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PATOLOGIAPATOLOGIA ALESSANDRA MORITAALESSANDRA MORITA 24 O Sistema Endócrino ANIRBAN MAITRA ! HIPÓFISE Manifestações Clínicas da Doença Hipofi sária Adenomas Hipofi sários e Hiperpituitarismo Prolactinomas Adenomas das Células Secretoras do Hormônio do Crescimento (Somatotróficas) Adenomas das Células Secretoras de ACTH (Corticotróficas) Outros Adenomas da Adeno-hipófise Hipopituitarismo Síndromes da Neuro-hipófi se Tumores Hipotalâmicos Suprasselares ! GLÂNDULA TIREOIDE Hipertireoidismo Hipotireoidismo Cretinismo Mixedema Tireoidite Tireoidite de Hashimoto Tireoidite Subaguda (Granulomatosa) Tireoidite Linfocítica (Indolor) Subaguda Doença de Graves Bócio Difuso e Multinodular Bócio Disfuso não Tóxico (Simples) Bócio Multinodular Neoplasia da Tireoide Adenomas Carcinomas Patogenia Carcinoma Papilar Carcinoma Folicular Carcinoma Anaplásico (Indiferenciado) Carcinoma Medular Anomalias Congênitas ! GLÂNDULAS PARATIREOIDES Hiperparatireoidismo Hiperparatireoidismo Primário Hiperparatireoidismo Secundário Hipoparatireoidismo Pseudo-hipoparatireoidismo ! PÂNCREAS ENDÓCRINO Diabetes Melito Diagnóstico Classificação Homeostase da Glicose Regulação da Liberação de Insulina Ação da Insulina e Vias de Sinalização de Insulina Patogenia do Diabetes Melito Tipo 1 Patogenia do Diabetes Melito Tipo 2 Resistência à Insulina Disfunção das Células ! Formas Monogênicas de Diabetes Patogenia das Complicações do Diabetes Morfologia do Diabetes e Suas Complicações Tardias Características Clínicas do Diabetes Neoplasias Endócrinas Pancreáticas Hiperinsulinismo (Insulinoma) Síndrome de Zollinger-Ellison (Gastrinomas) 1105 1106 CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino O sistema endócrino consiste em um grupo de órgãos altamente integrados e distribuídos que orquestram um estado de equilíbrio metabólico, ou homeostase, entre os vários órgãos do corpo. A sinalização, através de moléculas extracelulares secretadas, pode ser classifi cada em três tipos – autócrino, parácrino ou endócrino – com base na distância sobre a qual os sinais atuam. Na sinali- zação endócrina, as moléculas secretadas, que são frequentemente chamadas de hormônios, atuam em células-alvo que estão distan- tes de seus locais de síntese. Um hormônio endócrino é frequen- temente carreado pelo sangue a partir de seu local de liberação até seu alvo. Em resposta, o tecido-alvo frequentemente secreta fatores que regulam negativamente a atividade da glândula que produz o hormônio estimulante, um processo conhecido como retroalimentação de inibição. Diversos processos podem perturbar a atividade normal do sistema endócrino, incluindo a síntese ou liberação danifi cada dos hormônios, interações anormais entre hormônios e seus tecidos-alvo e respostas anormais dos órgãos-alvo. As doenças endócrinas podem ser geralmente classifi cadas como (1) doenças de subprodução ou superprodução de hormônios e suas consequên- cias bioquímicas e clínicas resultantes e (2) doenças associadas ao desenvolvimento de lesões de massa. Tais lesões podem ser não funcionais, ou podem estar associadas à superprodução ou sub- produção de hormônios. O estudo das doenças endócrinas requer a integração dos achados morfológicos com os níveis de medições bioquímicas dos hormônios, seus reguladores e outros metabólitos. Outras Neoplasias Endócrinas Pancreáticas Raras ! GLÂNDULAS SUPRARRENAIS Córtex Suprarrenal Hiperfuncionamento Adrenocortical (Hiperadrenalismo) Hipercortisolismo (Síndrome de Cushing) Hiperaldosteronismo Primário Síndromes Adrenogenitais Insuficiência Adrenocortical Insufi ciência Adrenocortical Aguda Primária Síndrome de Waterhouse- Friderichsen Insufi ciência Adrenocortical Crônica Primária (Doença de Addison) Insufi ciência Adrenocortical Secundária Neoplasias Adrenocorticais Outras Lesões da Suprarrenal Medula Suprarrenal Feocromocitoma ! SÍNDROMES DAS NEOPLASIAS ENDÓCRINAS MÚLTIPLAS Neoplasia Endócrina Múltipla, Tipo 1 Neoplasia Endócrina Múltipla, Tipo 2 ! GLÂNDULA PINEAL Pinealomas HIPÓFISE A hipófi se é composta de dois componentes morfológica e fun- cionalmente distintos: o lóbulo anterior (adeno-hipófi se) e o lóbulo posterior (neuro-hipófi se). A adeno-hipófi se constitui cerca de 80% da glândula. A produção da maioria dos hormônios hipofi sários é controlada predominantemente pela liberação de fatores estimulantes a partir do hipotálamo (Fig. 24-1), os quais são carreados para a adeno-hipófi se por um sistema vascular portal. A prolactina é a maior exceção; seu controle hipotalâmico primário é inibitório, através da ação da dopamina. O hormônio do crescimento hipofi sário também é diferente neste ponto, já que recebe tanto infl uências estimulatórias quanto inibitórias através do hipotálamo. Em cortes histológicos de rotina da ade- no-hipófi se, encontra-se um arranjo celular colorido que contêm células com citoplasma eosinofílico (acidófi lo), citoplasma baso- fílico (basófi lo) ou citoplasma fracamente corado (cromófobo) (Fig. 24-2). Anticorpos específi cos contra os hormônios hipofi sá- rios identifi caram cinco tipos de células: 1. Somatotrófi cas, produtoras do hormônio do crescimento (HC): estas células acidofílicas constituem metade de todas as células produtoras de hormônios na adeno-hipófi se. 2. Lactotrófi cas (mamotrófi cas), produtoras de prolactina: Estas células acidofílicas secretam prolactina, que é essencial para a lactação. 3. Corticotrófi cas: Estas células basofílicas produzem o hormô- nio adrenocorticotrópico (ACTH), a pró-opiomelanocortina (POMC), o hormônio estimulador de melanócitos (MSH), as endorfi nas e a lipotropina. 4. Tireotrófi cas: Estas células basofílicas pálidas produzem o hor- mônio estimulador da tireoide (TSH). CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino 1107 5. Gonadotrófi cas: Estas células basofílicas produzem tanto o hormônio folículo-estimulante (FSH) quanto o hormônio luteinizante (LH). O FSH estimula a formação dos folículos de Graaf no ovário e o LH induz a ovulação e a formação do corpo lúteo no ovário. Os mesmos dois hormônios também regulam a espermatogênese e a produção de testosterona nos homens. A neuro-hipófi se consiste em células gliais modifi cadas (cha- madas de pituicitos) e processos axonais que se estendem desde o hipotálamo, passando pela haste hipofi sária, até o lóbulo poste- rior (terminais axonais). Os dois hormônios peptídicos secretados pela neuro-hipófi se – a ocitocina e o hormônio antidiurético (ADH, também chamado de vasopressina) – são, na verdade, sin- tetizados no hipotálamo e armazenados dentro dos terminais axônicos encontrados na neuro-hipófi se. Em resposta a um estí- mulo apropriado, os hormônios pré-formados são liberados dire- tamente na circulação sistêmica através dos canais venosos da hipófi se. Por exemplo, a dilatação da cérvice na gravidez resulta em liberação massiva de ocitocina, levando à contração do músculo liso uterino, facilitando o parto (trabalho uterino). Simi- larmente, a ocitocina liberada pela estimulação do mamilo no período pós-natal atua no músculo liso que circunda os ductos lactíferos das glândulas mamárias e facilita a lactação. A ocitocina sintética pode ser administrada durante a gravidez para indução artifi cial do trabalho de parto. A função mais importante do ADH é conservar a água pela restrição da diurese durante períodos de desidratação e hipovolemia. A pressão sanguínea diminuída, sentida pelos barorreceptores (receptores sensíveis à pressão) no átrio cardíaco e nas carótidas, estimula a liberação de ADH. Um aumento na pressão osmótica do plasma detectada pelos osmor- receptores também induz a secreção de ADH. Contrariamente, os estados de hipervolemia e de distensão atrial aumentada resultam em inibição da secreção do ADH. HipotálamoTRH PIF (Dopamina) CRH GHRH GIH (Somatostatina) GnRH TSH PRL ACTH GH FSH LH Haste Anterior Posterior Hipófise FIGURA 24-1 Os hormônios liberados pela adeno-hipófise. A adeno-hipófise liberacinco hormônios que, por sua vez, estão sob o controle de vários fatores estimulatórios ou inibitórios liberados pelo hipotálamo. TSH, hormônio estimulador da hipófise (tireotrofina); PRL, prolactina; ACTH, hormônio adrenocorticotrófico (corticotrofina); GH, hormônio do crescimento (somatotrofina); FSH (hormônio folículo-estimulante); LH, hormônio luteinizante. Os fatores estimulatórios liberados são o TRH (hormônio liberador de tireotrofina), o CRH (hormônio liberador de corticotrofina), o GHRH (hormônio liberador de hormônio do crescimento) e o GnRH (hormônio liberador de gonadotrofina). As influências inibitórias hipotalâmicas compreendem o PIF (fator inibitório de prolactina ou dopamina) e o fator inibidor do hormônio do crescimento (GIH ou somatostatina). A FIGURA 24-2 A, Fotomicrografia da hipófise normal. A glândula é povoada por diversos tipos distintos de células contendo uma variedade de hormônios estimulatórios (tróficos). Cada um dos hormônios tem diferentes características de coloração, resultando em uma mistura de tipos celulares nas preparações histológicas de rotina. B, Imunomarcação para o hormônio do crescimento humano. 