espontâneo, massas de cidadãos se voltaram contra os batalhões de visitadores e a força policial dirigindo-se para o centro da cidade,onde as obras de reforma urbana prosseguiam. Lá chegando, entrincheiraram-se entre valas abertas, tomando ferramentas e materiais de construção como armas, com as quais se puseram a enfrentar os reforços enviados pela polÍcia. O motim ficou conhecido como Revolta da Vacina, de 1904.” (p.23-24) Vale ressaltar que este episódio ficou conhecido como um segundo Canudos, “o qual seria também preciso eliminar para salvar a República.” (p.23) “O chefe de polícia da capital deu ordem para que toda e qualquer pessoa abordada no centro da cidade que não pudesse comprovar emprego e residência fixos, fosse detida.” (p.26) As populações carentes não estavam dentro do projeto de modernização do Rio de Janeiro e a partir do momento que essa população teve seus espaços de moradia demolidos sem ter para onde ir tiveram que migrar para os morros, surgindo assim as primeiras favelas. Canudos e a Revolta da Vacina revelaram um Brasil que a participação da população tanto no contexto do espaço público quanto no privado era um privilégio de poucos, ou seja, não atingia as classes subalternas. 5 “Enfocar o âmbito da vida privada nesse contexto exige atenção especial para os modos pelo quais são as tensões entre os vários estratos da sociedade, tensões essas reforçadas pela dupla carga opressiva do estatuto colonial e da ordem escravista ou sua herança.” (p.28) “Essa mudança nas representações e expectativas relativas ao futuro e ao destino do país, fossem elas marcadas pelo otimismo dos grupos beneficiados com a Regeneração ou pelos pressentimentos sombrios dos que, nos sertões ou nas capitais, viam ameaçados seu modo de vida e seus valores, indica a percepção geral de que a sociedade estava sendo engolfada por um processo de transformação mais amplo e complicado que mera reforma das instituições políticas.” (p.34-35) “O marco seguinte seria já o momento inicial do período republicano, essa fase eufórica para os grupos beneficiados com o novo regime, a Belle Époque brasileira, cuja duração abrange o período da guerra européia, durante o qual ampliou-se suas exportações para as nações beligerantes, desenvolvendo-se ademais novas indústrias para substituir parte do que antes se importava.” (p.35- 36) “De 1920 a 1930 o regime começa a periclitar, arrastando-se em estertores até o golpe fatal, com a deposição do último presidente paulista e a ascensão de Getúlio Vargas.” (p.37) “Nos anos 30 e 40, vividos pela tutela varguista (1930-45), a orientação autoritária do governo pretendeu compor doses complementares de repressão e doutrinação a fim de construir sua base social de sustentação política. Esse período as diretrizes políticas utilizavam as propagandas e os meios de comunicação social para controle e interferência no pensamento da população.” (p.37) O principal objetivo desta introdução “é estabelecer uma percepção equilibrada do efeito homogeneizador do enquadramento da sociedade e cultura brasileiras uma dinâmica global, ao mesmo tempo que ressaltar os muitos traços que singularizam a formação histórica do país.” (p.42)
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