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Uma questão de identidade e representatividade

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MAQUIAGEM NEGRA: UMA QUESTÃO DE IDENTIDADE E 
REPRESENTATIVIDADE 
 
Lorena Letícia Silva de Aquino de Freitas
1
 
Orientadora: Renata Oliveira dos Santos
2
 
 
RESUMO: O presente artigo estuda a maquiagem de pele negra feminina, 
problematizando sua apresentação como ferramenta do empoderamento feminino 
na busca da representatividade da mulher negra. Pensando em feminismo e web, o 
artigo propõe o vislumbre de uma nova ferramenta que contribua para repensar o 
papel, lugar e beleza da mulher negra mediante a reflexão do Instagram da 
blogueira Camila Nunes. 
 
Palavras-chave: Maquiagem. Mulher Negra. Representatividade. 
 
Introdução 
O presente trabalho tem como objeto de pesquisa a blogueira negra Camila 
Nunes. A mesma faz uso da rede social Instagram para dar dicas sobre maquiagem 
direcionada para mulheres negras. 
Para compreender de que maneira a blogueira pode utilizar desse espaço 
para imprimir uma nova forma de discutir empoderamento feminino negro, foi 
realizada uma pesquisa detalhada de algumas de suas postagens e comentários 
nessa rede social. Além disso, essa pesquisa se baseou em algumas referências 
bibliográficas fundamentais para trilhar um caminho que possibilite pensar o tema 
como feminilidades negras e representatividade quando o viés se pauta na beleza 
feminina. Por se tratar de um objeto da WEB também foram utilizados alguns blogs 
que discutem a negritude, para auxílio na pesquisa. Para isso, o uso do método de 
análise intitulado Modelo de Lasswell, da teoria de comunicação, embasará como 
será possível observar essas questões por meio das seguintes perguntas: Quem? 
Diz o quê? Através de que Canal? A quem? Com que efeito? (WOLF, 2009). 
 
Este texto é resultado de trabalho realizado junto ao Programa de Iniciação científica da Faculdade 
Metropolitana de Maringá no ano de 2016. 
1
 Acadêmica do curso de Publicidade e Propaganda (UNIFAMMA). 
2
 Docente do curso de Publicidade e Propaganda – Mestre em Ciências Sociais (Universidade 
Estadual de Maringá). 
 
 
 
Existe uma “identidade mestra“ que serve de parâmetro para as pessoas 
serem incluídas – ou não – na cultura. Para Seffner (2015), a identidade vigente é 
permeada pelo masculino, heterossexual, branco, cristão e de classe média. Quem 
não se enquadra nessas prerrogativas culturais, afasta-se da norma e compõe os 
grupos marginalizados. Os referidos grupos são intitulados de minorias culturais, 
uma vez que não se referem à quantidade, mas às relações de poder e voz ativa na 
sociedade. Entre elas estão os/as não brancos/as, os/as moradores do norte e 
nordeste brasileiro, os/as gordos/as, os/as homossexuais e os/as pobres, apenas 
para citar alguns exemplos. 
Neste sentido, trabalhamos, neste artigo, com uma dessas minorias culturais: 
a mulher negra que se afasta da norma, daquilo que é estabelecido como padrão, 
porque além de ser mulher – e não homem – é negra – e não branca. Dessa 
maneira, como afirma Hall (1992), a identidade não é mais fixa, vitalícia e 
permanente, a identidade do sujeito pode ser reinventada constantemente, e isso 
pode ser decisivo quando nos permitimos a debater a questão de gênero e o 
feminismo. 
Nisso, existe a necessidade de reiventar ou repensar o movimento feminista, 
no que tange as mulheres negras, pois ficou preso, por muito tempo, ao 
eurocentrismo, deixando de lado outros aspectos femininos que não o sexismo3, 
esquecendo, momentaneamente, que as mulheres podem ser pardas, brancas, 
negras, indígenas e sofrem preconceitos e estigmatizações diferentes uma das 
outras (CARNEIRO, 2003). 
Esse artigo foi baseado no momento em que reconhecemos que existe 
também um empoderamento feminista negro a partir do próprio mercado de 
produtos e serviços que começa a sair do eurocentrismo, notando as outras formas 
de ser mulher presente na realidade social e cultural. São nesses eventos sociais 
que notamos visibilidade, enfatizando que a mulher negra vêm sendo representada, 
seja no mercado de trabalho, nas mídias e no segmento de maquiagem, ao passo 
que esta última é determinante para demarcar a sua identidade cultural. Sendo 
assim, nosso problema de pesquisa é: Quais feminilidades negras estão presentes 
no Instagram Camila Nunes sobre maquiagem? 
 