1108 CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino Manifestações Clínicas da Doença Hipofi sária As manifestações clínicas da doença hipofi sária são as seguin- tes: Hiperpituitarismo: Surge do excesso de secreção dos hormô- nios trófi cos. As causas do hiperpituitarismo incluem adenoma hipofi sário, hiperplasia e carcinomas da adeno-hipófi se, secreção de hormônios pelos tumores não hipofi sários e certos distúrbios hipotalâmicos. Os sintomas do hiperpituitarismo são discutidos posteriormente no contexto dos tumores individuais. Hipopituitarismo: Surge da defi ciência dos hormônios trófi - cos. Isso pode ser causado por processos destrutivos, inclusive lesão isquêmica, cirurgia ou radiação, reações infl amatórias e ade- nomas hipofi sários não funcionais. Efeitos de massa locais: Entre as primeiras mudanças referíveis aos efeitos de massa estão as anormalidades radiográfi cas da sela túrcica, inclusive a expansão selar, erosão óssea e ruptura do dia- fragma da sela. Por causa da grande proximidade dos nervos ópticos e do quiasma da sela, as lesões hipofi sárias expansivas geralmente comprimem as fi bras cruzadas no quiasma óptico. Isso dá origem a anormalidades no campo visual, classicamente na forma de defeitos nos campos visuais laterais (temporais), conhe- cidas como hemianopsia bitemporal. Além disso, uma variedade de outras anormalidades no campo visual pode ser causada pelo crescimento assimétrico de muitos tumores. Como qualquer outra massa intracraniana expansiva, os adenomas hipofi sários podem produzir sinais e sintomas de pressão intracraniana elevada, inclusive dor de cabeça, náusea e vômito. Ocasional- mente, uma hemorragia aguda em um adenoma está associada a evidências clínicas de aumento rápido da lesão, uma situação apropriadamente chamada de apoplexia hipofi sária. A apoplexia hipofi sária aguda é uma emergência neurocirúgica, já que pode causar morte súbita (ver adiante). As doenças da neuro-hipófi se frequentemente chamam a atenção clínica por causa da secreção aumentada ou diminuída de ADH. Adenomas Hipofi sários e Hiperpituitarismo A causa mais comum de hiperpituitarismo é um adenoma que surge no lobo anterior. Os adenomas hipofi sários são classifi cados com base no hormônio produzido pelas células neoplásicas, as quais são detec- tadas por colorações imuno-histoquímicas (Tabela 24-1). Alguns adenomas hipofi sários podem secretar dois hormônios (com HC e prolactina, sendo a combinação mais comum), e raramente, os adenomas hipofi sários são pluri-hormonais. Os adenomas hipofi - sários podem ser funcionais (i.e., associados com o excesso de hor- mônio e as manifestações clínicas disto) ou não funcionais (i.e., demonstração imuno-histoquímica e/ou ultraestrutural da produ- ção hormonal no nível do tecido, sem sintomas clínicos do excesso de hormônio). Causas menos comuns de hiperpituitarismo incluem carcinomas hipofi sários e alguns distúrbios hipotalâmicos. Os grandes adenomas hipofi sários, particularmente os não funcio- nais, podem causar hipopituitarismo ao passarem do limite e des- truírem o parênquima da adeno-hipófi se adjacente. Os adenomas hipofi sários são geralmente encontrados em adultos, com um pico de incidência de 35 a 60 anos de idade. Eles são designados, um tanto arbitrariamente, como microadenomas se tiverem menos de 1 cm em diâmetro e macroadenomas se exce- derem 1 cm em diâmetro. É provável que os adenomas silenciosos e hormônio-negativos chamem a atenção clínica em um estágio mais avançado do que aqueles associados a anormalidades endó- crinas e é, portanto, mais provável que sejam macroadenomas. Uma metanálise de estudos de necrópsia estima que a prevalência de adenomas hipofi sários na população seja de cerca de 14%, embora a grande maioria dessas lesões seja acidentalmente diag- nosticada como microadenoma (“incidentaloma hipofi sário”).1 Com os recentes avanços nas técnicas moleculares, informa- ções substanciais foram obtidas sobre as anormalidades genéticas associadas aos adenomas hipofi sários2 (Tabela 24-2): TABELA 24–1 Classificação dos Adenomas Hipofisários Tipo Celular Hipofisário Hormônio Tipo de Tumor Síndrome Associada* Corticotrófico ACTH e outros peptídeos derivados de POMC Adenoma de células secretoras de ACTH (corticotrófico) Síndrome de Cushing Síndrome de Nelson Somatotrófico GH Adenoma de células secretoras de GH (somatotrófico) Gigantismo (crianças) Acromegalia (adultos) Lactotrófico Prolactina Adenoma de células secretoras de prolactina (lactotrófico) Galactorreia e amenorreia (em mulheres) Disfunção sexual e infertilidade Mamossomatotrófico Prolactina e GH Mamossomatotrófico Características combinadas do excesso de GH e prolactina Tireotrófico TSH Adenoma de células secretoras de TSH (tireotrófico) Hipertireoidismo Gonadotrófico FSH e LH Adenomas oncociticos, “célula nula”, gonadotróficos Hipogonadismo, efeitos de massa e hipopituitarismo ACTH, hormônio adrenocorticotrófico; FSH, hormônio folículo-estimulante; GH, hormônio do crescimento; LH, hormônio luteinizante; POMC, pró-opiomelanocortina; TSH, hormônio estimulador da tireoide. * Note que os adenomas não funcionantes em cada categoria se apresentam tipicamente com efeitos de massa acompanhados por hipopituitarismo decorrente da destruição do parênquima da hipófise normal. Essas características são particularmente comuns com adenomas gonadotróficos. Adaptado de Ezzat S, Asa SL: Mechanisms of disease: the pathogenesis of pituitary tumors. Nat Clin Prac Endocrinol Metab 2:200-230, 2006. CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino 1109 TABELA 24–2 Alterações Genéticas nos Tumores Hipofisários Gene Mecanismo de Alteração Subtipo de Tumor Hipofisário GANHO-DE-FUNÇÃO Gs" Proteína cinase A (PKA)* Ciclina D1 HRAS Mutação ativante Mutações inativantes de PRKAR1A na linhagem germinativa (complexo de Carney), um regulador negativo da PKA Superexpressão Mutação ativante Adenomas de GH Adenomas de GH e prolactina Adenomas agressivos Carcinomas hipofisários PERDA-DE-FUNÇÃO Menina* CDKN1B (p27/KIP1)* Proteína de interação com o receptor aril hidrocarbono (AIP)* Proteína do retinoblastoma Mutações inativantes de MEN1 na linhagem germinativa (neoplasia endócrina múltipla, tipo 1) Mutações inativantes de CDKN1B na linhagem germinativa (síndrome “semelhante a MEN-1”) Mutações inativantes de AIP na linhagem germinativa (síndrome da predisposição ao adenoma hipofisário [PAP]) Metilação do promotor do gene RB Adenomas de GH, prolactina e ACTH Adenomas de ACTH Adenomas de GH Adenomas agressivos ACTH, hormônio adrenocorticotrófico; GH, hormônio do crescimento. * Alterações genéticas associadas à predisposição familiar aos adenomas da hipófise. Adaptado de Boikos AS, Stratakis CA: Molecular genetics of the cAMP-dependent protein kinase pathwayand of sporadic pituitary tumorigenesis. Hum Mol Genet 16:R80-R87, 2007. As mutações na proteína-G são possivelmente as anormalida- des moleculares mais bem caracterizadas nos adenomas hipo- fi sários. As proteínas G são descritas no Capítulo 3; aqui, serão revisadas suas funções no contexto do neoplasma endócrino. As proteínas G desempenham um papel crítico na transdução de sinais, na transmissão de sinais de receptores específi cos de superfície celular (p. ex., o receptor para GHRH) para efetores intracelulares (p. ex., adenil ciclase), que então gera mensageiros secundários (p. ex., o monofosfato de adenosina cíclico, AMPc). Estes são proteínas heterotriméricas, compostas de uma subu- nidade-" específi ca que se liga ao nucleotídeo guanina e inte- rage tanto com receptores da superfície celular quanto com efetores intracelulares (Fig. 24-3); As subunidades-! e -# são ligadas não covalentemente à subunidade-" específi ca. A Gs é uma proteína G estimulatória que tem um papel fundamental na transdução de sinais em diversos órgãos endócrinos, inclu- sive a hipófi se. A subunidade-" da Gs (Gs") é codifi cada pelo gene GNAS, localizado no cromossomo 20q13. No estado basal, a Gs existe em um estado inativo, com o difosfato de guanosina (GDP) vinculado ao sítio de ligação do nucleotídeo guanina da Gs". Ao interagir com o receptor de superfície aderido ao ligante, o GDP se dissocia, e o trifosfato de guano- sina (GTP) se liga à Gs", ativando a proteína G. A ativação da Gs" resulta na geração de AMPc, o qual atua como um potente estímulo mitogênico para uma variedade de tipos celulares endócrinos (tais como as somatotrófi cas e corticotrófi cas da hipófi se, as células foliculares da tireoide e as células paratire- óideas), promovendo a proliferação celular e a síntese e a secre- ção hormonal. A ativação da Gs" e a geração resultante de AMPc são transitórias devido à atividade intrínseca da GTPase na subunidade-", que hidrolisa GTP em GDP. Uma mutação na subunidade-" que interfere com sua atividade intrínseca de GTPase irá, portanto, resultar em uma ativação constitutiva da Gs", uma geração persistente de AMPc e uma proliferação celular descontrolada (Fig. 24-3). Aproximadamente 40% dos adeno- mas de células somatotrófi cas abrigam mutações no GNAS que anulam a atividade GTPásica da Gs". Além disso, as muta- ções no GNAS também foram descritas em uma minoria de adenomas corticotrófi cos; contrariamente, as mutações no GNAS estão ausentes em adenomas tireotrófi cos, lactotrófi cos e gonadotrófi cos, já que sua respectiva liberação hipotalâmica de hormônios não medeia suas ações através das vias depen- dentes de AMPc. A maioria esmagadora de adenomas hipofi sários é esporádica em sua natureza, e somente cerca de 5% dos casos surgem como resultado de uma predisposição hereditária. Quatro genes foram identifi cados até agora como causa de adenoma hipofi sário familiar: MEN-1, CDKN1B, PRKAR1A E AIP.3 As mutações inativadoras do gene MEN-1 no cromossomo 11q13 são responsáveis pela síndrome da neoplasia endócrina múlti- pla tipo 1 (MEN-1, discutido em detalhes adiante). O produto do gene MEN-1 é a proteína supressora de tumor menina, e indivíduos com a síndrome do MEN-1 desenvolvem tumores em múltiplos órgãos endócrinos, inclusive na hipófi se. Apro- ximadamente um terço dos pacientes com MEN-1 desenvolve adenomas hipofi sários, mais comumente tumores secretores de HC, prolactina ou ACTH. Em contraste, as mutações somá- ticas de MEN-1 são raras em tumores hipofi sários esporádicos. O produto do gene CDKN1B no cromossomo 12q3 é o regu- lador do ponto de checagem do ciclo celular p27 ou KIP1; as mutações no CDKN1B na linhagem germinativa são respon- sáveis por um subgrupo de pacientes com uma síndrome “semelhante à MEN-1” que não apresenta as anormalidades de MEN-1.4 O gene da subunidade regulatória 1" da proteína cinase A (PRKAR1A) no cromossomo 17q24 está mutado em pacientes com o complexo de Carney, um distúrbio autossô- mico dominante caracterizado por tumores hipofi sários ou outros tumores endócrinos. Este gene codifi ca um supressor de tumor que regula a atividade da proteína cinase A, um mediador negativo da sinalização dependente de AMPc. Logo, a perda da função da proteína PRKAR1A leva à ativação ina- propriada dos alvos celulares do AMPc, grifando ainda mais a importância da via deste mensageiro secundário na neoplasia hipofi sária. A proteína de interação com o receptor aril hidro- carbono (AIP) no cromossomo 11q é um gene predisponente do adenoma hipofi sário descrito recentemente. Pacientes com mutações no AIP na linhagem germinativa apresentam com frequência acromegalia decorrente de um adenoma secretor de HC subjacente, e são tipicamente mais jovens (< 35 anos de idade) no momento do diagnóstico do que os pacientes com 1110 CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino adenoma HC esporádico.5 O mecanismo preciso pelo qual a proteína AIP atua como um supressor de tumor na hipófi se não é conhecido. Nem todas as pessoas com mutações no AIP na linhagem germinativa têm um histórico familiar positivo para tumores hipofi sários como consequência de penetrância incompleta. A imuno-histoquímica para a AIP é recomendada nos adenomas HC que surgem em pacientes mais jovens, já que as mutações associadas a adenomas tipicamente causam ausência na expressão da proteína. As mutações somáticas desses quatro genes são raramente encontradas em adenomas hipofi sários esporádicos. As anormalidades moleculares associadas a comportamento agressivo incluem aberrações nos genes do ponto de checagem do ciclo celular, tais como uma superexpressão de ciclina D1, mutações no p53 e silenciamento epigenético do gene do reti- noblastoma (RB1). Além disso, as mutações ativantes do onco- gene HRAS são observadas em carcinomas hipofi sários raros (ver adiante). Morfologia. O adenoma hipofisário típico é uma lesão mole, bem circunscrita, que pode estar confinada à sela túrcica. Lesões maiores tipicamente se estendem supe- riormente através do diafragma da sela na região supras- selar, onde frequentemente comprimem o quiasma óptico e as estruturas adjacentes, tais como alguns dos nervos craniais (Fig. 24-4). Ao se expandirem, os adenomas frequentemente erodem a sela túrcica e os processos clinoides anteriores. Em até 30% dos casos, os adenomas não são macroscopicamente encapsulados e infiltram os tecidos vizinhos, como os seios cavernoso e esfenoide, a dura e, ocasionalmente, o próprio cérebro. Tais lesões são chamadas de adenomas invasivos. Como esperado, os macroadenomas tendem a ser invasivos mais frequen- temente do que os tumores menores. Focos de hemorra- gia e necrose também são mais comuns nesses adenomas maiores. Histologicamente, os adenomas hipofisários típicos são compostos de células poligonais relativamente unifor- mes arranjadas em lâminas ou cordões. O tecido conjun- tivo de suporte, ou reticulina, é esparso, responsável pela consistência gelatinosa e mole de muitas dessas lesões. A atividade mitótica é geralmente esparsa. O citoplasma das células constituintes pode ser acidofílico, basofílico ou cromofóbico, dependendo do tipo e da quantidade de produtos secretórios nas células, mas é geralmente uni- forme por todo o tumor. Este monomorfismo celular e a ausência de uma rede de reticulina significativa distin- guem os adenomas hipofisários do parênquima da adeno- hipófise não neoplásica (Fig. 24-5). O comportamento biológico do adenoma não pode ser sempre confiavel- mente predito a partir de sua aparência histológica. Um subgrupo de adenomas hipofisários demonstra uma ati- vidade mitótica intensa e a coloração de mais de 3% dos núcleos com o marcador de proliferação Ki-67; esses tumores geralmente também demonstram uma ampla imunorreatividade nuclear ao p53 nas células neoplási- cas, uma característica que se correlaciona com a pre- sença de mutações no p53. Recomenda-se que os adenomas com este perfil sejam classificadoscomo ade- nomas atípicos, já que estes tumores têm alta propensão para um comportamento agressivo, inclusive invasão e recorrência. FIGURA 24-3 Sinalização da proteína G na neoplasia endócrina. As mutações que levaram à hiperatividade da proteína G são vistas em uma variedade de neoplasias endócrinas. As proteínas G desempenham um papel fundamental na transdução de sinais, transmitindo sinais dos receptores de superfície celular (receptores de GHRH, TSH e PTH) para efetores intracelulares (p. ex., adenil ciclase), que geram mensageiros secundários (AMPc, monofosfato de adenosina cíclico). GDP, difosfato de guanosina; GTP, trifosfato de guanosina; Fi, fosfato inorgânico. Veja a Figura 24-1 para outras abreviaturas. FIGURA 24-4 Adenoma hipofisário. Este adenoma sólido e não funcionante cresceu além dos limites da sela túrcica e distorceu o cérebro sobrejacente. Os adenomas não funcionantes tendem a ser maiores no momento do diagnóstico do que aqueles que secretam hormônio. F F GDP ! "# F F F GTP F F GDP Receptor Ligante (GHRH, TSH, PTH) ! "# F F F GTP Adenil ciclase AMPc Proliferação Síntese e secreção hormonal Mutação !"# CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino 1111 Curso Clínico. Os sinais e sintomas dos adenomas hipofi sá- rios incluem anormalidades endócrinas e efeitos de massa. Esses efeitos da secreção excessiva dos hormônios da adeno-hipófi se são mencionados adiante, quando os tipos específi cos de adeno- mas hipofi sários são descritos. Os efeitos de massa locais podem ser encontrados em qualquer tipo de tumor da hipófi se e foram discutidos previamente devido às manifestações clínicas da doença hipófi se. Brevemente, estes incluem anormalidades radio- gráfi cas da sela túrcica, anormalidades no campo visual, sinais e sintomas da pressão intracraniana elevada e, ocasionalmente, hipopituitarismo. Uma hemorragia aguda em um adenoma pode, algumas vezes, estar associada à apoplexia hipofi sária, como já foi observado. Com esta introdução geral aos adenomas hipofi sários, pros- seguimos com a discussão dos tipos individuais de tumores. PROLACTINOMAS Os prolactinomas (adenomas lactotrófi cos) são o tipo mais fre- quente de adenoma hipofi sário hiperfuncional, responsável por cerca de 30% de todos os casos clinicamente reconhecidos. Estas lesões variam desde pequenos microademonas até grandes tumores expansíveis associados a efeitos de massa substanciais. Microscopicamente, a grande maioria dos prolactinomas é com- posta de células fracamente acidófi las ou cromófobas (prolacti- noma esparsamente granulado); raros prolactinomas são fortemente acidófi los (prolactinomas densamente granulados) (Fig. 24-6). A prolactina pode ser demonstrada nos grânulos secretores no cito- plasma das células usando colorações imuno-histoquímicas. Os prolactinomas têm propensão a sofrer calcifi cação distrófi ca, variando desde corpos psamonas isolados até calcifi cações exten- sivas de virtualmente toda a massa tumoral (“pedra hipofi sária”). A secreção de prolactina pelo adenoma funcional é geralmente efi ciente (até os microadenomas secretam prolactina sufi ciente para causar hiperprolactinemia) e proporcional, já que as concen- trações séricas de prolactina tendem a se correlacionar com o tamanho do adenoma. Os níveis séricos aumentados da prolactina, ou prolactinemia, causam amenorreia, galactorreia, perda da libido e infertilidade. O diagnóstico de um adenoma é feito mais prontamente na mulher do que no homem, especialmente entre as idades de 20 a 40 anos, presumivelmente por causa da sensibilidade da mens- truação de ser interrompida pela hiperprolactinemia. O prolacti- noma é a base de quase um quarto dos casos de amenorreia. Em contraste, nos homens e mulheres mais velhas, as manifestações hormonais podem ser sutis, permitindo que os tumores alcancem um tamanho considerável (macroadenomas) antes de serem cli- nicamente detectados. A hiperprolactinemia pode se originar de outras causas que não os adenomas hipofi sários secretores de prolactina. A hiperprolacti- nemia fi siológica ocorre na gravidez; os níveis séricos de prolac- tina aumentam, atingindo um pico no parto. Os níveis de prolactina também são elevados pelo estímulo do mamilo, como FIGURA 24-5 Adenoma hipofisário. O monomorfismo destas células contrasta significativamente com a mistura de células vista na adeno- hipófise normal. Note também a ausência da rede de reticulina. A B FIGURA 24-6 Características ultraestruturais dos prolactinomas. A, Micrografia eletrônica de um prolactinoma esparsamente granulado. As células tumorais contêm retículo endoplasmático granular em abundância (indicativo de síntese proteica ativa) e pequenos números de grânulos secretórios elétron-densos. B, Micrografia eletrônica de adenomas secretores do hormônio do crescimento densamente granulados. As células tumorais estão repletas com diversos grânulos secretórios grandes e elétron-densos. (Cortesia da Dra. Eva Horvath, St. Michael’s Hospital, Toronto, ON, Canada.) 