 
3
 Entendemos como imagens, comportamentos e ideias que alocam a mulher em um patamar inferior, se 
comparada ao homem, com base no sexo (MORENO, 1999). 
 
 
1. Questão de Gênero, Empoderamento Feminino e beleza negra 
Antes de apontarmos as feminilildades negras presentes no empoderamento 
feminino precisamos falar sobre a questão de gênero que na gramática (SCOTT, 
1989), é compreendido como meio de classificar fenômenos, sugerindo uma relação 
entre categorias que permite distinções ou agrupamentos separados. 
Sob a multidão de estudos em torno do conceito de sexo e sexualidade no 
decorrer da história, viu-se a necessidade de utilizar o termo gênero para indicar as 
construções sociais, uma vez que são manifestas por meio da ideia de papeis de 
homens e mulheres e as relações sociais entre os sexos. Esses usos descritivos 
utilizados pelos historiadores enfatizam todo um sistema de relações podendo incluir 
o sexo como sendo um fator biológico, mas não tratando-o como único no papel 
social do indivíduo (SCOTT, 1989). 
A questão de gênero pode ser resumida em três posições teóricas, baseadas 
nas abordagens na análise do gênero realizadas pelos/as historiadores/as 
feministas, que serão brevemente situadas abaixo. 
A primeira posição visa a explicação as origens do patriarcado cuja atenção 
está concentrada na subordinação das mulheres e encontram uma prerrogativa da 
dominação do macho sobre a mulher, principalmente no sentido reprodutivo da 
relação entre ambos. Uma analogia ao significado de trabalho – alienação do 
indivíduo social – para o marxismo: “Ele alia o ato à palavra, a construção à 
expressão, a percepção à coerção, o mito à realidade. “O homem come a mulher: 
sujeito, verbo, objeto” (SCOTT, 1989). 
 
Partindo dessa analogia, surge a segunda posição teórica oriunda dos 
primeiros debates entre feministas marxistas que rejeitavam o essencialismo 
presente na defesa da divisão sexual do trabalho pelo capitalismo; não reconheciam 
a determinação de forma direta as relações de gênero pelos sistemas econômicos; e 
buscavam, de certa forma, uma explicação materialista que excluísse as diferenças 
físicas e naturais (SCOTT, 1989). 
A terceira posição é inspirada nas várias escolas de psicanálise para explicar 
a produção e a reprodução da identidade de gênero do sujeito. Duas delas mais 
utilizadas foram a Escola Anglo-Americana, que aborda os termos de teorias de 
relações de objeto “Object Relations-Theory” e a Escola Francesa que se baseia nas 
 