1112 CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino ocorre durante a sucção nas mulheres lactantes, e como resposta a muitos tipos de estresse. A hiperprolactinemia patológica pode surgir da hiperplasia lactotrófi ca, assim como quando há interfe- rência com a inibição normal da secreção de prolactina pela dopamina. Isso pode ocorrer como uma consequência de danos aos neurônios dopaminérgicos do hipotálamo, danos à haste da hipófi se (p. ex., devido a trauma na cabeça), ou drogas que bloqueiam os receptores de dopamina nas células lactotrófi cas. Qualquer massa no compartimento suprasselar pode perturbar a infl uência inibitória normal do hipotálamo na secreção de prolactina, resultando em hiperprolactinemia. Portanto, uma elevação leve na prolactina sérica em uma pessoa com adenoma hipofi sário não indica necessariamente um tumor secretor de pro- lactina. Outras causas da hiperprolactinemia incluem diversas classes de drogas (como os antagonistas de dopamina, estrogê- nios, falência renal e hipotireoidismo). Os prolactinomas são tratados por cirurgia ou, mais comumente, com bromocriptina, um agonista do receptor de dopamina que faz com que as lesões diminuam em tamanho. ADENOMAS DAS CÉLULAS SECRETORAS DO HORMÔNIO DO CRESCIMENTO (SOMATOTRÓFICAS) Os tumores secretores de HC são o segundo tipo mais comum de adenoma hipofi sário funcional. Os adenomas das células somato- trófi cas podem estar bem grandes no momento em que chamam a atenção clínica porque a manifestação do HC excessivo pode ser sutil. Histologicamente, os adenomas que contêm células HC puras também são classifi cados em dois subtipos: densamente gra- nulado e esparsamente granulado. Os adenomas densamente gra- nulados são compostos de células monomórfi cas e acidófi las em cortes de rotina, retêm uma forte reatividade ao HC citoplasmá- tico na imuno-histoquímica e demonstram marcação para cito- queratina com distribuição perinuclear. Em contraste, as variantes esparsamente granuladas são compostas de células cromófobas com pleomorfi smos, nuclear e citológico, consideráveis e marca- ção fraca e focal para o HC. Os adenomas mamossomatotrófi cos bi-hormonais que expressam tanto HC quanto prolactina estão sendo crescentemente reconhecidos com a disponibilidade de rea- gentes imuno-histoquímicos melhores; morfologicamente, a maioria dos adenomas bi-hormonais parece com os adenomas somatotrófi cos puros, densamente granulados. Níveis persistentemente elevados de HC estimulam a secreção hepática do fator de crescimento semelhante à insulina 1 (IGF-1 ou somatomedina C), o que causa muitas das manifestações clínicas. Se o adenoma somatotrófi co aparece em crianças antes das epí- fi ses se fecharem, os níveis elevados de HC (e IGF-1) resultam em gigantismo. Este é caracterizado por um aumento generalizado no tamanho do corpo com braços e pernas desproporcionalmente longos. Se os níveis aumentados de HC estiverem presentes após o fechamento das epífi ses, os pacientesdesenvolvem acromegalia. Nesta condição, o crescimento é mais visível na pele e nos tecidos moles; vísceras (tireoide, coração, fígado e adrenais); e ossos da face, das mãos e dos pés. A densidade óssea pode estar aumentada (hiperostose) tanto na coluna vertebral quanto no quadril. O aumento do maxilar resulta em projeção (prognatismo), com alargamento da face inferior. As mãos e os pés estão aumentados, com dedos largos e semelhantes a “salsichas”. Na maioria dos casos, o gigantismo também é acompanhado por evidência de acromegalia. Essas mudanças se desenvolvem por décadas antes de serem reconhecidas, daí a oportunidade dos adenomas de alcançar tamanhos substanciais. O excesso de HC também está correlacionado com uma variedade de outros distúrbios, incluindo disfunção gonadal, diabetes melito, fraqueza muscular generali- zada, hipertensão, artrite, insufi ciência cardíaca congestiva e um risco aumentado de cânceres gastrointestinais. O diagnóstico do excesso de HC hipofi sário depende da docu- mentação dos níveis séricos elevados de HC e de IGF-1. Além disso, a falha em suprimir a produção de HC em resposta a uma carga oral de glicose é um dos testes mais sensíveis para a acrome- galia. O adenoma hipofi sário subjacente pode tanto ser removido cirurgicamente quanto tratado por meios farmacológicos. O último inclui os análogos da somatostatina (lembre que a soma- tostatina tem um efeito inibitório da secreção hipofi sária de HC) ou o uso de antagonistas do receptor de HC, o que evita que o hormônio se ligue aos órgãos-alvos, tal como o fígado. Quando o controle efetivo dos altos níveis de HC é alcançado, o cresci- mento excessivo, característico do tecido, e os sintomas relacio- nados recuam gradualmente e as anormalidades metabólicas melhoram. ADENOMAS DAS CÉLULAS SECRETORAS DE ACTH (CORTICOTRÓFICAS) Os adenomas corticotrófi cos são geralmente pequenos microade- nomas no momento do diagnóstico. Estes tumores são mais fre- quentemente basófi los (densamente granulados) e ocasionalmente cromófobos (esparsamente granulados). Ambas as variantes se coram positivamente com ácido periódico-Schiff (PAS) devido à presença de carboidratos na POMC, a molécula precursora do ACTH; além disso, eles demonstram imunorreatividade variável para a POMC e seus derivativos, inclusive o ACTH e a !-endorfi na. A produção excessiva de ACTH pelo adenoma corticotrófi co leva à hipersecreção suprarrenal de cortisol e ao desenvolvimento de hipercortisolismo (também conhecido como síndrome de Cushing). Esta síndrome é discutida em mais detalhes posterior- mente, com as doenças da glândula suprarrenal. O hipercortiso- lismo pode ser causado por uma ampla variedade de condições, além dos tumores hipofi sários produtores de ACTH. Quando o hipercortisolismo é decorrente da produção excessiva de ACTH pela hipófi se, o processo é designado doença de Cushing. Grandes adenomas destrutivos podem se desenvolver em pacientes após a remoção cirúrgica das glândulas suprarrenais para o tratamento da síndrome de Cushing. Esta condição, conhecida como sín- drome de Nelson, ocorre mais frequentemente devido à perda do efeito inibitório dos corticosteroides suprarrenais no microade- noma corticotrófi co preexistente. Como as suprarrenais estão ausentes em pessoas com este distúrbio, o hipercortisolismo não se desenvolve. Em contraste, os pacientes apresentam efeitos de massa do tumor da hipófi se. Além disso, há hiperpigmentação decorrente do efeito estimulatório de outros produtos da molé- cula precursora do ACTH nos melanócitos. OUTROS ADENOMAS DA ADENO-HIPÓFISE Os adenomas hipofi sários podem produzir mais de um hormô- nio. Por exemplo, a prolactina pode ser demonstrada por imuno- marcação dos adenomas somatotrófi cos. Em outros casos, os adenomas pluri-hormonais incomuns são capazes de secretar múltiplos hormônios; estes tumores são geralmente agressivos. Alguns poucos comentários são feitos sobre diversos tumores funcionais menos frequentes. CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino 1113 Os adenomas gonadotrófi cos (produtores de LH e produtores de FSH) podem ser difíceis de reconhecer porque eles secretam hor- mônios inefi ciente e variavelmente, e os produtos secretórios geralmente não causam uma síndrome clínica reconhecível (ade- nomas não funcionais, ver adiante). Os adenomas gonadotrófi cos são mais frequentemente encontrados em homens e mulheres de meia-idade quando se tornam grandes o sufi ciente para causar sintomas neurológicos, como visão prejudicada, dores de cabeça, diplopia ou apoplexia hipofi sária. As defi ciências hormonais hipofi sárias também podem ser encontradas, mais comumente uma secreção prejudicada de LH. Isto leva à dimunuição da energia e da libido no homem (devido à testosterona reduzida) e à amenorreia nas mulheres pré-menopáusicas. Logo, os adenomas gonadotrófi cos estão paradoxalmente associados ao hipofuncio- namento gonadal secundário. As células neoplásicas geralmente demonstram imunorreatividade para a subunidade-" da gonado- tropina comum e as subunidades FSH-! e LH-! específi cas. O FSH é, geralmente, o hormônio secretado predominante. Os adenomas tireotrófi cos (produtores de TSH) são raros, sendo responsáveis por aproximadamente 1% de todos os adeno- mas hipofi sários. Os adenomas tireotrófi cos são uma causa rara de hipertireoidismo. Os adenomas hipofi sários não funcionais são um grupo hetero- gêneo que constitui aproximadamente 25% a 30% de todos os tumores hipofi sários. Sua linhagem pode ser estabelecida por mar- cação imuno-histoquímica para os hormônios ou por demonstra- ção bioquímica de fatores de transcrição específi cos de um tipo celular. No passado, muitos desses tumores foram chamados de variantes silenciosas ou adenomas de células nulas. Não surpreen- dentemente, a apresentação típica dos adenomas não funcionais são os efeitos de massa. Essas lesões também podem comprometer sufi cientemente a adeno-hipófi se residual, causando o hipopitui- tarismo. Isto pode ocorrer como resultado do aumento gradual do adenoma ou após o aumento abrupto do tumor devido a uma hemorragia aguda (apoplexia hipofi sária). Os carcinomas hipofi sários são bem raros, sendo responsáveis por menos de 1% dos tumores hipofi sários. A demonstração de metás- tases cranioespinhais e sistêmicas é uma condição essencial do car- cinoma hipofi sário. A maioria dos carcinomas hipofi sários são neoplasmas funcionais, com a prolactina e o ACTH sendo os pro- dutos secretados mais comuns. As metástases geralmente aparecem tardiamente no curso, seguindo múltiplas recorrências locais. Hipopituitarismo O hipopituitarismo se refere à secreção diminuída de hormônios hipofi sários, que pode resultar de doenças do hipotálamo ou da hipófi se. A hipofunção da adeno-hipófi se ocorre quando aproxi- madamente 75% do parênquima são perdidos ou ausentes. Isto pode ser congênito ou resultar de uma variedade de anormalida- des adquiridas que são intrínsecas à hipófi se. O hipopituitarismo acompanhado por evidências de disfunção da neuro-hipófi se na forma de diabetes insípido (veja adiante) é quase sempre de origem hipotalâmica. A maioria dos casos de hipofunção surge de pro- cessos destrutivos envolvendo diretamente a adeno-hipófi se, embora outros mecanismos tenham sido identifi cados. Tumores e outras lesões de massa: adenomas hipofi sários, outros tumores benignos que surgem da sela, malignidades primárias e metastáticas e cistos podem causar hipopituitarismo. Qual- quer lesão de massa na sela pode causar dano por exercer pressão nas células hipofi sárias adjacentes. Lesões cerebrais traumáticas e hemorragia subaracnoide estão entre as causas mais comuns de hipofunção hipofi sária. Cirurgia ou radiação hipofi sária: A excisão cirúrgica de um adenoma hipofi sário pode, inadvertidamente, se estender para a hipófi se não adenomatosa. Apoplexia hipofi sária: Como foi mencionado, esta é uma hemorragia súbita na hipófi se, ocorrendo frequentementeno adenoma