 
leituras estruturalistas e pós-estruturalistas de Freud, no contexto das teorias da 
linguagem. Ambas escolas, tratam de forma geral, do processo o qual a identidade 
do sujeito foi criada, desde o desenvolvimento da criança e as indicações sobre a 
formação da identidade do gênero (SCOTT, 1989). 
Partindo dessa relação que as historiadoras feministas têm absorvido da 
questão de gênero, vemos ao longo dos anos a manifestação do empoderamento 
feminino – termo primeiro que não consta ainda no Dicionário da Língua Portuguesa, 
Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (2010), porém é o mesmo que apoderar-se, 
segundo o dicionário; Naila Kabber (1999), economista, feminista e especialista em 
gênero e pobreza, define empoderamento no contexto do feminismo, como um 
processo de capacidade – anteriormente negada – de fazer escolhas – diante do 
processo de formação de identidade desse gênero anteriormente abordado e 
detalhado. 
Ao longo dos anos, os processos de mudança e revisão do feminismo são 
vistos pelos setores democráticos e pelos formadoresde opinião como momentos 
de surgimento de novos conceitos e práticas. Conceitos tais referidos ao 
empoderamento feminino negro, por exemplo. Um ponto relevante a ressaltar do 
movimento feminista negro refere-se aos resultados, conquistas e contribuições 
gerados por intercâmbios políticos manifestos no meio social e comunicacional 
relatados na obra Feminismo Negro Diaspórico (SANTOS, 2007). 
A obra apresenta as experiências das mulheres negras e opressão sofrida por 
elas, dialogadas no contexto da Diáspora Africana, a fim de designar os diversos 
feminismos negros presentes na Diáspora. Santos (2007) classificou cinco correntes 
diferentes de representatividade do feminismo: o Afro-Latino Americano, o Afro-
Caribenho, o Afro-Americano, o Feminismo das negras britânicas e o Africano. Por 
meio dessa coleta de representações observou as práticas políticas e intelectuais de 
cada grupo e seus pontos em comum referindo-se a opressão sofrida e as 
ferramentas de luta contra o racismo, sexismo, classismo e o heterosexismo: 
 
A literatura produzida no campo político e acadêmico por feministas 
afrodescendentes tem enfatizado a centralidade da intersecção de 
“raça”, gênero, classe e sexualidade não só no que se refere à 
compreensão do status marginalizado e das drásticas condições de 
vida a que as mulheres negras encontram-se sujeitas, mas também 
no que diz respeito à elaboração de estratégias sociais e políticas 
que transforme tais circunstâncias (SANTOS, 2007, p. 02). 
 
 
 
Apesar de estarem separadas por fronteiras geográficas, socioculturais, 
econômicas e políticas as mulheres negras têm participado ativamente do 
feminismo, evidenciando o avanço na luta contra a opressão do sistema patriarcal e 
introduzindo na sociedade a reflexão não só da existência mas também da 
participação política e cultural da mulher negra. Dar voz a minoria é possibilitar a 
representatividade de fato. 
Partimos então do princípio de que a representatividade da mulher negra 
pode se dar também por meio da beleza. O fato é que o ser humano é repleto de 
particularidades. Cada indivíduo possui características únicas, como os olhos e as 
digitais por exemplo. Além das particularidades físicas individuais, temos traços 
diferenciados pela região, genealogia, cultura e meio em que vivemos. O dicionário 
Aurélio (2010) traz uma definição geral do termo como algo ligado a admiração: 
 
1. Qualidade de belo. 2. Pessoa bela. 3. Coisa bela, muito agradável, 
ou muito gostosa. (Dicionário da Língua Portuguesa Aurélio Buarque 
de Holanda Ferreira, 2010, 172). 
 
Falando de características culturais e sociais, não podemos deixar de lado as 
regras que permeiam os relacionamentos sociais entre os indivíduos. Precisamos 
falar do padrão de beleza. Para Bordenave (1997), o corpo é o instrumento mais 
completo de comunicação. Utilizado desde o “grunhido” até a internet hoje, como o 
autor afirma. A beleza física comunica padrões a serem seguidos. É um sistema de 
linguagem muito complexo que indica posição social, identidade étnica, origem, 
religião. 
O blog “A Cultura da Cor” trabalha essa temática de beleza negra. Reafirma: 
“O negro é belo”, uma das premissas do movimento Black Power, que surgiu em 
1960 nos Estados Unidos, na luta pelos direitos civis dos negros americanos. Como 
os americanos ditam muitas tendências, o movimento se espalhou pelo mundo todo, 
chegando ao Brasil. A cultura africana é recheada de adornos multicoloridos, 
tranças, dreads e blacks são traços específicos desse povo, resgatando suas 
memórias ancestrais (Blog “A Cultura da Cor”). 
O movimento Black Power e o Black Is Beautiful trouxeram à tona a 
valorização de uma minoria social que se via a margem de representação. Na 
atualidade e com a ajuda das redes sociais é possível notar outros movimentos 
semelhantes a esses que possibilitam a valorização a partir de uma beleza que é 
 
 
única e própria de um determinado povo. Nesse sentido, páginas online como: 
Cabelos & Cachos4, Cachos, Crespos e Dicas5 e Crespinhos SA6 contribuem com o 
movimento por meio de postagens diárias ou semanais que revelem a cultura do 
movimento (Facebook) 
Com isso torna-se incitável não pensar as redes sociais e o avanço da 
tecnologia como um tipo de ferramenta que tende a suscitar novos debates como 
também novas formas de representatividade. 
 
2. Redes Sociais Digitais: a representatividade negra por Camila Nunes 
 
Com o surgimento da internet, surgiu-se um novo mundo de comunicação, 
como novas linguagens, novas personagens, interações e interesses. Recuero 
(2009) trata em seu livro, as mudanças nas formas de organização, identidade 
conversação e mobilização social, a Comunicação Mediada pelo Computador. 
Aponta que as redes sociais digitais não só conectam computadores, mas também 
as pessoas. 
A socialização virtual promove uma conexão entre os indivíduos que são 
chamados de atores, pela autora. Em outras palavras, as redes sociais digitais são 
uma nova forma de interação pessoal mesmo que pela distância. Ainda assim 
promove uma construção identitária e representações, a diferença está no meio que 
é o ciberespaço: “Uma rede social é definida como um conjunto de dois elementos: 
atores (pessoas, instituições ou grupos; os nós da rede) e suas conexões 
(interações ou laços sociais)” (RECUERO, 2009, p. 24). 
Segundo McLuhan (1974), o meio de comunicação pode ser entendido como 
uma extensão da consciência humana, logo a internet propõem uma relação entre 
essas consciências. Sendo que sua maior afirmação é que o meio será sempre uma 
mensagem e dessa forma é necessário que estejamos atentos ao que cada meio 
revela como uma mensagem ou um código. 
 
4
 Página do Facebook Cabelos & Cachos: <https://www.facebook.com/blogdicasdafe/?fref=ts> Acesso em 23 de 
janeiro de 2017 
5
 Página do Facebook Cachos, Crespos e Dicas: <https://www.facebook.com/cachoscresposedicas/?fref=ts> 
Acesso em 23 de janeiro de 2017 
6
 Página do Facebook Crespinhos SA: <https://www.facebook.com/CrespinhosSa/?fref=ts> Acesso em 23 de 
janeiro de 2017 
 