hipofi sário. Nas apresentações mais dramáticas, a apoplexia causa o início súbito de uma dor de cabeça martiri- zante, diplopia decorrente da pressão nos nervos oculomotores e hipopituitarismo. Nos casos graves, pode causar colapso car- diovascular, perda de consciência e mesmo morte súbita. Logo, a apoplexia hipofi sária é uma emergência neurocirúrgica. Necrose isquêmica da hipófi se e síndrome de Sheehan: A sín- drome de Sheehan, ou necrose pós-parto da adeno-hipófi se, é a forma mais comum de necrose isquêmica clinicamente sig- nifi cativa da adeno-hipófi se. Durante a gravidez, a adeno-hi- pófi se aumenta para quase dobrar seu tamanho normal. Esta expansão fi siológica da glândula não é acompanhada por aumento no suprimento de sangue do sistema venoso de baixa pressão; por isso, há anoxia relativa. A redução adicional no suprimento de sangue causada pela hemorragia obstétrica ou pelo choque pode precipitar o infarto do lóbulo anterior. A neuro-hipófi se, pelo fato de receber o sangue diretamente dos ramos arteriais, é muito menos susceptível à lesão isquêmica e, portanto, geralmente não é afetada. A necrose hipofi sária também pode ser encontrada em outras condições, como coa- gulação intravascular disseminada e (mais raramente) anemia falciforme, pressão intracraniana elevada, lesão traumática e choque de qualquer origem. Qualquer que seja a patogenia, a área isquêmica é reabsorvida e substituída por um grão de tecido fi broso aderido à parede de uma sela vazia. Cisto da fenda de Rathke: Estes cistos, revestidos por um epi- télio cuboide ciliado com células caliciformes ocasionais e células hipofi sárias anteriores, podem acumular fl uido protei- náceo e se expandir, comprometendo a glândula normal. Síndrome da sela vazia: Qualquer condição que destrua parte ou toda a hipófi se, tal como uma ablação da hipófi se por cirurgia ou radiação, pode resultar em uma sela vazia. A sín- drome da sela vazia se refere à presença de uma sela túrcica vazia e dilatada. Existem dois tipos: (1) Em uma sela vazia primária, há um defeito no diafragma da sela que permite que a aracnoide-máter e o líquido cefalorraquidiano herniem para a sela, resultando em expansão da sela e compressão da hipó- fi se. Classicamente, os pacientes afetados são mulheres obesas com histórico de múltiplas gravidezes. A síndrome da sela vazia pode estar associada a defeitos do campo visual e ocasio- nalmente a anomalias endócrinas, como a hiperprolactinemia, como resultado da interrupção dos efeitos hipotalâmicos ini- bitórios. A perda do parênquima funcional pode ser grave o sufi ciente para resultar em hipopituitarismo. (2) Em uma sela vazia secundária, uma massa, tal como um adenoma hipofi sá- rio, aumenta a sela, mas então é cirurgicamente removido ou sofre necrose espontânea, levando à perda da função hipofi sá- ria. O hipopituitarismo pode resultar do tratamento ou do infarto espontâneo. Defeitos genéticos: A defi ciência congênita de fatores de trans- crição requeridos para o funcionamento normal da hipófi se é uma causa rara de hipopituitarismo. Por exemplo, a mutação do gene homeobox específi co da hipófi se POU1F1 (previa- mente conhecido como PIT-1) resulta em defi ciência combi- 1114 CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino nada de hormônios hipofi sários caracterizada pela defi ciência de HC, prolactina e TSH. Lesões hipotalâmicas: Como já mencionado, as lesões hipotalâ- micas também podem afetar a hipófi se através da interferência com a entrega de fatores que liberam os hormônios hipofi sários. Ao contrário das doenças que envolvem a hipófi se diretamente, as anormalidades hipotalâmicas também podem diminuir a secreção de ADH, resultando no diabetes insípido (ver poste- riormente). As lesões hipotalâmicas que causam hipopituita- rismo incluem tumores, inclusive lesões benignas que surgem na região do hipotálamo, como os craniofaringiomas, e os tumores malignos que dão mmetástases para este local, tal como os car- cinomas de mama e de pulmão. A defi ciência do hormônio hipotalâmico pode ocorrer quando os tumores cerebrais ou nasofaríngeos são tratados com radiação. Distúrbios infl amatórios e infecções, como as sarcoidoses ou a meningite tuberculosa, podem causar defi ciências dos hormô- nios da adeno-hipófi se e diabetes insípido. As manifestações clínicas do hipofuncionamento da adeno- hipófi se podem ser muito variáveis e dependem do(s) hormônio(s) específi cos que estão faltando. As crianças podem desenvolver falha no crescimento (nanismo hipofi sário) devido à defi ciência do hormônio do crescimento. A defi ciência de gonadotrofi na (LH e FSH) leva à amenorreia e à infertilidade em mulheres e dimi- nuição da libido, impotência e perda de pelos pubianos e axilares nos homens. As defi ciências de TSH e de ACTH resultam em sintomas de hipotireoidismo e hipoadrenalismo, respectivamente, e são discutidas posteriormente no capítulo. A defi ciência de prolactina resulta em falha da lactação pós-parto. A adeno-hipó- fi se também é uma rica fonte de MSH, sintetizado a partir da mesma molécula precursora que produz o ACTH; portanto, uma das manifestações do hipopituitarismo inclui palidez decorrente da perda dos efeitos estimulatórios do MSH nos melanócitos. Síndromes da Neuro-hipófi se As síndromes clinicamente relevantes da neuro-hipófi se envol- vem o ADH e incluem o diabetes insípido e a secreção inapropriada de altos níveis de ADH. Diabetes insípido. A defi ciência de ADH causa o diabetes insí- pido, uma condição caracterizada pela micção excessiva (poli- úria) decorrente da incapacidade do rim de absorver a água apropriadamente da urina. Isso pode resultar em uma varie- dade de processos, incluindo trauma na cabeça, tumores e distúrbios infl amatórios do hipotálamo e da hipófi se, assim como procedimentos cirúrgicos envolvendo estes órgãos. A condição também pode surgir espontaneamente, na ausência de qualquer distúrbio subjacente. O diabetes insípido da defi - ciência de ADH é designado como central para diferenciá-lo do diabetes insípido nefrogênico, que resulta da incapacidade de resposta tubular renal ao ADH circulante. As manifestações clínicas dessas duas doenças são similares e incluem a excreção de grandes volumes de urina diluída com uma gravidade espe- cífi ca inapropriadamente baixa. O sódio sérico e a osmolali- dade estão aumentados como resultado da perda renal excessiva de água livre, resultando em sede e polidipsia. Os pacientes que podem beber água geralmente compensam as perdas uriná- rias; os pacientes que estão obtundidos, acamados ou limita- dos de outra forma em sua capacidade de obter água podem desenvolver desidratação com risco de vida. Síndrome da secreção inapropriada de ADH (SIADH). O excesso de ADH causa reabsorção de quantidades excessivas de água livre, resultando em hiponatremia. As causas mais frequentes da SIADH incluem a secreção do ADH ectópico por neoplasias malignas (particularmente carcinomas de células pequenas do pulmão), drogas que aumentam a secreção de ADH e uma variedade de distúrbios do sistema nervoso central, inclusive infecções e traumas.6 As manifestações clínicas da SIADH são dominadas por hiponatremia, edema cerebral e disfunção neurológica resultante. Embora a água corporal total esteja aumentada, o volume sanguíneo permanece normal e o edema periférico não se desenvolve. Tumores Hipotalâmicos Suprasselares As neoplasias nesta localização podem induzir hipofunciona- mento ou hiperfuncionamento da adeno-hipófi se, diabetes insí- pido ou combinações destas manifestações. As lesões mais comumente implicadas são os gliomas (algumas vezes surgindo no quiasma; Cap. 28) e os craniofaringiomas. Sabe-se que os cra- niofaringiomas são derivados dos remanescentes vestigiais da fenda de Rathke. Estes tumores de crescimento lento são respon- sáveis por 1% a 5% dos tumores intracranianos; uma pequena minoria destas lesões surge dentro da sela, mas a maioria é suprasselar, com ou sem extensãointrasselar. Uma distribuição bimodal da idade é observada, com um pico na infância (5 a 15 anos) e um segundo pico em adultos de 65 anos de idade ou mais velhos. Os pacientes geralmente chamam a atenção por causa das dores de cabeça e dos distúrbios visuais, enquanto as crianças podem apresentar retardo no crescimento decorrente do hipo- funcionamento da hipófi se e da defi ciência de HC. Anormalida- des na via de sinalização WNT, inclusive mutações ativadoras da !-catenina, foram relatadas nos craniofaringiomas. Morfologia. Os craniofaringiomas medem em média 3 a 4 cm de diâmetro; eles podem ser encapsulados e sólidos, mas são, mais comumente, císticos e algumas vezes multilobulados. Em sua localização estratégica, eles fre- quentemente ultrapassam os limites do quiasma óptico ou dos nervos craniais, e não raramente se projetam para o assoalho do terceiro ventrículo e para a base do cérebro. Duas variantes histológicas distintas são reconhecidas: o craniofaringioma adamantinomatoso (mais frequente- mente observado em crianças) e o craniofaringioma papilar (mais frequentemente observado em adultos). O tipo adamantinomatoso contém, com frequência, calcifi- cações radiologicamente visíveis; a variante papilar rara- mente se calcifica. O craniofaringioma adamantinomatoso consiste em ninhos ou cordões de epitélio pavimentoso estratificado embebido em um “retículo” esponjoso que se torna mais proeminente nas camadas internas. Uma paliçada de epi- télio pavimentoso é frequentemente observada na perife- ria. A formação de queratina lamelar compacta (“queratina úmida”) é uma característica diagnóstica deste tumor (Fig. 24-7). Como mencionado anteriormente, a calcifica- ção distrófica é um achado frequente. Características adicionais incluem a formação de cistos, fibrose e reação CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino 1115 inflamatória crônica. Os cistos do craniofaringioma ada- mantinomatoso geralmente contêm um fluido amarelo- pardacento, espesso