 
A blogueira Camila Nunes faz uso da ferramenta internet para divulgação de 
seu trabalho como maquiadora e suas experiências como mulher negra. É o famoso 
“compartilhar”. Não só reinventou o sistema de emissão e recepção de mensagem, 
mas a internet, alavancou as tendências da comunicação. Um exemplo são os 
“memes”, que só precisam de um toque de criatividade e o restante de 
representatividade para “viralizar”, em outras palavras, atingir a massa. 
São as redes sociais digitais que espalham conteúdo em massa para muitas 
pessoas em questão de segundos. As mídias digitais que Camila utiliza em seu 
cotidiano são: YouTube – plataforma de compartilhamento de vídeo –, Instagram – 
plataforma de compartilhamento de fotos –, Facebook – redes sociais, ou como se 
chamava em 2005, sites de relacionamento (TELLES, 2010). 
Nisso, a troca de informações é muito grande. Possuir informação é possuir 
conhecimento. Possuir conhecimento é saber argumentar. Saber argumentar é 
saber se posicionar. O posicionamento têm sido a grande arma contra o racismo e 
as demais formas de opressão contra a mulher negra. Mas só se posicionar não foi 
o suficiente por muito tempo, até mesmo porque não era possível na mídia por 
exemplo. 
Por muito tempo a mulher negra esteve fora da padronização estipulada pela 
sociedade. É uma construção identitária que carece representatividade na mídia, 
apresenta uma conexão entre a cor da pele e a condição financeira, reforçando a 
discriminação e falta de espaço ocupado positivamente. Ser empregada doméstica 
ou babá não são profissões indignas, mas atribuir essa ocupação trabalhista à cor, 
só reforça a opressão do branco sobre o negro que deve servi-lo (MORAES, 2015). 
Atualmente, por meio das redes sociais vemos a visibilidade que a luta contrao racismo e sexismo vêm ganhando. Vídeos de exposição ao ato racista são 
compartilhados em grande escala na mídia social digital. Uma vez que, no passado 
o negro sofria preconceito calado, agora ele tem voz para expor sua ferida e não fica 
por isso mesmo. Afinal, racismo hoje é crime, conforme a Lei 1390/517 (BRASIL, 
1951, art. 1 a 7), conhecida como Lei Afonso Arinos. Temos grupos de grande 
visibilidade como a Página no Facebook Gelédes Instituto da Mulher Negra que 
além de dar voz às experiências vividas por elas, traz a representatividade como 
 
7
Disponível em: <http://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/128801/lei-afonso-arinos-lei-1390-51>. Acesso 
em: 27 de janeiro de 2017. 
 
 
anestésico para as feridas de muitas que acabam comentando e compartilhando sua 
própria vivência. 
Além de ferramenta de combate ao racismo8, a internet têm sido aliada da 
mulher negra em sua luta por conquista de espaço e representatividade. Seja no 
mercado de trabalho ou no consumo de produtos, assunto último, que abordaremos 
na sequência. 
Hoje podemos dizer que o negro têm alcançado mais visibilidade quando 
falamos de sua participação social e midiática. No decorrer dos últimos anos, o 
potencial de consumo do consumidor negro – que consome de fato – se tornou alvo 
de pesquisas a fim de ser explorada a comunicação, interação e representação dos 
mesmos na sociedade. Acompanhando a tendência do “compartilhar” pensamentos, 
ideias, ideologias e interesses nas redes sociais, a moda e o mundo da beleza não 
ficaria para trás (MORAES, 2015). 
A mulher negra não só vêm ganhando espaço na mídia para “desabafar” mas 
também para consumir. Marcas estão com os olhos sobre a mulata que antes só 
usava roupa de empregada e se interessava por produtos de limpeza. Agora, são os 
produtos de beleza que elas querem. Nos EUA, a revista Essence – revista para o 
público feminino negro – lançou sua “própria caixa da beleza” (AGOSTO, 2015), com 
produtos específicos para a consumidora negra. No Brasil, chegou um pouco depois, 
por meio da Afrô – cujo título da caixa é Afrôbox com o objetivo de impulsionar o 
consumo consciente, ampliando a visibilidade e autovalorização da mulher afro, 
desde maquiagem a produtos para o corpo todo. 
 
2.1 “Camila Nunes Make up”: uma ferramenta da internet para a pele negra 
 
Lembrando que estamos inseridos na era da mídia digital, vamos analisar a 
representação de gênero e raça que Camila propõem em seu contexto de 
comunicação atual, seguindo o Modelo de Lasswell, da teoria de comunicação, por 
meio das seguintes perguntas: Quem? Diz o quê? Através de que Canal? A quem? 
Com que efeito? (WOLF, 2009). 
 
8
 A música é uma ferramenta utilizada no combate ao racismo. Músicas como “Boa Esperança” do Emicida e 
“Negra Ângela” do Neguinho da Beija-Flor contribuem com a luta. No teatro também vemos essa contribuição, 
retratada, por exemplo, no fim da apresentação da peça “O Topo da Montanha” que fala sobre a vida do líder 
negro americano Martin Luther King, os atores Lázaro Ramos e Taís Araújo disseram à plateia: “Essa peça fala 
de respeito e afeto. O bastão agora está com vocês”; fato que ocorreu em novembro de 2015, após Taís ter 
recebido comentários racistas em sua página no Facebook. 
 
 
Camila Nunes é mulher e negra que por sua condição de gênero e raça, 
conforme relatado até aqui, é oprimida pelos demais indivíduos, por esses dois 
principais aspectos. Mesmo em meio ao racismo e sexismo, a blogueira se dedicou 
em sua formação no ramo da beleza e formou-se em Maquiagem e Estética. 
Trabalha constantemente com ferramentas de beleza e procura representação para 
seu tipo de pele, uma vez que a luta contra o racismo pode enfrentar os mais 
diversos obstáculos. Um deles, a anulação da participação do negro na sociedade 
em relação a consumo de produtos de beleza. (Dados coletados de suas redes 
sociais). 
Como profissional da beleza (maquiadora), seu foco é a maquiagem feminina. 
E pela interatividade que as redes sociais digitais fornecem (RECUERO, 2009), 
apresenta seu trabalho por meio de vídeos na plataforma midiática YouTube com 
dicas de maquiagens para a pele negra, onde comprar os produtos, como usa-los, 
valores, incentivando suas leituras/seguidoras ao empoderamento. 
Como ferramenta de divulgação, utiliza o Instagram para promover seus 
vídeos e seu trabalho. Essa promoção atinge pessoas que buscam 
representatividade na maquiagem de pele negra, seja para própria produção ou para 
fins profissionais, uma vez que produtos e técnicas para esse tipo de consumidor 
vêm sendo apresentados pela blogueira que fala de novidades, em parcerias com 
marcas de cosméticos como Vult, Sephora e a TBlogs que até lançou batom 
exclusivo da blogueira em 2016. Suas publicações são trocas de consciência 
(MCLUHAN, 1974) e experiências, promovendo uma interação entre quem emite a 
mensagem e quem recebe, contribuindo com empoderamento feminino negro. 
 A representação de uma minoria veiculada na mídia social digital, 
considerada um meio de comunicação de massa, propaga a diferença e traz 
visibilidade ao não visto, ao não reconhecido pela e, na sociedade. Promove 
avanços à igualdade por meio da discussão em movimento nas mídias. Permite uma 
atenção ao consumo de uma classe com identidade. Por isso: 
 
 Reconhece-se a importância dos meios de comunicação de massa, 
sua capacidade de difundir ideias, de se comunicar diretamente com 
as massas, e, sobretudo, a possibilidade que tem em criar estados 
emocionais coletivos (ORTIZ, 1988, p. 116). 
 
Foram realizadas análises em duas postagens de Camila Nunes em seu 
Instagram. 
 
 
 
Na primeira ilustração observamos a expressão “Ei negas” que Camila usa 
para se referir a suas seguidoras, trazendo assim uma proximidade com quem a 
acompanha, consequentemente representatividade, efetivando a identidade desse 
público específico. 
Nessa postagem, a maquiadora anuncia o uso de um produto (cosmético) 
para diferentes tons de pele. Por muitos anos o negro não frequentou o mesmo lugar 
que o branco, se “contentava” com os restos de comida, a limitação de posses e 
consumo para a sobrevivência. (NASCIMENTO, 2012) 
Soa como desafio usar um mesmo produto que a mulher branca padronizada 
usa. Porque ainda existe uma classificação de direitos de consumo entre as 
diferentes raças, gêneros e cultura. Assim como a história da propaganda relata a 
identificação que o negro tinha no Brasil, no ano de 1809, com sua primeira aparição 
 
 
em um anúncio – um ano após a criação da imprensa brasileira – como escravo 
fugitivo (NASCIMENTO, 2012). 
Por outro lado, não podemos negar o avanço que a propaganda atingiu em 
relação a publicidade negra. Na postagem de Camila, vemos o desafio mas também 
vemos a barreira da “não acessibilidade à maquiagem” sendo quebrada. Uma forma 
de sair do protocolo e promover avanços na luta contra qualquer forma de racismo. 
Que implica no reconhecimento das desigualdades entre as mulheres brancas e 
negras, que com o passar dos anos vêm diminuído por meio dessas manifestações 
nos meios de comunicação de massa. 
 