e rico em colesterol, que foi comparado com “óleo de máquina”. Estes tumores esten- dem projeções de epitélio para o cérebro adjacente, onde evocam uma reação glial enérgica. O craniofaringioma papilar contém tanto lâminas quanto papilas sólidas delimitadas por um epitélio pavi- mentoso bem diferenciado. Estes tumores geralmente não possuem queratina, calcificações e cistos. As células pavimentosas dos cortes sólidos do tumor não apresen- tam paliçadas periféricas e tipicamente não geram um retículo esponjoso nas camadas internas. Os pacientes com craniofaringiomas, especialmente aqueles <5 cm em diâmetro, têm uma sobrevivência completa e livre de recorrências. Lesões maiores são mais invasivas, mas isto não afeta o prognóstico. A transfor- mação maligna do craniofaringioma em carcinoma pavi- mentoso é excepcionalmente rara e geralmente ocorre após a irradiação. FIGURA 24-7 Craniofaringioma adamantinomatoso, demonstrando queratina “úmida” lamelar e compacta característica (metade direita da fotomicrografia) e cordões de epitélio pavimentoso com paliçadas periféricas à esquerda. (Cortesia do Dr. Charles Eberhart, Department of Pathology, Johns Hopkins University, Baltimore, MD.) GLÂNDULA TIREOIDE A glândula tireoide consiste em dois lobos laterais volumosos conectados por um istmo relativamente fi no, geralmente locali- zados abaixo e anteriormente à laringe. A tireoide é dividida em lóbulos, compostos de 20 a 40 folículos uniformemente distribuí- dos, por um septo fi broso e estreito, revestidos por um epitélio cuboide a colunar e repletos com tiroglobulina PAS-positiva. Em resposta aos fatores hipotalâmicos, o TSH (tireotrofi na) é libe- rado pelos tireotrofos da adeno-hipófi se para dentro da circula- ção. A ligação do TSH a seu receptor no epitélio folicular tireoidiano resulta em uma mudança conformacional e ativação do seu receptor, permitindo que ele se associe à proteína Gs (Fig. 24-8). A ativação da proteína G eventualmente resulta em um aumento nos níveis intracelulares do AMPc, o que estimula o crescimento da tireoide, a síntese e liberação dos hormônios através das proteínas cinases dependentes do AMPc. A dissocia- ção da síntese e liberação do hormônio da tireoide da infl uência controlada das vias de sinalização do TSH resulta na chamada autonomia tireoidiana e em hiperfuncionamento (veja adiante). As células epiteliais foliculares tireoidianas convertem a tiro- globulina em tiroxina (T4) e quantidades menores de triiodotiro- nina (T3). O T4 e o T3 são liberados na circulação sistêmica, onde a maioria destes peptídeos está reversivelmente ligada às proteí- nas plasmáticas circulantes, como a globulina ligante de tiroxina e transtiretina, para transporte aos tecidos periféricos. As proteí- nas de ligação servem para manter as concentrações séricas de T3 e T4 não ligados (livres) dentro de limites rigorosos, assegurando ainda que os hormônios estejam prontamente disponíveis aos tecidos. Na periferia, a maioria do T4 livre está deiodinizado a T3; o último se liga aos receptores nucleares do hormônio tireoidiano nas células-alvo com uma afi nidade dez vezes maior do que o T4 e tem uma atividade proporcionalmente maior. A interação do hormônio tireoidiano com seu receptor nuclear do hormônio tireoi- diano (TR) resulta na formação de complexo hormônio multipro- teico-receptor que se liga aos elementos de resposta ao hormônio tireoidiano (ERTs) em genes-alvo, regulando sua transcrição (Fig. 24-8). O hormônio tireoidiano tem diversos efeitos celulares, incluindo a regulação positiva do catabolismo de carboidratos e lipídios e a estimulação da síntese proteica em uma ampla varie- dade de células. O resultado fi nal desses processos é um aumento na taxa metabólica basal. Uma das funções mais importantes do hormônio tireoidiano é seu papel fundamental no desenvolvi- mento cerebral do feto e do recém-nascido (ver adiante). O funcionamento da glândula tireoide pode ser inibido por uma variedade de agentes químicos coletivamente conhecidos como goitrógenos. Como eles suprimem a síntese de T3 e T4, o nível de TSH aumenta e um subsequente aumento hiperplásico da glândula (bócio) ocorre. O agente antitireoidiano propiltioura- cil inibe a oxidação do iodeto e logo bloqueia a produção dos hormônios tireoidianos; parenteticamente, o propiltiouracil também inibe a deiodinização periférica do T4 circulante em T3, logo melhorando os sintomas do excesso de hormônio tireoi- diano (veja adiante). O iodeto, quando dado a indivíduos com hiperfuncionamento da tireoide, também bloqueia a liberação dos hormônios tireoidianos, mas através de mecanismos diferen- tes. Os iodetos em altas doses inibem a proteólise da tiroglobu- lina. Logo, o hormônio tireoidiano é sintetizado e incorporado dentro de quantidades crescentes de coloide, mas não é liberado para o sangue. Os folículos da glândula tireoide também contêm uma popu- lação de células parafoliculares, ou células C, as quais sintetizam e 1116 CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino secretam o hormônio calcitonina. Este hormônio promove a absorção de cálcio pelo sistema esquelético e inibe a reabsorção de osso pelos osteoclastos. As doenças da tireoide incluem condições associadas à libe- ração excessiva de hormônios tireoidianos (hipertireoidismo), aquelas associadas à defi ciência do hormônio tireoidiano (hipotireoidismo) e as lesões de massa da tireoide. Considera- remos primeiro as consequências clínicas da função tireoidiana perturbada, e então focaremos nos distúrbios que geram esses problemas. Hipertireoidismo A tirotoxicose é um estado hipermetabólico causado por níveis circulantes elevados de T3 e T4 livres. Como essa condição é causada mais comumente pelo hiperfuncionamento da glândula tireoide, é frequentemente conhecida como hipertireoidismo. No entanto, em certas condições o suprimento excessivo está relacio- nado tanto com a liberação excessiva do hormônio tireoidiano pré-formado (p. ex., na tireoidite) quanto com uma fonteextra- tireoidiana, mais do que com o hiperfuncionamento da glândula (Tabela 24-3). Logo, falando estritamente, o hipertireoidismo é somente uma (embora a mais comum) das causas da tirotoxicose. Os termos hipotireoidismo primário e secundário são algumas vezes utilizados para designar o hipertireoidismo que surge de uma anormalidade intrínseca da tireoide e aquele que surge de processos externos à tireoide, como um tumor hipofi sário secre- tor de TSH. Com essa advertência, seguiremos a prática comum de usar os termos tirotoxicose e hipertireoidismo alternadamente. As três causas mais comuns de tirotoxicose estão também asso- ciadas ao hiperfuncionamento da glândula e incluem o seguinte: Hiperplasia difusa da tireoide associada à doença de Graves (responsável por 85% dos casos). Bócio multinodular hiperfuncionante. Adenoma hiperfuncional da tireoide. Curso Clínico. As manifestações clínicas do hipertireoidismo são variáveis e incluem mudanças conhecidas como estado hiper- metabólico induzido pelo excesso de hormônio tireoidiano e pela superatividade do sistema nervoso simpático (i.e., um aumento no “tônus” !-adrenérgico). Os níveis excessivos do hormônio tireoidiano resultam em um aumento na taxa metabólica basal. A pele dos pacientes tiro- tóxicos tende a ser macia, quente e ruborizada por causa do fl uxo sanguíneo aumentado e da vasodilatação periférica para aumen- tar a perda de calor. A intolerância ao calor é comum. A sudorese é aumentada por causa dos altos níveis de calorigênese. A taxa metabólica basal aumentada também resulta em perda de peso aumentada a despeito do apetite aumentado. As manifestações cardíacas estão entre as mais precoces e mais consistentes características do hipertireoidismo. Os indivíduos com hipertireoidismo podem ter um aumento do débito cardíaco, decorrente tanto da contratilidade aumentada do coração quanto da necessidade periférica de oxigênio aumentada. Taquicardia, TRH Hipófise Tireoide T3, T4 T3, T4 Receptor do hormônio tireoidiano Gene- alvo TSH Receptor de TSH Proteína G GTP GDP AMPc G Expressão gênica em FIGURA 24-8 Homeostasia no eixo hipotálamo-hipófise-tireoide e mecanismo de ação dos hormônios tireoidianos. A secreção de hormô- nios tireoidianos (T3 e T4) é controlada por fatores tróficos secretados tanto pelo hipotálamo quanto pela adeno-hipófise. Os níveis diminuí dos de T3 e T4 estimulam a liberação do hormônio liberador de tireotrofina (TRH) a partir do hipotálamo e do hormônio estimulador da tireoide (TSH) a partir da adeno-hipófise, fazendo com que os níveis de T3 e T4 aumentem. Os níveis elevados de T3 e T4, por sua vez, retroalimen- tam a supressão da secreção tanto do TRH quanto do TSH. O TSH se liga ao receptor de TSH no epitélio folicular tireoidiano, o que causa a ativação das proteínas G e a síntese e liberação dos hormônios tireoi- dianos (T3 e T4), mediadas pelo AMPc. Na periferia, T3 e T4 interagem com o receptor do hormônio tireoidiano (TR) para formar um complexo hormônio-receptor que se transloca para o núcleo e se liga aos cha- mados elementos de resposta ao hormônio tireoidiano (ERTs) nos genes-alvo para iniciar a transcrição. TABELA 24–3 Distúrbios Associados à Tirotoxicose ASSOCIADOS AO HIPERTIREOIDISMO Primário Hiperplasia tóxica difusa (doenças de Graves) Bócio multinodular hiperfuncionante (“tóxico”) Adenoma hiperfuncionante (“tóxico”) Hipertireoidismo induzido por iodeto Tirotoxicose neonatal associada a doença de Graves materna Secundário Adenoma hipofisário secretor de TSH (raro)* NÃO ASSOCIADO AO HIPERTIREOIDISMO Tireoidite (dolorosa) granulomatosa (de De Quervain) Tireoidite (indolor) linfocítica subaguda Struma ovarii (teratoma ovariano com tireoide ectópica) Tirotoxicose factícia (ingestão exógena de tiroxina) *Associada ao hormônio estimulador da tireoide (TSH) aumentado; todas as outras causas de tirotoxicose associadas ao TSH diminuído. CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino 1117 palpitações e