Na segunda análise problematizada – seguindo a mesma intenção da 
postagem anterior, de reafirmar o consumo igualitário entre a mulher branca e 
mulher negra – observamos a variedade de possibilidades de representações 
“femininas” no mundo da beleza. A hegemonia masculina não é o único elemento 
 
 
opressor para a mulher, pois exige também, a superação de ideologias 
complementares desse sistema de opressão, como o racismo: 
 
Nessa perspectiva, a luta das mulheres negras contra a opressão de 
gênero e de raça vem desenhando novos contornos para a ação 
política feminista e anti-racista, enriquecendo tanto a discussão da 
questão racial, como a questão de gênero na sociedadebrasileira. 
(CARNEIRO, 2003, p. 03) 
 
O empoderamento manifestado no texto utilizado para a foto é atrelado a 
capacidade de interação social por sua condição racial, que pode ou não possibilitar 
o consumo livre de produtos que represente a identidade feminina. No caso da 
mulher branca, a possibilidade de consumo é maior que as opções apresentadas a 
mulher negra. Quando a blogueira afirma que “é preciso” publicar e compartilhar 
essa pluralidade de belezas e consequentemente de consumo, ela torna o racismo 
um assunto a ser discutido no ramo da beleza e na WEB, objetivando o combate ao 
mesmo. Ao longo dos anos, os processos de mudança e revisão do feminismo são 
vistos pelos setores democráticos e pelos formadores de opinião como momentos 
de surgimento de novos conceitos e práticas. 
A validação da Camila Nunes como profissional e comunicadora na internet, 
impulsiona a representação do feminismo negro. Por seu destaque como porta-voz 
da mulher negra, possibilita a visibilidade de sua luta e conquistas já alcançadas por 
meio de seu trabalho. Uma forma de enegrecer o feminismo, expressão designada a 
trajetória das mulheres negras no interior do movimento feminista brasileiro. 
Validação essa, que dialoga com a afirmação de Sueli Carneiro (2003), fundadora e 
coordenadora-executiva do Geledés – Instituto da Mulher Negra São Paulo: 
 
Acredito que nessa década, as mulheres negras brasileiras 
encontraram seu caminho de autodeterminação política, soltaram as 
suas vozes, brigaram por espaço e representação e se fizeram 
presentes em todos os espaços de importância para o avanço da 
questão da mulher brasileira hoje (CARNEIRO, 2003, p. 07) 
 
Um ponto relevante a ressaltar do movimento feminista negro refere-se aos 
resultados, conquistas e contribuições gerados por esses intercâmbios políticos 
manifestos na figura da Camila Nunes como mulher negra. Pois a cada postagem, 
nota-se um acréscimo de comentários compartilhados pelas seguidoras, curtidas, 
participação da classe. E a partir dessas possibilidades de trocas, as mulheres 
 
 
negras têm construído e sustentado alianças e espaços de confrontamento, crítica e 
análise de pensamentos e políticas a favor e contra as mulheres, em especial, as 
negras. 
Além disso, o fato de representar uma minoria que até então não era pensada 
como consumidora de produtos e serviços de beleza, revela que o mercado precisa 
o tempo todo se atentar às necessidades não apenas de um tipo de mulher ou pele. 
É importante compreender que o fato de uma mulher negra poder discutir em um 
meio como é a rede social, sobre suas próprias necessidades, revela-se como uma 
mensagem bem clara de que ser mulher e consumir produtos de beleza não pode 
mais estar restrito apenas a um tipo padrão da sociedade brasileira, que aliás, é feita 
de uma diversidade esplêndida de mulheres, homens, corpos, cores e identidades. 
 