cardiomegalia são comuns. As arritmias, particular- mente fi brilação atrial, ocorrem frequentemente e são mais comuns em pacientes idosos. Insufi ciência cardíaca congestiva pode se desenvolver, particularmente em pacientes idosos com doença cardíaca preexistente. Mudanças miocárdicas, como focos de infi ltração linfocítica e eosinofílica, fi brose leve no interstício, mudanças adiposas nas miofi bras e aumento no tamanho e no número de mitocôndrias, foram descritas. Alguns indivíduos com tirotoxicose desenvolvem disfunção ventricular esquerda reversível e insufi ciência cardíaca “de baixo débito”, conhecidas como mio- cardiopatias tirotóxica ou hipertireoidiana. No sistema neuromuscular, a superatividade do sistema nervoso simpático produz tremor, hiperatividade, labilidade emocional, ansiedade, incapacidade de concentração e insônia. Fraqueza muscular proximal e massa muscular diminuída são comuns (miopatia tireoidiana). Mudanças oculares frequentemente chamam a atenção para o hipertireoidismo. Um olhar fi xo e arregalado e movimento lento da pálpebra superior estão presentes por causa da superestimu- lação simpática do levantador de pálpebra superior (Fig. 24-9). No entanto, a oftalmopatia tireoidiana associada à proptose é vista somente na doença de Graves (ver adiante). No sistema gastrointestinal, a hiperestimulação sistêmica do intestino resulta em hipermotilidade, má absorção e diarreia. O sistema esquelético também é afetado. O hormônio tireoi- diano estimula a reabsorção óssea, aumentando a porosidade do osso cortical e reduzindo o volume do osso trabecular. O efeito fi nal é a osteoporose e um risco aumentado de fraturas em pacientes com hipertireoidismo crônico. Outros achados incluem atrofi a do músculo esquelético, com infi ltração gordurosa e infi ltrados linfocíticos intersticiais focais; dilatação hepática mínima devida às alterações adiposas nos hepatócitos; e hiperplasia linfoide generalizada e linfadenopatia em pacientes com doença de Graves. O termo tempestade tireoidiana é usado para designar um início abrupto de hipertireoidismo grave. Esta condição ocorre mais comumente em pacientes com doença de Graves subjacente e resulta provavelmente de uma elevação aguda nos níveis das catecolaminas, que pode ser encontrada durante infecção, cirur- gia, interrupção de medicamentos antitireoidianos ou qualquer forma de estresse. Os pacientes estão frequentemente febris e apresentam taquicardia fora da proporção da febre. A tempestade tireoidiana é uma emergência médica: Um número signifi cativo de pacientes não tratados morre de arritmias cardíacas. O hipertireoidismo apatético se refere à tirotoxicose ocorrendo em idosos, nos quais a idade avançada e as várias comorbidades podem ofuscar as características típicas do excesso de hormônio tireoidiano visto em pacientes mais jovens. O diagnóstico da tiro- toxicose nesses indivíduos é frequentemente feito durante a busca laboratorial por perda de peso inexplicada ou piora de doença cardiovascular. O diagnóstico de hipertireoidismo é feito utilizando-se tanto achados clínicos quanto laboratoriais. A mensuração da concen- tração sérica de TSH utilizando-se um ensaio sensível ao TSH fornece o teste de mapeamento simples mais útil para o hiperti- reoidismo, já que seus níveis estão diminuídos mesmo em está- gios mais iniciais, quando a doença ainda pode ser subclínica. Um valor baixo de TSH é geralmente confirmado com a men- suração do T4 livre, o qual está esperadamente aumentado. Em um paciente ocasional, o hipertireoidismo resulta predominan- temente de níveis circulantes de T3 aumentados (“toxicose de T3”). Nestes casos, os níveis de T4 livres podem estar diminuídos e a mensuração direta do T3 sérico pode ser útil. Em casos raros de hipertireoidismo associados à hipófi se (secundários), os níveis de TSH estão normais ou aumentados. A determinação dos níveis de TSH após a injeção do hormônio liberador de tirotrofi na (teste de estimulação do TRH) é usadana avaliação dos casos de hipertireoidismo com mudanças equivocadas no nível sérico basal de TSH. Um aumento normal no TSH após a administra- ção de TRH exclui o hipertireoidismo secundário. Uma vez que o diagnóstico de tirotoxicose tenha sido confi rmado por uma combinação de ensaios de TSH e níveis do hormônio tireoidiano livre, a mensuração da captação do iodeto radioativo pela glân- dula tireoidiana pode ser valiosa na determinação da etiologia. Por exemplo, pode haver captação difusamente aumentada em toda a glândula (doença de Graves), captação aumentada em um nódulo solitário (adenoma tóxico) ou uma captação diminuída (tireoidite). As opções terapêuticas para o hipertireoidismo incluem medicações múltiplas, e cada uma delas tem um mecanismo dife- rente de ação. Tipicamente, estes mecanismos incluem um blo- queador-! para controlar os sintomas induzidos pelo tônus adrenérgico aumentado, uma tionamida para bloquear a síntese de novos hormônios, uma solução de iodo para bloquear a libe- ração do hormônio tireoidiano e agentes que inibam a conversão periférica de T4 em T3. O radioiodo, que é incorporado em tecidos tireoidianos, resultando em ablação da função tireoidiana por um período de 6 a 18 semanas, também pode ser usado. Hipotireoidismo O hipotireoidismo é causado por qualquer desarranjo estrutural ou funcional que interfi ra com a produção de níveis adequados do hormônio tireoidiano. O hipotireoidismo é um distúrbio razoavelmente comum e, pela estimativa de alguns, a prevalência do hipotireoidismo aparente na população é de 0,3%, enquanto o hipotireoidismo subclínico pode ser encontrado em mais de 4%.7 A prevalência do hipotireoidismo aumenta com a idade, e é FIGURA 24-9 Uma pessoa com hipertireoidismo. Um olhar fixo e arregalado, causado pela superatividade do sistema nervoso simpático, é uma das características deste distúrbio. Na doença de Graves, uma das mais importantes causas de hipertireoidismo, o acúmulo de tecido conjuntivo frouxo atrás dos globos oculares também contribui para a aparência protuberante dos olhos. 1118 CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino aproximadamente dez vezes mais comum em mulheres do que em homens. Esse distúrbio pode resultar de um defeito em algum lugar do eixo hipotalâmico-hipofi sário-tireoidiano. Como no caso do hipertireoidismo, o distúrbio é dividido nas categorias primária e secundária, dependendo da origem do hipotireoi- dismo: se ele surge de uma anormalidade intrínseca na própria tireoide ou se ocorre como resultado de uma doença hipofi sária ou hipotalâmica (Tabela 24-4). O hipotireoidismo primário é responsável pela grande maioria dos casos de hipotireoidismo e pode ser acompanhado por um aumento no tamanho da glân- dula tireoide (bócio). O hipotireoidismo primário pode ser con- gênito, adquirido ou autoimune. Pelo mundo, o hipotireoidismo congênito é mais frequente- mente resultante de uma defi ciência endêmica de iodo na dieta (veja adiante). Outras formas menos comuns de hipotireoidismo congênito inclui erros inatos do metabolismo tireoidiano (bócio desormonogenético); por isso, qualquer um dos múltiplos passos que levam à síntese do hormônio da tireoide pode estar defi - ciente, tais como (1) transporte do iodo para dentro dos tirócitos, (2) “organifi cação” do iodo (ligação do iodo aos resíduos de tiro- sina da proteína de armazenamento, tiroglobulina) e (3) acopla- mento de iodotirosina para formar T3 e T4 hormonalmente ativos. Mutações no gene da peroxidase tireoidiana (TPO) são a causa mais comum de bócio disormonogenético. A síndrome de Pendred, caracterizada por hipotireoidismo e surdez sensorineural, é causada por mutações no gene SLC26A4, cujo produto, a pen- drina, é um transportador de ânions expressado na superfície apical dos tirócitos e no ouvido interno.8 Em casos raros, pode haver ausência completa de parênquima tireoidiano (agenesia tireoidiana) ou a glândula pode estar grandemente reduzida em tamanho (hipoplasia tireoidiana). Mutações na linhagem germi- nativa de fatores de transcrição que são expressos na tireoide em desenvolvimento e regulam a diferenciação folicular, como o fator de transcrição tireoidiano (TTF-2), também conhecido como FOXE1, e o “paired box-8” (PAX-8), foram relatadas em indiví- duos com agenesia da tireoide. Estes pacientes apresentam tipi- camente uma constelação de malformações extratireoidianas. Mutações na linhagem germinativa do receptor de TSH (TSHR) são causas genéticas raras de hipotireoidismo isolado (note que as mutações somáticas ativadoras do TSHR são encontradas em nódulos tireoidianos autônomos, veja adiante). A síndrome da resistência ao hormônio tireoidiano é um distúrbio autossômico dominante raro, causado por mutações herdadas no receptor do hormônio tireoidiano, que suprimem a habilidade do receptor de se ligar ao hormônio tireoidiano. Os pacientes demonstram resis- tência generalizada ao hormônio tireoidiano, a despeito dos altos níveis de T3 e T4 circulantes. Já que a hipófi se também é resistente à retroalimentação dos hormônios tireoidianos, os níveis de TSH também tendem a ser altos. O hipotireoidismo adquirido pode ser causado por ablação induzida por cirurgia ou radiação do parênquima da tireoide. Uma grande ressecção da glândula (tireoidectomia total) para o trata- mento do hipertireoidismo de uma neoplasia primária pode levar ao hipotireoidismo. A glândula também pode ser ablacionada pela radiação, seja na forma de radioiodo administrado para o tratamento do hipertireoidismo, ou por radiação exógena, como uma terapia de radiação externa para o pescoço. Drogas dadas intencionalmente para diminuir a secreção da tireoide (p. ex., metimazol e propiltiouracil) podem causar hipotireoidismo adquirido, assim como agentes usados para tratar condições não tireoidianas (p. ex., lítio, ácido p-aminosalicílico). O hipotireoidismo autoimune é a causa mais comum de hipo- tireoidismo em áreas do mundo com iodo sufi ciente. A grande maioria dos casos de hipotireoidismo autoimune é decorrente da tireoidite de Hashimoto. Anticorpos circulantes, incluindo anti- corpos antimicrossomais, antiperoxidase tireoidiana e antitiroglo- bulina, são encontrados neste distúrbio e a tireoide está geralmente aumentada (bociosa). O hipotireoidismo autoimune pode ocorrer isoladamente ou em conjunto com a síndrome poliendócrina autoimune (APS), tipos 1 e 2 (ver a discussão em “Glândulas Suprarrenais”). O hipotireoidismo secundário (ou central) é causado pela defi ciência de TSH e, muito mais raramente, pela defi ciência do TRH. Qualquer uma das causas do hipopituitarismo (p. ex., tumor hipofi sário, necrose hipofi sária pós-parto, trauma e tumores não hipofi sários) ou de danos hipotalâmicos por tumores, trauma, terapia de radiação ou doenças infi ltrativas pode causar hipoti- reoidismo central. As manifestações clínicas clássicas de hipotireoidismo incluem o cretinismo e o mixedema. CRETINISMO O cretinismo se refere ao hipotireoidismo que se desenvolve no período da lactância. O termo cretino foi derivado do francês chrétien, que signifi ca “cristão” ou “semelhante a Cristo”, e foi aplicado aos sofredores dessa doença porque eles foram conside- rados como mentalmente retardados e, portanto, incapazes de pecar. No passado, este distúrbio ocorreu muito mais comumente em áreas do mundo onde a defi ciência alimentar de iodo era endêmica, como o Himalaia, o interior da China, a África e outras áreas montanhosas. Ele se tornou muito menos frequente nos últimos anos, como resultado da suplementação mundial de ali- mentos com iodo. Em raras ocasiões, o cretinismo pode resultar também de erros inatos no metabolismo que interferem com a biossíntese dos níveis normais do hormônio tireoidiano (bócio desormonogenético, ver anteriormente). As características clínicas do cretinismo incluem desenvolvi- mento prejudicado do sistema esquelético e do sistema nervoso central, manifestado por retardo mental grave, estaturabaixa, características faciais grosseiras, língua projetada e hérnia umbilical. A gravidade do prejuízo mental no cretinismo parece estar rela- cionada com o tempo em que a defi ciência tireoidiana ocorre no útero. Normalmente, hormônios maternais, inclusive T3 e T4, TABELA 24–4 Causas do Hipotireoidismo PRIMÁRIAS Desenvolvimentista (disgenesia tireoidiana: PAX8, FOXE1, mutações no receptor de TSH) Síndrome da resistência ao hormônio tireoidiano (mutações THRB) Pós-ablativas Cirurgia, terapia com radioiodo ou irradiação externa Hipotireoidismo autoimune Tireoidite de Hashimoto* Deficiência de iodo* Drogas (lítio, iodetos e ácido p-aminossalicílico) Defeitos biossintéticos congênitos (bócio desormonogenético)* SECUNDÁRIAS (CENTRAIS) Falência hipofisária Falência hipotalâmica (rara) * Associadas ao aumento da tireoide (“hipotireoidismo bocioso”). A tireoidite de Hashimoto e o hipotireoidismo pós-ablativo são responsáveis pela maioria dos casos de hipotireoidismo nos países desenvolvidos. FOXE1, forkhead box 1; PAX8, paired box 8; THRB, receptor ! do hormônio tireoidiano. CAPÍTULO 24 O Sistema Endócrino 1119 atravessam a placenta e são críticos para o desenvolvimento cere- bral do feto. Se há uma defi ciência tireoidiana materna antes do desenvolvimento da glândula tireoide fetal, o retardo mental é grave. Em contraste, a redução nos hormônios tireoidianos maternos mais tardiamente na gravidez, após o desenvolvimento da tireoide fetal, permite o desenvolvimento normal do cérebro. MIXEDEMA O termo mixedema é aplicado ao hipotireoidismo que se desen- volve em crianças mais velhas ou em adultos. O mixedema, ou doença de Gull, foi ligado à disfunção tireoidiana, pela primeira vez, em 1873 por Sir William Gull em um artigo voltado para o desenvolvimento de um “estado cretinoide” em adultos.9 As manifestações clínicas variam com a idade de início da defi ciên- cia. As crianças mais velhas mostram sinais e sintomas interme- diários entre aqueles dos cretinos e aqueles de adultos com hipotireoidismo. No adulto, a condição aparece insidiosamente e pode levar anos para alcançar o nível de suspeita clínica. Os aspectos clínicos do mixedema são caracterizados por lenti- dão das atividades física e mental. Os sintomas iniciais incluem fadiga generalizada, apatia e preguiça mental, o que pode mime- tizar a depressão nos estágios iniciais da doença. As funções de linguagem e intelectuais se tornam lentas. Os pacientes com mixedema são apáticos, intolerantes ao frio e frequentemente estão acima do peso. A atividade simpática diminuída resulta em constipação e sudorese diminuída. A pele desses pacientes é fria e pálida devido à redução do fl uxo sanguíneo. O débito cardíaco reduzido provavelmente contribui para o encurtamento da res- piração e a capacidade de exercício reduzida, duas reclamações frequentes em indivíduos com hipotireoidismo. Os hormônios tireoidianos regulam a transcrição de diversos genes sarcolêmi- cos, como as ATPases de cálcio, cujos produtos codifi cados são críticos para a manutenção do débito cardíaco efi ciente. Além disso, o hipotireoidismo promove um perfi l aterogênico – aumento dos níveis de colesterol total e lipoproteína de baixa densidade (LDL) –, provavelmente contribuindo para as taxas de mortalidade cardiovascular adversa nesta doença. Histologica- mente há um acúmulo de substâncias matriciais, como os glico- saminoglicanos e o ácido hialurônico, na pele, no tecido subcutâneo e em vários pontos viscerais. Isso resulta em edema não depressível, um alargamento e engrossamento das caracterís- ticas faciais, aumento da língua e aprofundamento da voz. A avaliação laboratorial desempenha um papel vital no diag- nóstico do hipotireoidismo suspeitado devido à natureza não específi ca dos sintomas. Pacientes com aumento inexplicado no peso corporal ou hipercolesterolemia devem ser avaliados para um potencial hipotireoidismo. A mensuração dos níveis séricos de TSH é o teste de mapeamento mais sensível para este distúrbio. O nível de TSH está aumentado no hipotireoidismo primário como resultado da perda da inibição retroativa do TRH e da produção de TSH pelo hipotálamo e pela hipófi se, respectivamente. O nível de TSH não está aumentado em pessoas com hipotireoidismo decorrente de doença hipotalâmica ou hipófi se primária. Os níveis de T4 estão diminuídos em indivíduos com hipotireoidismo de qualquer origem. Tireoidite A tireoidite, ou infl amação da glândula tireoide, abrange um grupo diverso de distúrbios caracterizados por algumas formas de infl amação da tireoide. Estas doenças incluem condições que resultam em doença aguda com dor grave na tireoide (p. ex., tireoidite infecciosa, tireoidite granulomatosa subaguda) e distúr- bios nos quais há relativamente pouca infl amação e a doença é manifestada primariamente por disfunção tireoidiana – tireoidite linfocítica subaguda e tireoidite fi brosa (Reidel). A tireoidite infecciosa pode ser aguda ou crônica. As infecções agudas podem alcançar a tireoide através da disseminação hema- tógena ou através da semeadura direta da glândula, como através de uma fístula do seio piriforme adjacente à laringe. Outras infec- ções da tireoide, inclusive as infecções micobacterianas, fúngicas e por Pneumocystis, são mais crônicas e frequentemente ocorrem em pacientes imunocomprometidos. Qualquer que seja a causa, o envolvimento infl amatório pode causar um início súbito de dor no pescoço e sensibilidade na área da glândula e é acompanhada por febre, calafrios e outros sinais de infecção. A tireoidite infec- ciosa pode ser autolimitada ou pode ser controlada com a terapia apropriada. A função tireoidiana geralmente não é signifi cativa- mente afetada, e há poucos efeitos residuais exceto por pequenos possíveis focos de cicatrização. Esta seção foca nos tipos mais comuns e clinicamente signifi cativos de tireoidite: (1) tireoidite de Hashimoto, (2) tireoidite granulomatosa (de Quervain) e (3) tireoidite linfocítica subaguda. TIREOIDITE DE HASHIMOTO A tireoidite de Hashimoto é a causa mais comum de hipotireoi- dismo em áreas do mundo onde os níveis de iodo são sufi cientes. O nome tireoidite de Hashimoto é derivado do relato de Hashi- moto, de 1912, descrevendo pacientes com bócio e intenso infi l- trado linfocítico da tireoide (struma lymphomatosa).10 A tireoidite de Hashimoto e a doença de Graves (veja adiante) são os dois distúrbios mediados imunologicamente mais comuns da tireoide. A tireoidite de Hashimoto é caracterizada por falência gradual da tireoide devido à destruição autoimune da glândula tireoide. Este distúrbio é mais prevalente entre 45 e 65 anos de idade e é mais comum em mulheres do que em homens, com a predominância feminina de 10:1 a 20:1. Embora seja primariamente uma doença de mulheres mais velhas, ela pode ocorrer em crianças e é a maior causa de bócio não endêmico na população pediátrica. Analogamente a outras doenças autoimunes, a tireoidite de Hashimoto tem um forte componente genético. Isso é confi r- mado pela concordância da doença em até 40% de gêmeos mono- zigóticos, assim como a presença de anticorpos antitireoidianos circulantes em aproximadamente 50% dos irmãos assintomáticos dos pacientes com Hashimoto. A suscetibilidade aumentada da tireoidite de Hashimoto está associada a polimorfi smos em múl- tiplos genes associados à regulação imunológica, sendo o mais signifi cativo a ligação aos polimorfi smos do antígeno associado ao linfócito T citotóxico 4 (CTLA4).11 O CTLA4 é um regulador nega- tivo das respostas da célula T e, não surpreendentemente, os polimorfi smo do gene CTLA4 que resultam em nível reduzido da proteína ou de sua função estão associados a uma predisposição para a doença autoimune. Outro determinante genético da sus- cetibilidade para a tireoidite de Hashimoto, recentemente des- crito, é o polimorfi smo funcional no gene da proteína tirosina fosfatase-22 (PTNP22) que codifi ca uma tirosina fosfatase lin- foide,
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