Considerações Finais 
 
Com as análises realizadas baseadas em pesquisas bibliográficas neste 
artigo, cujo objetivo central é problematizar a representação e beleza da negritude 
feminina na WEB, é possível encontrar a representatividade identitária de uma 
minoria que ganhou espaço no mundo real por meio do mundo virtual. Analisamos a 
visibilidade da mulher negra a partir da maquiagem de pele negra feminina nas 
postagens da blogueira e maquiadora Camila Nunes. 
Foi necessário discutir o movimento pelo qual a cultura passou. Protocolos 
impostos na sociedade e também seus rompimentos. Quando falamos de cultura, 
precisamos falar de identidade, que por sua vez, é quem revela a vasta diferença 
cultural presente em cada indivíduo. Tratando-se do gênero, o feminismo foi 
discutido a fim de ser compreendido suas necessidades, como por exemplo, de 
incluir em sua luta, voz contra a opressão racial que a mulher negra enfrenta. 
Durante o caminho percorrido, os fenômenos de comunicação foram 
entendidos como ferramentas cruciais para, de fato, promover a representatividade 
da mulher negra. A própria blogueira, em suas postagens, declara sua realização em 
apresentar-se como fonte de inspiração no quesito maquiagem e ao mesmo tempo 
como ferramenta de luta no combate à desigualdade racial e de gênero, no mercado 
consumidor. 
No início da pesquisa, em 2015, a blogueira tinha em torno de 55 mil 
seguidores no Instagram, com quase 1.500 publicações, seguindo 794 perfis na rede 
 
 
social. Atualmente seu número de seguidores dobrou, passando para 104 mil 
seguidores. Além de novas pessoas que tiveram acesso a ela, agora segue 1.090 
perfis. Números nos revelam fatos. Por traz de cada acesso em seu canal, 
Instagram, página do Facebook e blog, uma interação acontece, seja ela forte ou 
fraca (RECUERO, 2009). Estabelece uma troca de consciência da cultura negra, 
tornando visível e acessível o conhecimento de sua beleza. Em um ano, os números 
dobraram, impulsionando assim, o trabalho da maquiadora até que em agosto de 
2016 Camila lançou seu próprio batom em parceria com a TBlogs que promove 
exclusivamente maquiadoras de todo o Brasil lançando produtos de beleza com seu 
nome. 
Camila Nunes iniciou o ano de 2017 dando continuidade no avanço na 
visibilidade de seu trabalho. Participou do Programa É de Casa da Rede Globo, 
dando dicas de como comprar e utilizar maquiagem na pele negra. (G1.COM, 2017) 
Uma emissora que é de grande porte, preferida no horário nobre e de grande 
influência nacional (KANTAR IBOPE MEDIA, 2016) abriu portas para falar de 
automaquiagem negra. 
Há muita luta pela frente. Há muito que se corrigir quando falamos de 
racismo, principalmente no contexto virtual. Mas por se tratar de uma ferramenta de 
propagação de ideia, a WEB é uma ferramenta poderosíssima de visibilidade, 
identidade e representatividade para as minorias. Para a mulher negra, mais um 
espaço de conquista. 
 
REFERÊNCIAS 
WOLF, Mauro. Teorias das comunicações de massa/ Mauro Wolf; tradução: Karina Jannini. 
- 3. ed. - São Paulo: Martins Fontes, 2009. 
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 1. ed. - Rio de Janeiro: DP&A 
Editora, 1992. 
CARNEIRO, Sueli. Enegrecer o feminismo: A situação da mulher negra na américa latina a 
partir de uma perspectiva de gênero. - São Paulo, 2003. 
SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil para análise histórica/ Joan Scott; tradução: 
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BELEZA. In: FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini dicionário da língua portuguesa. 
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